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Os limites à quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s), à luz da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos

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17/12/2011 às 15:46
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4 Correição Parcial nº 2008.72.00.005353-8/SC (7ª Turma do TRF/4ª)

Em complemento ao eixo temático do presente trabalho [96], centrado na jurisprudência remansosa do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos acerca da quebra do sigilo das fontes jornalísticas, recorda-se, na seara do Direito brasileiro, o correlato precedente da Correição Parcial nº 2008.72.00.005353-8/SC (Relator, Desembargador Federal Néfi Cordeiro), julgada em 3 de novembro de 2009, em que a Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, em votação unânime, filiou-se ao pensamento segundo o qual o resguardo do sigilo da fonte deve preponderar, em benefício da liberdade de informação, sobre a promoção de provas direcionadas à persecução penal. Frisou-se a impossibilidade jurídica de se impor a outrem a prática do tipo penal de violação de sigilo profissional (insculpido no art. 154 do Código Penal [97]):

PENAL. PROCESSO PENAL. CORREIÇÃO PARCIAL. JORNALISTA. DIREITO AO SEGREDO DA FONTE.

1. A constitucional preservação do sigilo da fonte não merece exclusão pelo interesse estatal de promover provas para a persecução criminal, prevalecendo na ponderação de valores a liberdade de informação, enquanto pilar do regime democrático de direito.

2. Descabido seria, aliás, obrigar alguém a praticar conduta inclusiva típica - quebra do sigilo profissional - para viabilizar a prova de crimes de outros.

3. Correição parcial denegada. [98] (grifo nosso)

Consoante narra [99] o relatório do Desembargador Néfi Cordeiro consignado no caderno processual da indicada Correição Parcial nº 2008.72.00.005353-8/SC, determinado membro do Ministério Público Federal [100] solicitara de Juiz Federal Substituto de Vara Criminal da Justiça Federal de Primeiro Grau da Subseção Judiciária de Florianópolis o "afastamento do direito de preservação da fonte jornalística, no intuito de determinar que a testemunha [jornalista] informasse quem lhe forneceu os dados sigilosos" [101] (concernente a "gravações de interceptações telefônicas" [102] constantes de inquérito policial que se encontrava sob o manto do segredo de justiça).

O pleito ministerial restou indeferido pelo juízo a quo. Irresignado, o(a) Agente Ministerial requereu correição parcial.

Subindo os autos à Justiça Federal de Segundo Grau, a 7ª Turma do TRF/4ª, capitaneada pelo voto condutor do Desembargador Federal Néfi Cordeiro, baseou-se no parecer alinhavado, naquele feito, pela Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza, a qual, ao dissentir do entendimento firmado na instância original pelo membro do Ministério Público Federal atuante como órgão-autor, reputou incabível a pretendida relativização do sigilo da fonte jornalística, tendo em vista não apenas o fundado risco da quebra do sigilo jornalístico afetar a liberdade de informação (na condição de sustentáculo do regime democrático) e sujeitar o jornalista (caso desenovele a identidade da sua fonte) a realizar o tipo penal de violação de sigilo profissional como também a ausência de indícios elementares de que o profissional do Jornalismo investigado tenha concorrido para a quebra do sigilo judicial.

Posto de outro modo, ponderou-se que o jornalista teria obtido sua informação de maneira lícita — a pessoa natural que lhe serviu de fonte é que teria se portado de forma antijurídica, ao fornecer àquele gravações que deveriam estar infensas à divulgação pública, escudadas pelo elmo do segredo judicial.

Ante a expressiva relevância das considerações expendidas, na qualidade de órgão-interveniente (custos legis), pelo Ministério Público Federal, nos autos da Correição Parcial nº 2008.72.00.005353-8/SC, colige-se, abaixo, parcela de tal manifestação ministerial, no tocante a estas ponderações (transcrição caudalosa, porém de alta pertinência):

A decisão combatida sustenta que: sendo o sigilo da fonte meio garantidor da própria liberdade de imprensa, a necessidade desse sigilo está sempre presente; violar o sigilo da fonte é crime (artigo 154 do Código Penal); e é possível identificar o autor do crime (a fonte do jornalista) de violação do sigilo judicial por outros meios.

O recurso do MPF colaciona excelente argumentação, sustentando a possibilidade da divulgação de interceptações telefônicas ferir a imagem, a intimidade dos envolvidos (premissa posta no relatório recursal); a relatividade do direito ao sigilo da fonte; a ilegitimidade da fonte; a aferição da necessidade de manutenção do sigilo da fonte pelo Poder Judiciário; a desnecessidade da fonte ilegítima para sustentar a notícia no caso concreto; a preponderância do direito à persecução penal de autores de fatos criminosos e do direito à imagem dos investigados sobre o direito do sigilo da fonte; o status jurídico de "testemunha" do jornalista, obrigado a dizer a verdade, porque somente se contra ele pesasse suspeitas de participação criminosa estaria desobrigado a fazer prova contra si mesmo; e a necessidade de afastamento do sigilo da fonte para identificação do autor de um crime.

