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O "jeitinho brasileiro" e "brasileiro otário".

A elite racista manipuladora

Agenda 05/08/2016 às 14:44

Livros, artigos, colunas, enfim, a liberdade de expressão no Brasil tem sido usada com intenções nada democráticas. E ainda tentam desmerecer os brasileiros, o "povão". Mas foi o "povão" que desenvolveu o Brasil!

O "jeitinho brasileiro" e "brasileiro otário". A elite racista manipuladora

Caros leitores, hoje,  tive o prazer de sentar num banco de praça pública para pegar sol. Algo que já não fazia há muito tempo. Fiquei olhando a localidade, sem maiores concatenamentos. Porém, instantaneamente, hábito profissional, comecei a reparar nas pessoas que estavam na praça, além de mim. Na maioria idosos, jogando cartas, outros se exercitando nos aparelhos de ginásticas da Prefeitura. Vi crianças negras brincando, outras procurando, nas latas de lixo, algo de interessante para elas. A praça possui um lago com chafariz desativo e, dentro do lago, sacos de lixo. Vi uma mulher negra pendurando roupas no banco da praça para secar.

Próximo ao assento em que eu estava, um senhor começou a olhar as crianças negras. Depois ele começou a olhar outras crianças e adolescentes, também negros, que estavam falando alto. Senti certa agitação nesse senhor. Também presenciei trabalhadores, possivelmente em horário de almoço, com seus respectivos uniformes. Quase esqueci, na praça há Estação de Metrô. Algum tempo, um homem sentou ao meu lado. Mais alguns minutos, e uma senhora pediu licença para também sentar. A praça é pública, certo? A senhora comentou sobre o lixo no lago, "As pessoas que jogam!". "Exato, hábito cultural!", respondi. Parece que ela não gostou, todavia, é péssimo hábito, indiferentemente da classe social, da etnia. Ventania. Resolvi, e estava já na hora de ir.

Agora estou aqui redigindo este artigo. Pois bem, o que me surpreendeu foi escutar "Pare com isto, parece favelada!". Pensei "Deve ser algum branco!", ledo engano. Era um casal com sua filha, todos afrodescendentes. Ah! A palavra afrodescendente não foi criada pelo PT, consulte a ONU. Por que uma mãe afrodescendente falaria isso para sua filha? Porque as gerações dos afrodescendentes foram duramente condicionadas de que eles próprios eram inferiores em relação aos “superiores” brancos. Essa doutrinação alienante pertence ao darwinismo social, teoria que possibilitou o colonialismo, a exploração de mão de obra escrava pelo conceito de que culturas inferiores deveriam ser conquistadas para “evoluírem”. Além disso, a África foi amaldiçoada por Noé, justificando colonizações e escravidão. Séculos de doutrinações, até por parte da Igreja Católica, de que os negros são sub-raças e, como tal, não são dignos de viver com dignidade, pois dignidade humana pertence somente aos “eleitos” por Deus, ou capacitados biologicamente, como no caso da eugenia.

 Minha geração foi doutrinada com certas "verdades", e agora venho retirando o Véu de Ísis através dos artigos. Uma delas é que brasileiro é preguiçoso, ou seja, não gosta de trabalhar; em outras palavras, “vagabundos”. Concordo, pelo prisma dos que exploraram a mão de obra negra, com certeza, são leitões. Concordo, também, pelo mesmo prisma, que o Estado [oligárquico e aristocrático] fez de tudo para continuar com a exploração da mão de obra dos que não eram considerados "dignos". No entanto, o Brasil é uma das maiores economias do planeta Terra, o que não foi conquistado com palavras, mas por muito trabalho. A mentira caiu por terra. Há quem diga que foram os estrangeiros, início do século XX, como portugueses, italianos, japoneses etc., que trabalharam duríssimo para este país.

