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Tributação no Estado Democrático de Direito.

Apontamentos sobre os impostos federais

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09/12/2010 às 15:44
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8. Imposto sobre a propriedade territorial rural

8.1. Escorço histórico

O ITR – Imposto sobre propriedade territorial rural – já foi de competência dos Estados-membros (CF/46) e dos Municípios (EC nº 5/61), contudo, atualmente é entregue à competência tributária da União, conforme prevê o art. 153, VI, CF/88.

Os dispositivos jurídicos que tratam desse imposto são: art. 153, VI e § 4º, da CF/88; arts. 29 à 31,do CTN; Lei nº 9.393/96 e Decreto nº 4.382/02 (regulamento).

8.2. Função

É concebido como um imposto de função extrafiscal, servindo de instrumento da política agrária do governo, por desestimular a manutenção de latifúndios improdutivos e, de outro lado, estimular a redistribuição de terras no país.

Em função, exatamente, dessa finalidade extrafiscal é que são previstas alíquotas progressivas de acordo com a área do imóvel e seu grau de utilização. Tendo em vista tais razões, foi editada a EC nº 42/03, que prescreveu no § 4º do art. 153 da CF/88, que o imposto será progressivo de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas.

8.3. Aspectos constitucionais

A competência para sua instituição vem previstas pelo art. 153, VI, CF/88, sendo atribuída à União, que prevê o imposto sobre "propriedade territorial rural".

a) Conceito de propriedade como limite à atuação do legislador infraconstitucional

A propriedade é o mais amplo dos direitos reais, envolvendo a faculdade de usar, gozar e dispor do bem, compreendendo, ainda, o direito de reavê-lo de quem quer que injustamente o possua ou detenha. Merece transcrição o art. 1.228 e seguintes do CCB/02:

"Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.

Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.

Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial, obedecido o disposto em lei especial.

Art. 1.231. A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário."

Para nós, é exatamente com esse conceito que se constrói a base econômica do ITR [67], tendo em vista o disposto no art. 110, do CTN, que prescreve:

"Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias."

De fato, a lei ordinária tributária não poderia alterar os conceitos previstos pela CF/88 sob pena dessa ficar desprovida de força normativa, porquanto, se a legislação estivesse livre para disciplinar o que seria propriedade não haveria limites para o legislador estatuir o imposto e retirar dos contribuintes os valores que bem entendesse. Nosso Estado Democrático de Direito não se compadece com isso, de modo que a Constituição serve de limite até mesmo contra a atuação do legislador, no que se inclui a sua atividade legislativa tributária.

Deste modo, o conceito de propriedade deve servir de limite para a exigência do ITR, não podendo o legislador equiparar qualquer outro direito real ao conceito de propriedade. Contudo, prevalece o entendimento de que a conduta tributável pode ser tanto a propriedade, como a posse ou o domínio útil, vejamos as razões para isso.

b) Entendimento majoritário

Não obstante a CF/88 fale expressamente em propriedade, o legislador previu a incidência do imposto sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse, o que fez tanto através de suas normas gerais (art. 29, do CTN) como da legislação instituidora do tributo (art. 1º, Lei nº 9.393/96).

A previsão legal (CTN e Lei nº 9.393/96) é considerada válida com base no entendimento de que a CF/88, ao mencionar a propriedade, também quis alcançar a posse e o domínio útil, pois esses nada mais são do que direitos inerentes à propriedade [68]. Conforme ensina Aires Fernandino Barreto [69] a Constituição ao mencionar o vocábulo "propriedade" não o empregou em seu sentido técnico-jurídico, mas sim na acepção de "patrimônio imobiliário rural", ou de "imóvel rural", abrangendo tanto o fato de alguém ser proprietário quando o de ser titular do domínio útil, ou ainda, ser possuidor a qualquer título.

Deste modo, quando a Constituição utiliza a expressão propriedade, que é o direito pleno, também autoriza a tributação de seus elementos (posse e domínio útil).

c) Territorial

Territorial é adjetivo que se liga à noção de propriedade vista acima, de modo que o que o imposto grava é a propriedade territorial (e também o domínio útil ou posse) e não toda e qualquer propriedade imobiliária. Tal expressão (territorial) se liga à território, sendo este uma extensão de terra, de modo que a dimensão econômica que se sujeita a tributação são terrenos [70], ou seja, é a propriedade da terra nua, diferentemente do que ocorre com o IPTU, que alcança a propriedade predial e territorial urbana.

