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Impugnação ao cumprimento de sentença de pagar quantia certa.

Necessidade ou não de prévia garantia do juízo

16/08/2009 às 00:00
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O instituto da impugnação previsto no artigo 475- J, § 1º do Código de Processo Civil foi uma inovação trazida pela Lei Federal nº. 11.232/2005 e prevê uma forma processualmente sincrética para o executado se opor à fase do cumprimento da sentença de pagar quantia certa. Sincrética, pois impugna-se nos próprios autos da execução de sentença, substituindo a forma antiga dos embargos do devedor ou embargos à execução, que eram distribuídos em apenso à ação principal. Por analogia, aplica-se o referido instituto às demais espécies de execução de título judicial (fazer, não fazer e dar coisa).

Nesta fase processual de execução, que difere da execução por título extrajudicial, o executado não pode, obviamente, ficar desprotegido, cabendo neste caso o regime da impugnação.

Ocorre que a natureza jurídica da impugnação diverge no entendimento dos doutrinadores mais festejados, ao afirmarem que: "trata-se de uma Exceção (Alexandre Freitas Câmara¹), de uma Ação Incidental (Araken de Assis²) ou de um Instrumento de Defesa na Matéria Vinculada (Leonardo Greco³ e Fredie Diddier4)", sendo este último entendimento o mais aceito pelos juristas. Tanto tem natureza de defesa que há prazo especial, ou seja, o prazo da impugnação será dobrado para aqueles que litigarem em litisconsórcio e com procuradores diferentes. Ainda, o oferecimento da impugnação haverá de oportunizar o direito de réplica ao exequente, pelo mesmo prazo processual.

Sabemos que a fase de execução é de cognição limitada, em que o executado tem a sua defesa mitigada, pois é chamado a cumprir a obrigação e não a se defender. Contudo, não se pode falar que não há contraditório e ampla defesa, pois há garantia Constitucional do devido processo legal, não cabendo limitação, conforme artigo 5º, inciso LV da Carta Magna:

LV – "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes";

Com isso, passemos a analisar o artigo discutido, 475-J, § 1º, do Código de Processo Civil, especialmente no seu parágrafo primeiro:

"Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação. (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)

§ 1º Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias. (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)"

Ao caput do referido artigo não cabe tecer maiores comentários, tendo em vista que, transitada em julgado a sentença e instaurado o procedimento para o seu cumprimento, a requerimento do interessado, o executado será intimado e não citado, na pessoa de seu advogado ou pessoalmente, caso não tenha procurador.

Mas, interpretando o parágrafo primeiro do referido artigo de forma literal, poderíamos concluir em um primeiro instante que a impugnação deve ser oferecida no prazo de 15 dias, contados da intimação do auto de penhora e avaliação, ou seja, se não houver penhora, não caberia impugnação.

No entanto, o presente trabalho objetivará demonstrar que a interpretação dada ao artigo deve ser extensiva e teleológica, reconhecendo-se haver posições contrárias.

Segundo Teori Albino Zavascki 5, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, o prazo de 15 dias conta-se desde logo, ou seja, conta-se desde a data da intimação para pagamento do débito. No mesmo sentido é a posição de Fredie Diddier6 e de outros renomados juristas que serão citados no decorrer da explanação.

A título de reflexão, primeiramente pergunta-se se haveria preclusão temporal do ônus de impugnar, lembrando que há matérias que podem ser alegadas a qualquer momento, como as de ordem pública.

Para Paulo Lucon7, se a impugnação tiver natureza de defesa, como é o entendimento majoritário, deve o executado aduzir todas as matérias no prazo de 15 dias, contados da intimação, caso contrário opera-se a preclusão.

Para aqueles que rezam pela possibilidade do oferecimento da impugnação sem a prévia penhora, seguem o regramento semelhante dos embargos do devedor do artigo 736 e 739-A do Código de Processo Civil, sob o alicerce da teoria da Comunicação dos Sistemas ou Diálogo das Fontes.

De acordo com a mudança trazida pela Lei Federal 11.232/05, em uma primeira leitura, o oferecimento da impugnação pressupõe penhora, mas a Lei Federal nº 11.382/2006 que alterou o regime jurídico dos embargos do devedor, lei posterior àquela que regulou a impugnação, não mais se fala em garantia, surgindo a seguinte dúvida: a penhora permanece como exigência para o oferecimento da impugnação ou é apenas pressuposto para concessão de efeito suspensivo? Teria o Legislador esquecido de modificar o dispositivo do artigo 475-J, como fez no artigo 736 do Código de Processo?

Sistematicamente, a 2ª alternativa é a melhor, ou seja, a de não se exigir prévia garantia. Ela é boa para o exequente e para o executado, que, intimado, terá o ônus de se defender logo nos primeiros 15 dias, antecipando uma discussão que surgiria tempos depois, após a constrição ou penhora de algum bem (o que poderia demorar muito ou nunca existir, como nos casos dos executados totalmente insolventes). Enquanto isso, exatamente porque a impugnação, em regra, não tem efeito suspensivo, a execução prosseguiria. Em conformidade com o princípio da economia e celeridade processual, o executado apresentaria defesa e o exequente continuaria pela busca por bens penhoráveis.

