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A história da força normativa do precedente judicial no common law e a conformidade da tradição brasileira com o sistema de precedentes vinculantes

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Agenda 25/06/2019 às 11:13

Enquanto juízes de common law buscam estabelecer uma comparação entre o precedente e o caso a julgar a partir dos chamados “fatos materiais”, os juízes do civil law adotam o precedente como um pronunciamento em forma de regra e de norma.

Sumário:1 INTRODUÇÃO. 2 A HISTÓRIA DA FORÇA NORMATIVA DO PRECEDENTE JUDICIAL NO COMMON LAW. 3 A FORÇA OBRIGATÓRIA DOS PRECEDENTES: PRECEDENTES VINCULANTES VERTICAIS E HORIZONTAIS. 4  A CONFORMIDADE DA TRADIÇÃO BRASILEIRA COM O SISTEMA DE PRECEDENTES VINCULANTES.  5. REFERÊNCIAS


1. INTRODUÇÃO

O CPC introduziu o conceito de precedentes no Direito brasileiro. Precedente é um pronunciamento judicial proferido em processo anterior que é empregado como base da formação de outra decisão judicial, prolatada em processo posterior, conforme Câmara.[2]O termo precedente, etimologicamente, vem da palavra preceder, anterior.

De acordo com Cambi e Fogaça, precedente tem natureza transcendental, irradiando efeitos para além do caso em que se originou.[3]Rosito conceitua precedente como toda e qualquer decisão anterior com relevância, que projete efeitos jurídicos para o futuro, condicionando o comportamento de distintos sujeitos em casos similares, revelando seu caráter normativo.[4]

Por sua vez, Zaneti Jr. afirma que os “[...] precedentes normativos formalmente vinculantes são as decisões passadas (casos-precedentes) que tem eficácia normativa formalmente vinculante para os juízes e tribunais subsequentes (casos-futuros) e são de aplicação obrigatória [...].”[5]

Sob o enfoque estrito, precedente é decisão de eficácia vinculante, que serve para solução de casos futuros, com eficácia semelhante a de uma norma jurídica[6].


2 A HISTÓRIA DA FORÇA NORMATIVA DO PRECEDENTE JUDICIAL NO COMMON LAW

O estudo dos precedentes encontra raízes no common law inglês e nos juges inanimés franceses, revelando-se o primeiro num direito controlado pelo judiciário, e estes últimos, num modelo de direito controlado pelo legislador.

O modelo inglês fundava-se na ideia de que os juízes constituíam oráculos do Direito, cujas decisões consubstanciavam-se em verdadeiras provas vivas da existência do common law[7].

Inspirada em Montesquieu, para quem o poder de julgar deveria ser invisível e inexistente, a experiência francesa oriunda da Revolução concebia os juízes como seres inanimados, que exerciam um poder em realidade inexistente, pois os juízes eram apenas a boca que pronuncia as palavras da lei, seres inanimados que não poderiam moderar nem a sua força, nem o seu rigor.[8]

O significado do precedente no direito inglês alterou-se profundamente desde as suas origens medievais até a época contemporânea, evolução que pode ser sintetizada em três expressões: ilustração, persuasão e vinculação.[9]

Historicamente, o precedente no direito inglês aparece vinculado ao modo de formação case to case que presidiu a formação da tradição do common law.

Os juízes medievais ingleses sempre invocaram precedentes em suas decisões, todavia, com o intuito de simples ilustração ou explicação do significado do Direito aplicado ao caso concreto, porquanto à época inexistia vinculação ao precedente.

Marinoni narra que o precedente ilustrativo servia como um recurso demonstrativo do Direito que os juízes citavam em suas decisões, refletindo o modelo do common law[10].

Naquele contexto, as decisões judiciais eram recolhidas em livros para facilitar a identificação, consulta e estudo dos casos, surgindo dessa prática os chamados Years Books, coletâneas de discussões forenses e decisões judiciais.

