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(In)segurança jurídica e proteção à confiança

14/11/2011 às 13:58
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Falamos em princípio da segurança jurídica quando designamos o que prestigia o aspecto objetivo da estabilidade das relações jurídicas, e em princípio da proteção à confiança, quando aludem ao que atenta para o aspecto subjetivo.

SUMÁRIO: 1.Introdução. 2.Segurança Jurídica no Direito Tributário. 3.Segurança Jurídica e Proteção à Confiança.4.Considerações Finais. Referencias Bibliográficas

RESUMO - O Estado Democrático de Direito – sobre o qual se constitui a República Federativa do Brasil (art. 1º da CF) – assenta-se, basicamente sobre o princípio da segurança jurídica, compreendendo a legalidade, a irretroatividade e a anterioridade, traduzindo-se na previsibilidade e estabilidade da atuação jurídica estatal. No Direito Tributário, o referido princípio surge como grande protetor do cidadão, visando um mínimo de confiabilidade do indivíduo para com o Estado, garantindo o convívio pacífico. E como valor fundante de todo o sistema jurídico, o princípio da segurança jurídica bem como o principio da proteção a confiança, devem ter sua receptividade, usos e aplicação, a fim de proporcionar uma melhor efetivação do princípio do Estado de Direito, que se quer vigente.

ABSTRACT - The Democratic Law State – the one that Brazil Republic is based on ( 1st article of The Federal Constitution) is basicaly related to the law security principles, as legality, translated on the prediction and stability of the law performance state. On tributary law, this principle appears as the biggest protection of the man, aiming confidence from the man to the state, a guarantee to a pacific contact. And the security law principle as well as the protection and trust ones, must have its receptivity, uses and application to give a better and permanent principle of the current law state.

PALAVRAS CHAVE

Direito Tributário. Segurança jurídica. Legalidade. Anterioridade. Irretroatividade. Proteção à Confiança.


1 - INTRODUÇÃO

A segurança jurídica é, sem dúvidas, um valor fundante do sistema jurídico, já que uma das principais funções do direito é a de estabilizar as relações sociais, garantindo o convívio pacífico.

No âmbito tributário, em que o Estado faz valer a sua força, cobrando do cidadão a participação nas contas e despesas públicas, a segurança e a proteção da confiança assumem grande relevância, servindo como um limitador, evitando e coibindo os excessos do poder público.

A proposta deste trabalho é justamente investigar os formadores da segurança jurídica, sua dimensão valorativa no Estado de Direito e sua aplicabilidade no direito tributário brasileiro em cotejo com o princípio da proteção à confiança.

Insta consignar que o trabalho desenvolvido possui especial relevância, pela própria natureza do objeto de sua disciplina jurídica, que regula uma limitação estatal, e pelo comportamento historicamente verificado do Estado em relação a vida privada dos cidadãos, o que torna imperativo a fixação de uma delimitação precisa da esfera privada em oposição ao Poder Público.


2 - SEGURANÇA JURÍDICA NO DIREITO TRIBUTÁRIO

O princípio da segurança jurídica atua no ordenamento jurídico pátrio como grande protetor do cidadão na construção e elaboração de normas novas, visando um mínimo de confiabilidade do indivíduo para com o Estado, principalmente no que tange a procurar estabilizar as relações sociais, garantindo o convívio pacífico.

É consabido que o poder público hoje nos transmite a idéia de Estado pai, e por esse motivo deve satisfazer as necessidades públicas. No âmbito tributário o Estado faz valer a sua força, cobrando do cidadão a participação nas contas e despesas públicas a fim de prover aos cidadãos saúde, segurança, educação, lazer e todas as demais necessidades do cidadão. Para tanto, a segurança e a proteção da confiança assumem grande relevância, servindo como limite, capaz de evitar e coibir possíveis excessos da administração pública.

Para que a arrecadação ocorra sem maiores problemas, e para que haja reciprocidade na relação jurídico-tributária faz-se necessário que as pessoas possam afastar uma possível sensação de insegurança, sendo possível uma previsão de figuras normativas que digam como devem ocorrer certos comportamentos.

Essa previsibilidade deve ocorrer principalmente dentro do Estado de direito, que é conceituado como "aquele que, tanto quanto os particulares, respeita as leis e as decisões judiciais".[01]

A partir desse primeiro conceito temos que as idéias do Estado Democrático de Direito estão ligadas intimamente com a dignidade da pessoa humana, respeitando as premissas e comprometendo-se com a busca existencial por essa dignidade, e podemos afirmar isso com mais propriedade quando lemos o preâmbulo da nossa Constituição Federal.

