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A moralidade como condição implícita de elegibilidade

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08/11/2011 às 14:53
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O legislador originário disponibilizou suficientes meios para aferir condições morais implícitas de elegibilidade e o momento idôneo para tal aferição é quando do registro de candidatura.

RESUMO

Um dos temas mais debatidos e controversos no âmbito da Filosofia e da Teoria Geral do Direito é, sem dúvida, o relativo à Moral e ao Direito. A comunicação entre Direito e Moral, do ponto de vista material, apresenta três correntes: o Direito está contido na Moral, o Direito se comunica só em determinado ponto com a Moral e Direito e Moral são totalmente independentes. Historicamente, o Jusnaturalismo, o Positivismo e o Pós-Positivismo, correspondem a esses critérios distintivos entre Direito e Moral. A juridicização da moralidade com a sua positivação na Constituição de 1988 implica numa reflexão de sua incidência como categoria normativa no processo político, especificamente na exigência de moralidade para o exercício dos direitos políticos de sujeição passiva. A interpretação constitucional hodierna torna possível a existência de uma condição implícita de elegibilidade ou de registrabilidade pautada em critérios morais para o exercício do direito político de ser votado. Além disso, o avanço da democracia tem sido, em grande parte, num plano meramente formal. A manipulação eleitoral é a prática. A debilidade jurídico-administrativa do processo eleitoral e a influência por parte de políticos profissionais sobre eleitores reduziram o conteúdo democrático do voto, de modo que muitas vezes a população ignora ou até mesmo contesta a legitimidade dos resultados eleitorais. As estruturas de dominação mantiveram-se depois de vinte anos de Constituição ainda que o povo seja chamado às urnas obrigatória e regularmente.

A ação de pedido de registro de candidatura, bem como a ação de impugnação de registro de candidatura são arquétipos processuais idôneos para aferição do requisito da moralidade para ser candidato A moralidade, por sua vez, é requisito sine qua non para a democracia.

Palavras-chave: moralidade – registro de candidatura – condições de elegibilidade

ABSTRACT

One of the most debated and controversial within the philosophy and the General Theory of Law is, without doubt, on the Moral and the Law. Communication between law and morals, the material point of view, has three streams: the law is contained in the Moral Law is communicated only at one point and the Moral Law and Morals are completely independent. Historically, natural law, positivism and post-positivism, meet these criteria distinguishing between Law and Morality. The juridicização of morality with their affirmation in the Constitution of 1988 implies a reflection of its scope and category of rules in the political process, specifically the requirement of morality for the exercise of political rights of passive submission. The present-day constitutional interpretation makes possible the existence of an implied condition of eligibility or to record guided by moral criteria for the exercise of political right to be voted. Moreover, the advance of democracy has been largely in the purely formal. The electoral manipulation is the practice. The legal and administrative weakness of the electoral process and influence by political professionals on voters reduced the democratic content of the vote, so that the public often ignores or even denies the legitimacy of the election results. The structures of domination remained after twenty years under the Constitution even if the people be called to the polls and regularly required.

The action of an application for registration application, and the suit challenging the registration application archetypes are suitable procedure for measuring the condition of morality to be a candidate Morality, in turn, is a requirement sine qua non for democracy.

Key words: morality - Registration of candidates - conditions of eligibility


INTRODUÇÃO

"Ubi societas ibi jus" é, via de regra, o primeiro brocado latino apresentado aos alunos de direito. Partindo deste pressuposto deve-se considerar que há diferentes formas de Direito já que há diferentes formas de organizações sociais. Umas mais, outras menos eqüitativas. Durante os cinco anos de academia vê-se que é possível entender a Constituição como norteadora de uma trajetória política democratizante, carregada de sentido principiológico e que induz a uma sociedade cada vez mais justa como um todo (Hesse). Por outro lado, a Constituição pode não passar de um amontoado de papel (Lassalle), valores programáticos nunca aplicados e o que é pior, apreende-se como é possível que num Estado democrático de Direito como o Brasil depois de vinte anos de Carta Republicana haja normas existentes, válidas, mas absolutamente ineficazes.

O art. 37 deveria servir de ponto de partida para a construção da moralidade como princípio constitucional, já que é ela, a moralidade administrativa, preconizada como um dos princípios fundamentais de toda atividade estatal. Prova disso é a necessidade de demonstração de idoneidade moral ou reputação ilibada para ocupar os cargos de ministro do Tribunal de Contas, art. 73; do Supremo Tribunal Federal, art. 101; do Superior Tribunal de Justiça, art. 104; do Superior Tribunal Eleitoral, art. 109; do Tribunal Regional Eleitoral, art. 120 e da exigência de idoneidade moral para requerer a naturalidade brasileira art. 12 e por fim a proibição de reeleição por violação à moralidade art. 14.

Neste trabalho faz-se uma breve incursão no interminável debate em torno da Moral e do Direito (capítulo primeiro), percorrendo varias escolas do conhecimento jurídico ocidental, maiormente nas obras de Jean-Jacques Rousseau, Max Weber, Habermas, Hans Kelsen e Emanuel Kant, e percebe-se que é possível comparar a superação do pensamento medieval escolástico, após as barbaridades cometidas durante a santa inquisição, dando lugar ao iluminismo e ao renascimento com a decadência do pensamento jus positivista de Kelsen, panorama das atrocidades nazi-fascistas, dando lugar ao pós-positivismo. Páginas negras da historia da humanidade, onde o Direito estivera acima da moral, já que o poder centralizara-se a tal ponto que prescindira da legitimidade que a moral lhe confere e adotara características dogmáticas, bem pela imposição da vontade divina como dissera o Vaticano no medievo, bem por ser imposto por um ordenamento desvinculado das ciências humanas como dissera Kelsen durante o holocausto. Exemplo desse poder intransponível e absoluto é a passagem no clássico "El ingenioso hidalgo Don Quijote de la Mancha", de Miguel de Cervantes quando, no capítulo IX da segunda parte do livro e para total espanto de seu fiel escudeiro Sancho Panza, retrocede ante um desafio e submisso o até então intrépido Don Quixote constata: "con la iglesia hemos dado, Sancho", "topamos com a Igreja, Sancho".

Vive-se, no Brasil, um momento de asseveração quanto a imediata aplicabilidade dos princípios constitucionais por parte de juristas comprometidos com a democracia em aguerrida luta pela decência no maculado panorama político nacional. O mínimo ético necessário para uma convivência pacífica no seio da sociedade decai. A escalada da violência é assustadora, vivemos em estado de guerrilha. Repetidos escândalos envolvendo parlamentares, fazem que a população perca a esperança na justiça. Nas eleições de 2008 o tema abordado no Capítulo II – A Moralidade Como Condição Implícita de Elegibilidade percorreu os tribunais até as supremas cortes sem que a sociedade restasse conformada.

