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Direito fronteiriço: a questão da segurança pública nas fronteiras do Brasil

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Visando a cooperação e integração dos órgãos envolvidos com a segurança pública nas regiões de fronteira, foi instituído o plano estratégico de fronteira, que se caracteriza pelo planejamento de ações integradas entre órgãos de segurança pública, defesa, fiscalização, estados, municípios e países vizinhos.

Resumo: O presente trabalho tem como tema central o Direito Fronteiriço e buscou compreender as estratégias adotadas pelo governo federal brasileiro para potencializar e aprimorar a integração dos órgãos de segurança pública nos últimos anos, especialmente no contexto dos Gabinetes de Gestão Integrada de Fronteiras, instituídos a partir da implantação do Plano Estratégico de Fronteiras, além de pesquisar os desafios da governança e cooperação entre os diversos órgãos e atores envolvidos com a segurança pública nas regiões de fronteira, a análise dos principais componentes efetivos da gestão de segurança publica nacional, a cooperação internacional entre as forças que atuam na fronteira tratando-se de atuação criminosa internacional e a integração dos órgãos nacionais e a comunidade.  Para auxiliar nessa avaliação, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com análise descritiva e metodologia científica, com base e fundamentação teórica baseado em autores como Letícia Nuñez Almeida, Andreia Oliveira Macedo e Lia Osório Machado, analisando conceitos como a definição de fronteira, Segurança pública e a demonstração descritiva do Plano Estratégico de Fronteira. Por fim, este artigo procurou demonstrar a importância da gestão de segurança pública através da integração das forças armadas e as diversas forças policiais.

Palavras-chave: Direito Fronteiriço; Fronteira; Segurança Pública.

Sumário: Introdução. 1. A Questão da Segurança Pública nas Fronteiras do Brasil. Conclusão. Referências.


INTRODUÇÃO

É sabido que as regiões fronteiriças brasileiras se caracterizam pelo intenso fluxo de pessoas que entram e saem dos territórios vizinhos, consequentemente, apresentam também intenso fluxo de mercadorias e uma interação entre os povos da América do Sul, ímpar e única. A intensa e ampla mobilidade de capitais, mercadorias e trabalhadores é um traço já bem marcado do mundo contemporâneo, típico da revolução técnico-cientifica.

Nesse cenário, destaca-se uma grande preocupação em âmbito local, regional, nacional e mundial, que é o ilícito transfronteiriço. Segundo Lia Osório Machado (2011), a economia movimentada pelos entorpecentes no mundo apresenta impactos e efeitos peculiares em cada Estado, no entanto, o caráter multinacional das organizações, o vínculo com sistema financeiro internacional através da lavagem de dinheiro, evasão de divisas, da acumulação de capital e de poder, vai de encontro à fragilidade dos atores estatais em fazer o enfrentamento efetivo, tornando as drogas ilícitas assunto de destaque e relevância na geopolítica mundial.

Visando o fortalecimento da cooperação e integração dos órgãos envolvidos com a segurança pública nas regiões de fronteira, foi instituído pelo Governo Federal brasileiro, o Plano Estratégico de Fronteira, através do Decreto nº 7.496, de 08 de junho de 2011, caracterizando-se oficialmente, pelo planejamento de ações integradas entre órgãos de segurança pública, defesa, fiscalização, estados, municípios e países vizinhos. O referido plano, no âmbito do Governo Federal, é Coordenado pelos Ministros da Justiça, Defesa e Fazenda, e nos Estados, pelos respectivos governadores e secretários de segurança pública, sendo que na época do lançamento. No Ministério da Justiça, o Plano Estratégico de Fronteira envolveu ações e projetos da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), Secretaria Nacional de Justiça (SNJ), do Departamento de Polícia Federal (DPF) e do Departamento de Polícia Rodoviária Federal (DPRF). As iniciativas desenvolvidas pela SENASP foram constituídas no âmbito do Programa ENAFRON – Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras.

Importante destacar que atualmente é muito escasso e quase inexistente estudos e análises acadêmicas sobre o Plano Estratégico de Fronteiras e a gestão de Segurança Pública aplicada, que tem como escopo institucional implantar uma nova metodologia de Governança entre os atores envolvidos com a segurança pública, sem hierarquia e decisões consensuais.

