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Responsabilidade ambiental da administração pública por danos decorrentes de condutas omissivas na visão da jurisprudência brasileira

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21/03/2012 às 16:10
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Ainda prevalece a responsabilidade subjetiva da Administração por danos ambientais nas hipóteses de omissão, mas é preciso implementar um regime constitucional atruibuindo o mesmo regime de responsabilidade objetiva que se tem para condutas comissivas.

Sumário: Introdução; 2. Lacunas no Direito; 2.1. Métodos de integração; 2.1.1 Analogia; 2.1.2 Costumes; 2.1.3 Princípios Gerais do Direito; 3. A visão jurisprudencial da responsabilidade ambiental da Administração Pública; 4. Os paradigmas da responsabilidade da Administração Pública por danos ambientais decorrentes da omissão; Conclusão; Referências.

Resumo: A responsabilidade da Administração Pública por danos ambientais decorrentes de condutas omissivas tem sido alvo de constantes divergências jurisprudenciais, ora admitindo-se a incidência da responsabilidade objetiva, com amparo na Lei nº 6.938/81, ora admitindo-se a responsabilidade subjetiva do Poder Público, com base no art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Tal divergência deriva, sobretudo, da falta de clareza da Lei nº 6.938/81 quanto à regulamentação aplicável nesta hipótese, ensejando a configuração de uma possível lacuna. Diante desse cenário, o presente trabalho se propõe a averiguar a existência de um efetivo vazio normativo na Lei nº 6.938/81, mediante o estudo prévio das lacunas no direito e suas formas de integração, bem como dos paradigmas que sustentam cada uma das correntes acerca da responsabilidade da Administração Pública.

Palavras-chaves: Responsabilidade civil. Dano ambiental. Administração Pública; Omissão.

Abstract: The State’s liability for environmental damage resulting from omission has been treated in different ways in case law, assuming, in many opportunities, the incidence of the strict liability, with support in the Law 6938/81, and in others, the based-fault liability, provided on art. 37, § 6, of the Federal Constitution. This difference stems mainly from lack of clarity of the Law 6938/81, allowing the configuration of a possible gap. In this scenario, this article seeks to ascertain the existence of an effective regulatory void in Law 6938/81, by a previous study of the gaps in the law, its forms of integration and the paradigms that support each of the theories about Public Administration’s liability.

Key-worlds: Civil liability. Environmental damage. Public Administration. Omission.


INTRODUÇÃO

O art. 225 da Constituição Federal de 1988 consagra o direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso do povo e essencial à sadia qualidade de vida, ao mesmo tempo em que impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Tal imposição implica a assunção de uma série de obrigações, cujo descumprimento enseja a responsabilização de quem der causa a danos ao meio ambiente.

“Responsabilização”, nesse contexto, tem por origem a palavra latina respondere, abrangendo a noção de garantia, isto é, de alguém se colocar como garantidor de algo – um dever jurídico – e sujeitar-se a reparar eventual dano oriundo da inobservância dessa posição.

Duas são as modalidades de responsabilidade admitidas pelo Direito: a objetiva e a subjetiva. Ambas possuem como elementos comuns o dano, o nexo causal e uma conduta, que poderá ser comissiva ou omissiva. Entretanto, a caracterização da responsabilidade subjetiva demanda, ainda, a existência de dolo e/ou culpa, sem os quais não se verificará o obrigação de reparação. Já a responsabilidade objetiva prescinde da averiguação do dolo e da culpa, bastando, para o estabelecimento de sua correspondente relação jurídica, os três elementos anteriormente citados.

Na seara do direito ambiental, o art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, ao apregoar que “é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”, claramente elege a responsabilidade objetiva como forma de tutelar o meio ambiente nas hipóteses de condutas lesivas comissivas. Porém, em relação às condutas omissivas, a Lei nº 6.938/81 não foi expressa quanto à natureza da responsabilidade incidente, o que tem gerado variadas discussões frente uma possível lacuna, especialmente quando esta omissão é atribuída à Administração Pública.

Em contrapartida, o Direito Administrativo, com substrato no art. 37, § 6º, da Constituição Federal 1988, tradicionalmente reconhece que a responsabilidade do Poder Público é objetiva quando se trata de danos causados por atos comissivos, e subjetiva quando o dano decorrer de omissões dos agentes públicos, fórmula que muitos não consideram adequada para o enfrentamento da reparação ambiental.

À vista do problema exposto, o presente trabalho tem por objetivos discorrer sobre as lacunas no Direito e suas formas de integração, bem como averiguar de que forma a responsabilidade da Administração Pública por omissões lesivas ao meio ambiente vem sendo tratada pelos tribunais brasileiros, para, então, analisar se efetivamente a Lei nº 6.938/81 ostenta alguma espécie de vazio normativo com relação às pessoas jurídicas de direito público.


