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O prequestionamento da matéria de ordem pública no âmbito dos recursos excepcionais

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14/10/2011 às 16:01
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Superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito devolutivo amplo, o que implica o julgamento da causa e a aplicação do direito à espécie.

RESUMO

Quando se está diante de recursos excepcionais, a matéria de ordem pública necessita ser prequestionada? Esta questão, que parece ser simplória em um primeiro instante, na verdade, atualmente encontra-se marcada por entendimentos apartados entre os juristas. Enquanto a primeira corrente estabelece que o prequestionamento não poderá deixar de ser aplicado perante as matérias revestidas de ordem pública, em razão da localização constitucional da expressão "causas decididas", a segunda, defende que, por força do efeito translativo, e, prestigiando a instrumentalidade do processo e a efetividade da prestação jurisdicional, as matérias de ordem pública devem ser conhecidas de ofício, mesmo que não tenham sido julgadas pelo órgão jurisdicional. Neste cenário, destaca-se o estabelecimento de uma terceira corrente sobre o assunto, a qual se distingue das outras, no sentido de que a matéria de ordem pública será analisada a partir da aplicação do direito à espécie, após a abertura da competência jurisdicional do STF ou STJ, conforme o caso.

PALAVRAS-CHAVE: Prequestionamento. Matéria de ordem pública. Recursos excepcionais.

1. INTRODUÇÃO; 2. A DIVERGÊNCIA EXISTENTE NO ÂMBITO DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA QUANTO À NECESSIDADE OU NÃO DO PREQUESTIONAMENTO; 3. O SURGIMENTO DE UM NOVO POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL; 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS.


1. INTRODUÇÃO

No âmbito dos recursos excepcionais, o prequestionamento em matéria de ordem pública é um tema marcado pela divergência de posicionamentos, tanto em sede jurisprudencial quanto doutrinária. Por isso, este breve trabalho tem por escopo encontrar respostas para a seguinte indagação: é possível suscitar matérias de ordem pública em sede de recurso extraordinário e recurso especial, ainda que o tema não tenha sido ventilado em instâncias inferiores, nem mesmo tenha sido objeto destes recursos excepcionais?

Para enfrentar este tema, mister se faz a compreensão de cada um dos pensamentos defendidos pelas três diferentes correntes existentes sobre o assunto, no âmbito do direito pátrio. A partir de jurisprudências selecionadas e exemplos práticos, será possível identificar a solução mais adequada para a questão proposta.


2. A DIVERGÊNCIA EXISTENTE NO ÂMBITO DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA QUANTO À NECESSIDADE OU NÃO DO PREQUESTIONAMENTO

O prequestionamento é um requisito específico de admissibilidade dos recursos excepcionais. Tal requisito está previsto nos arts. 102, III; e 105, III, ambos da CF, pelos quais, compete ao STF julgar, mediante RE e (ou) REsp, as "causas decididas", verbis:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

[...]

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: [...];

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

[...]

III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: [...] (grifou-se).

Os dispositivos constitucionais transcritos exigem, por intermédio da expressão "causas decididas", que a questão constitucional - no caso do RE -, e a questão federal - no caso do REsp -, estejam prequestionadas, isto é, presentes na decisão recorrida, tendo sido efetivamente julgadas. Em outras palavras: não se admite que, no REsp ou RE, se ventile questão inédita, a qual não tenha sido apreciada pelo órgão a quo. [01]

Nesta lógica, portanto, com lastro nestas básicas e ligeiras noções sobre o prequestionamento [02], faz-se mister uma primeira conclusão parcial: 1) as matérias que não foram decididas, não podem ser recorridas; e 2) ausente o requisito de admissibilidade do prequestionamento, o recurso não poderá ser conhecido, o que impedirá a análise do mérito.