E devido a esta defasagem em relação a pesquisas apresentadas neste segmento que este artigo possui como objetivo agregar informações valiosas para aprimorar o conhecimento de políticas pouco difundidas em relação à segurança pública de fronteira. De maneira bibliográfica e discursiva, esta pesquisa procura abordar brevemente os aspectos que envolvem a situação atual da Segurança Pública nas Fronteiras e seus principais atores.

Em virtude ao atual contexto histórico e político do Brasil imerso na globalização mundial, integrar as forças de segurança pública em áreas de grande criticidade, como são as fronteiras do país, passa a se tornar um tema de vital importância. Seguir as determinações e implantar o que está descrito pelo decreto que apresenta o Plano Estratégico de Fronteira passaria a ser o primeiro passo em relação à melhoria da Segurança Pública Nacional.


1 A QUESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA NAS FRONTEIRAS DO BRASIL

Para se falar de segurança pública no Brasil é necessário desenvolver vários conceitos alinhados a esta concepção. O que se entende sobre fronteira e segurança pública? Quais os integrantes desta realidade e os locais de atuação desses atores sociais? Além de todos os aspectos que envolvem o conceito de segurança pública aplicada à contenção da criminalidade nas fronteiras, também se faz necessário entender o contexto no qual ocorrem os ilícitos e a atuação do governo em relação à consequência destes atos.

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Mas dentro de todo esse aspecto o que pode ser considerado fronteira? Para Leticia Almeida (2017, p. 4) “as dinâmicas fronteiriças entre países extrapolam os seus limites geográficos e legislativos, pois criam fronteiras entre o que é legal e ilegal, além da troca de informações culturais entre as pessoas que moram na região”.

A faixa de fronteira é delimitada constitucionalmente como espaço de regulação especial por parte do Estado brasileiro, está regulada da seguinte forma na constituição Federal de 1988.

Art. 20. São bens da união: [...] § 2º - A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei. (BRASIL, 1988, p. 12)

No entanto quando se trata de gestão de segurança pública do país é necessário delimitar qual o campo de atuação dos órgãos responsáveis, dentro do território brasileiro. Para Lia Osório Machado (2011, p. 41) o conceito de fronteira está atrelado da seguinte forma:

[...] Implica, historicamente, aquilo que sua etimologia sugere - o que está na frente. A origem histórica da palavra mostra que seu uso não estava associado a nenhum conceito legal e que não era um conceito essencialmente político ou intelectual. Nasceu como um fenômeno da vida social espontânea, indicando a margem do mundo habitado.

Neste caso Almeida (2017) classifica com base no relatório de Segurança Pública SENASP em três regiões principais: Arco norte, Arco Central e Arco Sul. Na questão de responsabilidade sobre a politica de gestão de segurança pública compreende o seguinte conceito:

O estado tem o dever de propiciar aos seus nacionais o bem estar não apenas na sua jurisdição, mas também quando transponham seus limites territoriais, ou seja, deve ter o interesse sobre a forma com que seus cidadãos são tratados quando circulam por outro país, bem como dar garantias aos cidadãos de outra nacionalidade quando transitarem pelo seu território. (CAMPOS, p. 154, 2009).

Isso significa que apesar da delimitação geográfica do ponto de vista do estudo de atuação das organizações públicas, existe uma preocupação internacional da aplicação dessas políticas, quando se fala de segurança pública em fronteira, têm que se levar em consideração, além da questão criminal, os fatores populacionais, culturais e migratórios. A tratativa dessa política vai garantir o sucesso da gestão das políticas de segurança pública nas fronteiras.

Outro aspecto é que no que concerne aos integrantes da gestão de segurança pública, ainda há pouco o que se falar, pois apesar de ser um assunto de grande importância social, existe pouco material científico voltado para estes estudos, o que se observa é que com a globalização cada vez frequente em todos os aspectos sociais e a violência cada vez mais eminente, a questão da segurança pública tomou uma proporção de maior visibilidade e mais pesquisadores estão buscando informações a respeito do tema. No entanto o que se discute é a abordagem dos órgãos estatais.

