4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho preocupou-se em analisar, sob a perspectiva do Biodireito e da Bioética, os novos conceitos de família frente à quebra de paradigmas e o que preconiza a Resolução 2013/2013 do Conselho Federal de Medicina, quanto à possibilidade dos casais homossexuais recorrerem à reprodução assistida, em especial os casais lésbicos.
Partindo desse pressuposto, a constitucionalização do Direito Civil proporcionou mudanças de paradigmas, tendo em vista que a Constituição Federal, cujo centro axiológico é a dignidade da pessoa humana, passou a vigorar com supremacia material em nosso ordenamento jurídico.
Nesse contexto, o Direito de Família foi um dos mais beneficiados, a partir desta visão mais pluralista e tolerante, que tem abandonado a ideia conservadora a respeito da formação familiar, tendo em vista que antes da Lei Maior de 1988 só era reconhecida como legítima a família decorrente do casamento. Tal abandono pode ser evidenciado pelas decisões dos tribunais que passaram a reconhecer estas novas configurações familiares, contribuindo para sua legitimação perante à sociedade.
E nessa linha de raciocínio, é importante ressaltar os princípios da igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana perante o Direito de Família, especificamente no que diz respeito às famílias homoafetivas. Elas, como qualquer outra formação familiar, possuem direitos e deveres, inclusive no que tange aos filhos. Diversos casais homossexuais têm recorrido às técnicas de reprodução assistida para concretizarem o sonho de terem sua prole, fato este plenamente possível perante as garantias constitucionais que implicam em assegurar proteção ao indivíduo em suas estruturas de convívio e familiares, independentemente de sua orientação sexual.
Neste sentido, verificou-se que a Resolução 2013/2013 do Conselho Federal de Medicina permitiu o uso das técnicas de reprodução assistida para relacionamentos homoafetivos. A partir disto, surgiu a discussão pertinente ao Biodireito e à Bioética, uma vez que esta visa através de seus princípios, discutir a respeito de questões por vezes polêmicas como início e fim da vida e reprodução assistida, por exemplo.
Já o Biodireito visa à regulação de tais condutas que estão sendo cada vez mais presentes na realidade brasileira. E isso pode ser verificado na jurisprudência pátria com o reconhecimento de dupla maternidade e a possibilidade de adoção unilateral quando apenas uma das companheiras homoafetivas faz uso das técnicas de reprodução assistida heteróloga e isto também foi decorrente desta visão mais pluralista, tolerante e reconhecedora do afeto. Fora evidenciado que a reprodução humana assistida, no casos dos casais lésbicos, é classificada como heteróloga, pois haverá sempre um terceiro estranho à relação, o doador. Torna-se recorrente entre esses casais o fato de uma doar o óvulo, considerada a mãe biológica, e a outra parceira participar da gestação, a mãe gestacional.
Apesar de existir, por exemplo, a Resolução do Conselho Federal de Medicina e a Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça que tratam sobre uso de técnicas de reprodução assistida por casais homossexuais e sobre casamento e união estável de pessoas do mesmo sexo, respectivamente, elas não têm força normativa, ou seja, ainda não há uma lei consolidada que enfrente a questão de forma específica, o que evidencia uma lacuna no Direito, que deve ser preenchida para que sejam efetivamente alcançados os objetivos constitucionais e para que sejam de fato atendidos os casos concretos.
Por fim, concluiu-se que a constitucionalização do direito civil proporcionou uma mudança no modo de pensar decorrente da quebra do paradigma da família tradicional, sendo a Resolução 2013/2013 um avanço em prol do reconhecimento das famílias homoafetivas. Contudo, ainda há óbices a serem superados e a análise interdisciplinar, a partir da ótica do Biodireito e da Bioética, é de suma importância para o enfrentamento destas questões.
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