Segundo José Miguel Garcia Medina, a Constituição Federal não apresenta exceções a tal pressuposto, devendo a regra constitucional ser direcionada, também, às hipóteses concernentes às matérias de ordem pública dos arts. 267, § 3º, e 301, § 4º, do CPC. [03]

Para justificar seu posicionamento, o autor explica que as disposições do CPC (legislação infraconstitucional) ora citadas, não estão previstas na Constituição Federal, nem mesmo de modo análogo, devendo valer o princípio da hierarquia das normas; e, o fato de serem consideradas normas específicas, por si só, não tem o condão de prevalecerem em relação às normas constitucionais, porquanto o critério da hierarquia se sobressai em relação ao critério da especialidade. Se se admitisse o inverso, "os princípios fundamentais do ordenamento jurídico seriam destinados a esvaziar-se rapidamente de qualquer conteúdo, a teor do que ensina Norberto Bobbio". [04]

Com lastro nas razões apontadas, o autor remata:

Por isso, sob qualquer ângulo que se analise o assunto, conclui-se que o comando previsto nos arts. 267, § 3º, e 301, § 4º, do CPC não prevalece sobre o disposto nos arts. 102, inc. III e 105, inc. III, da CF. Infere-se do exposto que somente serão cabíveis os recurso extraordinário e especial no que respeita às matérias de ordem pública, se referidas matérias tiverem sido decididas no pronunciamento recorrido. [05]

Cassio Scarpinella Bueno, ao tratar sobre o tema, também se filia ao mesmo entendimento, no sentido de que a matéria de ordem pública também necessita ser prequestionada. Interessante notar que, estando diante de uma situação em que a parte opôs embargos de declaração com o objetivo de ver decidida uma matéria de ordem pública, e, ainda assim, o órgão jurisdicional não a atende, caracterizando-se a inexistência de prequestionamento, o autor propõe a seguinte solução:

Haverá omissão do órgão julgador a quo quando a questão que se pretende ver discutida é daquelas matérias que podem (rectius, devem), a qualquer tempo e grau de jurisdição (ordinária), ser examinadas, e não obstante, sobre elas ter se silenciado a instância local. Aqui têm lugar os embargos de declaração lastreados no art. 535, II, do Código de Processo Civil para que a questão seja devidamente enfrentada e decidida, mesmo que a matéria seja, por qualquer motivo, nova. [...]. De sua incorreta rejeição, segue-se também o "error in procedendo" a ser corrigido por recurso especial estribado na violação do art. 535, II, do Código de Processo Civil. [06]

Outrossim, na mesma linha defendida pelos autores mencionados, esclarecedoras são as lições de Nelson Nery Júnior e Rosa de Andrade Nery:

Trata-se de forma excepcional de recurso, não configurando terceiro ou quarto grau de jurisdição, tampouco instrumento processual para correção de injustiça. Daí não poder ser invocada, em grau de RE, a ordem pública de que se revestem algumas questões, para que possam ser apreciadas ex officio e pela primeira vez pelo STF. As questões de ordem pública devem ser decididas ex officio pelo juiz ou podem ser argüidas a qualquer tempo e grau ordinário de jurisdição (TJ, TRF, TRT ou TRE), conforme autorizam os CPC 267 § 3.º e 301 § 4º, mas não, pela primeira vez, em RE ou REsp, que são mecanismos de rejulgamento da causa (matéria), pressupondo matéria já decidida, conforme clara disposição dos CF 102, III e 105, III. [07]

No âmbito do STF, pode-se dizer que este entendimento - de que, mesmo em se tratando de matéria de ordem pública, é necessário o seu exame na instância de origem, para que se viabilize o recurso extraordinário - é o predominante. [08]

Para elucidar o tema que aqui se discute, basta imaginar um caso concreto. Uma ação de indenização por danos morais foi interposta perante a Justiça Estadual. Esta ação é julgada improcedente e transitada em julgado, de modo que a chancela do Estado-juiz foi no sentido de que o autor não tinha direito aos danos morais.

Após o trânsito em julgado, o mesmo autor tenta lograr êxito, interpondo demanda idêntica perante o órgão jurisdicional de outro Estado, também competente para o conhecimento de sua ação. Ocorre que, desta vez, o réu não foi citado, e, declarada a revelia, o processo teve seguimento, chegando até o STF ou STJ. A partir de então, o ministro relator, por sua vez, identifica o vício de citação. Diante de tal caso, pergunta-se: poderá o relator conhecer de ofício as matérias de ordem pública (nulidade de citação e coisa julgada), diante do fato de que não tenham sido prequestionadas (observe que a parte ré não teve oportunidade para alegar preliminar de coisa julgada nem tampouco a nulidade de citação)?

