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Responsabilidade das empresas fabricantes de cigarros.

Doutrina, jurisprudência e legislação

19/12/2007 às 00:00
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Palavras-chave: tabaco; cigarro; fumante; uso contínuo; vício; danos físicos; morte; dano moral.


Não é segredo o mal causado pelos produtos derivados do tabaco. Segundo a revista VEJA, em matéria sobre a inclusão de fotografias de crianças nascidas prematuramente e ratos mortos no verso da embalagem do produto, "a dependência está associada a 90% dos casos de câncer de pulmão, 85% dos óbitos por enfisema pulmonar, 40% dos derrames cerebrais e 25% dos infartos fatais". Em razão dos males comprovadamente resultantes do uso do tabaco, discute-se a indenizabilidade do dano e a responsabilidade das empresas fabricantes de cigarros e congêneres.

Na Justiça americana, ao contrário do imaginado pela maioria da população, são raros os casos de sucesso em pedidos nesse sentido, como destaca Mário Cézar Carvalho: "Nos EUA, para se ter uma idéia, as primeiras demandas contra as indústrias de cigarros surgiram em 1954. Até 1992, foram abertos 813 processos contra essas empresas, sendo que, dos 23 que chegaram a julgamento, só dois deles foram favoráveis, em primeira instância, aos fumantes e, ainda assim, acabaram reformados nos Tribunais Superiores" (O Cigarro. São Paulo: Publifolha, 2001, p. 59).

No Brasil, "foram ajuizadas, até agora, 508 ações indenizatórias dessa natureza contra a Souza Cruz. Nessas ações, já foram proferidas 298 decisões rejeitando os pedidos de indenização. Há 12 decisões, pendentes de recurso, em que os fumantes ou suas famílias saíram vitoriosos. As 199 decisões definitivas já proferidas pelo Judiciário afastaram as pretensões indenizatórias" (Gabriela Invernizzi. Substância nociva - Souza Cruz é condenada a indenizar família de fumante. Revista Consultor Jurídico, 2007).


DOUTRINA

"Para responsabilizar pelos males do fumo teríamos também que fazer o mesmo com relação às bebidas alcoólicas, os dietéticos, os adoçantes, os produtos alimentícios transgênicos, os defensivos para lavoura ("defensivos agrícolas") que contaminam os alimentos, todos com suspeita fundada de ter atributos cancerígenos se ingeridos durante largo tempo e, inclusive, alguns medicamentos. Os fundamentos seriam os mesmos" (Rui Stoco. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: RT, 2007, p. 793).

"Enfim, não há como afirmar a possibilidade de responsabilizar efetivamente o fabricante desse produto, em casos concretos, por doença adquirida, ou morte ocorrida em razão do seu uso reiterado, durante largo tempo, posto que – como visto – a impossibilidade acima afirmada não se apresenta apenas no plano fático, mas especialmente no plano jurídico" (Rui Stoco. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: RT, 2007, p. 793).

"Se o produto é perigoso, ou nocivo, mas oferece a segurança que dele legitimamente se espera, não é defeituoso, nos termos do art. 12 do CDC. Se assim não fosse, todo o produto perigoso seria defeituoso. O fundamental é, portanto, compreender o critério "segurança que do produto legitimamente se espera", tendo em conta a distinção traçada doutrinariamente entre periculosidade inerente e periculosidade adquirida" (Judith Martins-Costa. Ação indenizatória – Dever de informar do fabricante sobre os riscos do tabagismo, p. 89).

Prescrição

"O prazo para reclamar indenização por danos morais causados pelo hábito de fumar é de cinco anos, como prevê o Código do Consumidor. Com a decisão, a 3ª Turma do STJ afastou a incidência do prazo prescricional de 20 anos previsto no Código Civil de 1916 nas ações contra a indústria do fumo" (Gabriela Invernizzi. Substância nociva - Souza Cruz é condenada a indenizar família de fumante. Revista Consultor Jurídico, 2007).


LEGISLAÇÃO

Art. 8º, do Código de Defesa do Consumidor:

"Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito.

Parágrafo único. Em se tratando de produto industrial, ao fabricante cabe prestar as informações a que se refere este artigo, através de impressos apropriados que devam acompanhar o produto".

Art. 9°, do Código de Defesa do Consumidor:

"O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto".

Art. 12, do Código de Defesa do Consumidor:

"O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos".

Lei 9.294, de 25.07.96;

Lei 10.167, de 27.12.2000;

Lei 10.702, de 14.07.2003.


JURISPRUDÊNCIA

Û Favorável ao dever de indenizar

a) Morte resultante do uso contínuo do tabaco:

"a omissão das fornecedoras de tabaco em informar, à época em que a vítima começou a fumar, de maneira adequada e clara, sobre os riscos que o cigarro poderia gerar; a publicidade insidiosa difundida há tempo pelas fornecedoras de tabaco vinculando o cigarro a sucesso profissional, beleza, prazer, saúde e requinte; o fato de as indústrias do fumo inserirem no cigarro substância que acarreta dependência e obrigando-os a consumir mais o produto, não por uma escolha consciente, mas em razão de uma necessidade química". (TJRS – 9ª Câmara Cível – Ap. 7001.684.534-9 – Rel. Des. Odone Sanguiné – j. 12.12.2007).

"não há falar em liberalidade ou voluntariedade do usuário do tabaco". (TJRS – 3ª Câmara Cível – Ap. 7002.205.758-2 – Rel. Des. Paulo Sergio Scarparo).

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Ü Desfavorável ao dever de indenizar

a) Morte resultante do uso contínuo do tabaco:

"A propaganda das marcas de cigarro, até por não obrigar ninguém, não teria, por si só, o condão de levar o falecido marido, pai e avô dos autores ao fumo e assim mantê-lo a ponto de lhe causar a doença apontada, câncer de pulmão" (TJRS – 3ª Câmara Cível – AP. 7002.205.758-2 – Des. Osvaldo Stefanello).

b) Danos físicos ocasionados pelo uso contínuo do tabaco:

"Improcedente a ação de indenização movida por doente de câncer na laringe contra fabricante de cigarros, se o nexo causal entre a doença e o tabagismo, apesar do truísmo de que o cigarro provoca tumores malignos, não resta demonstrado, e inexiste prova do consumo exclusivo dos produtos da fabricante. Ressalta-se ainda que o tabagismo não foi imposto ao autor, que aderiu espontaneamente ao vício, não cabendo a alegação de que as advertências quanto aos seus malefícios somente passaram a ser feitas recentemente, porquanto os prejuízos que o cigarro pode causar são sensitivos, quando não intuitivos" (TJSP – 4ª C. Dir. Privado – Ap. 110.454-4/3-00 – Rel. Narciso Orlandi – j. 22.02.2001 – RT 789/220).


FONTES

Gabriela Invernizzi. Substância Nociva - Souza Cruz é condenada a indenizar família de fumante. Revista Consultor Jurídico (2007). Disponível no endereço www.conjur.com.br.

Karina Pastore e Anna Paula Buchalla. A Marca da morte nos cigarros. Revista VEJA, Edição n. º 1.735 (2002). Disponível no site www.veja.com.br.

Rui Stoco. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: RT, 2007.

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Sobre o autor
Leonardo Castro

Advogado. Professor de Direito Penal na UNINORTE/AC.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Leonardo. Responsabilidade das empresas fabricantes de cigarros.: Doutrina, jurisprudência e legislação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1631, 19 dez. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10780. Acesso em: 19 abr. 2024.

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