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Trabalho infantil, trabalho forçado

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Seria possível considerar que todo trabalho infantil ilícito é exercido em condições análogas à de escravo?

Resumo: O trabalho forçado em sua modalidade clássica do Código Penal Brasileiro exige ausência de manifestação de vontade, tipo jurídico em que o explorador submete empregados a trabalhos forçados, sem o consentimento daqueles que laboram. O trabalho, enquanto instrumento de lucro alheio, se empreendido por crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos, se dá necessariamente sem o consentimento destes obreiros mirins. O trabalho é tido como forçado quando crianças – que não podem manifestar vontade juridicamente válida – são exploradas para fins laborais. O tipo penal do art. 149 não só é inteiramente válido para crianças e adolescentes que trabalham, como se faz especialmente fundamental, enquanto dispositivo legal, para a proteção integral destes sujeitos de direito.

Palavras-chave: Crianças e adolescentes. Inspeção do trabalho. Trabalho forçado.


INTRODUÇÃO

Na década de 50, Florestan Fernandes (1960, p. 80)1 já constatava a compulsão de parte do empresariado brasileiro em enriquecer com rapidez. Corolário disso é que praticamente não existem limites para que este objetivo econômico seja atingido: leis construídas democraticamente são desrespeitadas, trabalhadores são arregimentados em condições análogas à de escravo, e crianças e adolescentes são exploradas para fins de trabalho infantil em situações semelhantes àquelas que Karl Marx, no século XIX, descreveu n’O Capital:

É muito característico do regime de Luís Filipe, o rei burguês, que a única lei fabril aprovada durante seu reino, em 22 de março de 1841, jamais tenha sido implementada, e essa lei trata unicamente do trabalho infantil. Ela estabelece uma jornada de trabalho de 8 horas para crianças entre 8 e 12 anos, 12 horas para crianças entre 12 e 16 anos etc., com muitas exceções, que permitem o trabalho noturno até mesmo para crianças de 8 anos. (...) (2013, p. 1242) Grifos nossos.

Estima-se que mais de 3 milhões de crianças e adolescentes trabalhem atualmente no Brasil (PNAD/IBGE, 2013).2 Em que pese a redução deste número nos últimos anos, o quantitativo ainda é assustador para um país que pretende alcançar o desenvolvimento, e não apenas a riqueza.

Dentro deste contexto de larga utilização ilegal da mão de obra infantil, nossa análise questionará se crianças e adolescentes, com idade inferior a 16 anos, detém plena capacidade civil para contraírem direitos e obrigações na esfera trabalhista.

Partiremos da premissa de que o trabalho escravo contemporâneo caracteriza-se quando não há oferecimento de labor livre e espontâneo3 para, em seguida, concluirmos que em inúmeros casos a exploração de trabalho infantil fora das hipóteses legais constitui-se em condição análoga à de escravo.


O CONSENTIMENTO DA VONTADE PARA O DIREITO E SUA RELAÇÃO COM LIMITES ETÁRIOS.

Pode-se dizer que há livre consentimento da vontade quando o legislador assim o estipular, desde que respeitados certos parâmetros, sendo que, em nosso ordenamento jurídico, considera-se que a vontade livre (o querer consciente) se dá quando ultrapassada a idade dos 18 anos. Há, assim, um estreito vínculo entre a validade legal da vontade de um sujeito e sua faixa etária.

O Código Civil assevera que a capacidade para contratar somente se dá plenamente aos 18 anos.4 A regra geral é que são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 anos. Somente a partir de 16 anos, com estabelecimento de economia própria, é que seria possível a cessação da incapacidade civil. Na seara trabalhista, por sua vez, é permitido o labor a partir dos 16 anos, desde que respeitadas as premissas legais, como a vedação ao trabalho noturno, perigoso e insalubre, entre outras.5 Não sendo o caso, porém, de ultrapassagem do limite etário legal nem de formalização de contrato de aprendizagem, crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos não detém capacidade civil para fins laborais. Em outras palavras, o sistema jurídico reconhece, sem grandes controvérsias, que inexiste consentimento destes trabalhadores precoces em uma relação de emprego.