Eis aqui mais um intento de trazer a moralidade à vida pública brasileira sem a necessidade de que aconteça uma tão desejada reforma político-administrativa. Desta volta, valendo-se do ordenamento jurídico pátrio existente e sua melhor interpretação demonstramos no terceiro capítulo que se intitula: O PROCESSO ELEITORAL E A INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO NO CONTROLE DA MORALIDADE COMO CONDIÇÃO IMPLÍCITA DE ELEGIBILIDADE, como existem hoje ferramentas jurídicas hábeis ao controle jurisdicional da moral administrativa.

Por fim e a título de lição paradigmática, salientamos que outros países próximos a nós, tanto em características históricas quanto sócio-econômicas, convivem democraticamente, sem ameaças à presunção da inocência, com ferramentas jurídicas que, mesmo antes de haver trânsito em julgado de sentença condenatória, impossibilitam o registro de candidatura de certos cidadãos cujo perfil é considerado lesivo ao interesse público (anexa legislação alienígena).


CAPÍTULO I – MORAL E DIREITO

Um dos temas mais debatidos e controversos no âmbito da Filosofia e da Teoria Geral do Direito é, sem dúvida, o relativo à Moral e ao Direito. Nesta seara, parece campear a subjetividade que acaba por afastar o consenso. Entretanto há outros pontos de vista. Nas justificativas da Crítica da Razão Pura (1781), Kant faz a defesa da crítica enquanto faculdade da razão, e define o Iluminismo como uma época de contestação dos valores e das instituições. Constata que naqueles tempos "a religião, por sua santidade e a legislação, pela sua majestade", queriam escapar de qualquer apreciação crítica racional; e considera que exatamente por quererem essa isenção é que levantavam contra elas "justificadas suspeitas". Finalmente, termina esse seu raciocínio considerando que justamente por este privilégio forçado é que a religião e a legislação não podiam, em seu tempo, "aspirar ao sincero respeito", pois este "a razão só concede a quem pode sustentar o seu livre e público exame."

Porém, o presente Capítulo, longe de pretender esgotar o assunto, tem o desiderato de expor, superficialmente, as principais discussões que se travam e travaram sobre a matéria, no fito de iluminar a reflexão aqui pretendida, se utilizando ainda das lentes da nova interpretação constitucional, tão atual e pertinente para a Ciência do Direito, que parece reaproximar as valorações éticas do Direito, o que leva a crer que em tal debate o subjetivismo não ocupa tanto espaço como se imagina.

Moral e Direito, por serem normas de comportamento, tem uma comum base ética, por isso, a problemática da distinção entre uma e outra é velha questão doutrinária, como assevera Maria Helena Diniz [01], chegando o jurista Jhering [02], como referenciou Cabral de Moncada [03], a se referir à questão como o cabo Horn ou cabo das tormentas da ciência jurídica, e para Croce o cabo dos naufrágios.

Desta forma serão identificadas algumas correntes filosóficas que arrojam luz ao assunto, dando-se maior ênfase ao pensamento dos filósofos Jean-Jecques Rousseau, Max Weber e, finalmente, Habermas, no intuito de conhecer os fundamentos da Moral positivada na Constituição de 1988, enquanto suas aplicações na seara do Direito Eleitoral, e do seu uso como referência nas hipóteses de se auferir ou não condições de elegibilidade quando do registro de candidatura.

1.Jean-Jacques Rousseau

Um dos maiores filósofos do século XVIII foi sem dúvida Jean-Jacques Rousseau, que desenha um conceito de Estado e de Sociedade Civil a partir de um contrato social. Em estado de natureza ou de condição natural, na verdade, uma condição pré-social, os indivíduos vivem isolados pelas florestas, sobrevivendo com o que a natureza lhes dá, desconhecendo lutas e comunicando-se pelo gesto, o grito e o canto, numa língua generosa e benevolente. Esse estado de felicidade original, no qual os humanos existem na condição de bom selvagem inocente, termina quando alguém cerca um terreno e diz: "É meu". A divisão entre o meu e o teu, isto é, o surgimento da propriedade privada, dá origem ao estado de sociedade, no qual prevalece a guerra de todos contra todos.

O estado de sociedade de Rousseau evidencia uma percepção do social como luta ente fracos e fortes, vigorando o poder da força ou a vontade do mais forte. Para fazer cessar esse estado de vida ameaçador e ameaçado os humanos decidem passar à civitas ou à sociedade civil, isto é, ao estado civil, criando o poder político e as leis.

A passagem do estado de sociedade ao estado civil ou à sociedade civil se dá por meio de um pacto social ou contrato social, pelo qual os indivíduos concordam em renunciar à liberdade natural e à posse natural de bens e armas e em transferir a um terceiro – o soberano – o poder para criar e aplicar as leis, usar da força, declarar a guerra e a paz. O contrato social funda a soberania e institui a autoridade política. É instituído, portanto, o estado civil, que deve por um fim às lutas mortais do estado de sociedade [04].

Para Rousseau, o soberano é o povo, entendido como vontade geral, pessoa moral coletiva livre e corpo político de cidadãos. Os indivíduos, pelo contrato, criaram-se a si mesmos como povo e é a este que transferem os direitos naturais para que sejam transformados em direitos civis. Assim sendo, o governante não é o soberano, mas o representante da soberania popular. Os indivíduos aceitam perder a liberdade natural de bens. Assim sendo criam a soberania e nela se fazem representar, são cidadãos. Enquanto se submetem às leis e à autoridade do governante que os representa, chamam-se súditos. São, pois, cidadãos do Estado e súditos das leis.

Em suas próprias palavras [05]:

O que o homem perde através do contrato social é sua liberdade natural e um direito ilimitado a tudo o que o tente e possa conseguir; o que ele ganha é a liberdade civil e a propriedade de tudo o que possui. Para não se enganar nessas compensações, é preciso, na verdade, distinguir a liberdade natural, que tem como únicos limites as forças do indivíduo, da liberdade civil que é limitada pela vontade geral, [...].

Da mesma forma, Rousseau não deixa olvidar que o contrato social deve estar sendo constantemente renovado. Para que sua validade transcorra ao longo do tempo determinadas situações são necessárias, tais como: o sentimento de pertencimento, uma determinada homogeneidade dos indivíduos para que estes compartilhem objetivos. Na falta de tais pré-requisitos rompe-se o pacto e só possível a manutenção do direito do mais forte absolutamente desvencilhado de qualquer virtude "A força é um poder físico, não vejo que moralidade deveria resultar de seus efeitos. Ceder à força é uma manifestação de necessidade, não de vontade: quando muito um ato de prudência. [...]. Convenhamos portanto, que a força não fundamenta o direito e que só somos obrigados a obedecer aos poderes legítimos." [06].

Sob a ótica do contratualismo de Rousseau a imposição da força não só rompe o contrato, mas avilta a sociedade.