Os argumentos apoiam-se, em parte, em conceitos indiscutíveis, tais como a proteção legal ao direito à intimidade, a inexistência de direitos constitucionais absolutos (como reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal), a distinção entre o tratamento legal dado à testemunha e ao investigado.

Todavia, vejo razões que sustentam o indeferimento do pedido ministerial, na linha da decisão judicial recorrida, ainda que não me filie integralmente aos seus fundamentos. De fato, penso que não importa se subsiste ou não o argumento da decisão judicial acerca da possibilidade de identificação por meio de outras diligências daquele que "vazou" as informações do processo para o jornalista - que é o autor do crime em investigação no inquérito encartado aqui - porque a conclusão de indeferimento do pedido ministerial está ancorado em fundamentos maiores, revelados já no enquadramento que o juízo deu à questão:

"Busca o Ministério Público Federal, em petição de fls. 81/92, decisão que afaste, de forma expressa, o direito do jornalista, responsável por divulgação do conteúdo de escutas telefônicas colhidas no curso de inquérito policial onde houve decretação de sigilo judicial, de manter sua fonte em sigilo.

É fato que a matéria aqui tratada reveste-se de caráter bastante tormentoso, gerando discussões frequentes acerca do tema. A recente decisão do STF, afastando integralmente aplicação da chamada lei de imprensa, trouxe à tona, novamente, maciça exposição de posicionamentos diversos acerca dos limites à liberdade de informação e garantias dadas aos jornalistas no que diz respeito à proteção de suas fontes.

A Constituição Federal de 1988 é expressa ao manifestar-se acerca do tema, elevando ao patamar de garantia constitucional o acesso livre às informações e o resguardo ao sigilo de fonte. Diz o art. 5º, XIV, da CF/88:

XN - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.

A preocupação constitucional de manifestamente expressar tais garantias encontra fundamento exatamente no fato de que elas formam, em conjunto com demais garantias também constitucionalmente previstas, o arcabouço legal que sustenta o próprio Estado Democrático de Direito.

A importância de tal tema é tamanha que a lei de imprensa, hoje afastada do mundo jurídico, defendida por muitos como de caráter absolutista por ter sido introduzida no ordenamento legal brasileiro durante período de exceção, também previa em seu texto a proteção às fontes jornalísticas.

Diante de tais observações, qualquer análise a ser feita acerca do tema deve o ser de forma extremamente cuidadosa e atenta."

À essa linha de entendimento, acrescento que, antes de tudo, é preciso perceber a extensão do conceito de sigilo da fonte. O sigilo da fonte e a liberdade de crítica substanciam o próprio direito à liberdade de imprensa. Por sua vez, a liberdade de imprensa é um dos pilares da Democracia. Nestas considerações é que encontramos a ordem de grandeza desse direito e a partir desse ponto é que poderão ser feitas as ponderações de valores em caso de conflitos de direitos.

[...]

Assim a questão da relatividade do direito ao segredo de fonte, conferido pela própria redação constitucional, permite o resguardo do sigilo da fonte quando necessário ao exercício profissional, deve ser examinada tendo em mente as premissas anteriormente mencionadas.

Não se pode negar a prioridade do sigilo da fonte, como meio de garantir o exercício profissional, que é a outra face do direito à informação, pilar da democracia. No caso concreto, a decisão não afirmou que estava diante de um direito absoluto, mas ponderou, refletiu sobre o conflito de valores postos.

O direito ao sigilo da fonte cederia diante de várias hipóteses. Obviamente, o direito repugna que o acesso às informações tenha sido obtido por meio criminoso pelo jornalista. Aí a vinculação do jornalista ao fato é direta, seja por autoria ou participação criminosa, na forma do artigo 29 do Código Penal e a disciplina legal a que submete é diversa. Mas na investigação em exame não há qualquer referência a indício ou mesmo suspeita de envolvimento do jornalista. Aqui outra pessoa (a fonte do jornalista) cometeu o ilícito de repassar informações cobertas por sigilo.

[...]

Na linha do que se expõe, fica revelada a insubsistência de outros argumentos do recurso, tal como a assertiva de que "apenas a licitude de acesso santifica a informação de modo a fazer da fonte um objeto sagrado" (fl. 108). Ocorre que foi justamente o que ocorreu - o jornalista obteve a informação de forma lícita. A ilicitude ocorrida é anterior e independente.