Talvez por isso, o Estado Democrático de Direito – sobre o qual se constitui a República Federativa do Brasil (art. 1º da CF) – assente-se, basicamente sobre o princípio da segurança jurídica, compreendendo a legalidade, o ato jurídico perfeito, a coisa julgada, etc., traduzindo-se na previsibilidade e estabilidade da atuação jurídica estatal.

A segurança jurídica entra em nosso ordenamento jurídico como princípio vez que é esse o nome que se dá a regras do direito positivo que introduzem valores relevantes para o sistema, valores que influenciam vigorosamente sobre a orientação de setores da ordem jurídica.

Pela importância e por todas as consequências que se extraem da chamada segurança jurídica, ela significa, justamente, um "ponto de partida", um "início", além de ter presença obrigatória em qualquer ciência, em qualquer estudo específico, não é diferente com o direito e com a sociedade em geral.

E uma vez ser tão imperioso que se obtenha a tal segurança jurídica, é necessário que caminhe junto com as demais normas, balizando-as, indicando o caminho a ser seguido, como princípio, como sustentação, orientação e realização do direito.

Eis o motivo pelo qual os princípios da estrita legalidade, irretroatividade e anterioridade guardam enorme conexidade entre si, já que atuam conjuntamente visando tornar efetivo o princípio da segurança jurídica.

Por esse motivo, como parte essencial dessa segurança, o princípio da legalidade assegura que nenhum cidadão no Estado de Direito pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II, da CF).

Da mesma forma, o cidadão deve ter a certeza de que as situações consolidadas no tempo assim permanecerão (art. 5º, XXXVI, da CF) e a previsibilidade de que os atos praticados pelo Estado, presumidamente legítimos, serão assim reconhecidos.

Assim também ocorre com o princípio da anterioridade, como ele protela a eficácia dessas novas exações para o exercício financeiro subsequente ao da publicação de suas leis criadoras, a segurança jurídica dos contribuintes estaria assegurada já que poderiam planejar, previamente, suas atividades econômicas, sabendo com antecedência, os gastos que teriam com relação ao Fisco.

Nesse sentido, é possível afirmarmos que não existirá, efetivamente, segurança jurídica, sempre que os princípios que o realizem forem violados.

Impossível imaginar qualquer sistema tributário sem a observância desses princípios.


3 - SEGURANÇA JURÍDICA E PROTEÇÃO À CONFIANÇA

A segurança jurídica, como visto, decompõe-se em duas perspectivas distintas: de um lado, o aspecto formal-temporal (anterioridade e irretroatividade); e, do outro, a dimensão material (legalidade). Dessa forma os cidadãos devem saber previamente quais normas vigentes, se elas estão em vigor antes que os fatos por ela regulamentados sejam praticados, e também o conteúdo das leis.

Nesta mesma senda, o cidadão deve dispor de compreensibilidade, clareza, calculabilidade e controlabilidade do conteúdo das leis. A idéia diretiva obtida a partir dessas determinações está em consonância com o conteúdo da lei, denominado também de legalidade no sentido material.

Sob esta óptica, portanto, a segurança jurídica atua sobre a estrutura do sistema normativo. É necessário que todo o ordenamento preencha requisitos objetivos de previsibilidade e calculabilidade dos efeitos decorrentes da prática de determinados atos pelos destinatários da norma, ou seja, pelo contribuinte.

Em razão do princípio da Segurança Jurídica, o Estado deve obedecer a determinados proclames objetivos de conduta, o que gera nos cidadãos expectativas legítimas em relação a determinadas condutas. Estas expectativas são uma dimensão subjetiva da segurança, que é, precisamente, o que se identifica como o princípio da proteção da confiança.

Assim, sob esta ótica falamos em princípio da segurança jurídica quando designamos o que prestigia o aspecto objetivo da estabilidade das relações jurídicas, e em princípio da proteção à confiança, quando aludem ao que atenta para o aspecto subjetivo.

A segurança jurídica subjetiva equivale, portanto, precisamente, à confiança depositada pelos particulares sobre os atos administrativos, pois estes, tendo em vista o princípio da legalidade, gozam de presunção de legitimidade.

