Sumário: Introdução; 1. Entrevistas; 2. Questionários; Referências bibliográficas.
Introdução
Os procedimentos de seleção de pessoal são aqueles que visam a analisar as qualidades e as características profissionais, bem como a qualificação técnico-profissional do candidato ao emprego durante a sua contratação.
O objetivo do empregador durante a realização dos métodos de seleção de pessoal é averiguar se as condições físicas, psicológicas e comportamentais do candidato ao emprego estão em consonância com o trabalho que será executado pelo mesmo.
De acordo com Santos (1985, p. 72), a seleção de pessoal compreende "o processo pelo qual são escolhidas as pessoas adaptadas a uma determinada ocupação ou esquema operacional". Assevera ainda que: "seleção nem sempre significa escolher os que revelam aptidões ou capacidades nos seus índices mais elevados [...] e, sim, os mais adequados a uma situação predeterminada" (Idem, ibidem).
Para Lobos (1979, p. 57), a seleção de pessoal representa
O processo de administração de recursos humanos, por meio do qual a empresa procura satisfazer sua necessidades de recursos humanos, escolhendo aqueles que melhor ocupariam determinado cargo na organização, com base em uma avaliação de suas características pessoais (conhecimentos, habilidades, etc.) e de suas motivações.
Já Chiavenato (apud COGO, 2006, p. 81) considera a seleção como "um processo pelo qual uma organização escolhe, de uma lista de candidatos, a pessoa que melhor alcança os critérios de seleção para a posição disponível".
Pontes (2008, p. 136) afirma que cada pessoa possui necessidades diferentes. Em razão disso, é preciso avaliar se as necessidades fisiológicas, sociais e de segurança, de estima e de autorrealização do candidato ao emprego serão satisfeitas no cargo e na empresa.
As técnicas ou os procedimentos de seleção podem consistir em: preenchimento de uma ficha pelo candidato, entrevistas, questionários, dinâmicas de grupo, simulação de desempenho, análise de currículo, dinâmica de grupo; além de testes de conhecimento, de personalidade, psicológicos e grafológicos; e, ainda, exames médicos, toxicológicos e genéticos.
Consoante ao ensinamento de Leite e Rios (2008, p. 169), "diante da inexistência de previsão legal, a seleção e seus métodos devem seguir o princípio da boa fé, de modo que do empregador é exigida uma atitude lícita na utilização dos métodos de investigação".
Em razão disso, o candidato ao emprego deve ser previamente comunicado acerca das técnicas de seleção que serão aplicadas pelo empregador durante a realização dos testes e dos exames.
Quando as informações solicitadas pelo empregador nos procedimentos de seleção pessoal são estranhas às aptidões profissionais a serem exercidas pelo interessado à vaga, ficarão constatados constrangimentos e prejuízos à autoestima e à dignidade do mesmo. Além disso, ficará caracterizado tratamento diferenciado entre os candidatos ao emprego durante tal procedimento, restando violado por isso o art. 5. caput, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que assim estatui:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...].
Acerca do dispositivo acima ressaltado, Cogo (2006, p. 31) diz que "a garantia constitucional vigente de que todos são iguais perante a lei é a base para toda a proteção do indivíduo, que aqui queira viver em liberdade e trabalhar com dignidade".
Entretanto, apesar da disposição expressamente contida no art. 5. da Constituição Federal de 1988, que visa a afastar qualquer tipo de discriminação realizada durante a fase pré-contratual no Direito do Trabalho, Motta (apud COGO, 2006, p. 67) informa que o moderno mundo dos negócios é marcado pela complexidade e pelos particularismos, relatando que o desenvolvimento de tecnologias e a necessidade de mudanças rápidas e profundas na organização da empresa e no desenvolvimento do trabalho produtivo exigem posturas agressivas.
Este mesmo autor ainda afirma que, na teoria geral da administração, o papel do administrador é o de estudar e de determinar o comportamento humano e a forma de produção, a fim de se atingir a maior eficiência possível, considerando como molas propulsoras a capacidade das máquinas e dos trabalhadores (MOTTA apud COGO, 2006, p. 68).