Outra argumentação que não resiste à análise é a que traz à baila interpretação ao artigo 154 do Código Penal, pertinente à violação de sigilo profissional, pois a lição diz exatamente o contrário do que pretende ver o recurso: se o jornalista desproteger sua fonte estará cometendo crime de violação de sigilo profissional. Neste sentido a decisão que restou assim ementada:

CONSTITUCIONAL E PENAL. RECURSO DE HABEAS CORPUS. CRIME DE CALUNIA. LEI N° 5.250/69. ARTIGOS 20 E 23, III. DELITO NÃO CARACTERIZADO. MATÉRIA JORNALÍSTICA VEICULADA COM O OBJETIVO DE INFORMAR FATOS DE INTERESSE PÚBLICO. ANIMUS NARRANDI. AUSÊNCIA DE ANIMUS CALUMNIANDI. DIREITO DE INFORMAR E À INFORMAÇÃO. SIGILO DA FONTE. DIREITO-DEVER DO JORNALISTA. CONFIRMADA A SENTENÇA QUE TRANCOU INQUÉRITO POLICIAL. [...] 4- A Constituição Federal assegura o direito à informação e resguarda o sigilo da fonte ao jornalista, quando no exercício de sua atividade profissional. 5- O sigilo da fonte é um direito-dever do jornalista. Sua inobservância importa em violação do sigilo profissional e, de consequência, na prática do crime previsto no artigo 154 do CP. 6- Configura manifesto constrangimento ilegal o ato de autoridade que determina o indiciamento de jornalista em inquérito policial caso não quebre o sigilo de suas fontes de informação jornalística. 7- No caso, a atipicidade da conduta do paciente é induvidosa. Incensurável a sentença recorrida. 8- Recurso de habeas corpus improvido. (RHC 199961810022020 Relator(a) JUIZ ARICE AMARAL Sigla do órgão TRF3 Órgão julgador SEGUNDA TURMA Fonte DJU DATA:22/ 03/2000 Decisão A Segunda Turma, por unanimidade, negou provimento à remessa oficial.)

Reconheço que a situação fática traz um paradoxo: ao deixar prevalecer o sigilo da fonte, protege-se também aquele que praticou a conduta criminosa que foi justamente adquirir a informação repassada ao jornalista. Mas de forma alguma pode-se obrigar alguém a praticar outra conduta criminosa - a da quebra do sigilo profissional - para viabilizar a persecução penal de outra e, ainda menos, pode-se por em risco a liberdade de informação, enquanto pilar do regime democrático, invocando a ponderação de valores. [103] (grifo nosso)


Conclusão

1 Da leitura do art. 10-1 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, percebe-se que a liberdade de expressão, tal como insculpida na CEDH, abarca tanto a liberdade de opinião quanto a liberdade de informação, o que explica a razão da jurisprudência consolidada do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos ter avistado em tal artigo a proteção à liberdade de imprensa, uma vez que a liberdade de imprensa abrange seja a liberdade de opinião jornalística, seja a liberdade informação jornalística propriamente dita.

2 No referido dispositivo da Convenção, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos divisou o respaldo normativo para a proteção das fontes jornalísticas, vislumbrada pelo TEDH como condição sine qua non para a liberdade de imprensa: na óptica da Corte de Estrasburgo, sem essa salvaguarda, as fontes podem ser obstadas de assistir a imprensa em informar à coletividade acerca de matérias de interesse público, o que prejudicaria a função fiscalizadora dos meios de comunicação social e a capacidade destes de proporcionarem ao corpo social informações precisas e confiáveis.

3 Em virtude da relevância que possui a proteção das fontes jornalísticas para a liberdade de imprensa em uma sociedade democrática e do potencial efeito inibitório que uma ordem de quebra de sigilo jornalístico teria sobre o exercício dessa liberdade, a jurisprudência remansosa do TEDH (Grande Câmara, Goodwin v. the United Kingdom, § 39; Terceira Seção, Voskuil v. The Netherlands,§ 65, e Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands § 54, d; Quarta Seção, Roemen and Schmit v. Luxembourg,§ 46, e Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 59; Primeira Seção, Nordisk Film & TV A/S v. Denmark) tem considerado incompatíveis com o direito à liberdade de expressão previsto no art. 10 da CEDH as determinações estatais de quebra de sigilo jornalístico, salvo se justificáveis diante de uma preponderante exigência do interesse público, harmônica com as balizas do art. 10-2 da Convenção.

