CONCLUSÃO
O estudo da literatura doutrinária jurídica, o levantamento da legislação em vigor e a análise da estrutura governamental de proteção ambiental, empreendidos por esta pesquisa, demonstram que o país tem-se preocupado nos últimos 30 anos em desenvolver instrumentos modernos, no âmbito dos poderes legislativo, executivo e judiciário, para conter a tremenda degradação que vem atingindo a flora, a fauna e os ecossistemas nacionais, prejudicando os recursos hídricos, a biodiversidade e comprometendo a economia futura do país.
É reconhecida internacionalmente a importância da flora brasileira. A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, o Pantanal do Mato Grosso, o Manguezal, a Caatinga e a Restinga, para só falar dos mais importantes, cada um com suas características, são ecossistemas que contribuem para uma das diversidades biológicas mais férteis do mundo. Além disso, são fundamentais para a regulagem dos rios, para a formação da vida marinha, para a proteção da costa e das encostas, para prevenir a erosão do solo, enfim, para todo um conjunto de fatores que juntos constituem um meio ambiente riquíssimo, fonte de vida.
Por outro lado, a análise da evolução legislativa empreendida, mostra ser inegável que o país conta com uma ordenação legal importante, em que pese não dispor ainda de lei específica para tipificar a biopirataria e punir os criminosos que avançam sobre as matérias-primas da flora amazônica e sobre o conhecimento ancestral da população nativa. Projeto do governo nesse sentido tramita lentamente nas diversas esferas, esbarrando numa série de obstáculos para sua aprovação, entre eles o poderio da indústria farmacêutica globalizada.
Também o estudo demonstrou que o país dispõe de uma organização governamental moderna no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, estruturada a partir de uma Política Nacional do Meio Ambiente que se baseia em conceitos ecológicos avançados. No entanto, isso não significa que sua ação apresente o grau de eficiência necessário para conter os desmatamentos, inclusive porque não dispõe de tecnologia nem de quantitativo de fiscais ambientais e de policiais federais suficientes para dar combate efetivo às forças poluidoras. Ou seja, falta a chamada vontade política para alocar os recursos humanos e materiais necessários aos órgãos encarregados de defender um patrimônio tão valioso.
É verdade também que o país não tem se furtado a participar, assinar e seguir as decisões ecológicas nascidas das Conferências Internacionais de Desenvolvimento e Meio Ambiente da ONU. O compromisso de defesa da biodiversidade e o conceito de desenvolvimento sustentável são base para toda a nova legislação nacional, que o país tem procurado aplicar, na medida de suas possibilidades.
O estudo demonstrou ainda que muitos desses instrumentos de defesa são conseqüência das pressões ambientalistas internacionais, somadas à mobilização de parte da sociedade civil brasileira. É satisfatório registrar o crescimento da consciência ecológica do país, seja a população elegendo representantes para o Congresso Nacional sensíveis ao tema, seja denunciando ao Ministério Público os danos praticados, seja apontando caminhos jurídicos para o aperfeiçoamento da tutela ambiental.
Mas isso não tem bastado. A verdade é que a devastação aumenta em proporção magnífica, pois, se de um lado as leis se aprimoram, de outro crescem também as técnicas e práticas causadoras dos danos ambientais, sem que o arsenal jurídico disponível seja capaz de contê-las.
Analisando o acesso à justiça como um direito fundamental de terceira geração já definitivamente arraigado na sociedade e na prática forense, e observando os instrumentos processuais postos à disposição da tutela ambiental, em especial a florestal, conclui-se que sua importância se dá mais pela sua virtualidade do que pela sua efetiva utilização e eficiência.
Somente com a existência de mecanismos processuais mais eficazes e ajustados à natureza dos conflitos ambientais poderá se avançar na construção de uma nova mentalidade que permeie toda a sociedade e não motive apenas os interessados ativistas. A conscientização social plena é uma etapa intermediária indispensável para se alcançar um desenvolvimento sustentado capaz de preservar a qualidade do meio ambiente.
Para que a sociedade civil adote uma postura ainda mais consciente e participativa deverá existir uma tutela ambiental efetiva e prática, respeitando o direito amplo de acesso judicial. Fato é que os instrumentos hoje postos à disposição da sociedade não atendem plenamente à necessidade da eficácia judicial em matéria ambiental.
Atualmente a legislação não dá à população legitimidade ativa de forma ampla e abrangente, o que resulta na transformação de todo o arcabouço legal, que de maneira geral é belíssimo, em normas insípidas e ineficazes.
Quando a Constituição determina que é dever de todos defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações e a legislação não dá legitimidade individual ativa ampla para o exercício deste dever, esvazia-se toda a eficiência dos instrumentos processuais. A ação civil pública é o instrumento adequado para coibir danos ao meio ambiente. Segundo o STJ, nasceu com esta finalidade. Quanto à legitimação ativa, o artigo 5º caput e o parágrafo 3° da lei 7.347/85 demonstram que o grande legitimado ativo e natural, para os casos de lesão ambiental é o Ministério Público.