O conceito relativo à expressão territorial pode ser reconduzido ao de imóvel por natureza, sendo exatamente esse o conceito utilizado tanto pelo CTN (art. 29) quanto pela Lei nº 9.393/96, motivo pelo tais disposições legais guardam compatibilidade com a CF/88 o conceito de imóvel por natureza era dado pelo art. 43 do revogado Código Civil de 1.916, sendo esta a acepção utilizada pelo legislador tributário ao instituir o imposto.

"Art. 43.  São bens imóveis:

I - o solo com a sua superfície, os seus acessórios e adjacências naturais, compreendendo as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo; (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)"

O atual CC/02 traz previsão semelhante no seu art. 79, verbis:

"Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente."

Portanto, imóvel por natureza, e, por conseguinte, propriedade territorial é o solo nu e seus agregados da própria natureza (vegetação, árvores etc.), ficando excluídos o cultivo ou construções, mas compreendendo as árvores, frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo. Contrapõe-se à noção de imóvel por acessão física [71] ou intelectual [72], que são conceitos de Direito Civil, que não se sujeitam à tributação pelo ITR.

d) Rural

Esse dado possui grande relevância na diferenciação do âmbito de tributação do IPTU e ITR, pois, se o imóvel for urbano, somente poderá ser exigido o IPTU, enquanto que, caso seja rural, somente pode ser exigido o ITR. Ressaltemos que nunca poderá ser exigido os dois impostos simultaneamente com base na mesma situação (propriedade imobiliária).

A definição do que seja imóvel rural ou urbano depende da adoção de dois critérios: a) localização do imóvel; b) destinação do imóvel.

d.1) Critério da localização

Pelo critério da localização, imóvel rural será aquele situado fora da zona urbana do Município. Desta forma, o conceito é definido por exclusão: será rural o imóvel que estiver fora da zona urbana, sem que exista conceito de zona rural que não seja aquela que não for urbana. Neste sentido citamos lição de Eduardo Sabbag:

"Assim, definir-se-á zona urbana pelo critério prevalente da localização, indicando-se que zona rural há de ser fixada por exclusão. Em primeiro lugar, averigua-se a natureza da zona urbana; parte-se, após, por exclusão, ao conceito de zona rural." [73]

Esse é o critério utilizado pelo CTN, vejamos:

"Art. 29. O imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localização fora da zona urbana do Município."

A delimitação de zona urbana é obtida pela análise da lei municipal (Plano Diretor), a qual deve seguir os parâmetros estatuídos pelo § 1º, do art. 32, do CTN:

"§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II - abastecimento de água;

III - sistema de esgotos sanitários;

IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

§ 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior."

Assim, a lei Municipal que defina a Zona Urbana deve observar, pelo menos, dois dos melhoramentos previstos no dispositivo do CTN supraindicado.

Destarte, para aferirmos se o imóvel se encontra em zona urbana devemos verificar a lei municipal que trate do tema, pois nela é que estará indicado o que se considera como tal. Além disso, devemos observar se tal lei obedeceu à condição estabelecida pelo CTN, qual seja, a existência de pelo menos dois dos melhoramentos previsto no dispositivo legal supracitado.

d.2) Critério da finalidade

Ao lado do critério da localidade existe o critério da destinação, que elege como elemento identificador do imóvel como urbano ou rural a sua destinação. O critério parte da premissa de que a palavra "rural" designa o que seja próprio do campo, em contraste do que seja próprio da cidade. Desta forma, a sua finalidade o caracterizaria para fins de pagamento de ITR ou IPTU.

O imóvel rural deve ser aquele destinado à atividade agropastoris, ou seja, utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial. Tendo em vista estas considerações, foi que o art. 15, do DL nº 57/66 previu que um imóvel em tais condições não deveria ser submeter ao pagamento de IPTU:

"Art 15. O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sôbre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados."

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O DL 57/66 foi editado quando não se fazia necessário a edição de Lei Complementar para tratar do tema (normas gerais), dessa forma, assim como o CTN foi recebido com o status de Lei Complementar de normas gerais, esse Decreto-Lei nº 57/66 também o foi, sendo considerado válido pela jurisprudência pátria:

"TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. FATO GERADOR. IMÓVEL SITUADO NA ZONA URBANA. LOCALIZAÇÃO. DESTINAÇÃO. CTN, ART. 32. DECRETO-LEI N. 57/66. VIGÊNCIA.

