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Interrogatório por videoconferência.

Evolução tecnológica no meio forense

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11.CONCLUSÃO

A morosidade do judiciário, por vezes, compromete a função do processo e ameaça a eficácia da prestação jurisdicional. É, justamente, neste contexto que se insere a justificativa para o uso da tecnologia de informação e comunicação em interrogatórios por videoconferência. Configura-se um mecanismo processual diferenciado, a ser empregado com cautela e apenas nos feitos que exigem procedimento especial.

Com o uso da videoconferência em interrogatórios, o princípio da ampla defesa sofre certa limitação, especialmente dos direitos de audiência e presença, em razão da necessidade de preservação de outros valores constitucionais, como a eficiência do processo, prevista no art. 5º, LXXVII, da Constituição Federal, mas não o aniquila, vez que o seu espírito permanece resguardado, por ter sido assegurada a participação do acusado no feito, não fisicamente, mas através da tecnologia.

Em determinadas situações, ante a demora em sua conclusão, a função do processo pode se mostrar ameaçada, o que demanda a necessidade do uso de mecanismos tecnológicos para se evitar tal comprometimento.

A compatibilização entre os princípios constitucionais da ampla defesa e da eficiência do processo deve ser buscada nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, ponderando-se os bens e valores concretamente colidentes, considerando a inexistência de hierarquia entre os princípios e garantias fundamentais previstos na Constituição.

O Ministro do STF, Celso de Melo, relatando a ADI 3.540-MC/DF, 01/09/05, assim se manifestou sobre a compatibilização de valores constitucionais: [30]

(...) torna-se essencial reconhecer que a superação desse antagonismo, que opõe valores constitucionais relevantes, dependerá da ponderação concreta, em cada caso ocorrente, dos interesses e direitos postos em situação de conflito, em ordem a harmonizá-los e a impedir que se aniquilem reciprocamente, tendo-se como vetor interpretativo, para efeito da obtenção de um mais justo e perfeito equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, o princípio do desenvolvimento sustentável.

O uso da tecnologia da videoconferência, entretanto, deve ser aplicada com ressalvas, e somente em situações que efetivamente reclamem sua aplicação, que deverá ser calcada no fundado receio de comprometimento da eficiência do processo, por razões de segurança ou diante da sua complexidade.

O Ministro Jesus Costa Lima, da 5ª Turma do STJ, em julgamento do RHC nº 4788/SP, do qual foi relator, já reconhecia a necessidade de informatização do processo em 1995:

Processo Penal. Excesso de prazo na instrução. Peculiaridades. I. Impetração alegando excesso de prazo para concluir a instrução. O tema implica em se considerar a época em que foi elaborado o Código de Processo Penal, as mudanças ocorridas no País e, especialmente, em se cuidando de processo incluindo vários réus, as dificuldades por eles opostas para serem citados ou a demora na apresentação ao juízo, a fim de serem interrogados, o que não depende do Poder Judiciário. Reconheço que, se poderia caminhar com o emprego da informática para agilizar o andamento processual, utilizando-se a teleconferência para se interrogar réus e testemunhas residentes em outras comarcas, com o que se evitaria, no caso dos réus, as comuns fugas. No caso, por evidente, se não está demonstrado que a coação decorre de ato provocado pelo Ministério Público e nem pelo juízo da causa, a demora encontra-se justificada. Em oportunidade anterior salientei que se trata de réu de acentuada periculosidade, tendo agido com mais doze ''colegas'', interceptando um carro forte com rajadas de metralhadoras e disparos de revólveres e fuzis subtraindo apreciável quantidade em dinheiro. II. Recurso conhecido, mas improvido pelos próprios fundamentos do julgado.

Não se prega o fim dos formalismos jurídicos, nem a mitigação de direitos constitucionais, mas sim a sua compatibilização com os avanços tecnológicos trazidos pelo progresso. A sociedade moderna busca, cada vez mais, a efetividade, ao contrário da mera formalidade. As formas devem ser instrumentos dessa efetividade do processo penal, e não um fim em si mesmo.

O Poder Judiciário não pode ficar inerte frente aos avanços tecnológicos, prendendo-se a formalismos, que ao final servirão apenas para desacreditá-lo perante a sociedade. Segundo Marco Antônio de Barros [31]:

Recomenda-se o bom senso não radicalizar a questão, pois a rejeição liminar e absoluta à adoção do sistema não satisfaz às exigências do nosso tempo. Com efeito, o interrogatório judicial presencial não se tornou um ato processual arcaico. De fato, este é e continuará sendo o meio mais apropriado de se preservar a liberdade de manifestação do interrogando, além de apresentar menor risco ao pleno exercício da autodefesa, e, por via de conseqüência, proporcionar ao julgador plenas condições de melhor captar as reações humanas, eventualmente não perceptíveis por interferência da transmissão eletrônica.

É indispensável, entretanto, o advento de uma lei que discipline e regulamente a questão, como se dará a videoconferência e em que situações, em homenagem ao princípio da legalidade, consagrado no art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, que é tido como a base fundamental do Estado de Direito [32]. Para viabilizar o uso da videoconferência hoje, na atual conjuntura de pré-legalidade, ele deve ser expressamente aquiescido pelo interrogado e seu defensor, que não poderão argüir nulidade posteriormente.

As vantagens do uso do mecanismo da videoconferência são inúmeras além da agilização processual, com a eliminação de cartas precatórias, rogatórias e de ordem, e dentre elas, Vladimir Aras [33] elenca: evita a condução de presos, aumentando a segurança da população em geral, pois diminui o risco de fugas e de resgate de presos; economia de recursos públicos empregados na escolta e no transporte de presos; os policiais civis e militares, e os agentes penitenciários, poderão permanecer em suas atividades fins, sem perder tempo com a segurança do transporte do preso; e incremento dos princípios do juiz natural e da identidade física do juiz.

