3. CONCLUSÃO
Diante dos argumentos apresentados, a vedação à liberdade provisória, de uma maneira geral, se mostra absolutamente incompatível com o ordenamento jurídico, pautado em bases constitucionais sólidas de defesa dos direitos individuais contra eventuais arbitrariedades que, porventura, possam afetá-los.
Como visto, muitas decisões invocam a cláusula da inafiançabilidade prevista na Constituição como fundamento lógico para a vedação à liberdade provisória, seja ela com ou sem fiança, o que se mostra equivocado, conforme se procurou demonstrar.
Com efeito, a expressão inafiançabilidade remonta ao contexto histórico da edição do Código de Processo Penal, em que a fiança era a única espécie de se alcançar a liberdade provisória. Após a edição da lei 6.416/77, foi incorporada ao nosso sistema a liberdade provisória sem fiança, o que enfraqueceu demasiado o instituto da fiança, permanecendo desta forma até muito recentemente. [12]
Neste sentido, entender a inafiançabilidade como impositiva da vedação à liberdade provisória é inconcebível. O constituinte apenas limitou a aplicação da modalidade com fiança. E, tratando-se de garantia fundamental, não são admitidas interpretações restritivas quando cabível uma mais salutar à tutela dos direitos fundamentais.
Além disso, deve a medida cautelar ser aplicada respeitadas sua excepcionalidade, no sentido de extrema ratio da ultima ratio; sua função de instrumento de tutela do processo; a jurisdicionalidade, somente podendo ser aplicada se emanada de autoridade judicial competente para tanto, mediante ordem devidamente fundamentada, o que indica a necessidade da motivação das decisões; além de necessitar respeitar a proporcionalidade das decisões.
E ao vedar a liberdade provisória, o legislador retira toda esta análise essencial das mãos do judiciário, transformando o juiz em mero aplicador autômato da lei. É o juiz quem deve aferir, no caso concreto, quem deve ser preso, e não o legislador, mediante um juízo abstrato de periculosidade da conduta ligada à traficância de drogas.
Por fim, cabe ressaltar que o que aqui é defendido não é a absoluta impossibilidade de negativa à liberdade provisória e conseqüente vedação à aplicação da prisão cautelar. Apenas se defende que para tanto, seja necessária atenção a todos os requisitos e características a ela, prisão, inerentes.
Assim, com base em tudo o que foi exposto, considera-se a vedação à liberdade provisória contida na lei de tráfico de drogas incompatível com o ordenamento jurídico como um todo.
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Notas
[1] Dados do Ministério da Justiça, disponíveis em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPBRIE.htm> Acesso em: 12 Jan. 2011
[2] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 149.535/MG. Rel. Ministro Anselmo Santiago. 6ª Turma. Julgado em 24/11/1998. DJ 01/02/1999, p. 239
[3] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ª Ed.. São Paulo: RT, 2007, p. 591-592
[4] WEDY, Miguel Tedesco. Teoria Geral da Prisão Cautelar e Estigmatização. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 04
[5] Dados disponíveis em :< http://www.ipclfg.com.br/category/campanha-sobre-a-violencia-penitenciaria/> Acesso em: 24 Set. 2011
[6] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 840730/SP. Rel. Ministro Sidnei Beneti. 3ª Turma. Julgado em 13/04/2010. DJe 22/04/2010.
[7] LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas: Lei 12.403/2011. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011. p. 173
[8] PACELLI, Eugênio de Oliveira. Curso de Processo Penal. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p.553.
[9] MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed.rev. e at. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 715.
[10] PACELLI, Eugênio de Oliveira. Curso de Processo Penal. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p.565
[11] FRANCO, Alberto Silva. Crimes Hediondos. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. p. 679
[12] Com a edição da lei 12.403/2011, o legislador parece ter reencontrado alguma utilidade para ela, já que se encontra no rol das medidas cautelares diversas das prisões que podem ser aplicadas.