1. Ao ser promulgado, o Código Tributário Nacional valeu-se do critério topográfico para delimitar o fato gerador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR): se o imóvel estivesse situado na zona urbana, incidiria o IPTU; se na zona rural, incidiria o ITR.

2. Antes mesmo da entrada em vigor do CTN, o Decreto-Lei nº 57/66 alterou esse critério, estabelecendo estarem sujeitos à incidência do ITR os imóveis situados na zona rural quando utilizados em exploração vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.

3. A jurisprudência reconheceu validade ao DL 57/66, o qual, assim como o CTN, passou a ter o status de lei complementar em face da superveniente Constituição de 1967. Assim, o critério topográfico previsto no art. 32 do CTN deve ser analisado em face do comando do art. 15 do DL 57/66, de modo que não incide o IPTU quando o imóvel

situado na zona urbana receber quaisquer das destinações previstas nesse diploma legal.

4. Recurso especial provido(STJ. REsp 492869 / PR. 1ª T., rel. Min. Teori Albino Zavascky, DJ. 07/03/2005)"

O Supremo Tribunal Federal corrobora esse entendimento como podemos observar do precedente representado pelo RE 140773 / SP, julgado em 08/10/1998.

d.3) Conclusão

Em razão do entendimento jurisprudencial, a delimitação do que seja imóvel rural deve ser obtida da conjugação do critério da localização com o da finalidade. Considera-se o critério da localização, com exceção dos imóveis localizados dentro da zona urbana Municipal que forem destinados à atividades agropastoris. Sobre o assunto, citemos o seguinte julgado:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. VIOLAÇÃO DO ART. 32, § 1º, DO CTN. NÃO-OCORRÊNCIA. IMÓVEL SITUADO NA ZONA URBANA. ART. 15 DO DECRETO 57/66. CRITÉRIO DA DESTINAÇÃO ECONÔMICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O critério da localização do imóvel é insuficiente para que se decida sobre a incidência do IPTU ou ITR, sendo necessário observar-se o critério da destinação econômica, conforme já decidiu a Egrégia 2ª Turma, com base em posicionamento do STF sobre a vigência do DL nº 57/66 (STJ. AgRg no Ag 498.512/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 16.5.2005).

2. Não tendo o agravante comprovado perante as instâncias ordinárias que o seu imóvel é destinado economicamente à atividade rural, deve incidir sobre ele o Imposto Predial e Territorial Urbano.

3. Agravo regimental desprovido.(STJ. AgRg no REsp 679173. 1ª Turma. Rel. Min. Denise Arruda, DJ. 18/10/2007)"

8.4. Princípios constitucionais

a) Progressividade

A progressividade do ITR vem prevista no art. 153, parágrafo 4, inc. I:

"4. O imposto previsto no inciso VI do caput:

I – será progressivo e terá as suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas;" [74]

Tal redação foi conferida pela EC n. 42/03, tendo acrescentado à redação anterior a expressão "será progressivo e", pois, a redação original já previa que o imposto deveria ter alíquotas fixadas de modo a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas. Assim, a reforma da CF/88 objetivou evitar alegações quanto à impossibilidade de se admitir a progressividade em impostos reais, alegações estas que geraram discussões quanto ao IPTU (STF. RE 153.441-0). Conforme ensina Leandro Paulsen:

"Com a nova redação, o inciso I do 4 do art. 153 enseja tanto o estabelecimento de alíquota maior à medida que aumenta a base de cálculo (progressividade), como a utilização extrafiscal do ITR, de modo que seja mais onerado o proprietário que não dê destinação econômica ao seu imóvel rural, produza apenas em parte do mesmo ou com baixo rendimento.

Note-se que, não fosse a expressa autorização outorgada pela EC n. 42/03, não se admitiria progressividade de alíquotas para o ITR, pois o STF tem orientação no sentido de que os impostos reais não admitem progressividade." [75]

b) Imunidade de pequenas glebas

O ITR não pode incidir sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando exploradas pelo proprietário que não possua outro imóvel. (153, 4, II, CF/88).

