CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assédio moral no trabalho é todo comportamento dos superiores hierárquicos, dos subordinados ou dos colegas do trabalhador que submetem a vítima, de forma repetitiva e prolongada, a situações humilhantes e constrangedoras, afetando sua dignidade e sua saúde psicofísica e degenerando o meio ambiente de trabalho. Caracteriza-se pela repetição prolongada de atos que expõem o trabalhador a humilhação ou constrangimento, atingindo a sua auto-estima.
Conquanto não seja um fato novo, o assédio moral no trabalho atualmente tem se apresentado de maneira crescente nos ambientes laborais, ante o modelo de exploração do trabalho vigente (reflexo da globalização econômica), caracterizado por violentas pressões por produtividade e impessoalidade nas relações entre dirigentes e trabalhadores, implicando falta ou deficiência da comunicação direta entre subordinante e subordinado e aumento da competitividade no âmbito da empresa.
São propiciadores do fenômeno complexidade das relações sociais modernas, o progresso do capitalismo selvagem, aliado à globalização, impõem uma forma de organização empresarial hierárquica, competitiva e robotizada e um sistema trabalhista com tendências à flexibilização ou desregulamentação, com a consequente precarização das condições de trabalho, escassez dos postos de emprego, ameaçando a efetivação dos direitos sociais.
Todavia, como aduz Maria Aparecida Alkimin 96, "pari passu ao fator de produção deve caminhar o fator humano, devendo o homem ser elevado à categoria de fim e não meio para a produção e progresso econômico-financeiro, e, para isso, além da contraprestação salarial pela entrega da força de trabalho, devem ser respeitados os valores íntimos e morais da pessoa humana do trabalhador".
Não há, no ordenamento jurídico brasileiro, lei de âmbito nacional coibindo a prática de assédio moral. Tramitam, entretanto, na Câmara dos Deputados projetos de lei que visam alterar o Código Penal para tipificar o assédio moral e alterar o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União (Lei n. 8.112/90) para proibir expressamente essas odiosas práticas no âmbito da administração pública federal.
A ausência de regulamentação específica, entretanto, não impede a configuração do assédio moral como ato ilícito. Adotando-se a concepção de que a prática de assédio moral agride a paz social e aos postulados constitucionais de preservação da dignidade da pessoa humana e de valorização social do trabalho, será plenamente possível preencher a lacuna existente em nosso sistema jurídico nacional. Ademais, a prática de assédio moral, muitas vezes, está diretamente ligada a uma conduta discriminatória insidiosa que ofende ao princípio constitucional da isonomia, consagrado no caput do artigo 5º da Constituição da República.
Outrossim, o assédio moral vicia o meio ambiente do trabalho, deteriorando a saúde da vítima, desrespeitando o direito fundamental a um meio ambiente laboral sadio, assegurado pelo texto constitucional em diversos dispositivos, tais como o artigo 7º, inciso XXII (direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança), o artigo 200, inciso VIII (inclui o ambiente de trabalho no meio ambiente geral) e o artigo 5º, § 2º (outros direitos decorrentes dos princípios e regime adotados pela Constituição da República).
O assédio moral praticado contra o empregado pelo seu superior hierárquico ainda autoriza o trabalhador a considerar rescindido o seu contrato de trabalho, justificando a ruptura do liame empregatício pelo empregado, com direito às mesmas parcelas rescisórias a que faria jus se tivesse sido dispensado sem justa causa, por força do artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Tendo em vista ser a prática de assédio moral um ato ilícito, com potencialidade para efetivar danos morais de natureza grave à vítima, faz surgir direito à indenização contra o assediante pelos danos causados.
Assegura a Constituição da República a inafastabilidade da jurisdição, ao dispor, em seu art. 5º, inciso XXXV, que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Todavia, no plano fático das relações de trabalho, o direito de ação assegurado individualmente ao trabalhador encontra alguns obstáculos. O primeiro reside no fato de que inexiste proteção contra a despedida arbitrária, e, como consequência, raramente o trabalhador promove ação na Justiça do Trabalho durante a vigência do pacto laboral. Ademais, outras barreiras existem à busca da tutela jurisdicional pelo obreiro, tais como o temor de formação de "listas negras" e a vulnerabilidade do trabalhador, desprovido, não raro, de condições de arcar não só com as dificuldades, incertezas e longa tramitação do processo, como com o próprio sustento.
Destacam-se, como alternativa eficaz, as ações coletivas na Justiça do Trabalho, que, tendo como legitimados entes coletivos legalmente previstos, protege os interesses dos trabalhadores sem, no entanto, expô-los a retaliações dos empregadores, assegurando o efetivo acesso à justiça.
As ações coletivas na seara trabalhista têm como legitimados ativos os sindicatos e o Ministério Público do Trabalho, o que realça a importância da atuação desses entes no combate ao assédio moral, visando coibir sua disseminação na estrutura organizacional do trabalho e, consequentemente, preservando a dignidade do trabalhador.
A prática de assédio moral não apenas no ambiente de trabalho, mas também nos diversos setores das relações sociais, deve ser repelida por todos, pois representa uma chaga social que faz adoecer os sujeitos de suas relações e, em última análise, afeta a própria sociedade. A luta deve ser constante e de todos!
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