4 A fim de verificar se, no caso concreto, a relativização da garantia do sigilo jornalístico poderia se apoiar nas hipóteses excepcionais delineadas pelo indicado art. 10-2 da CEDH, a Grande Câmara do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em Goodwin v. the United Kingdom (§§ 28 a 46), indagou se a interferência estatal, de acordo com o contexto in concreto, (1) foi prescrita por lei (prescribed by law; prévues par la loi), isto é,se estava prevista no correspondente Direito interno (se possuía respaldo na ordem jurídica do respectivo Estado contratante), (2) visou à finalidade legítima (legitimate aim; but légitime) e (3) era necessária em uma sociedade democrática (necessary in a democratic society; nécessaire dans une société démocratique), ou seja, se correspondia a uma premente necessidade social. Essa formulação tridimensional do princípio da proporcionalidade no tocante ao exame de alegação de quebra de sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) restou observada, na Corte de Estrasburgo, pela Primeira Seção (Nordisk Film & TV A/S v. Denmark), Segunda Seção (Ernst et Autres c. Belgique, §§ 96 a 105; Tillack c. Belgique, §§ 58 a 68) e Quarta Seção (Roemen and Schmit v. Luxembourg,§§ 47 a 60; Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, §§ 56 a 73).

5 Já a Terceira Seção do TEDH, em Voskuil v. The Netherlands (§§ 49 a 74), assim como em Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands (§§ 49 a 63), antes de se debruçar sobre os 3 (três) indicados critérios de aferição, adotou, como primeira baliza, o questionamento quanto à presença de interferência em direito encastoado no art. 10 da CEDH. Afirmado em outros termos, a Terceira Seção da Corte de Estrasburgo, em tais precedentes, averiguou se a atuação do Poder Público, à luz da circunstância concreta analisada, (1) configurou interferência em direito assegurado pelo art. 10 da CEDH, bem assim se a interferência, uma vez comprovada, (2) foi prescrita por lei, (3) voltou-se à finalidade legítima e se mostrou (4) necessária em uma sociedade democrática.

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6 Ao examinar se uma interveniência estatal na garantia do sigilo jornalístico resta prescrita por lei, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos perquire se houve a chancela do Direito Legislado (Grande Câmara, Goodwin v. the United Kingdom, § 29; Primeira Seção, Nordisk Film & TV A/S v. Denmark; Segunda Seção, Tillack c. Belgique, §§ 32 e 58; Terceira Seção, Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands,§ 51, e Voskuil v. The Netherlands,§ 50; Quarta Seção, Roemen and Schmit v. Luxembourg, § 49, e Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 57), encontrando tal respaldo, por vezes, na legislação processual penal apontada pelo Estado contratante demandado (Segunda Seção, Tillack c. Belgique, §§ 32 e 58; Terceira Seção, Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands,§ 51, e Voskuil v. The Netherlands,§ 50; Quarta Seção, Roemen and Schmit v. Luxembourg, § 49).

7 Em Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom (§ 57), a Quarta Seção do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos considerou, além da previsão em ato legislativo, o supedâneo haurido da jurisprudência consolidada no respectivo Direito interno, a exemplo de como procedera a Grande Câmara da Corte de Estrasburgo em Goodwin v. the United Kingdom (§ 33).

8 Naquela oportunidade, a Grande Câmara ponderou a relevância de que conceitos legais que confiram certa margem discricionária à interferência do Poder Público no exercício de determinado direito recebam construções judiciais que tenham o condão de tornar mais claro ao destinatário da lei em que consistiria o tipo ilícito delineado pelo legislador (Goodwin v. the United Kingdom, § 33).

9 É que não bastaria insculpir em lei formal o tipo do ilícito: seria necessário que o destinatário da norma pudesse, antes de cogitar a prática da conduta prevista no tipo, ter condições razoáveis de compreender, mediante a leitura do dispositivo legal e, se necessário, eventual assessoramento jurídico, o caráter ilícito da conduta proscrita, de modo que a redação do texto legal propiciasse um grau de precisão que tornasse possível ao destinatário da norma antever os possíveis desdobramentos jurídicos da conduta cogitada (Goodwin v. the United Kingdom, § 31).

10 Ao apreciar recurso contrário ao acórdão da Terceira Seção do TEDH em Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, a Grande Câmara da Corte de Estrasburgo, em 14 de setembro de 2010, reiterou tal ponderação (§ 81) em termos mais sucintos, ao ressaltar que a lei deve ser adequadamente acessível (à compreensão do destinatário da norma) e previsível (em seus efeitos), para que, assim, o indivíduo possa se pautar pelas balizas extraídas de tal preceito.

11 Acrescentou, baseada na jurisprudência remansosa do TEDH e em repulsa a normas que proporcionem poderes incondicionados aos agentes públicos, que a lei deve indicar, com clareza suficiente, o escopo da discricionariedade cometida à autoridade estatal competente para interferir na esfera jurídica alheia e os meios de exercício dos correspondentes poderes (Grande Câmara, Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 82).

12 Esplendeu a exigibilidade, principalmente em casos de tutelas de urgência (em que a autoridade a pleitear o descerramento do sigilo jornalístico, premida pelo tempo, não tem, por vezes, a oportunidade de alinhavar uma motivação mais minuciosa), de que órgão externo ao Poder Executivo e às demais partes, na qualidade de instância revisora (órgão de âmbito judicial ou extrajudicial), faça, de maneira objetiva e imparcial, o controle do ato estatal de quebra do sigilo jornalístico.