O pólo ativo somente é devidamente configurado quando há uma lesão direta e substancial a determinada pessoa, ou seja, após o dano e a propagação de suas conseqüências. No entanto, é muito raro identificar em matéria florestal quem é o lesado direto. Por exemplo, em desmatamento na Floresta Amazônica ou na Mata Atlântica, o efetivamente lesado é a coletividade, ou seja, todos e ninguém, o que torna impossível identificar a legitimidade ativa, conferindo quase que exclusivamente tal acesso ao Ministério Público.
Especialmente em situações de pequenos danos ambientais, fica-se sem um instrumento capaz de dar ao povo a possibilidade de atuação direta em prol do meio ambiente, impossibilitando a existência de pequenas condenações que funcionariam efetivamente como um mecanismo educacional para estimular a consciência preservacionista na comunidade e o aperfeiçoamento de técnicas aplicadas de desenvolvimento sustentável.
Diante do exposto, conclui-se ser indispensável tratar os interesses ambientais de forma difusa e pulverizada por toda a sociedade, oferecendo legitimidade ativa à população para atuar judicialmente contra os micro-danos ambientais. Caso contrário, jamais se alcançará uma maturidade sócio-cultural capaz de possibilitar efetivamente o desenvolvimento sustentável e a preservação ambiental para as futuras gerações.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 6. ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 29. ed. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2002.
BRASIL. Decreto Lei 303, de 28 de fevereiro de 1967. Cria o Conselho Nacional de Controle da Poluição Ambiental e dá outras providências.
BRASIL. Lei n.º 4.717, de 29 de junho de 1965. Regula a ação popular.
BRASIL. Lei n.º 4.771, de 15 de setembro de 1965. Institui o novo Código Florestal.
BRASIL. Lei n.º 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
BRASIL. Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.(VETADO) e dá outras providências.
BRASIL. Lei n.º 7.803, de 18 de julho de 1989. Altera a redação da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e revoga as Leis nºs 6.535, de 15 de junho de 1978, e 7.511, de 7 de julho de 1986.
BRASIL. Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.
BRASIL. Lei nº 8.490,de 19 de novembro de 1992. Dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios e dá outras providências.
BRASIL. Lei n.º 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências.
BRASIL. Lei n.º 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências.
BRASIL. Portaria IBDF n° 486-P, de 28 de outubro de 1986. Regulamenta a lei 7511, de 7 de julho de 1986 e fixa conceitos e procedimentos a serem observados para exploração florestal.
BRASIL. Proposta de Emenda à Constituição n° 141, de 8 de dezembro de 1992. Câmara dos Deputados. Brasília. DF.
BRASIL. Resolução CONAMA n° 001, de 23 de janeiro de 1986. Cria a obrigatoriedade de realização de EIA/RIMA para o licenciamento de atividades poluidoras.
BRASIL. Resolução CONAMA n° 236, de 19 de dezembro de 1997. Altera a composição e os objetivos da Câmara Técnica Temporária de Cerrado e Caatinga criada pela Resolução CONAMA n° 008, de 10 de outubro de 1995.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 12. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental econômico e a ISO 14000. Análise jurídica do modelo de gestão ambiental e certificação ISO 14001. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 1. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 3. ed. ampl. São Paulo: Saraiva, 2002.
FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 5. ed. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8. ed. rev. de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002). São Paulo: Saraiva, 2003.
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: parte geral. 1º vol. 23. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1999.
LUFT, Celso Pedro. Minidicionário Luft. 20. ed. 7. imp. São Paulo: Ática, 2002.
MALTA, Luiz Roberto; COSTA, Wagner Veneziani. Minidicionário de expressões jurídicas. 3. ed. São Paulo: Ícone, 2004.
MEDAUAR, Odete (org.). Constituição Federal: Coletânea de legislação de direito ambiental. atual. até 08 jan.2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente:doutrina, prática, jurisprudência, glossário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
MORAES, Alexandre de, Direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994.
ODUM, Eugene P. Ecologia. Tradução de Christopher J. Tribe, Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27 ed. ajustada ao novo Código Civil. 4. tir., São Paulo: Saraiva, 2004.
RANGEL, Rodrigo. Punição para os biopiratas: projeto tipifica crime de biopirataria e prevê punição de até 12 anos. O Globo, Rio de Janeiro, 17 abril de 2005, p. 3.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 20. ed. rev. ampl. São Paulo: Cortez, 1996.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2002.
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
SMITH, Gilbert Morgan. Botânica criptogâmica: algas e fungos. Tradução, prefácio e notas de Carlos das Neves Tavares. 4. ed. I vol. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1987.