De se perceber que, no exemplo em jogo, caso não haja uma possibilidade de mitigação do prequestionamento, restará para a parte ré tão-somente a opção pela ação rescisória ou ainda a querela nullitatis. Observa-se, pois, que neste caso, prequestionar as matérias de ordem pública seria obviamente impossível, afinal, a parte ré não tinha sequer o conhecimento de que contra ela existia uma pretensão que fora submetida perante o Judiciário.

Nesta linha, Alexandre Freitas Câmara entende que a mitigação do prequestionamento se faz necessária, trazendo a lume dois exemplos concretos, verbis:

O prequestionamento só é dispensado nos casos em que seria impossível (assim, por exemplo, vícios contidos no próprio julgamento recorrido – e.g., decisão extra petita – ou recurso especial interposto por listisconsorte necessário que não participou do processo alegando violação do art. 47 do CPC). [09]

Diante de tal quadro, então, surge a seguinte problemática: quando se tratar de matéria de ordem pública, quais serão os limites do prequestionamento?

Percebendo a necessidade de responder esta questão, Rodolfo de Camargo Mancuso, em ilustrada lição, ensina que a admissibilidade do RE ou do REsp, quando se tratar matéria de ordem pública, mesmo que não decidida pela decisão recorrida, faz emergir um conflito entre dois pontos: a observação necessária do princípio dispositivo, que caracteriza os recursos excepcionais como de devolutividade restrita (art. 2º e 128 do CPC); e a possibilidade de conhecimento de ofício das matérias preconizadas como de ordem pública pela legislação infraconstitucional (arts. 113; 219, § 5º; 267, § 3º, do CPC). [10]

Portanto, para erradicar este conflito, surge um novo posicionamento, no sentido de ser aplicável o que Mancuso denomina de "binômio instrumentalidade do processo-efetividade da prestação jurisdicional", bem como também, a lógica disposta no § 3º do art. 515 do CPC, que permite ao tribunal, nos casos do art. 267 CPC, julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento. É dizer, conquanto não se tenha discutido as matérias de ordem pública, desnecessário seria a exigência de prequestioná-las. Vale destacar, pois, a lição do autor:

O conhecimento de ofício (=sem prequestionamento) pelo STF ou STJ de questões de ordem pública – sejam de direito material (v.g., Lei 8.078/90, arts. 1.º e 51) ou processual (CPC, art. 267, § 3.º, e 301, § 4.º) – tanto poderia ser explicado pela dimensão vertical do efeito devolutivo dos recursos como pelo seu efeito translativo. [11]

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Ora, destacando-se o efeito translativo como a base de fundamento essencial deste posicionamento, e, em função da busca de celeridade da prestação jurisdicional, é possível afirmar que este – o efeito translativo - também é bem-vindo nos recursos excepcionais?

Para relembrar, diz-se que o efeito translativo é aquele em que o tribunal está autorizado a apreciar o seguinte: matérias de ordem pública (CPC, arts. 267, § 3º, e 301, § 4º) que devem ser conhecidas de ofício e a cujo respeito não se opera a preclusão; as questões que, suscitadas e discutidas no processo, não foram julgadas por inteiro pela sentença (CPC, art. 515, § 1º); e os fundamentos do pedido e da defesa não acolhidos pelo juiz de primeiro grau (CPC, art. 515, § 2º).