2 LACUNAS NO DIREITO

Empiricamente, entende-se por lacuna a ausência de norma em face de determinados comportamentos. A compreensão das lacunas no Direito, porém, está longe de ser encarada de forma tão simplista.

A densidade – e até mesmo a dificuldade – da temática em estudo começa pelo plano de existência das lacunas, já que renomados juristas chegam a negá-las, sob o argumento matriz comum de que o Direito consiste em um sistema fechado, hermético e autossuficiente quanto à regulamentação de todos os comportamentos em sociedade.

Esse ponto de vista pressupõe o exame das características do sistema jurídico, especialmente se este é concebido como um sistema aberto e incompleto ou como uma unidade normativa perfeita, completa e acabada.

Na concepção fechada de sistema, as lacunas são apenas aparentes e parte-se da premissa que sempre haverá uma norma aplicável a cada caso concreto. Seus fundamentos repousam no “princípio da razão suficiente” e no dogma da plenitude hermética da norma jurídica.

 Dentre os adeptos das teorias negadoras da existência das lacunas está Savigny, para quem o Direito é universal e dispõe de tamanha força orgânica que toda vez que um fato não encontrar regulamentação expressa em lei, será certamente possível alocá-lo em face de outro instituto jurídico preexistente. Em outra vertente dessa visão, Hans Kelsen trabalha a ideia de que “tudo o que não está juridicamente proibido, está permitido” para negar a existência das lacunas – as quais não passariam de mera ficção – e propagar o caráter pleno do sistema jurídico, capaz de oferecer, por si só, a solução para todos os conflitos postos ao Judiciário.

De outro lado, encontra-se a corrente que defende a incompletude do sistema jurídico e, por conseguinte, a existência das lacunas. Em breves linhas, advoga tal corrente que o Direito (dever ser) possui um caráter dinâmico e está constante mutação para melhor se adaptar aos anseios reclamados pela sociedade (o ser), embora nem sempre seja possível ao legislador prever e normatizar todas as relações sociais na mesma velocidade em que estas se transformam. Do descompasso entre a existência da norma e a realidade a ser regulada, surge a lacuna, que, em certa medida, representa a ruptura da tridimensionalidade do Direito – fato, valor e norma.

É fácil observar que o sistema jurídico brasileiro abraça a tese da existência das lacunas. A Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, recentemente alterado pela Lei nº 12.376, de 30 de dezembro de 2010) enuncia em seu art. 4º que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”, em franca admissão da natureza aberta e incompleta do ordenamento.

Avançando, torna-se também importante discorrer rapidamente acerca das classificações oferecidas pela doutrina em relação às espécies de lacuna para melhor compreender a essência deste instituto. Neste ponto, será concentrada maior atenção em apenas cinco proposições doutrinárias, dada à vastidão e riqueza do tema.

As lacunas são autênticas quando a lei não contemplar uma solução para o caso concreto. É a hipótese típica de lacuna tratada na conceituação inicial deste tópico. As lacunas são consideradas não autênticas quando, apesar de existir previsão normativa expressa, a solução conferida pelo ordenamento jurídico não se amolda ao fato, por ser tida como falsa ou insatisfatória.

 A distinção acima é uma primeira tentativa de diferenciar as lacunas entre normativas e axiológicas. As lacunas normativas correspondem às lacunas autênticas: ausência de norma para regular o caso concreto. Já as lacunas axiológicas giram em torno da discrepância entre o ato legislativo e os valores vivenciados por uma determinada sociedade, onde a norma, a despeito de estar posta e vigente, é considerada injusta.

As lacunas podem ainda ser originárias, também denominadas primárias, quando o “vácuo” normativo é verificado desde o início da ordem jurídica posta, e derivadas, ou secundárias, quando o surgimento da lacuna dá-se um momento posterior à vigência do ordenamento, em virtude transformações fáticas, valorativas ou institucionais, que não foram acompanhadas por uma atualização normativa correspondente.

Outra relevante classificação refere-se às lacunas deontológicas e ontológicas. Segundo as lições de Diniz (2007, p. 89/90),

 As lacunas deontológicas seriam inadequações da ordem normativa ao “dever-ser” (Sollen), ou seja, àquilo que deve ser. Trata-se de uma lacuna de dever-ser, quando há uma coisa em relação ao processo avaliativo que não se pode avaliar, por faltar um critério. Esse tipo de lacuna contém duas subespécies. Das lacunas deontológicas resultam as ideológicas – caso em que temos lacunas relacionadas a um critério transcendente, isto é, extrínseco à ordem jurídica, expressando a ausência de uma qualificação justa de um comportamento e a presença de uma norma que difere daquilo que se estima como justo, apresentando uma inadequação da ordem normativa em relação a uma ideologia dessa mesma ordem – e as teleológicas ou técnicas – subsistem em relação a um critério imanente, apresentando uma inadequação da ordem normativa a um fim imanente à própria ordem, contendo uma ausência de eficácia, ou por outras palavras, integrando a ausência de uma norma cuja validade é condição de eficácia de uma outra.