Sendo o cerne do trabalho a análise da moralidade como condição implícita de elegibilidade, vê-se a priori, que a sociedade brasileira não tem os efeitos esperados do contrato social. Máxime desta afirmação é Alagoas onde os níveis de marginalidade e corrupção desembocam no quadro de violência insustentável que vivemos, onde a única proposta feita pelos políticos eleitos é a do uso da força o aumento de efetivos policiais e aquisição de mais armas. Nota-se, portanto, um completo abandono da moral.

Podemos tomar como exemplo a atualidade brasileira, mais especificamente Alagoas, onde a marginalidade e a criminalidade são a tônica, sinal de que a moral é necessária para a estruturação desta sociedade que decide "contratar", pois compartilha metas perdeu-se por completo.

2.Max Weber

Max Weber interpreta as ordens estatais das sociedades ocidentais modernas como desdobramentos da "dominação legal". Porque a sua legitimidade depende da fé na legalidade do exercício do poder. Segundo ele, a dominação legal adquire um caráter racional, pois a fé na legalidade das ordens prescritas e na competência dos que foram chamados a exercer o poder não se confunde simplesmente com a fé na tradição ou no carisma, uma vez que ela tem a ver com a racionalidade que habita na forma do direito e que legitima o poder exercido nas formas legais. Max Weber introduz um conceito positivista do direito, segundo o qual direito é aquilo que o legislador, democraticamente eleito ou não, estabelece como tal, seguindo um processo institucionalizado juridicamente sob esta premissa, a força legitimadora da forma jurídica não deriva de um possível parentesco com a moral.

Isso significa que o direito moderno tem que legitimar o poder exercido conforme o direito, apoiando-se exclusivamente em qualidades formais próprias, destarte, o direito dispõe de uma racionalidade própria, que não depende da moral.

A confusão entre moral e direito pode supor um risco à racionalidade da ciência jurídica e por extensão a legitimidade da dominação legal. Ele não faz distinção entre valores que, no interior de determinadas tradições e formas culturais de vida, se recomendam como mais importantes que outros valores, e a validade deontológica de normas que obrigam indistintamente todos os destinatários. Ele não introduz uma fronteira entre os variados conteúdos valorativos concorrentes e o aspecto formal da obrigatoriedade ou validade de normas, a qual não varia com o conteúdo das normas. Resumindo, ele não levou a sério o formalismo ético.

Isso se depreende do modo como Weber interpreta o moderno direito racional, que ele contrapõe ao "direito formal" positivado. Ele pensa "que não pode haver um direito natural puramente formal", pois "A natureza e a razão são a medida material para aquilo que é legítimo" [07].

Uma das características mais importantes de uma forma de dominação fundada na crença da legitimidade da ordem jurídica e política é o seu caráter impessoal, uma vez que a obediência não está ligada àquele que detém o poder, mas é condicionada unicamente pelo conteúdo obrigatório do direito. Outro aspecto importante é o caráter objetivo das competências juridicamente delimitadas. A dominação legal tem ainda duas características particulares: a burocratização da direção administrativa e a preeminência da ordem jurídica estatal.

O fundamento da legitimidade de uma ordem estatal não poderia escapar à decisão, momento especificamente político. A concepção weberiana de dominação racional decorre da relação de força com os interesses complexos e com as ações destinadas a dar forma a tais interesses e a lhes promover. Em razão desse ponto de partida, o que importa, antes de tudo, é mostrar que a dominação é diferente dos princípios de legitimação que a lei reivindica, mas não se trata de uma discussão sobre a justiça ou injustiça de uma determinada construção política. Para Weber cabe a visualização do problema da legitimidade, como meio de estabilização e racionalização da disputa do poder, e também como fim a ser perseguido por qualquer tipo de dominação. Desta forma explicar-se-ia o fato de grupos políticos de tão variado cariz revezarem-se no poder sem que para isso haja necessidade de alterações substanciais no ordenamento jurídico.

3.Habermas

As análises de temas éticos e morais ocupam um lugar central no pensamento de Jürgen Habermas, que vem exercendo significativa influência entre teóricos e profissionais das Ciências Humanas. Habermas sobressai como um dos grandes defensores do projeto moderno. Para ele, os grandes trunfos da modernidade são; a idéia de racionalidade, de controle do homem sobre seu futuro e de possibilidade de construção de um projeto universal de liberdade, idéias-força que o homem ainda não deve abandonar. Ele pretende, em diálogo permanente com a problemática pós-moderna, sustentar a atualidade de um projeto moderno renovado, atento a seu tempo e aos desafios que o mundo apresenta.

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Dentre sua obra destacam-se, como de grande importância para o presente estudo, as aulas conferidas em Salt Lake City, EUA, em 1986 intituladas "The Tanner Lectures on Human Values". Ele começa questionando sobre a possibilidade de que o Direito se legitime pela legalidade, ou seja, pela positivação das normas. Temos em análise a primeira fase de Habermas fazendo críticas a pontos de vista de Max Weber no que toca o direito e a moral, a racionalidade jurídica e fatos que envolvem legitimidade e legalidade da norma jurídica [08].

Assim conclui que Weber estaria equivocado. A legitimidade da legalidade não pode ser explicada a partir de uma racionalidade autônoma inserida na forma jurídica isenta de moral. Acredita que o direito materializado possui qualidades formais das quais se deduz, pelo caminho da analogia, argumentos legitimadores. Ao contrário, a mudança da forma do direito exige uma radicalização da questão weberiana acerca da racionalidade que habita o médium do direito. Pois, o direito formal e o não formal constituem variantes diferentes nas quais se manifesta o mesmo direito positivo.

O "formalismo" do direito, que é comum a esses dois tipos especiais de direito, tem que estar situado num nível mais abstrato e se as qualidades formais do direito são encontráveis na dimensão dos processos referendados juridicamente, e se esses processos regulam discursos jurídicos que são suscetíveis a argumentações morais pode-se concluir que a legitimidade pode ser obtida através da legalidade sempre que os processos para produção de normas jurídicas sejam racionais no sentido de uma lógica prático-moral formal. A questão da qualidade formal das leis, sua forma clássica de lei abstrata e geral não legitima um poder exercido em tais formas pelo simples fato de esse poder preencher certas exigências funcionais para a busca autônoma, privada e racional, de interesses próprios [09].

Desta maneira se institucionalizam discursos jurídicos que operam nos limites exteriores do processo jurídico e sob as limitações da produção argumentativa de bons argumentos. O direito constitucional revela que muitos desses princípios possuem uma dupla natureza, a moral e a jurídica. Os princípios morais de direito natural transformaram-se em direito positivo nos modernos Estados Constitucionais. É assim como a lógica da argumentação permite ver que os caminhos de fundamentação, institucionalizados através de processos jurídicos, continuam abertos aos discursos morais [10].