Em poucas palavras, Nelson Nery Júnior e Rosa de Andrade Nery ensinam que o efeito translativo acontece "quando o sistema autoriza o tribunal a julgar fora do que consta das razões ou contra-razões do recurso, ocasião em que não se pode falar em julgamento ultra, extra, ou infra petita". [12] Outrossim, bem didática é a definição proposta por Rogério Licastro Torres de Mello, verbis:

Abalizada doutrina afirma consistir o efeito translativo dos recursos na automática transferência das questões de ordem pública ao tribunal ad quem independentemente de ter havido decisão a respeito (da matéria de ordem pública) na instância recorrida e ainda que a parte não tenha abordado tal assunto em seu recurso. [13]

Como dito alhures, especificamente na primeira transcrição do posicionamento de Nelson Nery Júnior, e, agora respondendo à pergunta antes proposta, para o autor, o efeito translativo não se manifesta no âmbito dos recursos excepcionais, porquanto o requisito do prequestionamento, estabelecido em regra constitucional, deve se sobrepairar em relação às regras infraconstitucionais dotadas do mandamento legal de que as matérias de ordem pública são cognoscíveis de ofício, verbis:

Isto porque os recursos excepcionais têm duas fases (cassação e revisão), sendo que, para a primeira delas (cassação), a CF estabelece o requisito de que a questão posta tenha sido efetivamente decidida, sem o que não caberá o recurso. Como para essa fase a fundamentação e o objeto do recurso são vinculados, não se pode aplicar o CPC 267, § 3.º, que, como é curial, cede diante da exigência da CF 102 III e 105 III. [14]

Em resumo, até este ponto, é possível inferir pela existência de duas correntes acerca da necessidade ou não do prequestionamento das matérias de ordem pública no RE e no REsp. A primeira, basicamente, estabelece que, em razão de o prequestionamento ter assento na CF, particularmente na expressão "causas decididas", este jamais poderá deixar de ser aplicado, ainda que perante as matérias revestidas de ordem pública. Já a segunda, defende que, por força do efeito translativo, e, prestigiando a instrumentalidade do processo e a efetividade da prestação jurisdicional, certamente as matérias de ordem pública devem ser conhecidas de ofício, mesmo que não tenham sido julgadas pelo órgão jurisdicional.


3. O SURGIMENTO DE UM NOVO POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL

Mas, afinal, em meio a estes dois posicionamentos, qual deverá prevalecer?

A resposta mais adequada à questão, talvez, não se repousa em nenhuma das correntes antes expostas. Isto porque o entendimento que mais se amolda e vem se mostrando mais robusto na jurisprudência, é outro, consistente no fato de que, tendo sido ultrapassado o juízo de admissibilidade do RE e (ou) do REsp, poderá o Tribunal Superior, aplicando o direito à espécie (Súmula 456 do STF), trabalhar matéria que não foi objeto de prequestionamento. Assim, diz-se que tal posicionamento seria um "meio termo" entre as duas outras correntes.

Para explicar melhor, basta entender o julgamento proferido no REsp 485.969 – SP, pela 2ª Turma do STJ [15], em especial na redação do voto proferido pela Ministra relatora Eliana Calmon.

O Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou ação civil pública em favor de uma criança, objetivando garantir a sua matrícula em creche particular enquanto não disponibilizada vaga em estabelecimento da rede pública municipal. Proferido acórdão em favor do MP-SP, concluindo, em suma, ser obrigação do Poder Público prestar atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade, o município de São Bernardo do Campo opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados, e, após, interpôs o REsp.

No âmbito dos embargos de declaração, o município embargante requereu o prequestionamento de diversas questões federais e constitucionais, dentre elas destacando-se alguns artigos da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Todavia, em nenhum momento, o embargante aflorou questão que versasse sobre a ilegitimidade do autor-recorrido (MP-SP).

A relatora para o REsp, Ministra Eliana Calmon, em seu voto, decidiu pela decretação da nulidade do processo por ilegitimidade ativa do autor. De início, pois, cabe exclamar: mas qual seriam os motivos justificadores de tal manifestação jurisdicional, uma vez que em nenhum momento do processo, sequer a matéria quanto a ilegitimidade ativa do autor foi debatida, e nem tampouco decidida? Neste caso, ausente um requisito específico de admissibilidade (prequestionamento), o REsp nem deveria ser conhecido?