13 A Grande Câmara, ainda em Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands (§§ 94, 100 e 101), ao se reportar ao critério da prescrição por lei, referiu-se também à qualidade da lei: embora a quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) contasse, in casu, com previsão em lei formal (Código de Processo Penal), a qualidade da lei se revelara deficiente ou insuficiente aos olhos do órgão maior do TEDH, porque, no âmbito do Estado contratante demandado (o Reino dos Países Baixos), a função de órgão revisor da ordem de quebra do sigilo jornalístico, depois da entrada em vigência do art. 96a do Estatuto Processual Penal neerlandês, passou a ser incumbência de membro do Ministério Público, o qual, como parte interessada na persecução penal e por não constituir órgão do Poder Judiciário, não poderia assegurar a necessária independência no controle, como instância revisora, da referida ordem.

14 Ainda em relação a Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, a Grande Câmara do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos frisou que aferir se uma interferência estatal no exercício de direito fundamental está de acordo com a lei ou prescrita por lei significa ter presente não apenas o Direito Legislado como também atos administrativos com conteúdo de lei, inclusive atos normativos emanados de órgãos de fiscalização profissional, bem assim a jurisprudência consolidada (Grande Câmara, Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 83). Preconizou, em suma, o acolhimento da acepção de lei em sentido material ou substantivo, em detrimento da adoção da acepção de lei stricto sensu ou em sentido meramente formal (mesmo parágrafo).

15 Em mesma direção se situou a Segunda Seção do TEDH em Ernst et Autres c. Belgique, de 15 de julho de 2003, ao lembrar que a jurisprudência iterativa da Corte de Estrasburgo enxerga a lei em sentido material e não formal (§ 96), a abarcar, no campo de incidência da acepção de lei, o Direito construído com base na interpretação legal feita pelos órgãos judiciários competentes (§ 96).

16 Para fins de quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s), finalidade(s) legítima(s) pode(m) dizer respeito (a) ao propósito de coibir a divulgação midiática de informações confidenciais de uma sociedade empresária (Grande Câmara, Goodwin v. the United Kingdom, §§ 11 e 35), (b) ao intento de prevenir a desordem e/ou crime (Quarta Seção, Roemen and Schmit v. Luxembourg, § 50; Terceira Seção, Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands,§ 53, e Voskuil v. The Netherlands,§§ 54 e 56), (c) ao duplo desiderato de proteger direitos alheios e evitar o vazamento de informações fornecidas em caráter confidencial (Quarta Seção, Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 58), (d) de prevenir desordem ou crime e salvaguardar direitos alheios (Primeira Seção, Nordisk Film & TV A/S v. Denmark), (e) ao triplo fim de impedir a divulgação de informações confidenciais, proteger a reputação alheia e assegurar a autoridade e a imparcialidade do Poder Judiciário (Segunda Seção, Ernst et Autres c. Belgique, § 98), e (f) de visar à defesa da ordem pública, à prevenção de infrações penais e da divulgação de informações confidenciais e à proteção da reputação alheia (Segunda Seção, Tillack c. Belgique, § 59).

17 Ao examinar as alegações do respectivo Estado contratante de que houve finalidade(s) legítima(s) a nortear(em) determinado procedimento estatal de quebra de sigilo jornalístico, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, por vezes, não perscruta a presença de todas as finalidades invocadas pelo polo passivo, bastando-lhe, para reputar contemplada tal exigência, concluir que se encontra comprovada nos autos parcela das finalidades aludidas pelo Estado requerido:

17.1 Em Goodwin v. the United Kingdom, o Estado contratante arguiu os propósitos de proteger o sigilo empresarial e de promover a prevenção criminal (§ 35). A Grande Câmara da Corte de Estrasburgo, ao acolher o primeiro argumento, dispensou a si mesma de proceder à análise do segundo argumento (§ 36).

17.2 E, em Voskuil v. The Netherlands,o Estado contratante mencionou os fins de proteger a reputação ou os direitos alheios (notadamente, a integridade moral do Poder Judiciário dos Países Baixos e da Polícia de Amsterdã), de resguardar a segurança pública e de efetuar a prevenção de crime ou de desordem (§ 54). A Terceira Seção do TEDH se ateve a aceitar o argumento da prevenção criminal, sem se posicionar, portanto, acerca das demais finalidades invocadas pelo polo passivo (§ 56).