Neste ponto, a referência às teorias procedimentais da moral e do direito visa apenas esclarecer por que os limites entre o direito e a moral não podem ser estabelecidos unicamente com o auxílio dos conceitos "formal" e "material". As considerações que tecemos levam, ao invés disso, à conclusão de que a legitimidade da legalidade não pode ser explicada a partir de uma racionalidade autônoma inserida na forma jurídica isenta de moral; ela resulta, ao invés disso, de uma relação interna entre o direito e a moral.

4.Comunicação e Critérios Distintivos

Classicamente, do ponto de vista material, identificam-se três teorias que fazem a devida distinção ou comunicação entre Direito e Moral e que são didaticamente representadas por círculos, ora concêntricos – Teoria do Mínimo Ético –, ora secantes – Teoria dos Círculos Secantes –, e ainda independentes, onde Direito e Moral estão desvinculados – Teoria dos Círculos Independentes.

Exposta pelo filósofo inglês Jeremias Bentham e posteriormente desenvolvida pelo jurista alemão Georg Jellinek, a teoria postula que o Direito representa apenas o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver.

O jusfilósofo Miguel Reale [11] comenta que a teoria do mínimo ético versa em dizer que o direito representa apenas o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. "Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre". Nesta concepção, o Direito não se distingue da Moral, pois é uma parte desta, munido de garantias específicas (IBDEM). Tal teoria pode ser vislumbrada pela imagem de dois círculos concêntricos, sendo o círculo maior o da Moral, e o círculo menor o do Direito. Haveria, portanto, um campo de ação comum a ambos, sendo o Direito envolvido pela Moral. Segundo o doutrinador, de acordo com essa imagem, "tudo o que é jurídico é moral, mas nem tudo o que é moral é jurídico" [12].

Porém, a crítica que se faz a tal teoria parte do princípio de que o Direito, protege muita coisa que é imoral, e muito embora, os homens se esforcem para que seja tutelado pelo Direito somente o "lícito moral", um resquício de imoralidade é por ele sempre protegido [13].

A segunda concepção é representada por círculos independentes um do outro tendo em vista que a validade das normas jurídicas não tem a ver com as regras morais. O maior expoente desta concepção é Hans Kelsen, que na esteira de inspiração da filosofia positivista de Augusto Comte, pretendeu elaborar uma teoria jurídica que descrevia tão somente as prescrições do direito positivo. Para o autor, o Direito é o direito positivo, não sofrendo influencia das normas morais, da filosofia, da sociologia. Bem assim Max Weber considera que a lei se legitima por ela mesma.

4.A Visão de Hans Kelsen e Emanuel Kant

Antes de prosseguir nesta exposição surge a necessidade de abrir um pequeno parêntese para melhor elucidar a concepção Kelseniana da diferenciação entre Moral e Direito, e conseqüentemente trazer a baila, na oportunidade, o contraste da filosofia de Emanuel Kant acerca do tema.

Hans Kelsen, ao tratar do Direito e da Moral os concebe em planos totalmente distintos e separados alertando para a necessária distinção entre ambos para não gerar qualquer prejuízo na compreensão da ciência jurídica. Parte do pressuposto da existência de normas jurídicas que regulam a vida social, e de normas morais que também são normas sociais [14].

Contudo, Kelsen, iconoclasta do positivismo, cogita a possibilidade do Direito ser moral, mas não necessariamente. Para distingui-lo da moral, afirma que não existe uma "moral absoluta", mas vários sistemas "fechados" de moralidade, os quais variam conforme o tempo e o espaço, de forma que a moral existe no Direito, podendo ou não com ele se confundir. O autor ainda procura separar radicalmente os planos, fundamentando no fato de que embora ambos possuam a mesma fonte de criação (costume), o Direito se destaca pela coercibilidade, característica praticamente invisível no âmbito da moralidade. Pelo exposto, percebe-se que Kelsen não leva em conta a moralidade da lei e nem considera, como tal, qualquer norma desprovida de sanção.

Salienta-se que Kelsen, sustenta a distinção entre Direito e Moral a partir do pensamento de Emanuel Kant, que concebe o Direito e a Moral estariam em dimensões categoricamente apartadas. Adepto da filosofia Racionalista, Kant assinala que é inimaginável, pensar nada no mundo, e em geral também nada fora dele que possa ser considerado como absolutamente bom sem restrições, a não ser talvez uma boa vontade, conforme Norberto Bobbio [15].

Também de acordo com Bobbio, Kant concebe "boa vontade" como aquela vontade direcionada ao cumprimento e respeito ao dever. Desta feita, uma ação moral, para Kant, seria uma ação que estivesse coerente com o dever e que fosse cumprida pelo dever. Assim, tem-se por moralidade, quando a ação é cumprida pelo dever, e por legalidade, quando a ação é cumprida em conformidade com o dever.

Kant, apud Bobbio [16] enfatiza que:

A lei que assenta uma ação como dever, e o dever simultaneamente como impulso, é moral. Aquela, em sentido oposto, que não compreende esta última qualidade na lei, e que, portanto, acolhe também um impulso díspar da opinião do próprio dever, é jurídica. [...] O imaculado acordo ou desacordo de uma ação com relação à lei, sem veneração alguma ao impulso da mesma, chama-se legalidade (em consonância com a lei) quando, ao invés, a opinião do dever procedente da lei é simultaneamente impulso para a ação, temos a moralidade.

O critério distintivo entre Direito e Moral na visão Kantiana é meramente formal por considerar somente a maneira de obrigar-se a uma ação, outro é o critério para diferençar moralidade da legalidade, aludindo que a mesma é derivação da diferença entre os imperativos categóricos e imperativos hipotéticos (comandos categóricos ou morais e comandos hipotéticos ou legais).

Para Kant, uma lei moral universal vale para todas as pessoas, em todas as sociedades, em qualquer época. Essa lei preceituaria a conduta para todas as ocasiões, o que identifica como um imperativo categórico. Imperativo, porque é uma ordem inevitável, e categórico, porque valeria para todas as circunstâncias. Reza uma das fórmulas do imperativo categórico de Kant: "devemos sempre agir de modo a podermos desejar que a regra a partir da qual agimos transforme-se em lei geral". Este imperativo categórico corresponderia a um dever, pois o dever contém em si uma boa vontade.

Hans Kelsen avalia o imperativo categórico de Kant como uma expressão vazia de Justiça, finalizando que uma ordem jurídica só pode ser legítima quando não considerar princípios morais. Entretanto, a construção da moral vigente não nasce espontaneamente em uma sociedade. Na verdade, ela é produto da vontade humana dirigida para tal fim. Nesse sentido, regras morais diferem das regras jurídicas. Para o autor, neste diapasão, se cada pessoa pudesse agir apenas de acordo com os seus pressupostos morais, teríamos o caos. Nesse interregno, entraria a função do Direito: normatizar a moral dominante, para a estabilidade social.