O limite etário define, portanto, uma gama de relações obrigacionais, sendo exemplos disso a outorga de capacidade eleitoral plena aos maiores de 18 anos em regra (art. 14 da CRFB); a imputabilidade dos maiores de 18 anos, sujeitando-os às penas restritivas de liberdade (art. 228 da CRFB); a proteção especial pela legislação penal às vítimas de agressão sexual com idade inferior a 14 anos (há presunção de estupro para menores de 14 anos).


ANALOGIA COM O ESTUPRO DE VULNERÁVEL.

Como vimos acima, há presunção de estupro (ausência de consentimento da conjunção carnal) de vítimas menores de 14 anos de idade. Quando um sujeito maior e capaz (imputável) mantém relações sexuais com uma menor com idade inferior a 14 anos, considera-se que há violência presumida nesta conjunção carnal, tipificando-se o crime do art. 217-A do CPB (estupro de vulnerável). A interpretação deste artigo faz presumir, a contrario sensu, a plena liberdade sexual tão somente para quem tem mais de 14 anos.

Trata-se de uma ficção legal que visa proteger crianças e adolescentes, desconsiderando, por antecipação normativa, a sua consciência ou aceitação do ato de consumação sexual.6

Em determinadas ocasiões, se o sujeito passivo de um crime não tiver a idade mínima fixada pelo legislador, o tipo penal, quando já existente, se agrava (tal como se dá com o tipo do art. 149 do CPB) ou se configura quando somente incide naqueles casos (conforme art. 217-A do CPB, acima referido). Trata-se, portanto, de uma técnica legislativa comum aquela que agrava as sanções quando os ilícitos são praticados contra sujeitos com idade inferior a determinado patamar etário.

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Se a idade do sujeito de direito é fundamental para aferirmos a liberdade do seu consentimento, por sua vez, este mesmo consentimento da vontade é elemento essencial para a configuração de determinados tipos jurídicos, dentre eles, o tipo penal de redução de trabalhador a condição análoga à de escravo.

Pretendemos enfatizar neste artigo que a liberdade e a dignidade de crianças e adolescentes7 que são protegidas pelo tipo penal do art. 217-A do CPB, devem também ser protegidas quando estes vulneráveis são explorados para o fim de lucro.


O TRABALHO FORÇADO.

A despeito do tipo penal constante do art. 149 ser um avanço em matéria de proteção à dignidade da pessoa do trabalhador – porque não contempla apenas o trabalho estritamente forçado – a sua caracterização mais elementar identifica a ocorrência do delito quando inexiste consenso de vontade entre o explorador da mão de obra e o trabalhador.

O trabalho escravo é, também, uma das piores formas de trabalho infantil, consoante Convenção 182 da OIT:

Para efeitos da presente Convenção, a expressão "as piores formas de trabalho infantil" abrange:

a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, tais como a venda e tráfico de crianças, a servidão por dívidas e a condição de servo, e o trabalho forçado ou obrigatório, inclusive o recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados;8

A respeito do tema, devem ser analisadas as convenções de ns. 29 e 105 da Organização Internacional do Trabalho, que tratam exclusivamente do tipo de escravidão moderna onde inexiste o elemento volitivo. A Convenção n. 29 da OIT, por exemplo, diz expressamente que trabalho forçado é aquele para o qual um indivíduo não se ofereceu de espontânea vontade:

Art. 2 — 1. Para os fins da presente convenção, a expressão ‘trabalho forçado ou obrigatório’ designará todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade9. (grifos nossos)