18 Já em Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom (§ 58), no qual o Estado contratante, em sua peça de defesa, indicou os fitos de (1) resguardar os direitos alheios, de (2) se acautelar contra o vazamento de informações repassadas de forma confidencial e (3) de prevenir a prática delituosa, a Quarta Seção da referida Corte Europeia, além de abraçar os dois primeiros argumentos, analisou a terceira justificativa, rejeitando-a, porque a prevenção criminal, atribuição típica do Poder Público, não se aplicava ao caso vertente, porquanto, in casu, a quebra do sigilo jornalístico tinha sido requerida, não por órgão público, mas por entidade privada não estatal (sociedade empresária belga), que anelara, ao solicitar tal provimento estatal, identificar as pessoas que forneceram a órgãos de comunicação social informações sigilosas cuja divulgação midiática havia lhe ocasionado consideráveis prejuízos financeiros (§§ 58 e 16).

19 Ao avaliar se dada flexibilização no resguardo do sigilo jornalístico afrontou o art. 10 da CEDH, a Corte de Estrasburgo tende a ser mais rigorosa ao final do julgamento do mérito, quando da análise estribada justamente no último critério, por meio do qual esquadrinha se uma interferência estatal se demonstra necessária em uma sociedade democrática.

20 Em Goodwin v. the United Kingdom, de 27 de março de 1996, a Grande Câmara do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, ao fundear os alicerces da visão do TEDH sobre o descobrimento do manto do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s), postulou estas balizas:

20.1 Restringe-se às circunstâncias excepcionais, isto é, adstringe-se às situações em que estão em jogo interesses públicos ou privados de cunho vital (§ 37).

20.2 A margem discricionária para a autoridade nacional aferir se existe, na circunstância com a qual se depara, uma necessidade social premente de se relativizar o sigilo jornalístico encontra-se circunscrita pelo interesse da sociedade democrática de assegurar e manter a liberdade de imprensa, aspiração coletiva que se reveste de peso considerável, ao se sopesar se, em dado contexto concreto, a restrição ao caráter inviolável do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) foi proporcional à finalidade legítima perseguida pelo Estado que assim procedeu (§ 40).

20.3 Incumbe à Corte de Estrasburgo o múnus de verificar se o Estado contratante impôs, de fato, temperamentos à inviolabilidade do sigilo jornalístico, e, em caso afirmativo, se, ao fazê-lo, estribou-se em motivos relevantes e suficientes (§ 40), de tal sorte que tenha existido um razoável nexo de proporcionalidade entre, de um lado, a finalidade legítima que impeliu o Estado demandado a emitir ordem de quebra de sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) e, de outra banda, os meios adotados pelo aparelho estatal a fim de alcançar esse desiderato.

21 Ao esposar síntese da construção pretoriana acerca do sigilo jornalístico inaugurada em Goodwin v. the United Kingdom, a Quarta Seção do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em Roemen and Schmit v. Luxembourg, de 25 de fevereiro de 2003, consignou 3 (três) requisitos (§ 51) para se esclarecer se a flexibilização do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) foi necessária em uma sociedade democrática: (1) se a interferência contemplou necessidade social premente, (2) se foi proporcional à finalidade legítima perseguida e (3) se as razões declinadas pelas autoridades nacionais, ao justificarem as medidas restritivas, foram relevantes e suficientes.

22 Articulando com mais minudência tais balizas, a Terceira Seção da Corte de Estrasburgo, em Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, de 31 de março de 2009, reconheceu a margem discricionária para os Estados signatários da Convenção Europeia dos Direitos Humanos analisarem se, em determinada circunstância, faz-se presente uma necessidade social premente que torne, com o perdão da redundância, necessária em uma sociedade democrática, a quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s), ao mesmo tempo que salientou a competência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, como reflexo da supervisão europeia sobre a atuação dos Estados contratantes, de proferir a decisão final nos casos levados à sua apreciação (inclusive na qualidade de instância revisora de atos decisórios proferidos pelo respectivo Poder Judiciário nacional), relativamente à controvérsia acerca da congruência de tal medida estatal com a proteção à liberdade de expressão de que cuida o art. 10 da indicada Convenção (§ 54, alínea a), tendo em perspectiva não apenas verificar se a atuação discricionária do Estado demandado foi razoável, cuidadosa e de boa-fé como também julgar o meritum causae com esteio em uma visão ampla do caso concreto analisado, ou seja, efetuar o exame da interveniência estatal "à luz do caso como um todo" (Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 54, alínea b).

23 Enfatizou que, amparado nas informações prestadas pelo Estado contratante, cabe ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos averiguar se as autoridades nacionais avaliaram de forma adequada os fatos relevantes e se procederam em harmonia com o plexo normativo do art. 10 da CEDH, o que significa aferir se houve motivos suficientes e relevantes e se a medida adotada foi proporcional à finalidade legítima em mira (Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 54, alínea c).

24 Recordou que os temperamentos à inviolabilidade do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) somente se justificam quando existe um interesse público cuja densidade, na situação in concreto, sobreponha-se à importância do sigilo jornalístico em uma sociedade democrática e ao potencial efeito inibitório (chilling effect ou effet inhibant) da quebra do sigilo sobre o exercício da liberdade de imprensa (Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 54, alínea d).