5.Direito e Moral: Categorias Distintas, mas implexos entre si

Num terceiro momento, visualizou-se a distinção entre Direito e Moral sem, no entanto separa-los totalmente, pois há um ponto em comum entre ambos, isto é, um ponto em que há competência para atuação tanto de um quanto de outro, mas deverá haver uma área independente e reservada a cada um, pois existem momentos que um não pode interferir na esfera de atribuições do outro. É a Teoria dos Círculos Secantes em que dois círculos se cruzam apenas em determinado ponto. Habermas [17] considera que: "somente se levarmos em conta a racionalidade que habita o próprio direito, poderemos assegurar a independência do sistema jurídico. No entanto, como o direito também se relaciona internamente com a política e com a moral, a racionalidade do direito não pode ser questão exclusiva do direito."

Miguel Reale [18] contrastando as duas teorias descritas acima, comenta:

Há, pois, que distinguir um campo de Direito que, se não é imoral, é pelo menos amoral, o que induz a representar o Direito e a Moral como dois círculos secantes. Podemos dizer que dessas duas representações – de dois círculos concêntricos e de dois círculos secantes, – a primeira corresponde à concepção ideal, e a segunda , à concepção real, das relações entre o Direito e a Moral.

No aspecto formal, os critérios classicamente utilizados para distinguir-se Moral e Direito são: a) o caráter bilateral do Direito e unilateral da Moral; b) o caráter interno das normas morais e caráter externo das normas jurídicas; c) a autonomia caracterizante da Moral e a heteronomia caracterizante do Direito; e d) a coercibilidade do Direito e a incoercibilidade da Moral.

A unilateralidade da moral e a bilateralidade do Direito são concebidas por Giorgio Del Vecchio [19]. A primeira se baseia no seu efeito regulador, que só diz respeito ao próprio agente. Na segunda, a conduta do sujeito é sempre tomada em relação aos outros. Em outros termos, o Direito, ao mesmo tempo em que concede direitos, impõe obrigações (bilateralidade); a moral, por sua vez, espera tão somente a obediência as suas regras, impondo somente deveres (unilateralidade).

Miguel Reale [20], no tocante a bilateralidade do Direito, acrescenta que ela é atributiva:

Pelos estudos que temos desenvolvido sobre a matéria pensamos que há bilateralidade atributiva quando duas ou mais pessoas se relacionam segundo uma proporção objetiva que as autoriza a pretender ou a fazer garantidamente algo. Quando um fato social apresenta esse tipo de relacionamento dizemos que ele é jurídico. Onde não existe proporção no pretender, no exigir ou no fazer não há Direito, como inexiste este se não houver garantia específica para tais atos. [...] Bilateralidade atributiva é, pois, uma proporção intersubjetiva, em função da qual os sujeitos de uma relação ficam autorizados a pretender, exigir, ou a fazer, garantidamente, algo.

O caráter externo do Direito é visto quando se percebe que são nas atitudes externas dos indivíduos que se concentra sua atuação. O Direito não pode punir o pensamento, porém a consciência é levada em consideração quando se examina a conduta. Com a moral ocorre diametralmente o oposto, pois o seu raio de atuação é justamente a consciência individual, no fito de não permitir que condutas não aceitáveis cheguem a serem externalizadas, e quando forem, deverá ser objeto de análise somente para se aferir a intenção do indivíduo. Vale dizer que esse critério não atingiria a moral social. Assim, imperioso reconhecer que tanto a conduta exterior é suscetível de ser objeto de valoração moral, como a interior pode ser objeto de valoração jurídica. Não existe, pois, um único domínio da conduta humana, quer interior, quer exterior, que não seja suscetível de ser ao mesmo tempo objeto de apreciações morais e jurídicas. Anota Radbruch [21] que

[...] aquilo que em princípio parece ser uma distinção de objeto entre a moral e o direito pode manter-se ainda, mais simplesmente como uma distinção entre duas direções opostas dos seus respectivos interesses. Isto é: a conduta exterior só interessa à moral na medida em que exprime uma conduta interior; a conduta interior só interessa ao direito na medida em que anuncia ou deixa esperar uma conduta exterior.

Há no Direito um caráter de ‘alheiedade’ do indivíduo, com relação à regra. Miguel Reale [22] diz, então, que o Direito é heterônomo, visto ser posto por terceiros, aquilo que juridicamente somos obrigados a cumprir. Na Moral o acatamento às regras se dá de forma autônoma e espontânea, cabendo ao indivíduo optar por aceitá-las ou não.

Da autonomia da Moral e da heteronomia do Direito, se extrai outra característica distintiva – a coerção –, considerada uma diferença básica, que pode ser mais bem indicada com esta expressão: a Moral é incoercível e o Direito é coercível. O que distingue o Direito da Moral, portanto, é a coercibilidade. Coercibilidade é uma expressão técnica que serve para mostrar a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a força. Bem observa Giorgio Del Vecchio [23], ao ressaltar que onde a coercibilidade faltar, faltará o Direito. O Direito é sempre a determinação de uma relação entre várias pessoas, correspondendo a uma delas a exigibilidade e, portanto, também a coercibilidade. Lógica e realmente, são inseparáveis os conceitos de direito e de coercibilidade.

Destas ilações, Miguel Reale [24] apresenta sua conclusão:

Direito é a realização ordenada e garantida do bem comum numa estrutura tridimensional bilateral atributiva, ou, de forma analítica: Direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos segundo valores. [E], ultimamente, pondo em realce a idéia de justiça, temos apresentado, em complemento às duas noções supra da natureza lógico-descritiva, esta outra de caráter mais ético: Direito é a concretização da idéia de justiça na pluridiversidade de seu dever ser histórico, tendo a pessoa como fonte de todos os valores.

É oportuno remeter ao que asseverou o renomado jurista Tércio Sampaio Ferraz Júnior [25] acerca desta discussão,

[...] independentemente do consentimento subjetivo individual, ambas são elementos inextirpáveis da convivência, pois se não há sociedade sem direito (ubi societas ibi jus) também não há sociedade sem mora. Não obstante, as mesmas (normas jurídicas e morais) não se confundem, e marcar a diferença entre elas é uma das grandes dificuldades da filosofia do direito, como o foi para os supracitados filósofos.

A exposição teórica acerca da comunicação entre Direito e Moral, é considerada por muitos como simples palavrório irrelevante por não chegar a lugar algum, porém, quando aplicada numa análise que remeta a sua relação com as principais correntes filosóficas que orientaram o Direito na história, sua pertinência é devidamente identificada, como se verá no tópico a seguir.

6.Direito e Moral na História: Jusnaturalismo, Positivismo e Pós-Positivismo

A maior parte da tradição do pensamento jurídico ocidental é marcada pela distinção entre o direito natural e o direito positivo e a superposição de um sobre o outro no transcurso da história, ora predominando corrente filosófica do Jusnaturalismo que aglutina os pensadores clássicos, escolásticos, iluministas e contratualistas, ora predominando a do Positivismo.