Nesta mesma linha, temos a previsão do artigo 149 do Código Penal que contempla algumas modalidades de trabalho forçado. Chamamos a atenção aqui para o fato de que o crime de redução de trabalhadores a condições análogas à de escravo aponta, como integrante do tipo, não apenas elementos conceituais do Direito Penal mas também institutos juslaborais da CLT, como a jornada de trabalho e os descontos salariais:

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 1º (omissis)

§ 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:

I - contra criança ou adolescente;

A exploração do trabalho infantil engendra trabalho em condições análogas às de escravo por uma conclusão lógica uma vez que não se consegue extrair consentimento de vontade válido de crianças e adolescentes que se submetem ao trabalho.

Não se trata, in casu, de contrato de trabalho livremente aceito, mas sim de contrato de trabalho imposto ou aliciado.10 Em outras palavras, não é trabalho voluntariamente aceito, mas trabalho coacto, nos exatos termos do art. 2º, 1, da Convenção n. 29 da OIT.


SITUAÇÕES FÁTICAS QUE JUSTIFICAM ESTA INTERPRETAÇÃO.

Ainda se verifica, com indesejável frequência, principalmente no Norte e Nordeste do País, famílias de classe alta e média que trazem crianças e adolescentes de municípios pobres para que venham executar serviços domésticos em suas residências como babás ou faxineiras. No mais das vezes, estas adolescentes dormem em quartos situados em local separado do ambiente familiar, próximo à cozinha ou área de serviço; não estudam ou quando estudam não frequentam as mesmas escolas que os filhos dos patrões; suas vestes são de padrão inferior; quando percebem remuneração, esta é inferior ao salário mínimo; de forma cínica, os empregadores afirmam, entretanto, que estas crianças e adolescentes são “quase da família”.

Como se observa, o trabalho infantil ilícito pressupõe que o(a) menor não outorgou consentimento válido para a relação contratual, seja ela doméstica11, celetista, urbana ou rural. A situação de debilidade psicológica do(a) menor que aceita trabalhar para um empregador adulto é evidente.

Veja-se, a propósito, que a Constituição Federal é peremptória ao afirmar que é um direito fundamental dos trabalhadores a proibição de todo e qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo nos casos de aprendizagem.12 Por força das disposições legais e constitucionais, consideram-se nulos os atos obrigacionais de quem tem menos do que 16 anos.

A despeito do art. 2º, alínea “c” da Lei n. 7.998/90 – que regula o Programa do Seguro-Desemprego – não fazer distinção entre crianças e adultos resgatados do trabalho em condições análogas à de escravo, a fiscalização do Ministério do Trabalho e Previdência Social ainda não reconhece, entretanto, a possibilidade de resgate de crianças escravizadas, com a consequente percepção das parcelas de seguro-desemprego (no valor de um salário mínimo cada). O tema é tratado como mera irregularidade trabalhista pelo órgão executivo. Há, inclusive, Instrução Normativa de n. 102/2013, da Secretaria de Inspeção do Trabalho (parágrafo 3º do art. 9º), que determina a não exigência do registro em CTPS de crianças exploradas para trabalho infantil, bem como a proibição de liberação das guias de seguro desemprego. Como se vê, o MTPS ainda aceita passivamente a velha noção doutrinária – prejudicial ao menor – que faz distinção entre o trabalho proibido e o ilícito.

O ponto que queremos alcançar aqui é a observação de que o mais vulnerável de todos os trabalhadores não tem direito ao mínimo de dignidade que um trabalho deveria proporcionar, como a exigibilidade da CTPS e a garantia previdenciária.

A criança ou adolescente com idade inferior a 16 anos encontra-se em situação ainda mais fragilizada do que a dos demais trabalhadores adultos que são resgatados em operações do Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Trabalho Escravo. Os menores nestas condições trabalham não apenas para ganhar o pão de cada dia – o que os faz suprimir seu elemento volitivo tal como os demais obreiros – mas também submetem-se com mais docilidade a qualquer tipo de trabalho, mediante qualquer remuneração. Isto quando não são aconselhados ou incentivados ao labor pelos seus próprios genitores.