25 Percebe-se, assim, a preferência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por intervenções estatais tópicas e sua oposição a medidas instrutórias que não se revelem indispensáveis ou que se denotem exorbitantes, a exemplo de devassas (materializadas, por vezes, por intermédio de buscas e apreensões indiscriminadas). Ilustrativos, nesse aspecto, precedentes da Quarta Seção (Roemen and Schmit v. Luxembourg, §§ 8º a 13, 15, 17, 52, 57 e 58, e Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 71), da Primeira Seção (Nordisk Film & TV A/S v. Denmark), da Segunda Seção (Ernst et Autres c. Belgique, §§ 101 a 105, e Tillack c. Belgique, §§ 6º a 9º e 66 a 68) e da Terceira Seção (Voskuil v. The Netherlands,§ 70) do TEDH.

26 Medidas instrutórias indiscriminadas, além de consistirem em intervenções desnecessárias na esfera jurídica dos jornalistas e de terceiros que com estes colaboram sob a condição de anonimato ou de sigilo, acarretam efeito inibitório excessivo sobre jornalistas, órgãos de comunicação social e eventuais fontes jornalísticas.

27 Com efeito, a Terceira Seção da Corte de Estrasburgo, em Voskuil v. The Netherlands (§ 70), de 22 de novembro de 2007, pontificou que medidas de quebra de sigilo jornalístico de longo alcance têm o condão de desencorajar pessoas que possuem informações verdadeiras e precisas de informarem aos meios de comunicação social a prática de ilícitos graves, como os que concerniam àqueles autos (tráfico de armas em Amsterdã).

28 Em outras palavras, na circunstância acima, a Terceira Seção do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos enxergou a intervenção estatal como prescrita por lei (encastoada no art. 294 do Estatuto Processual Penal dos Países Baixos) e direcionada à finalidade legítima (prevenção criminal), porém não a reputou necessária em uma sociedade democrática, ao divisar a prisão provisória de jornalista, durante 17 (dezessete) dias, medida judicial de longo alcance a inibir fontes jornalísticas de fornecerem à imprensa informações precisas e verdadeiras sobre ilícitos da espécie de que cuidavam aqueles autos ― tráfico de armas (Voskuil v. The Netherlands, §§ 50 a 56, 60, 71 e 72).

29 Com razão, a Quarta Seção do TEDH, em Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom (§ 63), de 15 de dezembro de 2009, observa que o efeito inibitório decorrente da quebra do sigilo bancário não incide somente sobre a pessoa que é, naquele caso concreto, a fonte do jornalista (efeito dissuasório, ante o risco e o temor de que sua identidade seja revelada) mas também sobre a reputação do respectivo órgão de comunicação social (o fato de ser o órgão em relação ao qual foi exigida a identificação de determinada fonte teria efeito dissuasório sobre outras pessoas ― inclusive do público ― que, por ventura, tivessem a eventual predisposição ou o potencial de lhe fornecer, de modo sigiloso, informações de interesse público, e, por receio de terem suas identidades posteriormente descobertas, mudariam de ideia, optando por não subsidiarem tais informações ao respectivo órgão de comunicação social), além de frustrar a parcela do público que almeja ter acesso a informações de interesse público repassadas por fontes anônimas. Mesma observação registrada em 14 de setembro de 2010, pela Grande Câmara da Corte de Estrasburgo (Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands, § 89).

30 Assinalou a Quarta Seção do TEDH, no acórdão acima citado (Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 63, in fine), que a conduta da fonte (a licitude ou ilicitude com que se houve uma pessoa, ao divulgar informações à imprensa) nunca deve ser o fator decisivo para se determinar a necessidade de uma ordem de quebra de sigilo jornalístico: ainda que relevante, convém que figure como mais um fator, dentre outros, a ser considerado, ao se avaliar o coeficiente de proporcionalidade da medida estatal impugnada.

31 No precedente em testilha, ressaltou-se a presença de efeito inibitório quando o jornalista é compelido a colaborar com a identificação de fontes anônimas, independente dos documentos requisitados pela autoridade judiciária contemplarem tal finalidade de modo direto ou indireto (Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 70).

32 No decisum em liça, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condicionou a quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) voltada à prevenção do vazamento de informações confidenciais e sensíveis (a) à ausência de meios alternativos, razoáveis e menos intrusivos de se alcançar tal fito e (b) à existência de risco de vazamento cuja gravidade seja suficiente para justificar tal medida e, por outro lado, consubstancie risco definido (Financial Times Ltd and Others v. The United Kingdom, § 69).