A partir dos séculos XVI e XVII, os precedentes incorporam um papel concernente ao processo de tomada de decisão judicial, começando a servir de critério para decisão do caso, desde que conforme ao commonlaw. Nesse estágio, os precedentes adquirem uma função persuasiva, servindo para decisão do caso, desde que não fossem contrários ao Direito, sendo catalogados em named reports[11].O precedente é a prova do common law. A lição de Neil Duxbury é esclarecedora a respeito:

“The status of judicial precedents began to change in the early Tudor period. During the second half of the sixteenth century the idea of common learning was still evident in the case-law. However the revival of the special verdict, and an increasing inclination on the part of judges to determine the law by decisions on demurrer and motions after trial, meant that courts were more likely to treat earlier decisions as supportive (though not determinative) of a particular result, at least where those decisions were accompanied by reasons. The sixteenth-century lawyer´s tendency to rely ever more on abridgements, and the emergence during this period of compilations of cases illustrating points of law settled by the central courts, probably also contributed to the increased emphasis on case-law as a source of authority. This subtle shift in emphasis was certainly evident to Coke in his Commentary upon Littleton: ‘our book cases are the best proofs what Law is’, he wrote, and ‘are principally to be cited for the deciding of cases in question, and not any private opinion’, for an argument drawn from authority is the strongest in law (‘Argumentum ab authoritate est fortissimum in Lege’)”[12]    

Blackstone explica a real função dos precedentes à época: “[...] eles deviam ser seguidos, salvo se absurdos ou injustos.”[13]

Mitidiero relata que, acaso se percebesse posteriormente que determinada solução já adotada para decisão de certo caso “was unjust, was unreasonable”, o correto seria julgar que o precedente “was not law”. Nesse caso, os juízes que o pronunciaram anteriormente incorreram em “mistake the law”, significando que a solução anterior não era Direito, mas uma solução equivocada. Com o novo caso, acha-se a sua verdadeira e correta solução.[14]

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O emprego da teoria cognitivista da interpretação e da teoria logicista da aplicação do precedente consagra a concepção dos juízes como oracles of the law, característica do common law.

Oliveira Jr. pontifica que o efeito vinculante dos precedentes judiciais, previsto na teoria do stare decisis, nem sempre esteve presente na tradição do common law, relatando que até o final do Século XIX, os juízes, ao julgarem os casos concretos, observavam os precedentes judiciais em razão da preocupação com a segurança jurídica e da ausência de interpretação distinta acerca de determinada norma jurídica[15].

Contudo, adverte Oliveira Jr. que não existia a obrigatoriedade de seguir o precedente, em decorrência da eventual autoridade desses, o que ocorria era apenas o costume de segui-los, sem qualquer força vinculante.

No século XIX, a partir da doutrina de Jeremy Bentham[16], encampada e sucedida por Austin[17], da reforma dos Law Reports em 1865 e do advento dos Judicature Acts de 1873–1875, o precedente passa da persuasão à vinculação, convertendo-se em uma efetiva norma jurídica[18].

Bentham inaugurou a campanha pela codificação do direito inglês – que, segundo sua projeção, seria capaz de prover segurança jurídica – e pela necessidade de adoção de precedentes vinculantes em seu sistema judiciário.

No direito inglês, a força vinculante do precedente judicial somente foi institucionalizada em 1898, no julgamento do caso London Street Tramways Co. Ltda. v. London County Council, no qual a House of Lords reconheceu a obrigação dos juízes de seguir os precedentes.

A controvérsia girava em torno dos parâmetros para a fixação do valor da indenização por desapropriação, sendo que a House of Lords entendeu que tais critérios já estavam definidos em caso anterior julgado em 1894.

No caso anterior, a alta Corte inglesa decidiu que os juízes deviam seguir os precedentes formulados na sua própria jurisdição e nos tribunais superiores, ainda que discordassem do entendimento, afirmando-se até mesmo que sequer a House of Lords poderia superar o seu próprio precedente.

Revelava-se a teoria de que os juízes apenas declaravam e anunciavam o direito; e não o criavam, de modo que a sua extinção ou superação somente poderia ser feita a partir do processo legislativo do Parlamento, registraOliveira Jr.