Uma criança ou adolescente de baixa renda não tem muitas opções para fugir à submissão deste tipo de trabalho oferecido por quem demanda mão de obra barata (segundo IBGE, a remuneração do trabalhador infantil é bastante inferior à do trabalhador adulto). Ora, não há possibilidade alguma deste menor discutir a função que será exercida; a sua jornada de trabalho não será livremente fixada; e quanto à sua remuneração, não terá nenhum poder de barganha. Enfim, não há qualquer liberdade de contrato nesta relação.


HIPÓTESES EXCEPCIONAIS.

O crime do art. 149 do Código Penal Brasileiro, porém, não imaginou alcançar aquelas situações de trabalho intrafamiliar, voluntário, cooperado ou autônomo, ainda que verificada eventual degradãncia no ambiente de trabalho. A atividade econômica que pode enquadrar-se como trabalho forçado ou degradante é aquela exigida por terceiro, com finalidade lucrativa, no âmbito de uma relação de emprego, porque caracterizadora de exploração.

Por este mesmo motivo, o trabalho prestado por crianças e adolescentes, de forma associada e solidária com seus genitores, apesar de constituir uma grande chaga social, não estaria apto a tipificar o delito em questão, porque aqui não há que se falar em exploração de mão de obra.

Na moldura penal adaptar-se-iam-se apenas aquelas situações fáticas em que um sujeito ativo, via de regra sem qualquer liame familiar com o sujeito passivo menor, explora o labor com vistas ao benefício próprio.

Excluem-se desta nossa intepretação, portanto, aquelas hipóteses em que crianças e adolescentes trabalham no ambiente doméstico, em colaboração com seus genitores ou responsáveis legais (sem geração de valor), bem como aquelas realizadas fora do lar, mas em que se visualiza uma entidade econômica familiar,13 muito comum na zona rural.


ENTRELAÇAMENTO ENTRE INSTITUTOS JURÍDICOS PENAIS E LABORAIS: TODO TRABALHO INFANTIL ILÍCITO É TRABALHO EM CONDIÇÕES ANÁLOGAS À DE ESCRAVO.

Sugere-se aqui, neste artigo, a mesclagem dos institutos jurídicos, ou seja, uma interpretação sistemática entre os limites etário-legais do Código Penal Brasileiro, do Código Civil, da Consolidação das Leis do Trabalho e da Constituição Federal.

A razão subjacente do legislador, inspirado pela Doutrina da Proteção Integral,14 há de ser a mesma: toda exploração de trabalho de crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 anos implica em trabalho em condições análogas à de escravo.15

Atualmente, a exploração do trabalho infantil caracteriza apenas e tão somente um ilícito trabalhista, mas não um tipo penal, criando assim um vácuo civilizatório em uma afronta à Doutrina da Proteção Integral. Ocorre que, de acordo com esta Doutrina, é dever do Estado – ou seja, de todos os operadores do sistema justrabalhista no Brasil – colocar as crianças e adolescentes a salvo de toda forma de exploração. Parece intuitivo, portanto, que o enquadramento da exploração do trabalho infantil como tipo penal do art. 149 do CPB é medida que irá reforçar o direito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à dignidade, ao respeito e, principalmente, à liberdade das crianças e dos adolescentes, tal como exige o art. 227 da Carta Maior.

A Constituição da República, o Código Civil e a CLT não consideram válidas as declarações de vontade, para fins trabalhistas, dos menores de 16 anos de idade, de forma que, não sendo aceitas pelo Direito estas manifestações de vontade, haverá a incidência de um trabalho não consentido ou, em outras palavras, trabalho escravo, em seu conceito mais rudimentar.