33 Conforme resplandecido alhures, a Grande Câmara do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em Sanoma Uitgevers B. V. v. The Netherlands §§ 90 a 93, no âmbito do critério da prescrição por lei, rutilou a exigibilidade de que órgão externo às partes (independente) exerça o controle, como instância revisora, da juridicidade da ordem de quebra do sigilo jornalístico, o que implica realizar tal exame firme, inclusive, no critério da necessidade, ao assim proceder:

33.1 Efetuar a prévia verificação — antes do fornecimento à autoridade (que o solicitou) do material fruto da quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s) — da predominância, no caso concreto, do interesse público específico da persecução penal atinente à circunstância in concreto sobre o interesse público geral da preservação da inviolabilidade do sigilo jornalístico.

33.2 E promover a prevenção do acesso desnecessário a informações capazes de revelar a identidade da fonte. De acordo com essa linha de raciocínio, cabe ao órgão revisor o múnus de cogitar, inclusive, a possibilidade de determinar seja adotada medida igualmente adequada ao fim colimado, porém menos ofensiva à salvaguarda do sigilo jornalístico, ou, ainda, de anular in totum a ordem de quebra do sigilo jornalístico, caso se revele totalmente despicienda. Trata-se de profilaxia indispensável, mesmo que no conteúdo do material cujo sigilo é objeto do pedido de quebra judicial não haja explícita menção a quem atua, no contexto fático em liça, como fonte jornalística.

34.1 Em complemento ao eixo temático do presente trabalho, centrado na jurisprudência remansosa do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos acerca da quebra do sigilo das fontes jornalísticas, recorda-se o correlato precedente da Correição Parcial nº 2008.72.00.005353-8/SC (Relator, Desembargador Federal Néfi Cordeiro), julgada em 3 de novembro de 2009, em que a Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, em votação unânime, filiou-se ao pensamento segundo o qual o resguardo do sigilo da fonte deve preponderar, em benefício da liberdade de informação, sobre a promoção de provas voltadas à persecução penal. Frisou-se a impossibilidade jurídica de se impor a outrem a prática do tipo penal de violação de sigilo profissional (o art. 154 do Código Penal).

34.2 Em tal julgado, a 7ª Turma do TRF/4ª, capitaneada pelo voto condutor do Desembargador Federal Néfi Cordeiro, baseou-se no parecer alinhavado pela Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza, a qual, ao dissentir do entendimento firmado na instância original pelo membro do Ministério Público Federal atuante como órgão-autor, reputou incabível a pretendida relativização do sigilo da fonte jornalística, tendo em vista não apenas o fundado risco da quebra do sigilo jornalístico afetar a liberdade de informação (na condição de sustentáculo do regime democrático) e sujeitar o jornalista (que desnovela a identidade da sua fonte) a realizar o tipo penal de violação de sigilo profissional como também a ausência de indícios elementares de que o profissional do Jornalismo investigado tenha concorrido para a quebra do sigilo judicial.

34.3 Em outros dizeres, ponderou-se que o jornalista teria obtido sua informação de maneira lícita — a pessoa natural que lhe serviu de fonte é que teria se portado de forma antijurídica, ao fornecer àquele gravações que deveriam estar infensas à divulgação pública, escudadas pelo elmo do segredo judicial.

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Sobre o autor
Hidemberg Alves da Frota

Especialista em Psicanálise e Análise do Contemporâneo (PUCRS).Especialista em Relações Internacionais: Geopolítica e Defesa (UFRGS). Especialista em Psicologia Clínica Existencialista Sartriana (Instituto NUCAFE/UNIFATECPR). Especialista em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário (PUCRS). Especialista em Ciências Humanas: Sociologia, História e Filosofia (PUCRS). Especialista em Direitos Humanos (Curso CEI/Faculdade CERS). Especialista em Direito Internacional e Direitos Humanos (PUC Minas). Especialista em Direito Público (Escola Paulista de Direito - EDP). Especialista em Direito Penal e Criminologia (PUCRS). Especialista em Direitos Humanos e Questão Social (PUCPR). Especialista em Psicologia Positiva: Ciência do Bem-Estar e Autorrealização (PUCRS). Especialista em Direito e Processo do Trabalho (PUCRS). Especialista em Direito Tributário (PUC Minas). Agente Técnico-Jurídico (carreira jurídica de nível superior do Ministério Público do Estado do Amazonas - MP/AM). Autor da obra “O Princípio Tridimensional da Proporcionalidade no Direito Administrativo” (Rio de Janeiro: GZ, 2009). Participou das obras colegiadas “Derecho Municipal Comparado” (Caracas: Liber, 2009), “Doutrinas Essenciais: Direito Penal” (São Paulo: RT, 2010), “Direito Administrativo: Transformações e Tendências” (São Paulo: Almedina, 2014) e “Dicionário de Saúde e Segurança do Trabalhador” (Novo Hamburgo: Proteção, 2018).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FROTA, Hidemberg Alves. Os limites à quebra do sigilo da(s) fonte(s) jornalística(s), à luz da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3090, 17 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20660. Acesso em: 25 abr. 2024.

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