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As lacunas ontológicas representam inadequações da ordem normativa quanto ao “ser” (Sein), aquilo que é, abrangendo as lacunas críticas e diacríticas. Há lacunas críticas quando for impossível uma avaliação deôntica de um comportamento de acordo com a norma, devido à incompletude da ordem jurídica. (...) As lacunas diacríticas derivam da impossibilidade de uma decisão ou de uma resolução para o caso concreto controvertido. As lacunas ontológicas e as deontológicas ideológicas são lacunas do direito, ao passo que as lacunas deontológicas teleológicas são lacunas no direito.

Finalmente, as lacunas podem ser também intencionais ou voluntárias, verificadas quando o legislador, deliberadamente, confere um caráter aberto à norma jurídica, já visando que a atuação futura do intérprete venha a completá-la, e não intencionais ou involuntárias, quando o vazio normativo não é fruto de um propósito legislativo, mas sim de uma atecnia na elaboração da norma ou da impossibilidade de se prever, no momento do processo legiferante, todas as situações merecedoras da regulação estatal.

Todas as colocações vistas acima revelam que a problemática das lacunas ultrapassa a mera noção de omissão normativa frente a um determinado comportamento, constatação que se reflete na prática jurídica cotidiana, sobretudo ante as dificuldades enfrentadas pelos tribunais na superação dos mais diversos conflitos gerados ora em função da ausência de norma, ora da inadequação valorativa entre a norma em vigor e as demandas do caso concreto.

Por tal motivo, os mecanismos de integração das lacunas instituídos pelo art. 4º do Decreto-Lei nº 4.657/42 ganham destaque na atividade dos magistrados, ao mesmo tempo em que despontam como instrumentos fundamentais para a garantia constitucional do acesso à justiça.

2.1 MÉTODOS DE INTEGRAÇÃO

Como visto anteriormente, o próprio ordenamento jurídico em vigor no Brasil indica os meios que o magistrado deve se valer para o preenchimento das lacunas legais.

Desse modo, no cenário onde impera a ausência de norma geral, a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito servirão de instrumentos para a construção de uma norma individual a ser aplicada no caso concreto.

Dois são os métodos tradicionais de complementação das lacunas: a autointegração, cujo elemento suplementador da lei é a própria lei, e a heterointegração, cujas fontes de suplementação correspondem a elementos outros diversos da lei. A analogia é a hipótese mais recorrente de autointegração, enquanto que os costumes e a equidade constituem exemplos de heterointegração.

Os itens seguintes explorarão os meios de integração previstos no art. 4º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro.

2.1.1 Analogia

Primeiro dos métodos de integração apontados no art. 4º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, a analogia, nas linhas traçadas por Reale (1998, p. 298), é o processo pelo qual

estendemos a um caso não previsto aquilo que o legislador previu para outro semelhante, em igualdade de razões. Se o sistema do Direito é um todo que obedece a certas finalidades fundamentais, é de se pressupor que, havendo identidade de razão jurídica, haja identidade de disposição nos casos análogos, segundo um antigo e sempre novo ensinamento: ubi eadem, ibi eadem juris dispositio (onde há a mesma razão deve haver a mesma disposição de direito).

Quando recorremos, portanto, à analogia, estendendo a um caso semelhante a resposta dada a um caso particular previsto, estamos, na realidade, obedecendo à ordem lógica substancial ou à razão intrínseca do sistema.

A analogia é, antes de tudo, um exercício intelectual de comparação e valoração entre dois fatos semelhantes, no qual se busca aplicar a um deles – sem previsão específica em uma norma jurídica – a regulamentação em vigor para o outro.

A similitude exigida como pressuposto da analogia liga-se muito mais às razões da norma a ser estendida (ratio legis) do que às características fáticas compartilhadas pelos casos comparados, de forma que os traços coincidentes entre as situações cotejadas devem, inexoravelmente, ensejar a aplicação de uma mesma norma para se fazer a justiça comum por ambas exigida. Com efeito, a premência de igualdade jurídica entre a situação normatizada e a não normatizada apresenta-se como o fundamento maior da analogia.