Tal matéria realmente não foi objeto de presquetionamento. Mas, faz-se mister atentar que o REsp foi admitido por ofensa à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, esta sim, prequestionada, e, deste modo, a Ministra relatora acabou por não desconsiderar o rigor estabelecido pelo requisito em comento, lastreado na regra constitucional do art. 102, III da CF.

Destarte, após o conhecimento do REsp, a relatora identificou matéria de ordem pública, pela qual, no seu entender, ensejaria a nulidade do processo. Veja-se que o prequestionamento não foi ignorado. Na verdade, vencida a barreira da admissibilidade, no julgamento do mérito, aplicou-se o direito à espécie, nos ditames do verbete da Súmula 456 do STF, cujo teor é o seguinte: "O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie". Observe-se, pois, transcrições da exposição precisa da ministra Eliana Calmon a este respeito:

Preliminarmente advirto que a questão da legitimidade ativa não foi prequestionada neste especial, o que, entretanto, não impede seu exame pelo STJ, uma vez que admitido o recurso por ofensa à Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

[...]

A rigidez da observância veio a ser flexibilizada por alguns acórdãos que entendem possível adentrar-se o STJ em matéria de ordem pública de ofício se, após ser o especial conhecido, com o prequestionamento de tese jurídica pertinente, depararem-se os julgadores com uma nulidade absoluta ou com matéria de ordem pública e que pode levar à nulidade do julgamento ou a sua rescindibilidade.

[...]

Entretanto, aberta a via do conhecimento, cabe ao STJ, no julgamento meritório do especial, aplicar o direito à espécie, como preconizado está na Súmula 456 do STF, [...]. [16]

Para definir a orientação acima exposta, trazida pela 2ª Turma do STJ, é possível afirmar que as matérias de ordem pública, mesmo que não prequestionadas, podem ser objeto de análise em sede de recurso especial, desde que se tenha presente a transposição do juízo de admissibilidade.

Este entendimento, como visto, encontra-se fundamentado na Súmula 456 do STF. Quer significar a referida Súmula, que, superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito devolutivo amplo, o que implica o julgamento da causa e a aplicação do direito à espécie. Para melhor elucidar, a lição do professor Rogério Licastro Torres de Mello se mostra imprescindível:

Forte na premissa de que o processo é instrumento a serviço da realização do direito material, o entendimento sumulado em referência significa que, instaurando-se a competência jurisdicional do STJ mediante admissão do recurso especial, questões cognoscíveis de ofício e que não tenham sido decididas nas instâncias ordinárias comportarão avaliação na seara do apelo especial.

A razão de ser deste posicionamento assume lineamentos bem claros: o que se pretende é que não persistam no sistema jurisdicional situações em que o irrestrito apego aos requisitos de admissão dos recursos excepcionais possam gerar convalidação de lesão a matérias de ordem pública. [17]

Se se optar por aplicar este entendimento para o primeiro exemplo citado no início deste estudo, concernente à presença de nulidade de citação e coisa julgada em uma ação de indenização por danos morais, certamente, tais matérias de ordem pública que não foram prequestionadas, acabariam sendo apreciadas quando ultrapassada a fase do conhecimento do recurso.

Deste modo, uma vez conhecida e compreendida esta que pode ser considerada – para fins deste estudo - como uma terceira corrente acerca do tema da necessidade ou não do prequestionamento em matérias de ordem pública, faz-se possível apresentar uma resposta sobre qual a corrente deverá prevalecer diante do questionamento sugerido ao principiar este trabalho, qual seja: é possível suscitar matérias de ordem pública em sede de recurso extraordinário e recurso especial, ainda que o tema não tenha sido ventilado em instâncias inferiores, nem mesmo tenha sido objeto destes recursos excepcionais.

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Sobre o autor
Rafael Augusto Pollini

1º Tenente OCT do Exército Brasileiro; Graduado em Direito pelo UniCEUB - Centro Universitário de Brasília; Pós-graduando em Direito Processual Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

POLLINI, Rafael Augusto. O prequestionamento da matéria de ordem pública no âmbito dos recursos excepcionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3026, 14 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20200. Acesso em: 2 nov. 2024.

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