Em razão disso, Cogo (2006, p. 68) adverte que as organizações empresariais, para alcançarem os desafios quotidianos do mercado, bem como a maximização dos lucros, implementam programas de excelência em todos os ramos da administração, como em: planejamento estratégico, produção, vendas, finanças, logística, comportamento organizacional e gestão de pessoas.
Percebe-se, assim, que o processo de gestão e de administração empresarial existente no atual mundo dos negócios pretende baixar os custos e maximizar os lucros.
Em razão disso, assevera o referido senador que "de uns tempo para cá, esses métodos de recrutamento têm sido aplicados com algumas distorções, a ponto de provocar danos morais aos candidatos que são obrigados a realizar atividades vexatórios e atentatórias de sua honra e dignidade".
Desse modo, é inegável que, em decorrência dos poderes conferidos ao empregador no contexto da relação de emprego, os direitos de personalidade acabem por ser violados, tendo em vista tal poder ser exercido, não raras vezes, de forma abusiva, violando preceitos constitucionais fundamentais. Para evitar a violação aos direitos humanos fundamentais que assistem ao empregado, torna-se necessária a cautela por parte do empregador de forma que possa garantir, de um lado, o exercício do poder empregatício sem abusividade; e, de outro, a observância dos direitos de personalidade do empregado.
A consagração do direito de propriedade como caracterizador do regime capitalista condensou nas mãos do detentor do poder empregatício um poder ameaçador da garantia da intimidade e, em geral, do respeito aos direitos fundamentais do empregado.
Além disso, esclarece Simón (2000, p. 129):
[...] é extremamente delicada a situação de um trabalhador candidato a um emprego. Ainda que se trate do acerto de um contrato, onde deveria imperar a autonomia da vontade, pelas circunstâncias específicas que envolvem a relação de emprego, o trabalhador fica numa posição de inferioridade.
A autora acima referenciada ainda destaca que o contrato de trabalho se assemelha a um contrato de adesão, e o empresário, detentor dos meios de produção e no exercício do seu direito de propriedade, acaba impondo as condições que regerão o contrato de trabalho, mesmo porque o trabalhador, dispondo apenas de sua força de trabalho, necessita do emprego para a sua subsistência própria e a de sua família. A situação se complica, quando se soma a isso o famoso fantasma do desemprego que ronda a sociedade capitalista (SIMÓN, 2000, p. 129).
Por esses motivos, Simon (2000, p. 129) enfatiza que a ocorrência de lesão do direito à intimidade e à vida privada, sem que haja resistência por parte do trabalhador, é muito mais evidente durante o processo seletivo. Em um primeiro plano, o candidato pode temer que a sua contratação deixe de se concretizar e, em um segundo plano, porque, além de não se concretizar, a empresa pode informar sua eventual resistência a outras empresas, que também poderão deixar de admiti-lo por tal motivo.
Em recente pesquisa realizada sobre a finalidade das dinâmicas de grupo no processo de contratação de pessoal, foi vislumbrada a possibilidade de trabalhadores sofrerem constrangimentos de ordem moral durante a sua realização. Vejamos, conforme o site <www.cipo.org.br/rotadotrampo>, acesso em 20 de janeiro de 2011:
A dinâmica de grupo é mais uma etapa do processo de seleção que avalia as questões de comportamento do candidato diante dos demais concorrentes. Nesse processo, não são analisados conhecimentos técnicos, mas a capacidade de expressar idéias e integrar-se. O objetivo é avaliar o desempenho do candidato e como desenvolve o trabalho em grupo, verificar algumas habilidades que são necessárias para o preenchimento da vaga. [...] O candidato deve ter jogo de cintura para lidar com imprevistos e saber improvisar, saber ouvir e principalmente saber se colocar, expor e defender suas idéias. Na dinâmica de grupo, normalmente os candidatos enfrentam situações desafiadoras e precisam representá-las de diversas formas, como: fazer propagandas, dramatizações e se colocar publicamente. O candidato deve saber que tudo o que for feito será avaliado e não deve se preocupar com os constrangimentos e sim com a vaga que irá ocupar. (grifo nosso)