Eis o voto do Lord Chancellor no julgamento do caso London Street Tramways Co. Ltda. v. London County Council:

“É claro que eu não nego que casos especificamente difíceis possam surgir, e que possa haver uma corrente de opinião declarando que determinado julgamento foi errado. Mas o que é esta interferência ocasional, talvez uma justiça abstrata, se comparada com a inconveniência – a desastrosa inconveniência – de submeter-se cada questão à nova discussão, e os negócios das pessoas tornados incertos por motivo de decisões diferentes, de forma que, na verdade e de fato, não haveria uma verdadeira corte final de apelação? Meus Lordes, interest rei pubicae (i.e. é de interesse público) que deva haver finis litium (i.e. um fim para o litígio em algum momento, e poderia não haver finis litium se fosse possível sugerir, em cada caso, que ele poderia ser novamente discutido porque não é ‘um caso ordinário’, seja lá o que isso possa significar. Nestas circunstâncias, eu estou entre aqueles que não devem permitir que esta questão seja rediscutida.”[19]    

Em seguida, a House of Lords, em Practice Statement, entendeu pela possibilidade dos seus juízes superarem os seus próprios precedentes, quando achassem adequado e justo.

Eis a transcrição da manifestação do Chancellor Lord Gardner, datada de 26 de julho de 1966:

“Suas Excelências consideram o uso dos precedentes como um fundamento indispensável com base no qual se decide o que é o Direito e sua aplicação ao caso individual. Ele proporciona pelo menos algum grau de certeza sobre como os indivíduos podem confiar na condução de seus negócios, bem como uma base para o desenvolvimento ordenado de regras legais. Suas Excelências, entretanto, reconhecem que a adesão rígida demais ao precedente pode levar à injustiça num caso particular e, também, indevidamente restringir o próprio desenvolvimento do Direito. Eles propõem, portanto, modificar a prática atual e, apesar de tratarem as decisões antigas desta Casa como normalmente obrigatórias, afastarem-se de uma decisão prévia quando assim parecer a coisa certa a se fazer. Nesse sentido, eles levaram em conta o perigo de se perturbar retrospectivamente a base em que contratos, acordos de propriedade e arranjos fiscais foram entabulados, e, também, a necessidade especial de certeza em relação ao Direito Criminal. Este anúncio não deverá afetar o uso do precedente em qualquer outro lugar que não esta corte.”[20]

Registre-se, contudo, que tal fato não implicou na possibilidade de os juízes modificarem com freqüência os precedentes, tampouco no enfraquecimento da teoria do stare decisis.[21]


A FORÇA OBRIGATÓRIA DOS PRECEDENTES: PRECEDENTES VINCULANTES VERTICAIS E HORIZONTAIS

Bertão examinando a classificação dos precedentes vinculantes de acordo com a relação entre o órgão julgador da primeira decisão e o que o utilizará como norma fundamento de sua decisão, traçando uma relação hierárquica entre os órgãos, prolator da decisão e subsequente, divide os precedentes vinculantes em verticais e horizontais.[22]

Segundo Bertão, a categorização é pertinente, pois os precedentes de tribunais superiores vinculam os inferiores, enquanto que, no inverso, há apenas uma persuasão.

 Os precedentes são horizontalmente vinculantes quando vinculam o mesmo órgão prolator, ou, ainda, outros órgãos com o mesmo nível hierárquico.

Adverte, contudo, que não há precedentes vinculantes de forma absoluta, em nenhuma forma, sendo certo que, estando diante de hipóteses que componham a técnica de superação dos precedentes, dever-se-á realizá-la.

Quanto à eficácia vinculante, Marinoni salienta que a circunstância de a Corte Suprema não poder revogar o precedente, ainda que tenha bons fundamentos para não o respeitar, é o que a caracteriza como absoluta. E ensina: trata-se, aproximadamente, do sistema inglês da Câmara dos Lordes da primeira metade do século passado.

Relata Marinoni que, em 1966, a House of Lords declarou, mediante Practice Statement, que, diante de certas circunstâncias, poderia revogar (realizar o overruling) as suas próprias decisões.

O Statement de 1966 afirmou que a House of Lords poderia decidir de forma diferente das suas anteriores manifestações quando isto lhe parecesse correto (depart from a previous decision when it appears right to do so)[23].

A House of Lords estava absolutamente vinculada às suas prévias decisões, ainda que estivesse convicta de que em determinados casos, ao reiterá-las, estaria perpetuando uma decisão injusta.

