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A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e suas inovações no âmbito do direito das mulheres vítimas de violência doméstica

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22/03/2009 às 00:00
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não há dúvidas que a Lei Maria da Penha trouxe instrumentos importantes para uma postura pró-ativa do Estado perante o problema da violência doméstica contra a mulher, dando-lhe instrumentos de atuação mais eficientes para a realização da justiça em seu significado mais profundo, não apenas como a aplicação fria e cega de regras, mas como um instrumento de mudança social em prol da emancipação do ser humano em sua completude.

A Lei 11.340/06 só pode ser interpretada como diploma que pretende resgatar de forma principiológica a política pública de proteção à família e de combate à desigualdade, sem espaço para alegação de inconstitucionalidade.

Constituindo-se a Lei Maria da Penha em uma quebra de paradigma, só funcionará, efetivamente, se pelo Estado houver a implementação dos serviços multidisciplinares previstos no microssistema criado. Por parte dos atores do processo, dentre os quais juízes e membros do Ministério Público.

É dever do Estado assegurar não somente a igualdade formal, em que os indivíduos, abstratamente, devem ser tratados do mesmo modo, sem qualquer tipo de distinção, mas também, a igualdade material ou substancial, em que os indivíduos devem ser tratados de modo desigual se for constatado, no plano sócio-econômico, igualdade entre eles. É justamente o que se dá com a implementação, pela Lei Maria da Penha, de políticas discriminatórias positivamente estabelecidas, diante da ocorrência de violência praticada contra a mulher.

As medidas públicas e privadas voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e a neutralização dos efeitos nocivos da discriminação de gênero são fundamentais neste aspecto.

O tratamento legal diferenciado em favor da mulher em situação de violência doméstica está em consonância com os objetivos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal, como a cidadania e dignidade da pessoa humana, impondo a intervenção do Estado, voltada para erradicar a violência de gênero e promover a igualdade material entre os homens e mulheres.

Não é somente a integridade física da mulher que é protegida, mas a sua própria dignidade. Nesta situação específica de violência contra a mulher, a lei especial é necessária, bem como é legítima a atuação do Estado. A racionalidade e a justiça estão presentes na intervenção estatal.

A violência histórica perpetrada contra a mulher, a discriminação sofrida e a desigualdade material manifesta justificam a intervenção penal do Estado, porque a sociedade não é mais conivente com a violência de gênero, é uma necessidade social que a violência cesse.

Por último, as medidas protetivas de urgência, quer obrigacionais do agressor ou protetivas das vítimas, somadas à possibilidade de decretação de prisão preventiva (mecanismo criado pela lei para garantir a efetividade dessas medidas), se revelam instrumentos processuais e penais úteis para coibir e prevenir a famigerada violência doméstica e familiar praticada contra a mulher.

Eles são necessários, porque não há no ordenamento jurídico, outros meios hábeis que venham garantir a dignidade da mulher em situação de violência doméstica. Os mecanismos anteriores à edição da lei, em especial as disposições da Lei 9.099/1995 e outros instrumentos processuais, como as existentes medidas cautelares de separação de corpos ou de afastamento do cônjuge do lar, se mostraram ineficazes para coibir ou cessar a violência praticada contra a mulher.

O juízo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher possui, agora, à sua disposição, instrumentos processuais suficientes para proporcionar integral proteção às vítimas dessa violência de gênero. Era imprescindível a implementação de medidas com o fim de resgatar, em essência, a cidadania e a dignidade da mulher; marginalizada pela sociedade machista e patriarcal.


REFERÊNCIAS

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CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - LEI MARIA DA PENHA - CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 33 E 41 DA LEI 11.340/2006 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA O JULGAMENTO. Processo: 1.0000.07.458339-4/000(1) MG. 2007. Disponível em: http://www.tjmg.gov.br/juridico/jt_/inteiro_teor.jsp?tipoTribunal=1&comrCodigo=0000&ano=7&txt_processo=458339&complemento=000&sequencial=&pg=0&resultPagina=10&palavrasConsulta=. Acesso em: 02.09.2008.

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TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.


Notas

  1. TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 351-352.
  2. IBDEM, p. 328.
  3. O julgado STF-RT 574/271 permitiu a concessão de alimentos para o cônjuge que vivia sob o mesmo teto do seu par, pois reconheceu a separação de fato entre eles.
  4. LOBO, Paulo Luiz netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus, in JusNavigandi, Teresina, ano 6, n. 53, janeiro 2002, Disponível em http://jus.com.br/artigos/2552,. Acesso em: 21 Set. 2008.
  5. BRASIL. Lei 11.340 de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  6. IBDEM.
  7. CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. Violência doméstica: análise artigo por artigo da Lei Maria da Penha, nº 11.340/06. 2. ed. ampliada e atualizada. Bahia: Jus Podivm. 2008. p. 172.
  8. DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça: a efetividade da Lei 11.340/06 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 22.
  9. CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 174.
  10. IBDEM, p. 176.
  11. BRASIL. Lei nº. 10.455, de 13 de maio de 2002. Modifica o parágrafo único do Art. 69 da Lei 9.099, de 26 de setembro de 195. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  12. BRASIL. Lei 10.886, de 17 de junho de 2004. Acrescenta parágrafos ao Art.129 do Decreto-lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código Penal. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  13. BASTOS, Marcelo Lessa. Violência doméstica e familiar contra a mulher. Lei Maria da Penha. Alguns comentários. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/9006. Acesso em: 05 de maio de 2008.
  14. CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 178.
  15. BRASIL. Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais, e dá outras providências. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  16. CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 180.
  17. IBDEM, p. 180.
  18. DIAS, Maria Berenice. op. cit, p. 13-14.
  19. BRASIL. Constituição Federal. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  20. ONU. Declaração dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php. Acesso em: 14 set. 2008.
  21. BRASIL. Constituição Federal. op. cit., 2007.
  22. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 154.
  23. MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 68.
  24. BRASIL. Constituição Federal. op. cit., 2007.
  25. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - LEI MARIA DA PENHA - CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 33 E 41 DA LEI 11.340/2006 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA O JULGAMENTO. Processo: 1.0000.07.458339-4/000(1) MG. 2007. Disponível em: http://www.tjmg.gov.br/juridico/jt_/inteiro_teor.jsp?tipoTribunal=1&comrCodigo=0000&ano=7&txt_processo=458339&complemento=000&sequencial=&pg=0&resultPagina=10&palavrasConsulta=. Acesso em: 02.09.2008.
  26. DIAS, Maria Berenice. op. cit, p. 57.
  27. GONÇALVES, Victor Eduardo Rios; JESUS, Damásio. A inconstitucionalidade do art. 41 da Lei 11.340/06 (Lei da violência doméstica ou familiar contra a mulher). Complexo Jurídico Damásio de Jesus, São Paulo, out.2006. Disponível em: www.damasio.com.br. Acesso em: 24.04.2008.
  28. DIAS, Maria Berenice. op.cit, p. 57.
  29. IBDEM, p. 25.
  30. CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 195.
  31. BASTOS, Marcelo Lessa. op. cit. 2008.
  32. BRASIL. Lei 11.340 de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
  33. BASTOS, Marcelo Lessa. op. cit. 2008.
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Sobre a autora
Christiane Silva Guerra

Bacharelanda em Direito na Faculdade Novafapi, em Teresina (PI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUERRA, Christiane Silva. A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e suas inovações no âmbito do direito das mulheres vítimas de violência doméstica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2090, 22 mar. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12451. Acesso em: 8 nov. 2024.

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