Para esse fim, pequenas glebas foram definidas pela Lei n. 9.393/96 como aquelas que variam de 30 há à 100 há conforme a localização das terras [76]. No entanto, a extensão da gleba, por si só, não a coloca sob o amparo da imunidade, é necessário também a unititularidade, ou seja, que o proprietário não possua outro imóvel rural ou urbano. Não há, atualmente, requisito de que o titular explore a gleba sozinho ou com auxílio somente de sua família, uma vez que tal requisito foi abolido pela EC n. 42/03.

A discussão que se põe sobre esse assunto é de ordem formal. A regulamentação dessa imunidade partiu de lei ordinária, enquanto que o art. 146, II, CF/88 exige lei complementar para tratar do assunto. Outrossim, sendo a imunidade um limite colocado conta o legislador, a sua regulamentação por lei ordinária inutilizaria o instituto, já que outra lei ordinária poderia dispor de forma contrária.

CARRAZZA prevê como solução para essa inconstitucionalidade a aplicação, por analogia, do art. 191 da CF/88, fixando a metragem das pequenas glebas em 50 ha, até que sobrevenha lei complementar que trate do assunto. [77]

8.5. Delegação aos Municípios

O ITR é de competência da União, a qual também tem o dever de fiscalizá-lo e arrecadá-lo, sendo que, nesse caso, o produto da arrecadação do ITR é distribuído ao Município em que se situa o imóvel e à União, na proporção de 50% (cinqüenta por cento) para cada um. Todavia, a CF/88 prevê que a sua fiscalização e arrecadação pode ser feita pelo Município, em razão de opção deste (art. 153, 4, III, CF/88), sendo que, neste caso, o produto da arrecadação se destinará exclusivamente à ele (art. 158, II, CF/88).

O detalhe que devemos ter em mente é que tal opção não poderá implicar em redução do imposto ou qualquer forma de renúncia fiscal, e, que embora a capacidade ativa passe para o Município, a competência, por ser indelegável, permanece com a União.

8.6. Normas gerais e regra-matriz

a)critério material

A conduta que, uma vez ocorrida, gera o dever de pagar o imposto é a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, ou, mesmo dentro da zona urbana quando o imóvel for destinado a atividades agropastoris. (art. 1. Lei n. 9393/96, art. 29 CTN, e art. 153, VI, CF/88).

O fato gerador desse imposto se caracteriza como um fato gerador continuado, pois consiste em uma situação duradoura, que se repete no tempo em intervalos regulares.

b) Critério temporal

A tributação pelo ITR não se vincula a determinado ato que ocorra num dado instante, mas a uma situação que se encontra presente a algum tempo, mais ou menos longo. Como tal situação é duradoura, faz-se necessário que a lei estabeleça um instante no qual ocorra a incidência tributária, e, então, o proprietário, possuidor ou titular do domínio útil tenha que pagar o imposto. Este momento é representado pelo critério temporal.

Conforme dita o art. 1, da Lei 9393/96, o momento em que a conduta passa a ser relevante, isto é, o instante em que ocorre a incidência tributária e que ao sujeito passivo é imposto o dever de pagar o tributo, se verifica no dia 1 de janeiro de cada ano.

Ressaltamos que o fato gerador do imposto não é ser proprietário [78] do imóvel por um ano, mas sê-lo no dia 1 de janeiro de cada ano, de maneira que é irrelevante se o sujeito passivo titularizava o imóvel por período inferior a um ano ou se o alienou durante o ano. Constatada a propriedade do imóvel na data prevista, seu proprietário é colocado na condição de sujeito passivo do tributo independentemente de considerações outras sobre a manutenção dessa propriedade.

c) Critério espacial

O critério espacial do imposto é o território nacional, de forma que verificada a titularidade de imóvel rural em qualquer lugar deste, haverá a incidência tributária. Tal critério não pode ser identificado com zona rural, eis que seu fato gerador não é somente "ser proprietário de imóvel", mas "ser proprietário de imóvel rural" e, tal conceito, como visto acima, não depende somente de sua localização, mas também de sua destinação, à luz do art. 15 do DL 57/66.

d) Critério pessoal

O sujeito ativo (credor), como regra, é a União, salvo em relação aos Municípios ou Distrito Federal optarem por fiscalizá-lo e arrecada-lo, nos termos do art. 153, 4, III, CF/88, quando, então, o sujeito passivo será o Município ou DF.