Quando se justifica o trabalho infantil no Brasil costuma-se argumentar que tal modalidade de labor ainda é necessária num país que pretende superar o subdesenvolvimento econômico; argumenta-se, também, que o labor de menores é uma ferramenta útil para moldar crianças e adolescentes para o trabalho na fase adulta, ou seja, para discipliná-los no futuro. Mas não se pode esquecer que a Convenção 105 da OIT é expressa ao exigir de todos os países que a ratificaram o compromisso de abolição de toda forma de trabalho forçado e dele não fazer uso como método de mobilização e de utilização da mão-de-obra para fins de desenvolvimento econômico nem como meio de disciplinar a mão-de-obra (art. 1º alíneas “b” e “c”). Nossos argumentos baseados no senso comum vão, assim, na contramão das diretrizes internacionais.

Como vimos, a mesma lógica que protege o vulnerável quando este é vítima de crime sexual deve também proteger o menor quando este for vítima de exploração econômica ou laboral, não se reconhecendo sua vontade como contratualmente válida. A exploração do trabalho infantil que se dá sem a aquiescência dos obreiros envolvidos enquadra-se adequadamente no tipo penal do trabalho escravo “moderno”.16

Desta forma, entendimentos consolidados em outras áreas jurídicas que consagram a tese da incapacidade civil de menores de 18 anos e da presunção de violência para vítimas menores de 14 anos em crimes sexuais deveriam ser aceitos, integralmente, também no Direito Penal do Trabalho.

Ora, se o tipo penal do trabalho escravo fala, expressamente, de trabalho forçado, ou seja, aquele que é exercido sem o consentimento da vontade do trabalhador, por óbvio que uma criança de 13 anos de idade não possui vontade livre quando sequer tem consciência do contexto em que está inserida naquela relação de emprego.


CONCLUSÃO.

O que este breve artigo permitiu concluir é que o consentimento de menores de 16 anos é nulo, para todos os fins, sejam eles eleitorais, civis ou trabalhistas. Abaixo da idade referida, o labor somente é permitido sob a modalidade de aprendizagem.17

Na Justiça do Trabalho, os operadores do Direito costumamos olvidar da total ausência de consentimento válido nas relações de emprego que envolvem o trabalho infantil. Como imperativo moral, citamos dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (grifos nossos)

Quando um sujeito maior e capaz explora, para fins laborais, alguém que não tem idade mínima para o trabalho (com idade inferior a 16 anos), a interpretação prevalecente deve considerar este ato jurídico como tipificação do crime de redução a condições análogas à de escravo, pois não há sentido em presumir inexistência de vontade para a vítima de um ato sexual e presumi-lo existente para uma vítima objeto de exploração laboral.18

Se a legislação tipifica como redução a condições análogas à de escravo a retirada da vontade do trabalhador adulto, deve-se aceitar que a supressão, determinada por lei a priori, do elemento volitivo do menor impúbere há de ser considerada uma conduta criminalmente ilícita. E se trabalho forçado é todo aquele trabalho que se dá sem consentimento do trabalhador, quando se relê o tipo penal do artigo 149 sob estas premissas, verifica-se que a exploração do trabalho infantil é a moldura legal do trabalho escravo mais evidente.

Todo trabalho infantil, fora dos ditames legais, enseja inequivocamente um trabalho não-livre (a criança não pode se oferecer de espontânea vontade), enquadrado portanto como crime nos termos do art. 149 do Código Penal Brasileiro.

Sobre os autores
Ilan Fonseca de Souza

Procurador do Trabalho na 5ª Região (Bahia), Especialista em Processo Civil, Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Doutor em Estado e Sociedade pela Universidade Federal do Sul da Bahia.

Jacqueline Carrijo

Auditora-Fiscal do Trabalho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Ilan Fonseca; CARRIJO, Jacqueline Carrijo. Trabalho infantil, trabalho forçado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6051, 25 jan. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67526. Acesso em: 22 dez. 2024.

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