Eis a justificativa da possibilidade de overruling contida no Statement de 1966, extraída da obra de Neil Duxbury[24]:

“Os Lordships consideram o uso do precedente uma base indispensável para decidir o que é o direito e para aplicá-lo aos casos concretos. Fornece um grau mínimo de certeza perante o qual os indivíduos podem pautar suas condutas, bem como uma base para o desenvolvimento ordenado de regras jurídicas. Os Lordships, não obstante, reconhecem que uma aderência muito rígida aos precedentes pode levar à injustiça em um caso concreto e também restringir excessivamente o devido desenvolvimento do direito. Eles propõem, portanto, modificar a presente prática e, embora tratando as antigas decisões como normalmente vinculantes, deixar de lado uma decisão anterior quando parecer correto fazê-lo.”[25]    

A partir de 1966, as decisões da House of Lords deixaram de ter eficácia absolutamente vinculante, embora ela venha utilizando o poder de overruling muito raramente.

Marinoni salienta que a Suprema Corte americana entende que a revogação de um precedente requer justificação especial, mas nunca se sentiu proibida de assim agir.

Relata que a Corte de Apelação de Nova Iorque evita perpetuar precedentes que se mostrem distantes das novas tecnologias, da nova realidade social ou mesmo que, em razão de uma experiência posterior, revelem-se evidentemente equivocados.

Assim, com a modificação legislativa de 1966, extinguiu-se o único exemplo de precedentes vinculantes absolutos.

Quanto aos precedentes verticalmente vinculantes, Zaneti Jr. conceitua como os que, emanados por órgão hierarquicamente superior, obrigam a adoção pelos demais, devendo ser obedecidos sob pena de erro.[26]

Esclarece Zaneti Jr. que os juízes e tribunais que possuam relação subordinada deverão seguir os precedentes emanados pela Corte Superior.

Bertão[27]defende que toda decisão é precedente, sendo sua força, persuasiva ou vinculativa, determinada pela legislação do local, de acordo com a sua cultura jurídica, sendo preciso analisar na legislação estudada qual o grau de força que se denota aos precedentes, para se perceber a adoção, ou não, da StareDecisis[28].    


 4. A CONFORMIDADE DA TRADIÇÃO BRASILEIRA COM O SISTEMA DE PRECEDENTES VINCULANTES

Didier Jr. e Souza relatam que o Direito brasileiro posterior à Independência política (1822) e nos primeiros anos da República revela a consciência sobre o problema do precedente judicial e sua função diante do sistema jurídico[29]

Temas relevantes como os efeitos dos precedentes judiciais, sua forma de publicação e citação demonstram a compreensão pelos juristas de oitocentos de que o precedente judicial e a jurisprudência consubstanciavam-se em fonte de normas jurídicas.

Após a proclamação da República (1889), o Brasil sofre influência do Direito dos Estados Unidos da América no Direito público, especialmente nos Direitos constitucional e administrativo, cabendo destacar, a partir da instituição do regime republicano, a materialização do federalismo, do presidencialismo, do controle de constitucionalidade difuso das leis, da concepção de direitos individuais[30].

Bustamante[31] relata que o Supremo Tribunal Federal republicano foi reconhecidamente influenciado pelas decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos da América no campo do Direito público, mencionando diversos precedentes do tribunal brasileiro em que os Ministros fizeram expressa referência ao Direito constitucional estadunidense, à Constituição dos Estados Unidos da América e a sua Suprema Corte, como modelos para as respectivas instituições no Brasil[32].

Todavia, ressalta que a doutrina da época refutou a formalização do Direito dos Estados Unidos da América como direito subsidiário no Brasil.

O problema teórico do respeito aos precedentes judiciais foi enfrentado pelos juristas dos primeiros anos da República similarmente ao modo como foi considerado pelos juristas do Império, discorrem Didier Jr. e Seixas Souza.

No Império, os juízes não eram obrigados a seguir precedentes judiciais, então também chamados de arestos, baseando-se em argumentos como: i) a "ausência de força de lei" do precedente; ii) a possibilidade de "erro" da decisão paradigma; e iii) a referência ao fragmento do Codex que ordena aos juízes que as decisões dos juízes não devam se fundar nos "exemplos estabelecidos por outros" (i.e, precedentes), mas nas leis (C. 7.45.13)[33] .

