4. PRINCÍPIOS ADOTADOS PELO CÓDIGO PENAL NA EFICÁCIA ESPACIAL DA LEI PENAL
Em face de toda exposição fática, pode-se afirmar que a Legislação penal brasileira adotou os seguintes princípios segundo as hipóteses previstas em especial nos artigos 5º e 7º do Código Penal.
1º - territorialidade: art. 5º (regra);
2º - real ou de proteção: art. 7º, I e § 3º;
3º - justiça universal: art. 7º, II, a;
4º - nacionalidade ativa: art. 7º, II, b;
5º - representação, da bandeira ou pavilhão: art. 7º, II, c.
5. O CASO SUPOSTAMENTE CRIMINOSO DO JOGADOR DE FUTEBOL REGISTRADO NO BRASIL E A APLICAÇÃO DA LEI PENAL BRASILEIRA.
Após toda exposição jurídico-penal, passa-se doravante à análise da hipótese de aplicação da lei penal brasileira a fotos ocorridos fora do Brasil.
A lei penal brasileira pode ser aplicada a fatos registrados fora do país em várias possibilidades jurídicas.
No caso do jogador de futebol, que é acusado de ter estuprado uma jovem brasileira no interior de um hotel na França, trata-se de fato grave e considerado hediondo, o que nasce para o Estado o exercício da pretensão penal punitiva, evidentemente, viabilizado palmilhadas investigações pela Polícia Judiciária, nos termos do artigo 4º e SS do Código de Processo Penal.
No caso em testilha, pode-se dizer em adoção do princípio da extraterritorialidade condicionada, uma vez que o Brasil por Convenção se obrigou a reprimir o crime de estupro, cuja acusação se recai a um brasileiro, o que justifica a aplicação da lei penal brasileira, em razão das seguintes condições:
I – a primeira condição é que o agente tenha entrado no território brasileiro, o que se motiva a aplicação do princípio sob exame.
II - ser o fato punível também no país em que foi praticado, o que também se evidencia, eis que a França também pune a prática do estupro em seu Código Penal, preenchendo aquilo que se chama de dupla tipicidade.
III - não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena, o que também se confirma, uma vez que o fato não foi registrado na Polícia francesa.
Pode-se afirmar que estamos diante do princípio da extraterritorialidade condicionada, com a presença de todas as condições de procedibilidade para o exercício da ação penal, muito embora, a meu juízo, quem deveria apurar os fatos seria a Polícia francesa, pelos argumentos expendidos nas conclusões finais deste ensaio.
6. DO CRIME DE VAZAMENTO DE IMAGENS E FOTOS ÍNTIMAS
O crime de divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia foi incluído pela Lei nº 13.718, de 2018, que acrescentou o artigo 218-C no Código Penal, consistente oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia.
A pena para esse tipo de conduta criminosa é de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave, havendo aumento de pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.
Como se sabe, após o registro do suposto crime de estupro na França, houve o vazamento de imagens de fotos íntimas da jovem que registrou o fato de estupro numa Delegacia de Polícia em São Paulo.
Trata-se de crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, instantâneo que consuma no exato momento da conduta criminosa, comissivo, porque denota ação do agente e crime formal eis que a conduta se perfaz tão somente com a conduta criminosa, não havendo necessidade de resultado naturalístico.
Por se tratar de crime de médio potencial ofensivo, cuja pena mínima não é superior a 01 ano, cabe a suspensão condicional do processo, a teor do artigo 89 da Lei nº 9.099/95.
7. DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
De todo o exposto, há de se afirmar que as informações acusatórias são gravíssimas, considerando que o crime de estupro é classificado e rotulado como crime violento e hediondo.
O fato teria ocorrido na França, em 15 de maio de 2019, no interior de um hotel, mas registrado numa Unidade Policial no Brasil, o que atende perfeitamente as condições para o exercício da ação penal no Brasil, preenchidas, é claro, as condições de procedibilidade do artigo 7º, inciso II, do Código Penal, muito embora, a meu sentir, devesse ser apurado pela Polícia francesa, onde estaria a maior parte das provas, como depoimentos de testemunhas do hotel, imagens de vídeo-monitoramento das instalações na França e demais meios de prova.
Sabe-se que se a Polícia brasileira necessitar inquirir testemunhas do fato, e com certeza isso vai acontecer, em especial, empregados do hotel na França, deverá utilizar-se de meios de cooperação como carta rogatória e outros meios de prova, devendo tramitar por meio das vias diplomáticas, o que pode dificultar ou demorar para a apuração do crime.
Quando ao fato da divulgação e vazamento das imagens íntimas da jovem, crime previsto no artigo 218-C do Código Penal, aqui a matéria de competência e atribuição investigativa não possui e nem oferece maiores implicações, aplicando a lei penal brasileira em face do princípio da territorialidade, artigo 5º do Código Penal.
Noutra toada, não comprovando os fatos imputados ao jogador de futebol, a própria lei brasileira prevê o crime de denunciação criminosa, previsto no artigo 339 do Código Penal, consistente em dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente, com pena de 02 a 08 anos de reclusão, além de multa.
O crime de denunciação criminosa é considerado comum, porque pode ser cometido por qualquer pessoa, não se exigindo nenhuma condição especial em relação ao sujeito ativo.
De acordo com a lição do festejado professor NELSON HUNGRIA:
“Denunciação caluniosa, perante o nosso Código, é crime de quem, mala fide, atribui falsamente à pessoa individualizada uma determinada infração penal (crime ou contravenção), provocando contra o acusado a atividade policial ou judicial”.
Por fim, espera-se que o fato seja rigorosamente apurado na forma da legislação em vigor, dentro do mais rigoroso tecnicismo e profissionalismo dos órgãos que compõem o sistema de persecução criminal para que a sociedade mundial tenha a verdadeira dimensão daquilo que efetivamente ocorreu intramuros na França e também possível crime cibernético no Brasil prevalecendo, unicamente, a verdadeira justiça, nada mais que isso, que há de sobrepujar sobre o poder econômico, fama e estrelismos, de um lado e, possíveis oportunismos de outro.
DAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOTELHO, Jeferson. Manual de Processo Penal; FERNANDES, Fernanda Kelly Silva Alves, Editora D´Plácido, BH, 1ª edição, 20015.
BOTELHO, Jeferson Botelho. Elementos do Direito Penal. Editora D´Plácido, BH, 1ª edição, 2016.
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Parte Especial. 5ª edição. Editora Jus PODIVM. 2013.