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A responsabilidade civil das escolas particulares nos casos de bullying

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Agenda 26/02/2018 às 15:59

2 O BULLYING E A LEI DO BULLYING(13.185/2015)

O bullying sempre existiu no âmbito escolar. Entretanto, antigamente as práticas não repercutiam rapidamente, e por vezes não repercutiam, uma vez que os meios para a transmissão não possuíam tecnologia capazes de acelerar o processo de informação.

É perceptível o quanto a tecnologia avançou nas últimas décadas e no caso em questão, os avanços não são considerados positivos, pois com os meios de informação modernizados, os atos de bullying repercutem rapidamente na internet, e muitas vezes não é para inibir o comportamento de quem pratica, mas sim, para continuar os atos.

As redes sociais, como por exemplo, o Twitter e Facebook, são meios que potencializam os atos, ou seja, os atos praticados no âmbito escolar rapidamente se espalham para a Internet, fazendo com que a vítima do ato não tenha onde se esconder. É o chamado cyberbullying.

O cyberbullying nada mais é do que bullying praticado por meio de novas tecnologias. No entanto, a análise mais profunda do tema, evidenciará que ele pode se configurar como mais gravoso, perpetuando a situação de vitimização em virtude das configurações do espaço virtual, que permite o livre e simultâneo fluxo das informações, o que faz com que as notícias e informações se propaguem muito rapidamente, alcançando um número indefinido de internautas. Aliado a isso, tudo o que é publicado na web (imagens, vídeos, fotos, palavras e recados postados em redes sociais – como Orkut, Facebook, Myspace, Twitter, dentre outras) é facilmente capturado pelos demais internautas, que tanto podem armazenar esse conteúdo, como disseminá-lo entre outras pessoas. Significa dizer, de outro modo, que se perde o controle sobre as informações postadas podem armazenar esse conteúdo, como disseminá-lo entre outras pessoas. Significa dizer, de outro modo, que se perde o controle sobre as informações postadas[1] (GALIA, 2015, p. 12).

O primeiro a relacionar a palavra a um fenômeno foi Dan Olweus, professor da Universidade da Noruega, no fim da década de 1970. Ao estudar as tendências suicidas entre adolescentes, o pesquisador descobriu que a maioria desses jovens tinha sofrido algum tipo de ameaça, o que ocasionou um abalo psicológico imensurável, tendo como uma das consequências o suicídio.[2]

"É uma das formas de violência que mais cresce no mundo", afirma Cléo Fante, educadora e autora do livroFenômeno Bullying: Como Prevenir a Violência nas Escolas eeducar para a paz. (FANTE, 2005).

Segundo a Psicóloga Daniela DemskiAdário, com 12 anos de experiência em Gestão e Direção escolar na Educação Infantil:[3]

O portador dessa síndrome possui necessidade de dominar, de subjugar e de impor sua autoridade sobre outrem, mediante coação; necessidade de aceitação e de pertencimento a um grupo; de autoafirmação, de chamar a atenção para si. Possui ainda, a inabilidade de expressar seus sentimentos mais íntimos, de se colocar no lugar do outro e de perceber suas dores e sentimentos. As consequências para as "vítimas" desse fenômeno são graves e abrangentes, promovendo no âmbito escolar o desinteresse pela escola, o déficit de concentração e aprendizagem, a queda do rendimento, o absentismo e a evasão escolar (ADÁRIO,2012. p. 01).

Como visto, os meios eletrônicos, principalmente a internet, ajudaram o crescimento do bullying, devido ao alto grau e a velocidade de propagação dos atos no mundo cibernético.

A vítima sofre com ataques morais e físicos e raramente busca ajuda no ambiente que sofre o bullying. O motivo disso é a vergonha e o medo, uma vez que a vítima tenta demonstrar que não é covarde e que a maioria das vezes seus agressores ficam impunes.

É visível a gravidade das consequências que o ato ocasiona na vida das vítimas, ofendendo diretamente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, consagrado na Constituição Federal, assim sendo de suma importância a criação de mecanismos capazes de combater a prática do bullying.

Entretanto, como não existia nenhuma legislação que regulamentava o bullying, surgia inúmeras dúvidas acerca do tema, por exemplo: quais práticas se enquadrava no conceito do bullying, os meios de combate a prática, quais as medidas que as escolas devem tomar antes, durante e depois do ato de bullying.

Em 2009, A Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia) sugeriu as seguintes atitudes para um ambiente saudável na escola:- Conversar com os alunos e escutar atentamente reclamações ou sugestões;- Estimular os estudantes a informar os casos;- Reconhecer e valorizar as atitudes da garotada no combate ao problema;- Criar com os estudantes regras de disciplina para a classe em coerência com o regimento escolar;- Estimular lideranças positivas entre os alunos, prevenindo futuros casos;- Interferir diretamente nos grupos, o quanto antes, para quebrar a dinâmica do bullying.[4]

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Várias foram as atitudes tomadas frente ao bullying nos últimos anos, contudo nenhuma surtiu o efeito desejável. Visando a diminuição dos casos e uma forma mais contundente ao combate dessa mácula social, a Ex-Presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Rouseff sancionou a lei 13.185, de 6 de novembro de 2015, denominada de “lei do bullying” que entrou em vigor no início de fevereiro de 2016, instituindo o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) em todo o território nacional.