No pensamento clássico esta diferenciação foi estabelecida por Aristóteles, como se observa no início do capítulo VII do livro V da sua Ética à Nicômaco:

Da justiça civil uma parte é de origem natural, outra se funda na lei. Natural é aquela justiça que mantém em toda a parte o mesmo efeito e não existe em razão de pensarem os homens deste ou daquele modo, legal é aquela que não importa se suas origens são estas ou aquelas, mas sim como é, uma vez sancionada [26].

Para o filósofo grego o direito natural é aquele em toda parte tem a mesma eficácia, enquanto que o direito positivo tem eficácia apenas nas comunidades políticas singulares em que é posto. O direito natural, na lição de Bobbio [27], também prescreve ações cujo valor não depende do juízo que sobre elas tenha o sujeito, mas existe independentemente do fato de parecerem boas ou más, uma vez reguladas pela lei, devem ser desempenhadas nos conformes de sua prescrição.

A distinção mais famosa entre direito natural e direito positivo no pensamento moderno é a de Hugo Grócio, segundo este autor [28], que liberta o Jusnaturalismo da visão teológica da escolástica para centrá-lo na razão conceituando-lo como um ditame da justa razão destinado a mostrar que um ato é moralmente torpe ou moralmente necessário segundo seja ou não conforme a própria natureza racional do homem, e a mostrar que tal ato é, em conseqüência disto, vetado ou comandado por Deus, enquanto autor da natureza.

Em resumo, a Escola do Direito natural fundamenta-se na concepção de que existe uma categoria de normas sólidas, inquestionáveis, presumíveis, inerentes à natureza do homem e das coisas, uma idéia superior de Justiça, anterior ao surgimento da ordem jurídico-positiva estatal, proveniente seja da vontade divina, seja da razão, podendo (e devendo) servir de inspiração para a criação das leis do Estado, sob pena de surgirem eivadas de ausência de legitimidade ou ferindo disposições inatas.

O professor Luis Roberto Barroso [29] assim conceitua:

O termo jusnaturalismo identifica uma das principais correntes filosóficas que tem acompanhado o Direito ao longo dos séculos, fundada na existência de um direito natural. Sua idéia básica consiste no reconhecimento de que há, na sociedade, um conjunto de valores e de pretensões humanas legítimas que não decorrem de uma norma jurídica emanada do Estado, isto é, independem do direito positivo. Esse direito natural tem validade em si, legitimado por uma ética superior, e estabelece limites à própria norma estatal.

Desta forma, sob as lentes do Jusnaturalismo, a moral é um dos valores que se sobrepõe e fundamenta o direito posto, devendo inspirá-lo, em outras palavras, o Direito está contido na Moral.

A mudança do paradigma jusnaturalista para o positivista confunde-se historicamente com a formação do Estado moderno a partir da dissolução da sociedade medieval. A monopolização da produção jurídica por parte do Estado faz com que o direito positivo e o direito natural ganhem outro sentido. O positivismo jurídico exclui o direito natural da categoria de direito e reduz todo o direito ao direito positivo com as codificações no final do século XVIII e início do século XIX, através das quais o direito natural foi totalmente absorvido pelo direito estatal, como destacou Norberto Bobbio [30]. É a proclamação histórica do início do divórcio entre Direito e Moral causado pela distância que se operou entre filosofia e ciências jurídicas. Ana Paula Barcellos [31] assim comenta:

Em fins do século XVIII e início do século XIX, com a instalação do Estado Liberal e todo o seu aparato jurídico (constituição escrita, igualdade formal, princípio da legalidade etc.), o direito natural conheceria seu momento áureo na história moderna do direito. As idéias desenvolvidas no âmbito da filosofia ocidental haviam se incorporado de uma forma sem precedentes à realidade jurídica. Talvez por isso mesmo, tendo absorvido os elementos propostos pela reflexão filosófica, o direito haja presumido demais de si mesmo, considerando que podia agora prescindir dela. De fato, curiosamente, a seqüência histórica reservaria para o pensamento jusfilosófico não apenas um novo nome – filosofia do direito – como também mais de um século de ostracismo.

A partir da superação histórica do jusnaturalismo, com o advento da promulgação dos códigos, incorporando de forma generalizada o direito natural aos ordenamentos positivos, o positivismo tornou-se a filosofia dos juristas. O direito positivado passou a ser acreditado como única forma legítima de se fazer justiça.

No início do século XX, a corrente juspositivista chega ao ápice de sua formulação teórica, especialmente com a publicação da Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen em 1934, considerada o divisor de águas no estudo do direito, ao buscar a afirmação do caráter científico do Direito a partir de uma análise interna do fenômeno jurídico. A purificação da ciência do direito implica em separar o conhecimento jurídico do direito natural, da metafísica, da moral, da ideologia e da política, assim comenta o autor:

A necessidade de distinguir o Direito da Moral e a ciência jurídica da Ética significa que, do ponto de vista de um conhecimento científico do Direito positivo, a legitimação deste por uma ordem moral distinta da ordem jurídica é irrelevante, pois a ciência jurídica não tem de aprovar ou desaprovar o seu objeto, mas apenas tem de o conhecer e descrever. [...] a tarefa da ciência jurídica não é de forma alguma uma valoração ou apreciação do seu objeto, mas uma descrição do mesmo alheia a valores (wertfreie) [32].

No modelo kelseniano, "a ciência jurídica, porém, apenas pode descrever o direito; ela não pode, como o Direito produzido pela autoridade jurídica (através de normas gerais ou individuais), prescrever seja o que for" [33].

Dizer que "se a ordem moral não prescreve a obediência à ordem jurídica em todas as circunstâncias e, portanto, existe a possibilidade de uma contradição entre a Moral e a ordem jurídica [...]" [34], o que não retira a validade da norma jurídica, mesmo contrariando a ordem moral, pois uma ordem social imoral, porém legal, é aceita pela Teoria Pura [35]: "[...] uma ordem jurídica ou certas das suas normas que, ao tempo em que entraram em vigor, poderiam ter correspondido às exigências morais de então, hoje podem ser condenadas como profundamente imorais" [36].

Por fim, Kelsen [37] diz: "Com efeito, a ciência jurídica não tem de legitimar o Direito, não tem por forma alguma de justificar – quer através de uma Moral absoluta, quer através de uma Moral relativa – a ordem normativa que lhe compete – tão-somente – conhecer e descrever".

