PROGRAMAS DE COMPLIANCE
Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 76) indica o significado da referida medida preventiva:
A expressão “compliance” deriva do verbo em inglês “to comply”, que significa cumprir ou satisfazer as regras impostas e poderia ser definido como o conjunto de medidas adotadas por determinada empresa para garantir o cumprimento de exigências legais e regulamentares e implementar princípios de ética e integridade no ambiente negocial.
Programas como esses estão previstos no inciso VIII do artigo 7° na Lei n° 12.846/2013 como sinônimo de boa-fé das empresas que a eles aderirem. A norma os cita no rol de situações que influenciam na dosimetria da punição, desta forma: “a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.
Em outras palavras, o diploma legal beneficia empresas que se adequarem aos procedimentos que buscam restringir a corrupção de suas atividades. Essas inciativas se manifestam em programas internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades, bem como na aplicação efetiva de códigos de ética, e podem ser consideradas dependendo do momento da aplicação das sanções, conforme esclarece Campos (2015).
A finalidade do dispositivo é a busca da moralidade permanente, mediante novas condutas capazes de fazer surgir uma cultura mais proba em benefício da coletividade; gradativamente, medidas preventivas poderiam extirpar vícios e costumes alinhados com a cultura de tirar vantagem do próximo e mudando o modo de agir das pessoas jurídicas que venham a contratar com a Administração Pública.
Campos (2015, p. 174) trata da eficiência do compliance:
A previsão de compliance na Lei n°. 12.846/2013 constitui um avanço direcionado à ética e à transparência das relações negociais entre a Administração Pública e o setor privado. Ademais, trata-se de um sinal de que a empresa deve adotar um determinado padrão de conduta compatível com uma boa-fé objetiva.
Os programas de compliance se mostram uma tendência mundial, pois têm o objetivo de tornar mais eficiente a conduta da governança, assim como de implementar a padronização da ética na rotina das empresas. Dessa forma, contribuem para um ambiente mais adequado às relações negociais, além de serem iniciativas consideradas num eventual processo judicial ou administrativo, avaliam Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 76).
Não há novidade em programas de compliance trazerem benefícios em caso de eventual ação judicial ou administrativa. A condição foi inaugurada pela FCPA (Foreign Corrupt Practice Act), nos Estados Unidos, e mais recentemente, aplicada pela UK Bribery Act, no Reino Unido, segundo esclarecem Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 76).
Por outro lado, Marinela, Paiva e Ramalho (2015, p. 130) trazem uma crítica em relação ao compliance, mais especificamente na sua abordagem pela lei:
O primeiro consiste na falta de previsão expressa na Lei sobre as diretrizes e quais elementos devem existir nos programas de compliance para que estes sejam aptos a permitir uma atenuação nas sanções. O segundo problema está no fato de não estar na Lei indicado objetivamente qual será o benefício que será concedido àqueles que implementarem de forma efetiva o programa de compliance, mesmo porque não se pode confundir a previsão do inciso VIII do art. 7° com a possibilidade de realização de acordo de leniência do art. 16.
Cabe observar que os citados parâmetros da avaliação de mecanismos e procedimentos devem ser estabelecidos em regulamento do Poder Executivo federal, segundo o parágrafo único do artigo 7° da Lei n°. 12.846/2013.
A regulamentação se configurou mediante o Decreto n.º 8420/2015, que define conceitos e parâmetros. Também a Portaria da CGU n.º 909/2015 estabeleceu como os programas de integridade serão avaliados para que a pessoa jurídica possa se beneficiar de redução de 1% a 4% no custo da multa, segundo o inciso V do artigo 18 do decreto.
Ademais, Marinela, Paiva e Ramalho (2015, p. 133) sustentam que se deve levar em consideração que o assunto demanda uma análise mais apurada baseada nas experiências internacionais. Os autores levantam, ainda, fatores que precisam ser ponderados nos programas aplicados no Brasil. Um exemplo é a necessidade de que empresas de pequeno porte adotem e tenham medidas específicas relacionadas à integridade.
Exige-se também ainda que este programa de integridade seja estruturado, aplicado e atualizado, observando-se as características e riscos atuais das atividades desenvolvidas em cada pessoa jurídica, sendo apenas considerado efetivo se houver um constante aprimoramento e adaptação à realidade e às circunstâncias peculiares de cada ramo (MARINELA, PAIVA E RAMALHO, p. 133).
Vale salientar que a OCDE tem suas orientações quanto a métodos de boas condutas em controle interno, ética e compliance. A organização aconselha que empresas se comprometam com uma política anticorrupção transparente, viabilizando a liberdade aos diversos níveis da instituição e independência de fiscalização ao programa. Um ponto a ser claramente definido é a política quanto a recebimento e entrega de brindes, presentes, viagens e entretenimento, além de cobertura de despesas, contribuições políticas, doações, patrocínios e eventuais pagamentos de facilitação, segundo observam Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 76).
CONHECIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
O artigo 15 da Lei Anticorrupção estabelece que “a comissão designada para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica, após a conclusão do procedimento administrativo, dará conhecimento ao Ministério Público de sua existência, para apuração de eventuais delitos”.
Assim, quer-se garantir que, após a conclusão do processo administrativo, a autoridade responsável poderá instaurar procedimento dando ciência da situação dos atos praticados ao Ministério Público, tendo em vista que esta instituição pública tem a prerrogativa de custos legis.
Nesse sentido, Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 89) sustentam:
Cremos, porém, que, ao tomar ciência da existência do procedimento, o Ministério Público, que é legitimado para a propositura de ação civil para a responsabilização judicial das pessoas jurídicas por ato lesivo à administração, nos termos do art. 19 da Lei n.º 12.846/2013, não deve se limitar à apuração de delitos (infrações penais).
À luz da norma, a atuação do Ministério Público segue a direção da responsabilidade judicial e está prevista na Lei n.º 12.846/2013. Também cabe ao Parquet outras providências, como propositura da ação civil por ato de improbidade administrativa, segundo entendimento de Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 89).
Observa-se que a norma estabelece a comunicação do procedimento do Ministério Público mesmo sem a decisão de mérito no processo administrativo.
Portanto, mesmo na hipótese da isenção da pessoa jurídica, o Ministério Público deverá tomar ciência da decisão e dos elementos que fizeram parte da apuração para sua avaliação.
ACORDO DE LENIÊNCIA
Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 91) assim conceituam o chamado acordo de leniência, atualmente talvez o instituto mais célebre relacionado à Lei Anticorrupção:
Leniência deriva do latim, lenitate, que tem o significado de mansidão ou brandura. Embora, no plano internacional, o instituto da leniência tenha tido largo emprego, principalmente após a década de 1970, no Brasil o instituto somente aportou no ano de 2000, a partir da Lei n.º 10.149/2000, que instituiu o acordo de leniência, com a aplicabilidade nas infrações de caráter econômico e concorrencial.
O acordo de leniência configura-se como uma espécie de delação premiada, tendo em vista a efetiva colaboração do infrator pertinente ao esclarecimento da mesma infração em relação a seus autores e partícipes, com a possibilidade de eventual abrandamento de pena.
Na mesma linha, Harada (2014, p. 5) explana sobre a ferramenta introduzida pelo artigo 16 da Lei Anticorrupção, que tem como prerrogativa a colaboração inconteste da pessoa jurídica com as investigações:
O artigo 16 introduz a figura do acordo de leniência a ser celebrado pela autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública com a pessoa jurídica responsável pela prática de atos previstos nesta Lei que colabore efetivamente com as investigações e o processo administrativo de sorte a possibilitar a identificação dos demais envolvidos e obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.
Diplomas penais como a Lei de Organizações Criminosas, a Lei de Drogas e a Lei de Lavagem de Dinheiro também tratam do ato de colaborar com as autoridades no sentido de angariar benefícios pela delação premiada, uma vez que, no caso dessas normas, o alcance é em relação às pessoas jurídicas, conforme observam Marinela, Paiva e Ramalho (2015, p. 193).
Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 92-93) enumeram os requisitos para um eventual acordo de leniência: efetiva colaboração com as investigações e o processo administrativo; que essa colaboração seja eficiente, o que se consubstancia com a identificação dos demais envolvidos na infração, quando for o caso, e o fornecimento de informações e documentos que comprovem o ilícito em apuração; a pessoa jurídica deve ser a primeira dentre os infratores a manifestar seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito; a pessoa jurídica deve cessar seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo; a pessoa jurídica deverá admitir sua participação no ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.
Para serem reconhecidos, tais requisitos devem ser considerados cumulativamente, de forma a consequentemente ser aceito o acordo de leniência.
Em relação às consequências pertinentes ao acordo de leniência, vale ressaltar que as sanções previstas poderão ser aplicadas mesmo com essa colaboração, sejam essas sanções de perdimento de bens, suspensão ou interdição de atividades e até mesmo dissolução compulsória da pessoa jurídica, segundo explicam Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 93).
O caput do artigo 16 da Lei n.º 12.846/2013 dispõe que caberá à autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública celebrar o acordo de leniência.
Em caso de descumprimento do acordo, Petrelluzzi e Rizek Junior (2014, p. 95) esclarecem que todos os atos, informações e depoimentos que validavam a concretude da celebração do acordo poderão ser utilizados no processo administrativo em desfavor da pessoa jurídica que cometeu o ato infracional, assim como os demais atos que violaram a Administração Pública.