Os brasileiros — negros e índios —, por sua vez, eram preguiçosos e nada fizeram para desenvolver este país. Deveria existir algum livro cujo título seria “A História da Loucura Brasileira para narrar as hipocrisias ensinadas nas instituições de ensino”. O Estado Novo queria o “branqueamento” do Brasil, pois negros [inferiores] existiam mais do que brancos [superiores], o que, nas palavras dos eugenistas, causava atraso, considerável, ao desenvolvimento do Brasil — o leitor poderá encontrar mais sobre eugenia, na minha página pessoal, já disponível.

De 1500 até 2016, a mão de obra negra contribuiu muito, mas muito, para o desenvolvimento do Brasil, fato este comprovado pela Década Internacional de Afrodescendente 2015-2024 — de que os afrodescendentes contribuíram para o desenvolvimento das Américas. Logo, brasileiro não é preguiçoso. Quanto ao “jeitinho brasileiro”, cada caso é um caso. Qualquer estudante de Direito, ou outra ciência humana, como sociologia, história, por exemplo, ou os já formado, conhece muito bem sobre o desenvolvimento brasileiro privilegiando certas classes sociais. Também existe a diferença entre lei e postura. Mesmo que haja leis para conduta ilibada do agente público, exercendo ou não suas funções, a corrupção sempre foi a marca registrada brasileira. Há também a burocracia a serviço das elites, para dificultar a vida dos “indesejáveis”. Ou seja, um Estado Déspota, mesmo nos períodos democráticos.

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Os resultados das políticas darwinista e eugenista nos séculos?

[...] vou aos morros e vejo crianças com disposição, fumando e vendendo baseado. Futuramente, elas serão três milhões de adolescentes que matarão vocês [a polícia] nas esquinas. Já pensou o que serão três milhões de adolescentes e dez milhões de desempregados em armas? Quantos Bangu Um, Dois, Três, Quatro, Cinco... Terão que ser construídos para encarcerar essa massa? (AMORIM, 2004, p. 348)

Tanto nos EUA [negros e hispânicos] quanto no Brasil [negros], cadeia é para os “inferiores”. Tanto no Brasil quanto nos EUA, os “superiores” [brancos] são beneficiados por políticas light de condenações, como serviços comunitários. Ambos os países cometem violações gravíssimas de direitos humanos. As políticas urbanísticas, como aconteceu em Detroit e no Rio de Janeiro, nesta o famoso Bota Abaixo, sempre criaram empecilhos para os “inferiores”. A especulação imobiliária, as restrições criadas pelos Estados [EUA e Brasil], condutas que deixaram, e ainda deixam, os cidadãos norte-americanos e brasileiros nas sarjetas. Escuto muito sobre a maravilhosa economia dos EUA, onde as pessoas compram carros, eletroeletrônicos e eletrodomésticos com facilidade, em menos horas trabalhadas. Se é tão maravilhoso assim, como os EUA (e outros países) conseguiram “quebrar” suas economias em 2008? Simplesmente os bancos deram créditos e mais créditos podres, ou seja, os bancos emprestaram o que não tinham. Como, em 2016, os norte-americanos ainda tentam se erguer para ter qualidade de vida, que não têm desde a década de 1980? Neoliberalismo, este recriminado por sociólogos e ganhadores do Nobel de Economia. Reino Unido e EUA, mãe e pai do neoliberalismo, os países com altíssimas taxas de desigualdades sociais.

Pois bem, o brasileiro otário é o povo. Povo este que foi deixado ao esquecimento dos avanços econômicos. Somente em 1990 houve avanço pleno Estado Social do Bem-Estar. Milhões saíram da extrema pobreza, da fome. Sob um sistema perverso, que intitulo de Máquina Antropofágica — a novela Velho Chico e minissérie Liberdade Liberdade resumem tudo o que é o Brasil —, os “inferiores” tiveram que sobreviver pelo Pão e Circo, enquanto as elites consumiam todos os recursos econômicos do solo tupiniquim.