A Lei nº 13.185/15 determina que será considerada intimidação sistemática (bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas.

No âmbito jurídico, a repercussão da lei do bullying (13.185/15), trouxe inúmeras dúvidas, logo é importante trazer essas desconfianças para discussão, veja-se:

A caracterização do bullying (artigo 2º) e a sua classificação (artigo 3º) foram elencadas pelo legislador em caráter exemplificativo e não taxativo, sendo certo que as agressões e meios pelos quais essas se propagam podem ser diversos daqueles previstos em lei, desde que configurada a intimidação sistêmica. Dessa forma, a zona cinzenta de entendimento é porta aberta para qualquer argumento que impeça ações corretivas e inibidoras contra agressores infanto-juvenis que acreditam na impunidade e na pseudo proteção parental contra os efeitos da lei.”[5]

Quando tomamos ciência do que significa bullying, ou até mesmo cyberbullying a dúvida mais frequente seria se esses atos configuram-se como infração penal. Podemos recordar o princípio da fragmentariedade, onde, direito penal só deve se ocupar com ofensas realmente graves aos bens jurídicos protegidos (JUS BRASIL, 2012). Nem todas as violações dos bens jurídicos configuram um crime. Somente as infrações mais graves, mais incisivas aos bens jurídicos podem configurar infrações penais desde que haja previsão legal.

Dessa maneira, o bullying verbal, moral e psicológico, pode configurar o crime contra a honra (calúnia, injúria, difamação), bem como crime de ameaça ou, eventualmente, pode não configurar infração penal (como no caso do isolamento social consciente e premeditado).”[6]

O que leva ao inciso II, que afirma que irá capacitar docentes e equipes pedagógicas na solução dos problemas decorrentes de bullying, visando, ainda, a prevenção, algo que poderia ser visto por alguns como tentativa de cessar as agressões, mas o questionamento que resta é como o governo pretende realizar tal ato e quando, pois resta claro, a partir das consequências desses atos, a urgência de medidas, ainda que preventivas.

Podemos observar, também, no inciso VIII, que a punição ao agressor é expressamente reprovável, já que insiste em “evitar, tanto quanto possível, a punição dos agressores”. E quanto a vítima? Quais são as medidas para resguardar os danos causados à vítima da agressão e para que a mesma se sinta segura e protegida no ambiente escolar? Ainda, é preocupante a percepção que algo assim traz ao agressor – que tem sérias e reais tendências criminosas, como já foi abordado nos estudos do professor Dan Olweus – de impunidade.

O artigo 5º apresenta o ‘dever’ de determinados estabelecimentos em prevenir e combater a intimidação sistemática, mas não prevê qualquer tipo de sanção àqueles que o descumprirem, assim como ocorre com qualquer determinação presente nesta legislação[7] (BRASIL, 2015).

É evidente que existe uma grande dificuldade no assunto, uma vez que o tema é ainda pouco debatido no ambiente acadêmico, gerando inúmeras dúvidas entre os operadores do direito, principalmente na questão da responsabilidade civil das escolas quando ocorrer casos de bullying dentro de suas dependências.


3 RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO CIVIL E NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR BRASILEIRO 

O instituto da responsabilidade civil está consagrado no Direito Brasileiro no Código Civil de 2002, precisamente nos art. 927/CC veja-se:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem (BRASIL, 2002).

É meritório ressaltar que o parágrafo único faz referência ao Código de Defesa do Consumidor, em sua previsão legal, uma vez que ao mencionar “em casos especificados em lei”, está fazendo alusão ao Código de Defesa do Consumidor, precisamente aos art. 12 e 14/CDC.

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde,independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (BRASIL, 2002).

A responsabilidade objetiva expôs de forma clara o lado hipossuficiente do consumidor, uma vez que com o que se extrai das análises dos artigos citados acima é que o fornecedor responde pelos danos independentemente de culpa.

Ademais, a jurisprudência é pacífica nesse sentido, veja-se:

Indenização. Danos causados aos consumidores. Fabricante. Responsabilidade. Art. 12 do CDC. Ementa: "Responde contratualmente o fabricante por danos causados ao consumidor decorrentes de defeitos de seus produtos" (TAMG, 3ª C. Civil, AC n.º 144.007-9, j. em 25.11.92, rel. juiz Abreu Leite, v.u., RJTAMG 49/228-229).”

Indenização. Responsabilidade Civil. Dano moral. Refrigerante impróprio para o consumo. Ingestão. Existência de batráquio em estado de putrefação no interior da garrafa. Dor psicológica. Fato notório de grande repugnância. Sensação de nojo e humilhação. Verba devida. Recurso provido. (TJSP, 2ª C. Civil, AC n.º 215.043-1, j. em 7.3.95, rel. des. Lino Machado, v.u., JTJ-Lex 171/91-95.) (BRASIL, 1992).

“PROCESSO CIVIL. APELAÇÕES. FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO. INSTRUMENTO NÃO FIRMADO PELO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR. ART. 14 DO CDC. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM MANTIDO.