Observa-se que esse cenário está se transformando nos últimos dez anos e está em formação um campo multidisciplinar de pesquisas transdisciplinares nas ciências sociais brasileiras sobre a temática das fronteiras. Isso pode ser observado, por exemplo, nos estudos da área da geografia sobre a criminalidade, segurança pública, migração e institucionalização nas fronteiras. (ALMEIDA, p. 5, 2017)

Do ponto de vista das políticas públicas brasileiras, um dos problemas associados às fronteiras que vem ganhando repercussão nas últimas décadas é a segurança pública. Pensada, sobretudo, como uma questão cujo centro são as ilegalidades que ocorrem devido a essa ultrapassagem pelas fronteiras do país, esse trânsito de pessoas nessas fronteiras causam diversos pontos de insegurança, pois está atrelado diretamente a crimes internacionais, sobretudo o tráfico de drogas ilícitas, o tráfico de pessoas e o contrabando de produtos informais, assim como as suas conexões reais ou imaginárias com os grandes centros urbanos brasileiros. Por meio da urgência que o controle dessas circulações impõe à agenda política, a repressão a esses ilícitos vem fixando a área de segurança pública como espaço de atenção prioritária.

Para Maia Neto (2006, p.159) ao analisar a ação da polícia federal, Militar e Civil em regiões de fronteira, observa-se a complexidade das situações que são apresentadas.

É possível através de convenio expresso e/ ou tácito, a solidariedade entre os órgãos de segurança publica (ver CF, art. 144), para garantir a eficiência das operações de repressão ao crime, sem que, com isso, se materialize qualquer espécie de arbitrariedade ou desvio de atribuições. (MAIA NETO, p. 159, 2006)

Segundo (SCHNEIDER, p. 14, 2011)

[...] Todos somos responsáveis pela construção da segurança pública, mas suas mais potentes redes entrelaçadas de sustentação devem ser formadas pelos chamados “operadores diretos de segurança publica”, uma vanguarda destacada da sociedade: os policiais federais e estaduais (civis e militares), os peritos, bombeiros, os guardas municipais, os agentes prisionais.

Neste sentido pode-se entender que para uma gestão de segurança pública seja eficiente, independente da posição geográfica, é necessário que se faça uma estrutura coerente de apoio aos órgãos de atuação. Em questionamento a esta atuação, segundo Rosa (2007, p. 1):

[...] Acusa-se a policia como sendo a responsável pelo aumento da criminalidade, por falta de uma melhor política de defesa da sociedade, uma vez que a criminalidade deve ser combatida com a força, para se evitar que as pessoas inocentes sejam mortas pelos chamados marginais.

Na visão de Lima, Sinhoretto & Bueno (2015), apesar de alguns avanços nas instituições de segurança pública e no ordenamento infraconstitucional, ainda há uma evidente falta de “coordenação e controle”, bem como uma insistente e complexa falta de sintonia entre as instituições de segurança pública, que em certa medida, é causada pela ausência de normativos específicos:

A ausência de regras que regulamentem as funções e o relacionamento das polícias federais e estaduais, e mesmo das polícias civis e militares, produz no Brasil um quadro de diversos ordenamentos para solução de problemas similares de segurança e violência sem, contudo, grandes avanços em boa parte do território nacional. (LIMA, SINHORETTO & BUENO, 2015, p. 125).

Segundo Lima, Sinhoretto & Bueno (2015, p. 126), “após mais de 30 anos da carta política de 1988, o Brasil ainda carece de um projeto de governança das polícias brasileiras e de alinhamento das políticas de segurança pública aos requisitos da democracia e à garantia de direitos humanos”. Nesse mesmo sentido Rosa (2007) entende que “tal falha na política de gestão pública pode estar relacionada com a falta de integração entre as diversas forças policiais que a integram, em exemplo as polícias estaduais Civis e Militares”. Atualmente essa separação de competência acaba por dificultar as denuncias e até mesmo à participação da comunidade. No mesmo sentido a cooperação entre entidades governamentais internacionais nas áreas de fronteira podem ser adotadas medidas que buscam a resolução, prevenção e repressão do delito transnacional, a exemplo disto, Malarino (2004, p. 127) cita um exemplo de cooperação pelos países da América Central:

Os países da América Central programaram um mecanismo de cooperação e coordenação entre suas forças policiais de maneira a combater o crime organizado. Deste modo, foi criada a comissão de Chefes de Policia da América Central e do Caribe, cuja função principal consiste no intercambio de informações e na elaboração e implementação de planos estratégicos contra o crime organizado.

