CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não há dúvidas que a Lei Maria da Penha trouxe instrumentos importantes para uma postura pró-ativa do Estado perante o problema da violência doméstica contra a mulher, dando-lhe instrumentos de atuação mais eficientes para a realização da justiça em seu significado mais profundo, não apenas como a aplicação fria e cega de regras, mas como um instrumento de mudança social em prol da emancipação do ser humano em sua completude.
A Lei 11.340/06 só pode ser interpretada como diploma que pretende resgatar de forma principiológica a política pública de proteção à família e de combate à desigualdade, sem espaço para alegação de inconstitucionalidade.
Constituindo-se a Lei Maria da Penha em uma quebra de paradigma, só funcionará, efetivamente, se pelo Estado houver a implementação dos serviços multidisciplinares previstos no microssistema criado. Por parte dos atores do processo, dentre os quais juízes e membros do Ministério Público.
É dever do Estado assegurar não somente a igualdade formal, em que os indivíduos, abstratamente, devem ser tratados do mesmo modo, sem qualquer tipo de distinção, mas também, a igualdade material ou substancial, em que os indivíduos devem ser tratados de modo desigual se for constatado, no plano sócio-econômico, igualdade entre eles. É justamente o que se dá com a implementação, pela Lei Maria da Penha, de políticas discriminatórias positivamente estabelecidas, diante da ocorrência de violência praticada contra a mulher.
As medidas públicas e privadas voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e a neutralização dos efeitos nocivos da discriminação de gênero são fundamentais neste aspecto.
O tratamento legal diferenciado em favor da mulher em situação de violência doméstica está em consonância com os objetivos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal, como a cidadania e dignidade da pessoa humana, impondo a intervenção do Estado, voltada para erradicar a violência de gênero e promover a igualdade material entre os homens e mulheres.
Não é somente a integridade física da mulher que é protegida, mas a sua própria dignidade. Nesta situação específica de violência contra a mulher, a lei especial é necessária, bem como é legítima a atuação do Estado. A racionalidade e a justiça estão presentes na intervenção estatal.
A violência histórica perpetrada contra a mulher, a discriminação sofrida e a desigualdade material manifesta justificam a intervenção penal do Estado, porque a sociedade não é mais conivente com a violência de gênero, é uma necessidade social que a violência cesse.
Por último, as medidas protetivas de urgência, quer obrigacionais do agressor ou protetivas das vítimas, somadas à possibilidade de decretação de prisão preventiva (mecanismo criado pela lei para garantir a efetividade dessas medidas), se revelam instrumentos processuais e penais úteis para coibir e prevenir a famigerada violência doméstica e familiar praticada contra a mulher.
Eles são necessários, porque não há no ordenamento jurídico, outros meios hábeis que venham garantir a dignidade da mulher em situação de violência doméstica. Os mecanismos anteriores à edição da lei, em especial as disposições da Lei 9.099/1995 e outros instrumentos processuais, como as existentes medidas cautelares de separação de corpos ou de afastamento do cônjuge do lar, se mostraram ineficazes para coibir ou cessar a violência praticada contra a mulher.
O juízo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher possui, agora, à sua disposição, instrumentos processuais suficientes para proporcionar integral proteção às vítimas dessa violência de gênero. Era imprescindível a implementação de medidas com o fim de resgatar, em essência, a cidadania e a dignidade da mulher; marginalizada pela sociedade machista e patriarcal.
REFERÊNCIAS
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Notas
- TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 351-352.
- IBDEM, p. 328.
- O julgado STF-RT 574/271 permitiu a concessão de alimentos para o cônjuge que vivia sob o mesmo teto do seu par, pois reconheceu a separação de fato entre eles.
- LOBO, Paulo Luiz netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus, in JusNavigandi, Teresina, ano 6, n. 53, janeiro 2002, Disponível em http://jus.com.br/artigos/2552,. Acesso em: 21 Set. 2008.
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- CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 174.
- IBDEM, p. 176.
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- CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 178.
- BRASIL. Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais, e dá outras providências. In: Vade Mecum acadêmico de direito. Anne Joyce Angher (org). 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007.
- CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 180.
- IBDEM, p. 180.
- DIAS, Maria Berenice. op. cit, p. 13-14.
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- DIAS, Maria Berenice. op. cit, p. 57.
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- DIAS, Maria Berenice. op.cit, p. 57.
- IBDEM, p. 25.
- CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. op. cit, p. 195.
- BASTOS, Marcelo Lessa. op. cit. 2008.
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- BASTOS, Marcelo Lessa. op. cit. 2008.