1. "As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno" (STJ - AgRg no AREsp 92.579/SP - Quarta Turma - Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira - Julg. 04.09.2012 - DJe 12.09.2012).2. O dano moral independe da existência de prova. Basta a prova do fato apontado como a causa bastante do dano para que se induza pela ocorrência deste. Por isso, trata-se de dano moral in re ipsa. 3. O valor arbitrado a título de indenização, isto é, R$ 10.000,00 (dez mil reais), a serem adimplidos pelo Banco BMG e por seu correspondente de forma solidária, e R$ 3.000,00 (três mil reais) em desfavor do Banco Itaú demonstrou-se razoável e consentâneo com as peculiaridades do caso.4. RecursoS a que se nega provimento.”(Brasil, 2015)

Entretanto, vale ressaltar que, embora a responsabilidade objetiva dispense o consumidor de comprovar a culpa, os requisitos para a reparação por danos morais ainda devem ser preenchidos, veja-se:

Acórdão nº 214279 “Não se pode, todavia, equiparar ou confundir a responsabilidade objetiva com uma autêntica presunção de culpabilidade ou dever de indenizar. (…) Assim, a responsabilidade objetiva instituída no Código de Defesa do Consumidor dispensa a vítima da prova de haver o fornecedor agido de maneira culposa, mas o nexo de causalidade e a extensão dos danos permanecem regidos pela regra geral, pois, de modo diverso, estar-se-ia permitindo a reparação civil de danos não demonstrados, ou até mesmo não relacionados a qualquer atitude da pessoa jurídica a quem está sendo imposta a obrigação de indenizar.” (Des. J.J. Costa Carvalho, DJ 24/05/2005 TJDFT) (BRASIL, 2005, grifo nosso).

A importância da responsabilidade civil é indiscutível, uma vez que o instituto traz o direito de as pessoas serem indenizadas por danos que sofreram, decorrentes de um ato ilícito.

O Estado traz para si a responsabilidade, cabendo ao Poder Judiciário decidir respeitando cada caso em sua peculiaridade, de forma a não generalizar um instituto tão importante no direito brasileiro.

No Código Civil, o ato ilícito é imprescindível para o dever de indenizar a vítima. Logo, vale citar alguns pontos acerca dos requisitos para a caracterização do ato ilícito, que são: A conduta humana (ação ou omissão), nexo causal, dano e a culpa.

No caso do Código do Consumidor, visando proteger o lado mais vulnerável da relação de consumo, foi consagrada a responsabilidade civil objetiva, ou seja, independe da existência de culpa por parte do fornecedor, como visto nos artigos citados acima.

Felipe P. Braga Netto complementa:

Pelos danos que cause no mercado de consumo, o fornecedor – cujo conceito é amplo o bastante para compreender todos que disponibilizam produtos ou serviços com habitualidade, mediante remuneração – responde, sem culpa, pelos danos sofridos pelos consumidores[8] (BRAGA NETTO, 2014, p. 134).

Em se tratando de um contrato em que o fornecedor disponibiliza um serviço determinado para o consumidor, embora independa da existência de culpa, deve o cliente demonstrar que houve a falha na prestação de serviços.

Uma vez ausente o defeito na prestação de serviços, não há o que se falar em indenização, entendimento este dominante na jurisprudência. Vejamos um exemplo:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. PRAZO. CDC. FATO DO SERVIÇO. TERMO INICIAL. AUSÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. 1. De acordo com o art. 27, do CDC, prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. 2. O Código de Defesa do Consumidor prevê, em seu art. 14, a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços. 3. O instituto da responsabilidade objetiva tem como principal característica ser prescindível a comprovação da culpa, bastando a demonstração do fato e do dano decorrente. 4. Contudo, em se tratando de responsabilidade objetiva, esta poderá ser elidida nos casos de ausência de defeito na prestação de serviços e de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. 5. Deve ser julgado improcedente o pedido de indenização quando não for demonstrado qualquer ato ilícito cometido pela parte apelada, mormente porque o serviço educacional foi devidamente prestado e o curso mantido pela ré encontra-se credenciado perante o MEC e sem irregularidade reconhecida.(APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0335.14.000749-3/001 - COMARCA DE ITAPECERICA - APELANTE(S): EDVÂNIA LÚCIA SOUZA - APELADO(A)(S): ASSOCIAÇAO JACAREPAGUA DE ENSINO SUPERIOR)”[9] (BRASIL, 2017).

Nesses casos, o fornecedor pode alegar ausência da falha na prestação de serviço, culpa exclusiva do consumidor e por fim, culpa exclusiva de terceiro. São esses os casos em que o fornecedor será isento do dever de indenizar o consumidor.

A responsabilização dos estabelecimentos educacionais depende da falha na prestação de serviços, pois é sabido que a escola também tem o dever de garantir a segurança e educação da criança ou adolescentes.

Entretanto, a nova legislação acerca do bullying traz consigo algumas questões a ser discutidas pelos operadores de direito, especificamente em relação acerca da responsabilidade civil desses estabelecimentos.

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