O sujeito passivo (devedor) pode se revestir da condição de contribuinte ou responsável. Contribuinte do imposto é titular da propriedade, domínio útil ou posse do imóvel rural em 1 de janeiro de cada ano. Por sua vez, a legislação de regência colocou o sucesso, a qualquer título, na condição de responsável pelo pagamento do imposto. (art. 31 do CTN c/c arts. 4 e 5 da Lei 9.393/96).

O sucessor a qualquer título é aquele previsto pelos arts. 128 à 133 do CTN, valendo menção ao adquirente, o espólio, os herdeiros, o cônjuge meeiro do titular do imóvel a época de sua incidência. Na verdade, o responsável pode ser encontrado pela análise das regras de responsabilidade tributária prevista no próprio CTN.

e) Critério quantitativo

O critério quantitativo é incumbido de determinar o quantum que deve ser recolhido aos cofres públicos. Neste aspecto, ganha importância a previsão constitucional de progressividade e fixação de alíquotas de modo a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas. De fato, a legislação que cuida do imposto esposa tais diretrizes ao delinear a base de cálculo e alíquotas desse imposto.

e.1) Base de cálculo

O CTN prevê que a base de cálculo será o valor fundiário do imóvel. Valor fundiário nos remete ao valor do terreno, correspondendo ao valor da terra nua correspondente ao seu preço de mercado, o que impede a inclusão dos valores relativos a benfeitorias em sua base de cálculo. (art. 31 do CTN).

Com tais conceitos o legislador tributário se manteve fiel à base econômica prevista constitucionalmente, que indica que o imposto somente pode alcançar a propriedade territorial. Ao eleger o valor da terra nua como a base de cálculo, a lei não desbordou da autorização constitucional, pelo contrário, a homenageou, excluindo o cômputo de construções, instalações, benfeitorias, culturas, pastagens cultivadas e melhoradas, florestas plantadas etc.

Contudo, nem toda a terra nua pode ser tributada, eis que existem determinadas extensões que não são utilizáveis ou que não se sujeitam à exploração pelo titular do imóvel. Assim, a Lei n. 9.393/96 considera na apuração do imposto as áreas de preservação permanente, reserva legal, de interesse ecológico e as comprovadamente imprestáveis para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira ou florestal, as quais, se existentes, diminuem o valor a ser pago a título de ITR (art. 10, 1, II).

Portanto, a base de cálculo do imposto, conforme estipulado por sua lei instituidora, não é o valor da terra nua (VTN), mas o valor da terra nua tributável (VTNt), que é um conceito que permite certo abatimento em relação as áreas imprestáveis, de preservação permanente, reserva legal, de interesse ecológico etc. [79]

e.2) Alíquotas

As alíquotas são graduadas de forma progressiva em consideração à extensão da gleba, e também de modo a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, variando de 0.03% à 20%.

A progressividade é encontrada quando constatamos que as alíquotas aumentam conforme aumenta a área do imóvel, independentemente do grau de utilização. Por sua vez, a diferença maior encontramos no aumento de alíquota que considera o grau de utilização do imóvel, vejamos a tabela de suas alíquotas:

TABELA DE ALÍQUOTAS

(Art.11)

Área total do imóvel

(em hectares)

GRAU DE UTILIZAÇÃO - GU ( EM %)

 

Maior que

80

Maior que

65 até 80

Maior que

50 até 65

Maior que

30 até 50

Até 30

Até 50

0,03

0,20

0,40

0,70

1,00

Maior que 50 até 200

0,07

0,40

0,80

1,40

2,00

Maior que 200 até 500

0,10

0,60

1,30

2,30

3,30

Maior que 500 até 1.000

0,15

0,85

1,90

3,30

4,70

Maior que 1.000 até 5.000

0,30

1,60

3,40

6,00

8,60

Acima de 5.000

0,45

3,00

6,40

12,00

20,00

e.3) As alíquotas do ITR e o princípio do não-confisco

A alíquota de 20% de um imposto que grave a propriedade é bem alta, já que em 5 (cinco ) anos o imposto terá absorvido o valor total do bem, o que chegaria às raias do confisco. Por outro lado, o ITR possui nítida função extrafiscal, sendo utilizado como instrumento estatal para desestimular a manutenção de propriedades improdutivas e garantir a função social da propriedade. Como então resolver esse dilema? Sobre esse assunto é esclarecedora a lição de Luís Fernando de Souza Neves:

"O direito de propriedade, que era tido como absoluto, exclusivo e perpétuo, sofreu uma relativização em virtude da função social da propriedade introduzida pela Constituição de 1988.