Após a ascendência do Positivismo jurídico de matriz kelseniana sua decadência é constatada, conforme a análise de Luís Roberto Barroso [38]:

O positivismo pretendeu ser uma teoria do Direito, na qual o estudioso assumisse uma atitude cognoscitiva (de conhecimento), fundada em juízos de fato. Mas resultou sendo uma ideologia, movida por juízos de valor, por ter se tornado não apenas um modo de entender o Direito, como também de querer o Direito. O fetiche da lei e o legalismo acrítico, subprodutos do positivismo jurídico, serviram de disfarce para autoritarismos de matizes variados. A idéia de que o debate acerca da justiça se encerrava quando da positivação da norma tinha um caráter legitimador da ordem estabelecida. Qualquer ordem. [...] a decadência do positivismo é emblematicamente associada à derrota do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha. [...] Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a idéia de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos e da lei como um estrutura meramente formal, uma embalagem para qualquer produto, já não tinha mais aceitação no pensamento esclarecido.

Mas com o tempo, este movimento sujeitou-se a várias e profundas críticas, provenientes de um fracasso político que chegou a uma reação intelectual. A decadência deste estava associada à indignação diante das barbáries promovidas pelos episódios históricos, que em nome da lei [39], se valeram para disfarçar os arbítrios praticados pelos regimes totalitários, arbítrios estes que promoveram um desrespeito ao ser humano que ultrajou a consciência da humanidade.

Os acontecimentos da época, diante das desastrosas conseqüências geradas pelo desrespeito aos direitos do homem, serviram para mostrar que a estrutura meramente formal do positivismo desassociado dos valores éticos já não era passível de aceitação. As iniqüidades respaldadas pela concepção juspositivista cunharam a necessidade de uma reaproximação do Direito com a Justiça conforme o pensamento de J. Flóscolo Nóbrega [40], partindo de uma reflexão acerca da interpretação [41] firmada nos fins sociais da norma e nos direitos fundamentais [42]. Desenha-se agora uma nova hermenêutica jurídica, dando-se centralidade ao Direito Constitucional, que lança as bases de um novo paradgma de concepção do Direito. O inconformismo deu margens a um conjunto amplo de reflexões à cerca do Direito, promovendo um novo movimento denominado póspositivismo [43].

Este movimento retomou a discussão do direito sob um novo prisma, que sem retornar à razão subjetiva do jusnaturalismo, ultrapassou o legalismo do positivismo e introduziu idéias de justiça e legitimidade, consagrando o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana como forma de orientação da atuação estatal.

Para Luís Roberto Barroso:

[...] o Pós-positivismo não surge com o ímpeto da desconstrução, mas como uma superação do conhecimento convencional. Ele inicia sua trajetória guardando deferência relativa ao ordenamento positivo, mas nele reintroduzindo as idéias de justiça e legitimidade. O constitucionalismo moderno promove, assim, uma volta aos valores, uma reaproximação entre Ética e Direito. Para poderem beneficiar-se do amplo instrumental do Direito, migrando da filosofia para o mundo jurídico, esses valores compartilhados por toda a comunidade, em dado momento e lugar, materializam-se em princípios, que passam a estar abrigados na Constituição, explícita ou implicitamente [44].

Assim, a partir da segunda metade do século XX, os desejos humanitários promoveram uma reaproximação entre a ética e o direito, ao reintroduzir no ordenamento jurídico as idéias de justiça e eqüidade.

Com a virada kantiana, a partir da releitura do imperativo categórico de Kant – "[...] age como se a máxima de tua conduta pudesse se transformar em lei universal", a liberdade estava relacionada com a legalidade, uma vez que era entendida como princípio de direito; agora, passa a ser vista sob um novo enfoque. Ao lado da idéia de liberdade, foi incluída a regra de justiça, passando a norma ética a exercer influência sobre a ordem jurídica positivada. Assim, faz surgir todo um campo de estudos que salienta a utilização da argumentação para uma melhor compreensão do Direito, uma aproximação da teoria dos direitos fundamentais e da teoria da justiça, como também um reconhecimento dos princípios na ordem jurídica.

Com o armistício entre o direito e a ética, bem como do reconhecimento dos valores na órbita jurídica, houve uma promoção e uma referência aos princípios constitucionais, expressos ou implícitos.

Pós-positivismo identifica um conjunto difuso de idéias que ultrapassam o legalismo estrito do positivismo normativista, sem recorrer às categorias da razão subjetiva do jusnaturalismo. Sua marca é a ascensão dos valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialiadade dos direitos fundamentais, como ensina Divid Wilson de Abreu Pardo [45]. Seu surgimento não tem uma finalidade desconstrutiva, apresenta-se como alternativa de superação do conhecimento convencional. Não pretende abandonar a lei, antes disso, é a reintrodução de idéias como justiça e legitimidade, ou seja, o retorno da discussão ética e moral [46] ao Direito.

O pós-postivismo trouxe consigo a ascenção científica e política do Direito Constuticional no Brasil. Neste sentido Luís Roberto Barroso [47] destaca:

O novo direito constitucional brasileiro, cujo desenvolvimento coincide com o processo de redemocratização e reconstitucionalização do país, foi fruto de duas mudanças de paradigma: a) a busca da efetividade das normas constitucionais, fundada na premissa da força normativa da Constituição; b) o desenvolvimento de uma dogmática da interpretação constitucional, baseada em novos métodos hermenêuticos e na sistematização de princípios específicos de interpretação constitucional. A ascensão política e científica do direito constitucional brasileiro conduziram-no ao centro do sistema jurídico, onde desempenha uma função de filtragem constitucional de todo o direito infraconstitucional, significando a interpretação e leitura de seus institutos à luz da Constituição.

Este movimento contemporâneo promoveu a ascensão dos valores, o resgate da teoria dos direitos fundamentais e fez surgir uma dogmática principialista. Inaugurou uma nova concepção sobre a eficácia e a importância dos princípios, por reconhecer a sua normatividade e a sua relevância no sistema jurídico, passando a ser a síntese dos valores fundamentais consagrados no novo ordenamento jurídico.

Com o pós-positivismo, os princípios obtiveram uma posição de relevo e denunciaram a insuficiência da subsunção como método de aplicação das normas. Foi concebido um sistema jurídico composto por regras e princípios, e assim, fez nascer a teoria contemporânea dos princípios jurídicos, onde merece destaque, dentre outros autores, o trabalho de Ronald Dworkin e Robert Alexy.

A teoria dos princípios tem como principal autor Ronald Dworkin, que numa crítica ao positivismo propõe um modelo diferente; procura mostrar que os métodos clássicos de produção de direito não são únicos e que o direito pode ser redescoberto por seus operadores. Em sua tese, constrói uma teoria monista onde direito e moral se confundem, ou seja, não mais são entendidos em termos de separação estrita, pois ele reconhece a condição jurídica dos princípios-morais. O modelo de Dworkin constrói um ordenamento jurídico aberto e propõe um sistema formado por regras e princípios. Estes últimos têm a sua importância ressaltada, sendo proclamados como normas jurídicas, passando a ter validade jurídica, podendo, assim como as regras, imporem obrigação legal, uma vez que a eles é atribuída eficácia plena.