A maioria dos governos no mundo pelo menos diz operar de acordo com uma constituição que restringe os poderes das corporações e garante aos seus cidadãos alguns direitos, por este motivo existe uma preocupação com o que se refere à tratativa e modelo de gestão. Os modelos de gestão pública também estão restritos às leis e assim como vários países, o Brasil também adota diversas formas de administração, ditando modelos organizacionais definidos, assim como o definido especificamente para a atuação nas Fronteiras do País, através do decreto 7.496, que contribui para as políticas de segurança das fronteiras, relacionados aos órgãos responsáveis, Almeida (2017, p. 45) descreve o Plano Estratégico de Fronteiras (PEF):

Art. 1º. I – a atuação integrada dos órgãos de segurança publica e das Forças Armadas; II – a integração com países vizinhos; [...] art. 5º As ações do plano estratégico de fronteiras serão implementadas por meio de: I – Gabinetes de gestão integrada de fronteira (GGIF); e II – Centro de Operações Conjuntas (COC).

Entende-se que dentro do contexto da PEF, atribui que todo o trabalho executado pelas forças armadas e pelos demais órgãos possuam um comando único, sob a responsabilidade do COC, e diante dessa unificação possibilitaria o ministério de defesa o controle de toda a fiscalização, operações e força policial na região de fronteira. Além disso, o esforço se basearia na ação conjunta de enfrentamento da criminalidade, baseado no Policiamento Especializado de Fronteira (Pefron) e em seguida, claramente propõe a integração com outras instituições de segurança publica, tais como: a polícia civil e a militar, dando o apoio necessário às forças armadas no âmbito municipal e estadual nas cidades fronteiriças.

Em se tratando de organismos hierarquizados, como nas áreas de Segurança e Justiça Criminal, Defesa, Relações Exteriores e Aduana, presentes nas fronteiras, as mesmas carecem de desenvolverem mecanismos de adaptação, conforme preconiza Macedo (2012):

Adaptar-se para gerir redes intergovernamentais, ainda que programas tradicionais continuem a ser administrativos via estruturas rígidas de autoridade. Nesse sentido, quanto maior a abertura dos processos interpessoais e interorganizacionais de gestão, maior é o grau de flexibilidade exigido, das estruturas administrativas tradicionais para o aprimoramento das ações coordenadas (MACEDO, 2012, p. 41).

Segundo Almeida (2017, p. 46) partir do PEF, “a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) criou a Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras (Enafron), vinculada a outras iniciativas do governo federal”. Esta estratégia foi dividida em duas fases distintas, a de Defesa e outra de Gestão. Segundo o Ministério da Justiça, o Programa ENAFRON tem como objetivo intensificar o controle e a fiscalização nas fronteiras, de forma a fortalecer a prevenção, o controle e a repressão dos delitos transfronteiriços e outros delitos praticados nas regiões da fronteira brasileira, em parceria com estados e municípios, e se organizou a partir da implementação de inúmeros projetos estruturantes que tem como beneficiários diretos, a população residente na fronteira e os profissionais de segurança pública dos estados.

Sendo assim, experiências na direção de institucionalizar instâncias de governança, otimização da articulação, cooperação e integração de esforços na área de segurança pública, como se dispôs o Plano Estratégico de Fronteiras, é de fundamental importância, visto a necessidade de sistematizar conhecimentos sobre essas experiências, especialmente na atual conjuntura de violência no país.

Sobre os autores
Antonio José Cacheado Loureiro

Professor de Direito Penal e Processual Penal da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA).

Gabriel Cunha Alves

Administrador, Servidor da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Amazonas, Especialista em Direito Militar, Gestão em Segurança Pública e Docência em Administração Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOUREIRO, Antonio José Cacheado; ALVES, Gabriel Cunha. Direito fronteiriço: a questão da segurança pública nas fronteiras do Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5752, 1 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72888. Acesso em: 22 dez. 2024.

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