Desde que sejam preservados os princípios e garantias constitucionais da ampla defesa, contraditório e devido processo legal, assegurando ao defensor acesso direto, exclusivo e em tempo real ao interrogado, e garantindo a este a livre manifestação e a autodefesa, entendo que o interrogatório por videoconferência é um mecanismo constitucional hábil a servir de instrumento ao combate da morosidade do judiciário, conferindo-se efetividade e eficácia à justiça, encontrando-se em perfeita harmonia com os reclames da sociedade e com a Constituição Federal, representando uma evolução do direito processual.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. CF, art. 5º, LXXVIII: "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
  2. Artigo 8º, 1 e artigo 25, 1.
  3. Art. 14, § 3º: "A reunião de juízes domiciliados em cidades diversas será feita pela via eletrônica".
  4. TORNAGHI, Hélio. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 1995. v. 1.
  5. MARQUES, José Frederico. Elementos do Direito Processual Penal. 2 Edição. Campinas: Milennium, 2003.
  6. GRINOVER, Ada Pelegrini; FERNANDES, Antônio Scarance e GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
  7. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 1999.
  8. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1997.
  9. Art. 187, VIII, CPP.
  10. CF, art. 5º, LIV: "Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal".
  11. PITOMBO, Sérgio Marcos de Moraes. Interrogatório à distância. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. São Paulo, ano 8, nº 93, agosto 2000.
  12. DOTTI, René Ariel. O interrogatório à distância: um novo tipo de cerimônia degradante. Revista de Informação Legislativa. Brasília, ano 34, nº 134.
  13. CF, art. 5º, LIII: "Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente".
  14. CF, art. 5º, LX e art. 93, IX.
  15. Art. 570, CPP: "A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte".
  16. O uso da videoconferência na justiça brasileira. Disponível em: http://www.juristas.com.br/mod_revistas.asp?ic=2549. Acesso em: 13/12/2007
  17. Art. 69, 2: "A prova testemunhal deverá ser prestada pela própria pessoa no decurso do julgamento, salvo quando se apliquem as medidas estabelecidas no artigo 68 ou no Regulamento Processual. De igual modo, o Tribunal poderá permitir que uma testemunha preste declarações oralmente ou por meio de gravação em vídeo ou áudio, ou que sejam apresentados documentos ou transcrições escritas, nos termos do presente Estatuto e de acordo com o Regulamento Processual. Estas medidas não poderão prejudicar os direitos do acusado, nem ser incompatíveis com eles".
  18. Art. 18, nº. 18: "Se for possível e em conformidade com os princípios fundamentais do direito interno, quando uma pessoa que se encontre no território de um Estado Parte deva ser ouvida como testemunha ou como perito pelas autoridades judiciais de outro Estado Parte, o primeiro Estado Parte poderá, a pedido do outro, autorizar a sua audição por videoconferência, se não for possível ou desejável que a pessoa compareça no território do Estado Parte requerente. Os Estados Partes poderão acordar em que a audição seja conduzida por uma autoridade judicial do Estado Parte requerente e que a ela assista uma autoridade judicial do Estado Parte requerido".
  19. Art. 1º: "Fica o Poder Executivo autorizado a criar salas de videoconferência nas penitenciárias localizadas no Estado do Rio de Janeiro, destinadas à realização dos procedimentos judiciais que exijam a oitiva de detentos e apenados".
  20. "A inconstitucionalidade da lei estadual sobre videoconferência", Boletim IBCCrim, São Paulo, nº. 147, fev. 2005.
  21. "Garantismo à paulista: a propósito da videoconferência", Boletim IBCCrim, São Paulo, nº. 147, fev. 2005.
  22. Art. 7º, nº. 5: "Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo."
  23. Art. 9º, nº. 3: "Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência e a todos os atos do processo, se necessário for, para a execução da sentença."
  24. ARAS, Vladimir Barros. O Teleinterrogatório no Brasil. Revista Jurídica Consulex, Brasília, n. 153, maio 2003
  25. OLIVEIRA, Ana Sofia Schmidt. Parecer da conselheira relatora da comissão constituída para elaborar anteprojeto referente à realização de interrogatório on line para presos perigosos. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. São Paulo, ano 10, nº 120, novembro 2002.
  26. WEISS, Carlos. Manifestação do conselheiro referente à realização de interrogatório on line para presos perigosos. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. São Paulo, ano 10, nº 120, novembro 2002.
  27. GRINOVER, Ada Pelegrini; FERNANDES, Antônio Scarance e GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
  28. Art. 572, II, CPP.
  29. www.stf.gov.br.
  30. Citação extraída de PUOLI, José Carlos Baptista. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. O STF e o princípio da proporcionalidade. Material da 9ª aula da Disciplina Processo Civil: Grandes Transformações, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de Direito Processual: Grandes Transformações – UNAMA – UVB - REDE LFG.
  31. BARROS, Marco Antônio de. Teleaudiência, interrogatório on-line, videoconferência e o princípio da liberdade da prova. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 92, nº 818.
  32. CF, art. 5º, II: "Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
  33. Videoconferência no processo penal. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/6311. Acesso em 19 de agosto de 2007
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Sobre a autora
Luciana Magalhães Oliveira Amorim

Juíza de Direito do Estado da Bahia

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Luciana Magalhães Oliveira. Interrogatório por videoconferência.: Evolução tecnológica no meio forense. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1804, 9 jun. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11350. Acesso em: 23 dez. 2024.

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