Sônia das Dores Dionisio, Juíza do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, numa brilhante decisão proferida em novembro de 2005, já condenou a prática das chamadas técnicas de dinâmica de grupo. Para a juíza, a sua aplicação desvirtuada ou inconsequente pode caracterizar a prática de assédio moral. Vejamos:
ASSÉDIO MORAL DINÂMICA GRUPAL. DESVIRTUAMENTO. VIOLAÇÃO AO PATRIMÔNIO MORAL DO EMPREGADO. ASSÉDIO MORAL. INDENIZAÇÃO. A dinâmica grupal, na área de recursos humanos, objetiva testar a capacidade do indivíduo, a compreensão das normas do empregador e gerar a sua socialização. Entretanto, sua aplicação inconsequente produz efeitos danosos ao equilíbrio emocional do empregado. Ao manipular tanto a emoção, como o íntimo do indivíduo, a dinâmica pode levá-lo a se sentir humilhado e menos capaz que os demais. Impor pagamentos de prendas publicamente, tais como dançar a dança da boquinha da garrafa, àquele que não cumpre sua tarefa a tempo, configura assédio moral, pois o objetivo passa a ser o de inferiorizá-lo e torná-lo diferente do grupo. Por isso golpeia a sua autoestima e fere o seu decoro e prestígio profissional. A relação de emprego cuja matriz filosófica está assentada no respeito e confiança mútua das partes contratantes impõe ao empregador o dever de zelar pela dignidade do trabalhador. A CLT, maior fonte estatal dos direitos e dos deveres do empregador e do empregado impõe a obrigação de o empregador abster-se de praticar lesão à honra e à boa fama do seu empregado (art. 483). Se o empregador age contrário à norma, deve responder pelo ato antijurídico que praticou, nos termos do art. 5, X da CF/88.
(Recurso Provido) TRT 17 Região RO 01689. 2004. 008. 17. 00-0. Relatora Juíza Sônia das Dores Dionisio. DJU 18/11/2005 AC 08693/2005.
Em razão disso, é preciso estabelecer limites à atuação patronal durante a fase pré-contratual no decorrer das técnicas de seleção utilizadas pelo empregador nesta etapa, pois a legislação trabalhista não estipula os limites quanto à adoção de tais métodos durante tal procedimento, e vislumbra-se, na ementa acima transcrita, um caso de assédio moral.
A dinâmica do assédio moral resulta em sérios prejuízos à integridade física e à saúde psicológica do trabalhador, podendo ocasionar, dependendo da conduta praticada pelo empregador, o aparecimento das seguintes doenças decorrentes: alteração no humor, medo, palpitações, tristeza, mágoa, sentimento de revolta, dores no peito, diminuição da libido, insegurança, perda da concentração, dores de cabeça, dores musculares, bruxismo e pensamentos suicidas (OLIVEIRA DA SILVA, 2005, p. 44).
Assim, para Marie France Hirigoyen, tem-se constatado que "o mundo do trabalho está se tornando cada vez mais penoso, onde se exige cada vez mais das pessoas, que se trabalha cada vez mais e em condições que são psicologicamente cada vez mais duras [...]" (Disponível em: <www.assediomoral.org>. Acesso em: 20 de janeiro de 2011).
A situação se agrava quando o empregado, muitas vezes devido à necessidade econômica, abdica de seu direito de personalidade na fase pré-contratual do Direito do Trabalho, permitindo a invasão de sua intimidade e de sua integridade moral pelo empregador.
Dessa forma, adverte Sein (apud BARROS, 2009, p. 60): "premido da necessidade econômica e pela dificuldade de obtenção de trabalho, não raro o aspirante a um emprego abdica de aspectos de sua personalidade, em garantia da adesão de seu comportamento futuro à vontade ordenada do empregador".
Acerca da submissão do candidato ao emprego por meio de entrevistas invasivas, testes psicológicos de personalidade e dinâmicas de grupo que ultrapassem os limites acessíveis do empregador, Almeida (2008, p. 67), enfatiza:
Deve-se ter em mente a condição peculiar do indivíduo que se submete a testes psicológicos e dinâmicas de grupo, ou, indo mais além, a testes genéticos ou polígrafos, entrevistas avançadas com mais de uma pessoa, uma vez que o candidato é a parte fragilizada na relação, quer e depende da aprovação na vaga para emprego essencial para a sobrevivência digna. Não estão fora de questão, ainda, como se viu pelas tendências do mercado atual, testes grafológicos e utilização de técnicas diversas, por profissionais não habilitados, visando selecionar candidatos a emprego.