Nos primeiros anos da República, a doutrina compreendeu a questão de forma muito similar. A eficácia vinculante ou normativa dos precedentes judiciais foi comparada ao exercício de atividade legislativa, proibida aos tribunais; além disto, entendia-se que caso os juízes fossem obrigados a seguir os precedentes judiciais dos tribunais superiores eles teriam a sua "liberdade interpretativa" violada - o que seria vedado sob o novo regime constitucional.

Aos precedentes era reconhecido, portanto, um efeito apenas persuasivo.

A vinculatividade dos precedentes judiciais não foi reconhecida pela doutrina nem mesmo nos precedentes do Supremo Tribunal Federal em exercício do controle difuso de constitucionalidade das leis, forjado na Constituição Federal de 1891 com inspiração no judicial review estadunidense[34].

Didier Jr. e Souza relatam que um dos marcos do pensamento jurídico das últimas décadas foi a revisão do papel dos precedentes judiciais nos sistemas jurídicos romano-germânicos.[35]

Para Didier e Souza, a teoria clássica das fontes do Direito teve de ser reconstruída, reverberando na reconstrução da Teoria Geral do Processo, com o aporte de novos conceitos jurídicos fundamentais e a redefinição de outros que se tornaram obsoletos.[36]

O precedente passou a ser considerado um fenômeno marcado pela ubiquidade, presente onde quer que se verifique decisão judicial, posto que a doutrina passou a dedicar-se ao estudo dos precedentes judiciais, concebendo as suas características e a dinâmica de sua aplicação, bem como a identificação dos seus efeitos nos mais diversos sistemas jurídicos, estudando também a relação dos estilos de decisão (style et La pratique des jugements) com o papel dos precedentes no Direito comparado[37].

Didier Jr. e Marcus Seixas Souza realçam que a construção de uma teoria geral dos precedentes judiciais somente se tornou um tema de interesse da doutrina brasileira nos últimos vinte anos, intensificada após as reformas por que passaram a Constituição Federal, o Código de Processo Civil e a Consolidação das Leis do Trabalho brasileiros, para dotar de alguns efeitos processuais os precedentes, a jurisprudência dos tribunais e os enunciados das suas súmulas, bem como após o surgimento da súmula vinculante.

As transformações em curso na jurisdição constitucional brasileira, a exemplo da teoria da transcendência dos motivos determinantes da decisão de inconstitucionalidade, a mutação constitucional do art. 52, X, da Constituição Federal e a teoria da inconstitucionalidade por arrastamento contribuíram para o aprofundamento do estudo do precedente judicial, nas lições de Didier e Souza.

No Brasil, o sistema de precedentes ganhou relevo e impulso no cenário jurídico nacional com a EC nº 3/1993[38], quando instituída a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), e com ela o efeito vinculante das decisões proferidas pelo STF, efeito esse estendido às decisões do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIn, por meio do art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/1999.[39]

Zaneti Jr. registra que o sistema jurídico brasileiro é híbrido, misturando-se aspectos das tradições romano-germânica e de common law.[40]

Tal entendimento é notadamente seguido pela doutrina contemporânea de escol, a exemplo de Barreiros[41], ao enfatizar que o sistema brasileiro convive com um paradoxo metodológico: “a necessidade de compatibilizar uma tradição constitucional extremamente influenciada pelo direito norte-americano e uma tradição infraconstitucional sustentada em influências oriundas da Europa continental.”

Tanto os magistrados do common law quanto os de civil law têm preocupação com precedentes, apenas a atitude deles[42] frente aos mesmos é que muda. Enquanto juízes de common law buscam estabelecer uma comparação entre o precedente e o caso a julgar a partir dos chamados “fatos materiais”; os juízes do civil law adotam o precedente como um pronunciamento em forma de regra, tratando-o de forma abstrata, como norma[43].

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FEITOSA, Dulce Anne Freitas. A história da força normativa do precedente judicial no common law e a conformidade da tradição brasileira com o sistema de precedentes vinculantes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5837, 25 jun. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73795. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Este estudo é também resultado dos grupos de pesquisas “Transformações nas teorias sobre o processo e o Direito processual”, vinculado à Universidade Federal da Bahia e cadastrado no Diretório Nacional de Grupos de Pesquisa do CNPq (dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/7958378616800053). Esse grupo é membro fundador da “ProcNet – Rede Internacional de Pesquisa sobre Justiça Civil e Processo Contemporâneo” (http://laprocon.ufes.br/rede-de-pesquisa).

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