Estaríamos, então, autorizados a concluir que o princípio da função social da propriedade, à guisa de relativizar o direito de propriedade, antes absoluto, exclusivo e perpétuo e de aplicar a extrafiscalidade para inibir abusos, autorizou, ilimitadamente, a progressão de alíquotas para forçar o proprietário a melhorar a produtividade de sua área rural ou dela defazer-se?

Cremos que não, porque esse princípio não recebeu do poder constituinte originário "status" e valoração tão elevados a ponto de sobrepô-lo ao princípio da proibição de tributos com efeitos confiscatórios e que o autorizasse, por meio da progressividade o aumento ilimitado de alíquotas.

É cedido que a Constituição Federal em seu art. 5, XXIII prescreveu que a propriedade deverá atender sua função social. Porém, esse mesmo artigo também garantiu no inciso imediatamente anterior – XXII, que essa propriedade apesar de não ser mais considerada perpétua, exclusiva, absoluta ou incontrastável, jamais poderá ser desconsiderada e, sob qualquer pretexto, encampada pelo Estado em detrimento dos direitos do particular.

Os limites à ação do Estado também estão postos nessa mesma Constituição nos arts. 5, XXIV e 184.

Já o art. 184 atribui à União competência para desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel que não esteja cumprindo sua função social, mas condiciona essa ação do Estado à prévia e justa indenização.

Portanto, mesmo as propriedades improdutivas não poderão, sob pretexto de não estarem cumprindo sua função social, receber como castigo uma tributação escorchante que resulte em seu perdimento, pois e o princípio da função social da propriedade não estiver sendo cumprido, apesar da Constituição autorizar o uso de alíquotas progressivas no ITR, impede que a progressividade resvale para o confisco.

Mas, se mesmo com o decurso de tempo tal progressividade não demonstrar resultado eficaz para forçar o proprietário, possuidor ou detentor do domínio útil a tornar a propriedade produtiva, a União ainda poderá valer-se da desapropriação para fins de reforma agrária, mediante justa e prévia indenização." [80]

e.4) Reserva legal e área de preservação permanente

A reserva legal e a área de preservação permanente possuem relevante impacto no valor do imposto devido, uma vez que têm repercussão tanto no grau de utilização do imóvel (o que determinará a alíquota aplicável), quando no valor da terra nua tributável (que repercute diretamente na base de cálculo). Sendo assim, a possibilidade de sua utilização traz implicações em todo o critério quantitativo, já que é determinante tanto da alíquota quanto da base de cálculo, tornando o tributo mais gravoso ou de reduzido impacto.

Como o ITR é um imposto cujo lançamento se faz através da sistemática do chamado lançamento por homologação (art. 150, CTN), surge a questão sobre a necessidade de comprovação documental da existência da reserva legal e da área de preservação permanente, eis que o sujeito passivo deverá declarar o tributo e efetuar seu recolhimento independentemente de análise prévia por parte da Administração Tributária. A resposta quanto a esta questão é dada pelo 7, do art. 10, da Lei 9.393/63, vejamos:

"§ 7º  A declaração para fim de isenção do ITR relativa às áreas de que tratam as alíneas "a" e "d" do inciso II, § 1º, deste artigo, não está sujeita à prévia comprovação por parte do declarante, ficando o mesmo responsável pelo pagamento do imposto correspondente, com juros e multa previstos nesta Lei, caso fique comprovado que a sua declaração não é verdadeira, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)"

Portanto, em razão desse dispositivo legal, o sujeito passivo não necessita comprovar a existência de tais áreas, bastando que as inclua em sua declaração. A verificação da veracidade das informações prestadas pelo declarante ficariam sujeitas à homologação por parte do Fisco, que, discordando, poderá lançar a diferença e aplicar as penalidades respectivas.

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Sobre o autor
Ari Timóteo dos Reis Júnior

Especialista em Direito Tributário pelo IBET. Ex-Procurador do Estado de Minas Gerais. Procurador da Fazenda Nacional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REIS JÚNIOR, Ari Timóteo. Tributação no Estado Democrático de Direito.: Apontamentos sobre os impostos federais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2717, 9 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17989. Acesso em: 5 nov. 2024.

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