Em termos práticos podemos afirmar que o princípio da proteção à confiança visa gerar ao cidadão uma maior segurança e estabilidade, de forma a facilitar previsões financeiras, sem que isto prejudique a contabilidade de uma grande empresa, ou até, de uma família de classe média.

Assim, temos que em matéria tributária, o principio da segurança jurídica funciona a própria proteção da confiança do contribuinte no Estado, ou seja, protege o cidadão no intuito de que os atos praticados pelo ente tributante não serão alterados de forma repentina.

Significa dizer que, com base na análise conjunta do principio da segurança jurídica, e do principio da proteção a confiança, que não pode a administração pública mudar uma interpretação na aplicação de determinado tributo, querendo cobrar, de forma retroativa, por exemplo.

O princípio da proteção à confiança decorre, pois, da boa-fé, significando que o fisco não poderá prejudicar os interesses do contribuinte, se este agiu conforme a legislação vigente a época do fato. A boa-fé atua aqui como um limitador de ações, exigindo certo respeito àquilo que a outra parte acredita, coibindo assim, condutas contrárias a sua própria conduta, ou seja, aquela que até então se tinha como correta.

O Fisco deve agir com lealdade a certeza das pessoas, sejam físicas ou jurídicas. Certeza de que não serão surpreendidas com as medidas adotadas pela administração pública, dando a todos a tranqüilidade e a possibilidade de planejamento futuro.

Essa certeza é a própria confiança que o cidadão deve ter no Estado.

A existência desse princípio deve conferir ao contribuinte uma certa garantia que essa previsibilidade será ponderada quando acontecer alguma mudança inesperada, ou seja, em decorrência do princípio da proteção a confiança o aplicador do direito deverá ponderar a garantia da inviolabilidade do ato jurídico perfeito e a alteração na tributação aplicada ao fato gerador praticado pelo contribuinte, de forma que àquilo que era entendido como correto seja mantido.

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O princípio da Confiança trata-se de preceito ao qual, assim como ocorre com a segurança jurídica, se deve devotar particular atenção. As hipóteses de utilização deles são abertas e muito amplas, prontas para serem estendidas diante de novas e inusitadas situações, afim de garantir ao contribuinte maior estabilidade em suas relações comerciais e financeiras.


4 Considerações finais

Primeiramente há que se ressaltar que as hipóteses de aplicação do princípio da segurança jurídica e do princípio da proteção da confiança em matéria tributária não se esgotam com essas apresentadas até aqui. Suas hipóteses de utilização são, e sempre serão, abertas; prontas para serem estendidas diante de novas e inusitadas situações.

Estes princípios, como vimos, têm amplitude suficiente para afastar a possibilidade de se delimitar suas repercussões de modo exaustivo. Suas hipóteses de aplicação permanecem sempre em aberto, podendo ter seu conteúdo acrescido na medida em que novas situações concretas se apresentem.

O princípio da segurança jurídica, como vimos, confere ao contribuinte, na relação com o Estado, confiança e estabilidade, de forma a facilitar previsões financeiras, sem que isto prejudique a contabilidade de uma grande empresa, ou até, de uma família de classe média, ou seja, visa proteger o cidadão contra atos repentinos praticados pela administração pública, evitando a surpresa fiscal.

Tais princípios constitucionais exigem e conferem ao contribuinte condições de prever objetivamente seus direitos e deveres tributários, e por isso mesmo, podemos afirmar, que não haverá respeito ao princípio da segurança jurídica sempre que as diretrizes que o realizem venham a ser concretamente desrespeitadas, em outras palavras, não se pode falar em segurança jurídica, ou proteção à confiança se a criação do tributo não respeitar os princípios da legalidade, da anterioridade e da irretroatividade.

Após essa análise fácil concluir que o princípio da segurança jurídica é um componente de ética jurídica e sua aplicação nas relações jurídicas de direito público é obrigatória, tendo por precípua finalidade a obtenção de um estado de coisas que enseje estabilidade dos atos, procedimentos ou simples comportamentos das atividades estatais.

E somente com a devida importância que se deve ofertar aos princípios em tela é que poderemos atingir a efetiva realização da Justiça na seara do Direito Tributário.


Nota

01 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 26ªed. Malheiros. 2010.

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Sobre a autora
Rubia Erthal dos Santos

Advogada. Especialista em Direito de empresa com ênfase em Direito tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Rubia Erthal. (In)segurança jurídica e proteção à confiança. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3057, 14 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20402. Acesso em: 22 dez. 2024.

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