Desse modo, no que se refere aos procedimentos de seleção pessoal adotados no âmbito empresarial no decorrer da fase pré-contratual, Barros (2009, p. 61) assevera que o empregador deve limitar-se a obter dados somente no que se refere à capacidade profissional do empregado. Quando aquele não se contenta em receber dados profissionais do candidato ao emprego e decide invadir a vida privada deste, por investigar as suas características pessoais sem qualquer conexão com a natureza da prestação de serviços ou com a organização do trabalho, restará clara a conduta discriminatória praticada pelo empregador.
A discriminação, de acordo com Pontes (2008, p. 141), "representa o cerceamento das potencialidades do ser humano, visto que, num prejulgamento errôneo, não é dada à pessoa a oportunidade de comprovar suas potencialidades".
Em razão do preconceito ou da discriminação, muitas vezes operados pelo empregador em desfavor do candidato ao emprego durante as técnicas de seleção pessoal, convém registrar o pensamento de Coelho (2008, p. 46):
O chamado perfil ou cara da empresa pode indicar discriminação, seja estética, seja por personalidade. Afinal, não admitido por tendências agressivas, ou por excessiva sociabilidade, deve o candidato, no mínimo, obter conhecimento de tal diagnóstico, seja por discriminação, no caso, por exemplo, de rejeição por tendências homossexuais, seja porque deve existir plausibilidade entre a rejeição e o perfil do candidato.
Nesse sentido, somente em situações excepcionais, o empregador poderá adentrar, com prudência, durante a realização da contratação, em informações sobre a vida pessoal do candidato ao emprego. São informações inerentes ao cargo, que, caso não sejam verificadas, poderão colocar em risco a segurança da coletividade ou do próprio trabalhador. Trata-se, por exemplo, das funções que exigem o manuseio de arma de fogo e a autorização prévia da autoridade competente para o exercício de tal atividade.
Nesse enleio, o estudo se mostra pertinente na medida em que visa a analisar as questões que envolvem o abuso aos direitos de personalidade do trabalhador no decorrer das técnicas de seleção de pessoal durante a fase pré-contratual, seja através das entrevistas ou mesmo pela descabida exigência de informações sobre a vida pessoal do trabalhador que ultrapassem para além das atividades profissionais do candidato ao emprego, mesmo porque reza o art. 3, inciso IV da Constituição Federal de 1988: "Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".
O objetivo é assegurar o pensamento sempre bem saudoso de Cogo (2006, p. 33), que assim destaca:
"[...] o homem da pós-modernidade não é apenas um, ao contrário, está no coletivo, necessita além da liberdade e igualdade, ainda, de um meio ambiente desenvolvido e saudável, para então promover a fraternidade na aldeia global onde está inserido".
1. Entrevistas
As entrevistas destinadas à contratação do trabalhador situam-se na fase pré-contratual, ou seja, na fase que antecede à formação do contrato de trabalho definitivo.
Assim, nas entrevistas a que são submetidos os candidatos ao emprego durante o processo de seleção, as perguntas formuladas pelo empregador no exercício do seu poder de direito, devem se pautar por questões relacionadas às atividades, às experiências e às aptidões profissionais do candidato ao emprego para o desempenho do cargo, bem como a dados pessoais comuns, como filiação, naturalidade, data de nascimento, estado civil, filhos, etc.
Questionamentos não condizentes com as habilidades do interessado à vaga, ou, como nas palavras de Nascimento (2009, p. 109), "com a finalidade de descobrir aspectos que guardem relação com a personalidade do candidato e com a sua esfera de intimidade e de privacidade", acarretarão a prática de ato de discriminação por parte do empregador e implicarão responsabilidade civil pré-contratual pelo prejuízo decorrente da violação do seu direito de personalidade conforme art. 5, inciso X da CF/88.