Robert Alexy posicionou-se muito próximo às idéias de Ronald Dworkin [48], principalmente com a inserção dos princípios em seu modelo de sistema jurídico, embora não adotando o conceito restritivo do jus filósofo americano. Mas de forma diferente, o seu modelo compõe-se de regras, princípios e procedimentos.

Em sua Teoria dos Direitos Fundamentais, Alexy [49] coloca que a distinção entre regras e princípios pode ser considerada como o marco de uma teoria normativo material dos direitos fundamentais, sendo o ponto inicial para responder às dúvidas sobre a possibilidade e os limites de racionalidade no âmbito dos direitos fundamentais. E, para a aplicação dos princípios, Alexy propõe procedimentos racionais de ponderação, através de um processo argumentativo.

Diante desta nova fase, os princípios jurídicos passaram a ocupar um novo espaço dentro do constitucionalismo contemporâneo, projetaram-se como normas basilares de todo o ordenamento jurídico, dando coesão ao sistema, assumindo uma posição hierárquica. Converteram-se em fonte primária de normatividade e as novas Constituições promulgadas acentuaram a hegemonia axiológica dos mesmos, convertendo-se, nas palavras de Paulo Bonavides [50], no coração das Constituições.

Por conseguinte, a positivação dos princípios nos textos constitucionais traduz uma eficácia que vincula, de forma obrigatória, a sua observância, pois estes sintetizam a idéia de direito e justiça vigentes ao refletirem os valores eleitos constitucionalmente pela sociedade. A Carta Republicana Pátria de 1988 não deixa lugar a duvidas: "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]".

Assim, os princípios assumiram uma posição de fonte primária de normatividade no constitucionalismo contemporâneo, sendo incorporados aos valores sociais, políticos e éticos, de forma explícita ou implicitamente, na tentativa de construção de uma sociedade justa e democrática.

Paulo Bonavides ao sintetizar a evolução da teoria dos princípios, assim se pronunciou:

[...] passagem dos princípios da especulação metafísica e abstrata para o campo concreto e positivo do Direito, com baixíssimo teor de densidade normativa; a transposição crucial da ordem jusprivatista (sua antiga inserção nos Códigos) para a órbita juspublicista (seu ingresso nas Constituições); a suspensão da distinção clássica entre princípios e normas; o deslocamento dos princípios da esfera da jusfilosofia para o domínio da Ciência Jurídica; a proclamação de sua normatividade; a perda de seu caráter de normas programáticas; o reconhecimento definitivo de sua positividade e concretude por obra sobretudo das Constituições; a distinção entre regras e princípios, como espécies diversificadas do gênero norma, e finalmente, por expressão máxima de todo esse desdobramento doutrinário, o mais significativo de seus efeitos: a total hegemonia e preeminência dos princípios.

E finalmente estabelece de forma inequívoca:

Fazem eles a congruência, o equilíbrio e a essencialidade de um sistema jurídico legítimo. Postos no ápice da pirâmide normativa, elevam-se, portanto, ao grau de norma das normas, de fonte das fontes. [51].

Pode-se dizer que, esta nova dimensão do constitucionalismo, tem-se mostrado como uma resposta viável [52] para impor respeito aos direitos individuais e como limitação do poder estatal.

Neste contexto a moralidade foi duplamente prestigiada. Num primeiro momento é elevada àquele conjunto de princípios gerais do direito [53] que fundamentam o direito posto (direito estatal), produzidos pela sociedade que o pressupõe (direito pressuposto), comprometendo o Direito com a Justiça, nos dizeres de Eros Roberto Grau (2000, p. 35). Num segundo momento, por opção do constitucionalismo de 1988, o princípio da moralidade foi positivado [54] constitucionalmente, adquirindo maior imperatividade. Sendo a moral um conceito proveniente da Ética, que se juridicizou, mediante a sua inserção no texto constitucional, não somente como princípio da Administração Pública, no art. 37 da Constituição Federal, mas também, no teor do art. 5º, LXXIII da Constituição da República; "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência"; foi ampliado para alcançar a possibilidade de anulação dos atos lesivos à moralidade administrativa e são igualmente formas de expressão do princípio da moralidade os preceitos constitucionais que prevêem como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (Art. 3º, I, da CR/88) e que resguardam o decoro parlamentar (Art. 55, II e § 1º, da CR/88) e o dever de probidade do Presidente da República (Art. 85, V, da CR/88), dentre outros textos infra-constitucionais tais como o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal que trata com muita clareza o assunto:

II - O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante as regras contidas no art. 37, caput, e § 4°, da Constituição Federal.

III - A moralidade da Administração Pública não se limita à distinção entre o bem e o mal, devendo ser acrescida da idéia de que o fim é sempre o bem comum. O equilíbrio entre a legalidade e a finalidade, na conduta do servidor público, é que poderá consolidar a moralidade do ato administrativo.

Adquire assim a moralidade, por extensão, força vinculante normativa, na medida em que os princípios constitucionais possuem esta característica, como bem assenta Rubens Beçak [55].

Isto posto, a juridicização da moralidade dá azos à reflexão de sua incidência como categoria normativa no processo político, especificamente na exigência de moralidade para o exercício dos direitos políticos de sujeição passiva, o que será melhor abordado no próximo capítulo.

Há mudanças marcantes que demonstram a necessidade de adequação, a ciência do direito, ao longo da historia, evolui conforme a humanidade demanda respostas. A antiguidade e o jusnaturalismo, os escolásticos, a sacralização do direito e a santa inquisição. O positivismo, a total autonomia do direito frente à filosofia, as grandes guerras e o holocausto. Atualmente o pós-positivismo, o constitucionalismo e a problemática sócio-ambiental que sob a ótica de muitos pensadores da atualidade faz do homem sua principal ameaça. Uma vez constatada essa dinâmica e, certos de que a história é feita pelo homem (Karl Marx) e por tanto se constrói a cada momento sempre com a possibilidade da realização do inesperado, queda como reflexão o pensamento de Bobbio: "[...] O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje não é tanto de justificá-los mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político" [56]; "Essa universalidade (ou indistinção, ou não-discriminação) na atribuição e no eventual gozo dos direitos de liberdade não vale para os direitos sociais, e nem para os direitos políticos, diante dos quais os homens são iguais só genericamente" [57]; "[...] é que a proteção destes últimos [direitos sociais] requer uma intervenção ativa do Estado, que não é requerida pela proteção dos direitos de liberdade." [58]; "hoje o conceito de democracia é inseparável do conceito dos direitos do homem" [59].

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Sobre o autor
João Luiz Valente Dias

Advogado, jornalista, diretor geral Instituto SALT, Coordenador Geral da Associação dos Trabalhadores do Instituto Zumbi dos Palmares (ATRIZP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIAS, João Luiz Valente. A moralidade como condição implícita de elegibilidade . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3051, 8 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20387. Acesso em: 29 mar. 2024.

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