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Busca domiciliar, pessoal e veicular: breve análise acerca dos efeitos das decisões dos tribunais superiores.

Os precedentes judiciais e a mudança de paradigma da atuação policial

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Restou demonstrada, no decorrer do presente trabalho, a complexidade do tema precedentes judiciais, tema este, que ainda se encontra engatinhando no ordenamento jurídico brasileiro e que vem causando demasiadas discussões jurídicas acerca de sua aplicabilidade. Após mais de quarenta anos da existência do antigo Código de Processo Civil, vigente antes da égide da atual Constituição Federal, normal que um novo código procesual, embora mais democrático, gere incertezas e insegurança. Contudo, ao fazer uma análise do sistema de precedentes, desde a sua origem, evidencia-se os diversos benefícios da adoção dos precedentes no Brasil, mesmo que adaptado as nossas necessidades.

Tendo como objetivo trazer segurança jurídica, previsibilidade, estabilidade, respeito à isonomia, maior celeridade processual, respeitando-se, inclusive a autonomia do exercício jurisdicional, não vislumbro motivo para desconfiar, muito menos criticar o sistema de precedentes, ao contrário, vangloria-lo, consistindo desconfiança aos atores incubidos de dar executoriedade ao sistema, pois estes sim, demonstram e comprovam total desrespeito às decisões judiciais potenciais, capazes de gerar precedentes.

Superada a nobreza do sistema de precedentes, mesmo que à brasileira, passo a verificar a eficácia e efeito das decisões dos Tribunais Superiores acerca das temáticas da busca pessoal, veicular e domiciliar. No que tange à busca domiciliar, já há decisão de caso concreto, em sede de recurso extraordinário, com repercussão geral - RE 603.616/RO (TEMA 280), regulamentando a matéria, figurando tal decisão judicial como precedente normativo, com efeito vinculante e eficácia erga omnes, tendo a Suprema Corte, portanto, estabelecido os critérios autorizadores da busca domiciliar sem mandado judicial. Fazendo alusão ao efeito vinculante, novamente friso a revogação parcial do acórdão proferido em sede de HC 598.051 - STJ, através do RE n.1.342.077 - STF, interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, que recebido e conhecido, por se tratar de matéria constitucional, chegando ao conhecimento do ministro Alexandre de Moraes, entendeu que o STJ ultrapassou seu limite legal de atuação ao tentar dar efeito vinculante à uma decisão em sede de habeas corpus individual, contrariando e criando regras inexistentes no precedente vinculante já criado pela Suprema Corte.

A mesma lucidez não se pode afirmar das decisões acerca da busca pessoal e veicular no ámbito do STJ, em que as 5ª e 6ª turmas do Tribunal criticam duramente a atividade policial, denominando-a de arbitrária por realizar abordagens desprovidas de fundada suspeita, embora o próprio Tribunal Superior não consiga aclarar o conceito de tal terminologia vaga, abstrata, genérica, que requer as mais diversas interpretações, não alcançando a segurança jurídica necessária, em total contramão à teoria dos precedentes judiciais, que requer uniformidade e integridade nas suas decisões. Conforme demonstrado mediante julgados subscritos no presente trabalho, o próprio STJ, através de suas turmas, apresentam decisões divergentes em casos análogos, quando se deveria aplicar o mesmo direito.

Utilizar-se do mesmo elemento normativo que norteia o precedente da busca domiciliar talvez não seja a medida mais adequada, pois se está igualando direitos que não possuem a mesma similaridade, estando a busca domiciliar num patamar de direito fundamental, assegurado na Carta Magna. Inconcebível imaginar que a policía, no exercício de suas atividades funcionais, mediante característico nervorsismo apresentado por um transeunte em uma área de tráfico, por exemplo, não possa ser submetido a uma abordagem policial. Sustentar tal tese é um verdadeiro retrocesso, principalmente se considerarmos que a grande maioria das prisões no Brasil são decorrentes de flagrante. Longe de defender a tese de que a abordagem policial deve ser vista como atividade de rotina, desprovida de critérios, pois de fato causa constrangimento a quem a ela é submetida, no entanto verifica-se um evidente conflito de interesses, de um lado o direito social à segurança, de outro, o interesse do particular.

Com a devida vênia, por serem destituídas de qualificação necessária para que sejam utilizadas como fundamento para casos análogos em decisões futuras, pois desprovidas da segurança jurídica e previsibilidade necessárias, entendo que nenhuma das decisões do STJ quanto à temática busca pessoal/veicular tenha legitimidade suficiente para criar um precedente, pois repletas de abstratividade. Tais decisões são providas de diversos fundamentos de passagem, mas desprovidas de motivo determinante da decisão, no máximo dotadas de efeito meramente persuasivo, e portanto, não vinculantes a nenhum dos poderes constituidos, resultando na imprevisibilidade e insegurança jurídica perante os magistrados que, quando no exercício da atividade jurisdiccional, decidem, com discricionariedade, a qual linha se aliam, enquanto os jurisdicionados são surpreendidos, em casos análogos, com decisões divergentes dos juízes pertencentes ao mesmo Tribunal. Com isso, visando imiscuir qualquer dúvida, resta esclarecer que, diversamente da busca domiciliar, atualmente não há precedente vinculante normatizando a busca pessoal/veicular por parte das Cortes Superiores, em total desrespeito ao sistema de precedentes adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro.


6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. Câmara, 2022, p. 442.

  2. Tammay, 2021, p. 177.

  3. Idem, 2021, p.185.

  4. Wambier, 2010,p.33.

  5. Reale, 2013, p.142.

  6. Marinoni, 2022, p. 42.

  7. Thamay, 2019, p.32.

  8. Reale, 1995. P.142.

  9. Marinoni, 2022, pg. 79.

  10. Arruda, 2021, p. 379.

  11. Marinoni,2022,p.153.

  12. Idem, p. 154.

  13. Didier, 2013,p.385.

  14. Câmara, 2022, p. 449.

  15. Thamay, 2019, p. 68.

  16. Thamay, 2019, p.151.

  17. Fux, 2021, p. 919.

  18. Idem, p.919.

  19. CNJ, acesso em 20/09/2022.

  20. Thamay, 2019, p.67.


THE JUDICIAL PRECEDENTS AND THE PARADIGM CHANGE IN POLICE PERFORMANCE - BRIEF ANALYSIS ABOUT THE EFFECTS OF THE DECISIONS OF THE HIGHER COURTS ON HOME, PERSONAL AND VEHICLE SEARCH

Abstract: Given the current scenario of instability generated in police activity in the face of recent decisions of the 6th Panel of the Superior Court of Justice - STJ regarding the legality of carrying out personal and vehicular searches by ostensible policing, routine activities of the public security forces, if, with the present academic work, through doctrinal and jurisprudential research, to analyze the model of the system of judicial precedents in Brazilian procedural law, notably in criminal procedural law, discussing, in the end, the effects and effectiveness of judicial decisions on of the subject under study.

Keywords: Judicial Precedents. Juridical Insecurity. Police Activity. Judicial Decisions. Personal Search.Vehicle Search.

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Sobre a autora
Rita de Cássia Carvalho Tenório

Mestranda em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito -FADISP.Corregedora Geral Adjunta do Sistema de Segurança Pública do Estado do Amazonas. Delegada de Polícia Civil no Estado do Amazonas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TENÓRIO, Rita Cássia Carvalho. Busca domiciliar, pessoal e veicular: breve análise acerca dos efeitos das decisões dos tribunais superiores.: Os precedentes judiciais e a mudança de paradigma da atuação policial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7142, 20 jan. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/100690. Acesso em: 23 nov. 2024.

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