Para Teixeira Filho (1999, p. 636), dano moral é:
[...] O sofrimento humano provocado por ato ilícito de terceiro que molesta bens imateriais ou magoa valores íntimos da pessoa, os quais constituem o sustentáculo sobre o qual a sua personalidade é moldada e a sua postura nas relações em sociedade é erigida.
Já Medeiro Neto (2007, p. 57) considera o dano moral ou extrapatrimonial
[...] lesão injusta imprimida a determinados interesses não-materiais, sem equipolência econômica, porém concebidos como valores jurídicos protegidos, integrantes do leque de proteção interna ou externa, inerentes à personalidade do ser humano, podendo também alcançar valores extrapatrimoniais reconhecidos pelo sistema legal à pessoa jurídica ou a uma coletividade de pessoas.
Os direitos de personalidade são inerentes à pessoa humana e a ela estão vinculados. Tais direitos estão insculpidos no art. 5, incisos V e X da Constituição Federal de 1988, que consagrou a defesa dos direitos da personalidade como valores supremos. Sem essa proteção constitucional, a dignidade da pessoa humana não se concretiza na ordem justrabalhista brasileira.
Coelho (2008, p. 62), ao demonstrar a importância da aplicação da teoria da responsabilidade pré-contratual, quando constatada a não razoabilidade quanto ao uso das técnicas de seleção de pessoal pelo empregador, adverte:
A lógica do mercado pode tornar-se, facilmente, a lógica da discriminação: dentre outras, a estética, na medida em que exclui obesos, etária, porque exclui os mais velhos, e, porque não dizer, psíquica, na medida em que exclui, pelo prisma negativo, os não dinâmicos, os não ambiciosos, os não expansivos...pergunta-se: quem estará apto para trabalhar e, afinal, o mercado serve ao homem ou inverteu-se a equação e, agora, o mercado é o grande irmão que exclui o ser humano em seus planos de longo prazo? A solução desse problema está, portanto, na utilização com a máxima efetividade, da teoria da responsabilidade pré-contratual aplicada ao direito do trabalho.
A tutela aos direitos de personalidade tem como finalidade primordial resguardar as qualidades e os atributos essenciais do trabalhador nas relações de trabalho, pois, como assevera Cogo (2006, p. 45), "os direitos da personalidade se apresentam como guardiões, entre outros: da vida humana, da igualdade, da intimidade, da honra, da imagem e da liberdade".
A Constituição Federal de 1988 protege os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade e, por consequência, a sua condição de dignidade no que tange à tutela aos direitos de personalidade do trabalhador. Em razão disso, os direitos de personalidade representam emanações do princípio da dignidade da pessoa humana e estão inseridos no título dos direitos e das garantias fundamentais.
Consoante ensina Leite (2007, p. 44), "os direitos de personalidade são espécies de direitos inerentes à dignidade humana que têm por objeto a proteção da incolumidade física, psíquica e moral da própria pessoa".
Logo, a manifestação da dignidade se faz presente na incolumidade do direito à vida, à honra, à saúde, à integridade física, à integridade moral, à intimidade e à garantia da afirmação social do trabalhador nas fases pré-contratual, de execução do contrato de trabalho e pós-contratual.
Essa proteção fundamental possui o intuito de garantir ao trabalhador o bem-estar desejado em todos os âmbitos da sua vida social e profissional, visto que, como destaca Tepedino (2003): "a lógica fundante dos direitos da personalidade é a tutela da dignidade da pessoa humana".
De acordo com Sarlet (apud COGO, 2006, p. 36):
[...] os princípios constitucionais, essência da Constituição, são o fio condutor de todas as interpretações tendentes a extrair do sistema jurídico pátrio a proteção dos direitos elementares da vida humana, dentre eles o da intimidade, para salvaguarda das informações mais basilares de sua própria existência: as psíquicas.
Nascimento (2009, p. 109) estabelece, então, que o empregador não pode fazer perguntas relacionadas à vida pessoal, familiar, afetiva e sexual do candidato ao emprego, muito menos realizar indagações sobre as opiniões políticas, filosóficas ou religiosas do trabalhador, eis que tais informações não interferem nas aptidões profissionais do candidato nem no objeto de sua futura prestação de serviços.
