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A decisão de bloqueio do Whatssapp: princípio da razoabilidade x segurança jurídica

Agenda 21/07/2016 às 01:36

Trata-se de análise jurídica da decisão proferida pela Justiça Estadual Carioca de primeiro grau, em 19 de julho de 2016, que suspendeu o funcionamento do aplicativo Whatssapp, confrontando o princípio da razoabilidade com a segurança jurídica.

Está se tornando comum, ao trocar mensagens de texto pelo aplicativo Whatssapp, perceber falha no envio e posteriormente tomar conhecimento de que algum magistrado de primeiro grau suspendeu o funcionamento do referido instrumento de comunicação, como medida coercitiva para obriga-lo a fornecer informações referentes a mensagens trocadas por seus usuários. Neste dia 19 de julho não foi diferente; por volta das 11h30min os provedores de conexão foram notificados da ordem judicial prolatada pela Juíza de Direito Daniela Barbosa, que determinou a suspensão do aplicativo, tendo em vista que o gigante do entretenimento, Whatssapp, se negou a oferecer informações pertinentes à instrução probatória de um inquérito policial (2016).

De fato, desnecessário é comentar o quanto foi incomoda ao povo tal decisão judicial, tendo em vista que além privar alguns do lazer, que usavam o aplicativo para sem comunicarem com amigos e familiares, prejudicou a atividade profissional de muitos, que faziam do Whatssapp uma ferramenta de trabalho. Entretanto, indaguemo-nos: juridicamente a decisão foi razoável?

Nos moldes do que dispõe o artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal, “é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica”. Porém, nos dizeres de Antonio Fernando Pires, “temos a soberania como princípio da ordem econômica” (2014, p. 369). Em suma, é licito a todos explorar a ordem econômica brasileira, desde que respeitadas as leis e as instituições públicas, verdadeiras expressões da soberania. Nesta esteira, o gingante norte americano da comunicação não poderia desrespeitar a requisição da Juíza de Direito Carioca.

Porém, não basta a decisão judicial seguir a direção certa, entre o deferir e o indeferir, entre o absolver e o punir. A decisão, principalmente coercitiva e punitiva, precisa ser razoável, proporcional à falta do agente. Nesse sentido, leciona Oriana Piske que “os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade são cânones do Estado de Direito, bem como regras que tolhem toda ação ilimitada do poder do Estado no quadro de juridicidade de cada sistema legítimo de autoridade” (2011).

Segundo o Presidente do Conselho Nacional de Justiça, Ricardo Lewandowski, no ano de 2013 cada magistrado teve sob sua jurisdição uma média de 6.000 processos (LEWANDOWSKI, 2014). O mesmo órgão, por meio do programa de prestação de contas “Justiça em Números” divulgou que no ano de 2014 o Superior Tribunal de Justiça recebeu 326 milhões de novos processos, enquanto o Tribunal Superior do Trabalho, 244,5 milhões de processos.

Como dito, o Whatssapp merecia uma reprimenda pelo desrespeito à determinação judicial. Não obstante, não é razoável uma decisão prolatada em primeiro grau, em um único processo, gerar efeitos em todo território nacional, atingindo diretamente  milhões de brasileiros que usam o aplicativo, seja para o laser, como uma forma de se comunicar com os entes queridos, seja como ferramenta de trabalho.

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A sanção deveria ser voltada ao Whatssapp e não a todo povo brasileiro.

Para Dalmo de Abreu Dallari, o Estado, “como sociedade política, tem um fim geral, constituindo-se em meios para que os indivíduos e as demais sociedades possam atingir seus fins particulares” (DALLARI, 1989, p. 91). E o magistrado, que no exercício judicante é o Estado personificado, deve ser razoável em suas decisões, evitando o sentimento de desconforto no povo, fazendo valer sua função de justiça.     

REFERÊNCIAS 

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números. Disponível em: http:// http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Direito. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1989.

LEWANDOWSKI, Ricardo. Desafios e Perspectivas do Judiciário. LETRADO: revista da IASP, n.110, p. 20-21, 2014.

O GLOBO. WhatsApp: Justiça do RJ manda bloquear aplicativo em todo o Brasil. São Paulo, 19 jul. 2016. Disponível em: http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2016/07/whatsapp-deve-ser-bloqueado-decide-justica-do-rio.html. Acesso em: 21 jul. 2016.

PISKE, Oriana. Proporcionalidade e Razoabilidade: Critérios de Intelecção e Aplicação do Direito. TJDFT: revista do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Distrito Federal, 17 nov. 2011. Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/artigos/2011/proporcionalidade-e-razoabilidade-criterios-de-inteleccao-e-aplicacao-do-direito-juiza-oriana-piske. Acesso em: 21 jul. 2016

Sobre o autor
João Gabriel Fraga de Oliveira Faria

Advogado (OAB/SP n. 394.378). Especialista em Direitos Fundamentais pela Universidade de Coimbra - Portugal. Especialista em Direito Constitucional Aplicado. Cursou especialização em Direito Público. É especialista em Direito Empresarial. Fez especialização em Direito e Processo Civil. É presidente da comissão de Direito de Família da 52º Subseção da OABSP. Foi membro da diretoria do núcleo regional (Lorena/SP) do IBDFAM. E-mail para contato: joaogabrielfariaadvogado@gmail.com.

Informações sobre o texto

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