Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A (in)constitucionalidade das medidas indutivas do CPC sob a perspectiva do princípio da dignidade humana e da liberdade de locomoção

Exibindo página 3 de 3

5. CONCLUSÃO

A (in)constitucionalidade das medidas indutivas, inseridas no inciso IV do artigo 139 do Código de Processo Civil, devem ser analisadas, sem dúvida, sob o olhar do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito fundamental de liberdade de locomoção, estabelecidas pelo Pacto de San Jose da Costa Rica (COSTA RICA, 1969) e Constituição Federal (BRASIL, 1988).

As medidas indutivas que na prática vêm sendo adotadas pelo Poder Judiciário ao aplicar o artigo mencionado causam profunda divergência no âmbito nacional, pois se de um lado entende-se que as medidas executiva típicas devem ser esgotadas antes de aplicar-se as medidas indutivas; a suspensão de CNH constituiria punição não prevista em lei; ocorreria ainda violação ao direito de ir e vir; há restrição do uso das medidas às limitações constitucionais; as dívidas devem ser adimplidas com o patrimônio do devedor e não com a sua liberdade ou restrição de direitos; por outro, e ainda de forma incipiente, há julgados  no sentido de que as medidas indutivas devem forçar o devedor a cumprir suas obrigações; o dever de cooperação só é atingido quando o devedor tem algum direito atingido; a medida visa assegurar  a efetividade da determinação; não há impedimento ao direito de ir e vir, pois a parte tem outros meios para locomover-se.

Nesse sentido, uma vez não encontrados bens passíveis de penhora ou inexitosos outros meios de execução, a suspensão da CNH e passaporte surgem como vias adequadas para a efetividade do processo de execução, uma vez que embora cerceiem parcialmente a liberdade de locomoção do devedor, este pode exercer o seu direito por outras vias (transporte público, Uber, táxi, metrô, a pé, bicicleta), de modo que não há que se falar propriamente em uma restrição total a este direito fundamental.

Ademais, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana será respeitado, pois se o devedor passar a não ter autorização para dirigir o veículo próprio ou viajar para o exterior, não sofrerá prejuízo em suas condições mínimas, que devem ser asseguradas a todo ser humano, mas tão somente terá uma limitação às suas opções de lazer e conforto, uma restrição mínima esperada àquele que contrai dívidas, não paga e regularmente deixa de registrar seus bens no próprio nome a fim de evitar futura execução.

Desse modo, é fundamental que os magistrados brasileiros, diante do exaurimento de todos os demais atos executórios, apliquem o inciso IV do artigo 139 do Código de Processo Civil na execução civil, conforme seu entendimento e peculiaridades do caso, e determinem limitações à vida privada do devedor, não com a finalidade de ferir-lhe a dignidade ou locomoção, mas notadamente de ordenar pressão coercitiva, mediante a suspensão da CNH ou passaporte, para a obtenção da satisfação do comando.


6. REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

BARROSO, Luís Roberto. Um outro país: transformações no direito, na ética e na agenda do Brasil. Belo Horizonte: Fórum, 2018.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 31 de Mai. de 2018.

________. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 31 Mai. de 2018.

_________. Decreto n. 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm>. Acesso em 31 Mai. de 2018.

CERVO, Fernando Antonio Sacchetim. A livre iniciativa como princípio da ordem constitucional econômica. Jusnavegandi.  Disponível em < https://jus.com.br/artigos/26778/a-livre-iniciativa-como-principio-da-ordem-constitucional-economica>. Acesso em 1º jun. de 2018.

COSTA RICA. Convenção americana sobre direitos humanos. Assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969. Disponível em <https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/ c.convencao_americana.htm>. Acesso em 31 Mai. de 2018.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; e, OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: execução. 7 ed. rev., ampl. e atual – Salvador: Ed. JusPodivm, 2017.

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. Coordenador Pedro Lenza. 7 ed. São Paulo: 2016.

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: RT, 2015.

LEMISZ, Ivone Ballao. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana: Reflexão sobre o princípio da dignidade humana à luz da Constituição Federal. 2010. Disponível em: < https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5649/O-principio-da-dignidade-da-pessoa-humana>. Acesso em 27 mai. 2018.

MEIRELES Edilton. Medidas sub-rogatórias, coercitivas, mandamentais e indutivas no Código de Processo Civil de 2015. Novo CPC doutrina selecionada, v. 5: Execução. Coordenador geral, Fredie Didier Jr.; organizadores, Lucas Buril de Macêdo, Ravi Peixoto, Alexandre Freire. Salvador: Juspodivm, 2016.

NOTÍCIAS STF. Pacto de San José da Costa Rica sobre direitos humanos completa 40 anos. Publicado em: 23 nov. 2009. Disponível em < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticia Detalhe. asp?idConteudo=116380>. Acesso em 31 de mai. 2018.

NUNES, RizzatoO Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2007.

PRODANOV, Cleber Cristiano; FREITAS, Ernani Cesar de. Metodologia do trabalho científico: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2 ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013.

SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. 4 ed. ampl., incluindo novo capítulo sobre princípios fundamentais. São Paulo: Saraiva, 2015.

SILVEIRA, Paulo Antonio Caliendo Velloso da. Direito tributário e analise econômica do Direito: uma visão crítica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.

Sobre as autoras
Patricia Rodrigues de Menezes Castagna

Especialista em Direito Tributário e Graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera (UNIDERP/LFG). Advogada inscrita na OAB/SC n. 14.752 e professora da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), atuante nas áreas de Teoria do Direito, Direito do Consumidor e Direito Processual Civil. Orientadora do Núcleo de Prática Jurídica na mesma instituição.

Vívian de Gann dos Santos

Mestranda no programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (CESUSC), com graduação em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Advogada e professora da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), atuante nas áreas de Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direito Processual Civil, Direito Civil e Direito do Consumidor. Membro da Comissão Estadual de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Santa Catarina (OAB/SC), e Relatora do Tribunal de Ética e Disciplina da mesma instituição.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTAGNA, Patricia Rodrigues Menezes; SANTOS, Vívian Gann Santos. A (in)constitucionalidade das medidas indutivas do CPC sob a perspectiva do princípio da dignidade humana e da liberdade de locomoção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5583, 14 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68947. Acesso em: 24 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!