Segundo Barros (2009, p. 61),
O princípio da não discriminação possui conexão com a garantia dos direitos da personalidade e atua como limite imposto pela Constituição Federal à autonomia do empregador, quando da obtenção de dados a respeito do candidato ao emprego, e se projeta durante a execução do contrato.
A autora assim instrui:
Deverá o empregador, em princípio, abster-se de fazer perguntas ao candidato a respeito de suas origens raciais, opções políticas, convicções religiosas, atividades sindicais. É necessário, também, que se reconheça ao candidato ao emprego o direito de ocultar circunstâncias alheias à causa contratual não relacionadas diretamente com o cargo que irá ocupar diante de situações de imposição coativa (BARROS, 2009, p. 61).
Pontes (2008, p. 164) também orienta da seguinte forma:
Permita que o candidato fale livremente, dando a ele liberdade de expressão, e ajude-o a preencher as omissões quando necessário. Tanto o entrevistador como o candidato devem sentir-se bem com a experiência, portanto o clima da entrevista deve ser agradável, natural e humano.
De tal modo, as perguntas formuladas pelo empregador devem cingir-se a informações estritamente necessárias sobre a vida profissional do candidato ao emprego e manter-se em relação direta com o cargo a que o empregado se dispõe a exercer no ambiente de trabalho.
Dessa forma, enfatiza Simón (2000, p.132):
Além de observar o princípio da não discriminação, o empregador, no exercício do poder de direção, deverá limitar-se a tomar informações relacionadas às atividades profissionais que o candidato desempenhará se contratado, para aferir as suas aptidões. Consequentemente, não devem ser admitidos métodos que, sub-repticiamente, têm por objetivo "desvendar" aspectos da personalidade do candidato no que diz respeito à sua esfera íntima e privada.
Portanto, no procedimento das entrevistas, não poderá haver intromissões na esfera íntima e privada do candidato ao emprego, tais como perguntas ou opiniões que desrespeitam os aspectos da personalidade do candidato (opinião política, opção sexual, crença religiosa).
Consoante ensina Nascimento (2009, p. 110),
[...] todas e quaisquer informações obtidas neste procedimento de avaliação devem ser relacionadas apenas com as atividades profissionais do trabalhador e com o objeto de sua prestação de serviços. Trata-se, portanto, de nítido e legítimo limite imposto pela ordem constitucional ao limite de alcance do exercício do poder diretivo do empregador.
O mesmo autor ainda estabelece que o procedimento de entrevista deve se limitar a obter informações sobre o candidato ao emprego, de acordo com os seguintes aspectos: a) histórico escolar e profissional; b) experiência, qualificações e aptidões profissionais; c) organização de trabalho; d) desenvolvimento de atividades; e) outros assuntos relacionados com o perfil da vaga e com o objeto da prestação de serviços (NASCIMENTO, 2009, p. 109).
Assim, caso o entrevistador viole o direito à intimidade e à vida privada do candidato ao emprego durante a realização da entrevista, o entrevistado poderá esquivar-se de responder ao que lhe foi questionado, ou mesmo responder falsamente ou omitir as informações necessárias para o preenchimento da vaga de emprego.
Nessa situação, deve-se invocar a teoria da responsabilidade civil pré-contratual ao candidato que fora excluído de uma vaga de emprego por ter resistido contra a prática abusiva de seus direitos de personalidade pelo empregador durante a fase pré-contratual.
Assim estabelece Nascimento (2009, p. 110):
[...] durante o procedimento de entrevista, o empregado não está obrigado a responder às perguntas formuladas pelo empregador que estejam relacionadas com a sua intimidade e com a sua vida privada, eis que dissociadas do objeto do contrato de trabalho e nada têm a ver com o trato das obrigações contratuais.
Nesse enleio, as entrevistas devem ser destinadas única e exclusivamente aos fatos profissionais decorrentes das exigências técnicas para o preenchimento do cargo, sendo proibida qualquer diferenciação e discriminação quanto a sexo, raça, cor, crença religiosa e idade.