A Lava Jato conseguiu colocar os poderosos atrás das grades, feito este que entrará para o Guinness World Records. As dez medidas propostas pelo Ministério Público, juntamente às milhões de assinaturas do povo cansado de ser explorado, ainda serão apreciadas pela Câmara dos Deputados. Se o povo nada fizer [pressionar], com certeza, há muitos risos dos calhordas do PPPI [Parceria Público Privada Ímproba] lesarem os otários brasileiros. Sempre questionei a postura dos brasileiros que só levantavam a bandeira do Brasil em jogos futebolísticos, ou eventos de alegria nacional. Entendo que cultura faz bem, e entendo que as festividades, um pouco, serviam para esquecer a vida ingrata produzida pelos calhordas.

A Justiça brasileira, como bem pontuou o Procurador da República, Deltan Dallagnol, no Programa do Jô [02/08/2016], sempre privilegio a impunidade dos calhordas — não usou esta palavra, mas imagino que, se pudesse, falaria — “representantes do povo”. Amei quando ele disse que o brasileiro não pode mais ficar na poltrona reclamando ou culpando os portugueses colonizadores pelas mazelas do país, tem que agir. É necessário agir, sair da zona de conforto, se assim acham, todos que querem mudanças. Entretanto, político brasileiro não veio de Marte, o que prova que o problema é cultural. Cultura essa que foi doutrinada a considerar o imoral como moral, como no exemplo “Roubou, mas fez!”. Ou seja, consegue-se, infelizmente, introduzir uma nova moral justificando a própria imoralidade, numa inversão de valores.

Escravidão tem vários meios de se consolidar, por exemplo, o trabalho análogo à escravidão. Se analisarmos, por exemplo, o empregado doméstico, este laborava por um salário, se é que se pode dizer salário, e nada mais. Quando o empregador se cansava do empregado doméstico, o olho da rua, e nada mais. Além disso, muitos empregados domésticos sofriam nas mãos de seus empregadores, já que, sem proteção trabalhista [CLT], estes exigiam posturas aquém dos limites físicos, outros sofriam com as chacotas de seus "senhores". “E ai” do empregado que reclamasse do seu "senhor" ou "senhora".

O racismo e o preconceito ainda existem, os noticiários sobre digitações, palavras e frases de "macaco", "comedor de banana", entre outros, são notórios. Se não existissem brasileiros abolicionistas, ainda nos tempos atuais, as correntes seriam colocadas nos "inferiores". Não é à toa que a ONU lançou a Década Internacional dos Afrodescendentes.

REFERÊNCIAS:

AMORIM, Carlos. CV_PCC: A irmandade do crime. 4. Ed. Rio de Janeiro: Record, 2004

GRILLO, CRISTINA. Guetos no Brasil são das classes média e alta, diz sociólogo francês. São Paulo, domingo, 22 de abril de 2001. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2204200119.htm

IPEA. História - O destino dos negros após a Abolição. Disponível em http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2673%3Acatid%3D28&Itemid=23

PEREIRA, Sérgio Henrique da Silva. O darwinismo social presente no Brasil do século XXI. JusBrasil. Disponível em: http://sergiohenriquepereira.jusbrasil.com.br/artigos/115488228/o-darwinismo-social-presente-no-brasil-do-seculo-xxi

Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes. OS PENSADORES QUE INFLUENCIARAM A POLÍTICA DE EUGENIA DO NAZISMO. Disponível em: http://ruisoares65.pbworks.com/f/darwinismo+social+e+eugenismo.pdf

Revista Pesquisa Fapesp. Os indesejáveis. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2012/11/12/os-indesejaveis/

WILKINSON, Richard; PICKETT, Kate. O Espírito da Igualdade – Por que razão sociedades mais igualitárias funcionam quase sempre melhor. Coleção: Sociedade Global. Nº na Coleção: 40. Data 1ª Edição: 20/04/2010. Nº de Edição: 1ª. Editora Presença


 

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

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