SNYDER, Ernest Elwood. Parem de matar-me: o planeta em perigo. Tradução de Richard Paul Neto. São Paulo: Nacional, 1978.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo cautelar. 21. ed. rev. Atual. São Paulo: Universitária de Direito. 2004.
Sítios virtuais
BUGLIONE, Samantha. As flores não resistem a canhões. O desafio de tutelar o meio ambiente. Jus Navigandi, Terezinha, a. 4, dez. 1999. Disponível em: jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=1686"> http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=1686 >. Acesso em 12 nov. 2004.
CAMARGO, Ricardo Antônio de Lucas. A tutela da floresta na legislação penal e no direito econômico. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 313, 16 maio. 2004. Disponível em: jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=5212"> http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=5212 >. Acesso em 12 jan. 2005.
CNRBMA – Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. A importância da Mata Atlântica.Disponível em: http://www.mataatlantica.org.br/mataatlantica/mataatlantica.html >. Acesso em 03 nov. 2004.
COMITÊ CHICO MENDES. 10 anos sem Chico Mendes. Disponível em: http://www.amazonlink.org/chico/cd.htm >. Acesso em 30 abr. 2005
CORRÊA, Hudson. da Agência Folha, em Campo Grande. Folha Online. Chega a 15 o número de crianças mortas em MS. 30/03/2005 - 21h54.Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u68121.shtml >. Acesso em 30 abr. 2005.
DELLAZARI, Juliana Cristina. Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal. In: "A priori", INTERNET. Disponível em: ahref=http://www.apriori.com.br/artigos/areas_de_preservacao_ambiental.shtml >.
Acesso em 26 abr. 2005.
ECONOMIANET. Conceito de desenvolvimento sustentável. Disponível em: http://www.economiabr.net/economia/3_desenvolvimento_sustentavel_conceito.html >. Acesso em 12 fev. 2005.
FOLHA ONLINE. Missionária americana é assassinada a tiros no Pará. 12/02/2005 - 17h22. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u105580.shtml >. Acesso em 30 abr. 2005.
FOLHA ONLINE. Polícia Federal detém alemão sob acusação de biopirataria. 27/09/2004 - 20h57. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u100035.shtml >. Acesso em 30 abr. 2005.
FONSECA, Izabel A.Z. Manguezal. Guia Guarujá. Disponível em: http://www.guiaguaruja.com.br/meioambiente/manguezal.htm >.Acesso em 3 fev. 2005.
OLIVEIRA COSTA, José Pedro de. Estações ecológicas. Disponível em: http://www.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/meioamb/arprot/tombadas/estecol/index.htm >. Acesso em 29 abr. 2005.
POR, Francis Pov; FONSECA, Vera Lúcia Imperatriz; LENCIONI NETO, Frederico. Economia do Pantanal. Disponível em: http://www.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/meioamb/ecossist/pantanal/economia/apresent.htm >. Acesso em 3 fev. 2005.
PORTAL BRASIL. O Cerrado brasileiro. Disponível em: http://www.portalbrasil.net/cerrado.htm >. Acesso em 03 nov. 2004.
PREFEITURA DE VITÓRIA, ES.Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Espaços Territoriais Especialmente Protegidos. Lei n.º 4.438/97. Disponível em: http://www.vitoria.es.gov.br/secretarias/meio/unidades.htm>. Acesso em 29 abr. 2005.
QUEIROZ, Fábio Albergaria de; SILVA, Luciene de Jesus Maciel da. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) e a Participação Popular. A Lei n.º 9985/2000. Disponível em: http://www.ibap.org/teses2004/teses2004d15.doc >. Acesso em 29 abr. 2005.
REDE GOVERNO. Disponível em: http://www.redegoverno.gov.br/defaultCab.asp?idservinfo=11162&url=http://www.terracap.df.gov.br/perfil/qualidade/iso_01.htm >. Acesso em 15 abr. 2005.
REDE GOVERNO. Disponível em: http://www.redegoverno.gov.br/defaultCab.asp?idservinfo=11162&url=http://www.terracap.df.gov.br/perfil/qualidade/iso_01.htm >. Acesso em 15 abr. 2005.
RÊGO, Werson Franco Pereira. O leasing e a revisão judicial dos contratos. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. In: Âmbito Jurídico, ago/2000. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/aj/dconsu0019.htm >. Acesso em 18 abr. 2005.
SZKLAROWSKY, Leon Frejda. SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Lei 9985, de 2000. Disponível em: http://www.tj.ro.gov.br/emeron/sapem/2001/junho/0106/snuc%20sistema%20nacional%20de%20unidades%20de%20conserva%c3%87%c3%83o%20da%20natureza%20lei%209985%20de%202000.htm >. Acesso em 29 abr. 2005.