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No caso de se entender que o Código de Processo Civil permanece exigindo prévia penhora para oferecer impugnação, o juiz deveria então rejeitar a que for oferecida nesta forma, e surge a indagação, se em situações como essa, haveria algum prejuízo à defesa ou ao exequente. A resposta é negativa, pois atos já foram praticados, reduzindo a complexidade do procedimento, que prosseguirá apenas com a possibilidade de o executado discutir a penhora superveniente ou questão arguível a qualquer momento, não podendo mais discutir a dívida executada ou outras matérias, que se não deduzidas no primeiro momento, ficariam sujeitas ao instituto da preclusão.

Luis Guilherme Marinoni8 indaga:

"Em que aspecto seria favorável à parte o não recebimento de uma impugnação, oferecida sem prévia penhora, se, realizada posteriormente a constrição, essa mesma defesa poderia ser novamente apresentada? Só atrasaria o processo ..."

Apesar das respeitadas opiniões contrárias, é possível (e recomendável em alguns casos) o oferecimento da impugnação sem a necessidade de prévia penhora, que permanece importante para a concessão do efeito suspensivo da execução.

O que a regra do art. 475, J, § 1º, estabeleceu foi um limite temporal para o oferecimento da impugnação, dizendo que a impugnação deve ser apresentada até o final do prazo de 15 dias após a intimação da penhora, e não houve uma proibição de se apresentá-la, desde logo, da intimação para cumprir a obrigação.

Para Daniel Amorim Assumpção Neves9:

"A penhora não constitui requisito necessário e suficiente ao ajuizamento da impugnação; esta pode, então, ser oferecida antes mesmo da penhora."

No mesmo sentido, Rodrigo Barioni10:

"O prazo para impugnação começa a fluir da intimação da penhora; nada impede, porém, que o executado se antecipe ao momento da penhora e oferece desde logo a impugnação, uma vez que não há norma legal que condicione a impugnação á prévia segurança do juízo."

Ainda para Luis Rodrigues Wambier, Eduardo Talamini e Flávio Corrêa11:

"Em único caso pode-se ocasionalmente a admitir a oposição de impugnação sem a prévia garantia do juízo: quando o devedor não dispõem de bens para penhora, sob pena de desrespeito a constituição federal, no que tange à indevida limitação do direito de defesa". "Havendo nova penhora no curso da impugnação, abre-se novamente a oportunidade de impugnação, ainda que limitada, quanto ás matérias veiculáveis, a questão superveniente á anterior oportunidade de impugnação."

Assim, considerando que a impugnação é um meio de defesa do executado, e a relevância dos princípios Constitucionais citados acima (contraditório, ampla defesa, economia processual, celeridade), a boa-fé objetiva do executado em impugnar sobre matérias impugnáveis e ou questões de ordem pública, e por não haver bens para garantir a totalidade da dívida, vislumbro a possibilidade de propor impugnação sem prévia garantia do juízo, mesmo que seja postergada até a garantia, caso seja o entendimento do magistrado. Não haveria qualquer tipo de preclusão ou prejuízo ao direito de defesa do devedor e nem prejuízo ao exequente, pois o curso do processo não suspenderia, podendo o mesmo buscar por bens para satisfação do seu crédito.


BIBLIOGRAFIA:

¹ A Nova Execução de Sentença, 3ª ed., Editora Lumem Iures, p. 125, Rio de Janeiro, 2007.

² Cumprimento de Sentença, Editora Forense, p. 314, Rio de Janeiro, 2006.

³ Primeiros Comentários Sobre a Reforma da Execução Oriunda da Lei 11.235/2005 , Editora Dialética, p. 81, São Paulo, 2006.

4 -6

Curso de Direito Processual Civil, Editora Podium, p. 264, 2009.

5 Processo de Execução , 3ª ed., Editora RT, p. 438, São Paulo, 2006.

7 Nova Execução de Títulos Judiciais e a sua Impugnação, Editora RT, p. 448, São Paulo, 2006.

8 Execução, 2ª ed., Editora RT, p. 293, São Paulo, 2008.

9 -10

A Desnecessidade de Penhora Para o Oferecimento de Impugnação, Editora Método, São Paulo, 2007.

11 Curso Avançado de Processo Civil, Editora RT, pág. 406, 2007.

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Sobre o autor
Daniel Teixeira Dantas

Advogado e sócio do escritório José Rezende Silveira Advogados & Associados. Bacharel em Direito pela PUC-Minas. Pós-graduado em Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Daniel Teixeira. Impugnação ao cumprimento de sentença de pagar quantia certa.: Necessidade ou não de prévia garantia do juízo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2237, 16 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13340. Acesso em: 25 abr. 2024.

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