Como bem destacam Leite e Rios (2008, p. 171), "durante a entrevista de emprego, há o direito à informação do empregador e o direito à privacidade do emprego".
Assim, nenhuma pergunta pode ir além do que se considera requisito para o preenchimento adequado da vaga de emprego. Os direitos à intimidade e à vida privada são violados quando as perguntas são abusivas e não têm qualquer relação com a avaliação do candidato ao cargo disponível. Também serão abusivas quando refletem preconceito ou mesmo quando requerem respostas tão pessoais que chegam a constranger o candidato (LEITE, R. C.; RIOS, S. C. T., 2008, p. 171).
Moreira (apud LEITE e RIOS, 2008, p. 171) considera a entrevista como
Diálogo entre o candidato ao trabalho e o empregador ou um seu representante tendo por objecto identificar o que melhor se adéqua ao posto de trabalho, sendo uma técnica bastante habitual e com a vantagem de ser simples, permitindo aos trabalhadores obter maior intercâmbio de informação e aos empregadores uma observação directa das reacções espontâneas daqueles.
Para Nascimento (2009, p. 108), a entrevista "revela legítima forma de manifestação do poder diretivo do empregador que contrata força de trabalho compatível com a necessidade empresarial, visando à obtenção dos resultados esperados".
Reza o art. 5, caput e inciso IV da Constituição Federal de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato (grifo nosso)
[...]
De acordo com o referido dispositivo constitucional, a liberdade de pensamento compreende a possibilidade de o indivíduo expressar o seu pensamento, com o intuito de preservar a sua individualidade e a sua intimidade. O direito fundamental à intimidade é inerente à natureza humana. Os Direitos Fundamentais são direitos inerentes a cada pessoa humana pelo simples fato de esta existir. São direitos que visam a consolidar a noção atualizada da dignidade fundamental do ser humano.
O primeiro parágrafo do preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece que "a dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz do mundo".
Assevera Barbugiani (2008, p. 49):
Inerência significa dizer que, aos seres humanos, independentemente de raça, religião, idade, etnia, ideologia, nacionalidade, sexo, entre outras, são garantidos certos direitos integrantes do chamado padrão vital mínimo pelo simples fato de serem humanos.
Em razão disso, o empregador não pode realizar questionamentos sobre aspectos da vida privada do candidato, muito menos acerca de suas opiniões políticas, filosóficas e outras mais, porque, como assevera Simon (2000, p. 130) "a primeira regra que deve nortear um processo de seleção é a da não discriminação, corolário do princípio da igualdade".
Consoante ensina Nascimento (2009, p. 109), "as normas jurídicas servem para o fim de coibir e eliminar as condutas discriminatórias praticadas pelo empregador e promover a igualdade de participação a todos os trabalhadores".
Caracterizam, por exemplo, perguntas discriminatórias e vexatórias durante a sua realização: Você é heterossexual? É portador de alguma patologia? É filiado a algum partido político? Pertenceu ou pertence à diretoria de algum tipo de sindicato? Você lê que tipo de leitura, jornal, revista, romances e obras técnicas? Na sua família, há histórico de câncer, alzheimer ou parkinson? Você é ou já foi um simpatizante do comunismo?
No magistério de Pontes (2008, p. 138), a entrevista de seleção "visa a averiguar a qualificação, o potencial e a motivação do candidato ao cargo". Portanto, para ele, a entrevista possui a seguinte finalidade:
[...] verificar com profundidade se o candidato possui a qualificação necessária para a ocupação do cargo aberto, além, é claro, de avaliar globalmente o candidato. É importante salientar que essas entrevistas permitem à empresa conhecer melhor o candidato e também permitem que o candidato conheça melhor a empresa e sua cultura.
Por fim, vale registrar o pensamento de Barros (2009, p. 63):
O ideal seria submeter as indagações ao sindicato de classe ou ao Ministério do Trabalho, para aferição da relevância das perguntas formuladas, no que tange ao normal desenvolvimento das atividades a serem desempenhadas. Note-se, todavia, que tal procedimento não é observado, inexistindo disposição legal a respeito.