Nesse contexto, os requisitos da analogia são, pois, os seguintes: a ausência de norma a regular um determinado caso concreto, a similitude entre o caso não regulado e aquele amparado expressamente por uma norma e a existência de uma mesma razão jurídica que justifique a extensão da tutela normativa expressa ao caso não contemplado na lei, revelada, em última instância, na necessidade de se conferir um tratamento jurídico igualitário às duas situações.

Muito se debate sobre a natureza jurídica da analogia.

A tese mais aceita atualmente pela doutrina refuta enquadrá-la tão somente no campo da Lógica Formal, uma vez que a analogia não se ajusta adequadamente nem ao método de dedução e nem ao de indução. O raciocínio estrutural empregado na analogia compõe-se de premissas particulares que levam uma conclusão também particular, ao passo que, na dedução, parte-se do geral para o particular, e na indução, do particular para o geral.

Em função desse desajuste, a analogia tem sido considerada mais como um procedimento de averiguação valorativa, justamente por almejar uma justiça igualitária para casos semelhantes, onde os elementos axiológicos da norma posta são “transferidos” para o fato não normatizado, que compartilha de sua mesma ratio legis.

É interessante registrar, ao fim, que nem todos os campos do Direito demonstram a mesma aceitação quanto ao uso da analogia. Via de regra, em alguns ramos do direito público, onde predomina o legalismo estrito, a analogia tende a ser afastada, visto que a amplitude que esta confere ao enunciado normativo muitas vezes implica na transformação do núcleo regra em vigor. É o que ocorre com o direito penal[1] e com o direito tributário[2].

2.1.2 Costumes

Os costumes constituíram as primeiras fontes do Direito e hoje exercem um papel subsidiário frente à lei.

Para que se revista de juridicidade, o costume deve ser dotado de dois elementos: um de ordem objetiva, relacionado com a repetição constante de um comportamento por um considerável período (consuetudo), e outro subjetivo, ligado à consciência e à necessidade coletiva de se observar o costume, imprimindo-lhe status de conduta obrigatória (opinio juris et necessitatis).     

Os costumes, quando comparados à lei, podem-se ser secudum legem, praeter legem e contra legem.

Secudum legem é o costume amparado por lei. Diniz (2007, p. 204) aponta como exemplo dessa modalidade de costume o art. 1.297, § 1º, do Código Civil, cujo enunciado assim dispõe:

Art. 1.297...........

§ 1º Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação. (grifo nosso)

Outro exemplo de costume secudum legem é extraído do art. 100, inciso III, do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro 1966), enunciado que expressamente considera as “práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas” como normas complementares das leis, tratados, convenções internacionais e decretos em matéria fiscal.

Praeter legem é o costume mencionado pelo art. 4º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, cuja função é tipicamente supletiva frente às lacunas legais.

Contra legem corresponde ao costume capaz de levar a lei ao desuso, pois se forma em sentido oposto a ela. O intuito implícito do costume contra legem é o de revogar a disposição legal, já que o conteúdo normativo encontra-se em conflito com os valores sociais.

Em continuação, passa-se a uma breve explanação sobre o último mecanismo de integração das lacunas citado pelo Decreto-Lei nº 4.657/42.

2.1.3 Princípios gerais do direito

A partir da já clássica definição de autoria de Mello (1997, p. 450), entende-se por princípio o “mandamento nuclear de um sistema”, a “disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência”.

Abre-se espaço para destacar uma peculiaridade não salientada acima: os princípios gerais do direito, mais do que meras proposições basilares de natureza axiológica, são elementos de coesão da ordem jurídica, sem os quais o Direito perderia seu caráter de ciência sistematizável, não passando de um agrupamento desorganizado de normas. Dessa forma, os princípios identificam-se tanto pelo seu conteúdo, quanto pela sua função de estruturar o ordenamento jurídico.

A noção dos princípios gerais enquanto elementos de coesão e estruturação do Direito nasce em decorrência da validade que estes conferem às demais normas jurídicas. O princípio, assim, funciona como filtro através do qual se verifica a adequação da norma jurídica com o sistema onde ela se situa.

Além da possibilidade de se utilizar os princípios para o preenchimento de lacunas, através deles é possível também alterar, por vezes, o próprio núcleo da norma jurídica, revisitando o seu sentido e alcance para atualizá-la, segundo os valores tutelados pelo ordenamento em determinado espaço e tempo.

Diante disso, exercem os princípios as seguintes funções: a integradora, consagrada no Decreto-Lei nº 4.657/42, e a interpretativa, na qual os princípios condicionam e orientam a compreensão da norma posta, auxiliando o operador do direito a extrair o seu conteúdo em consonância com o sistema jurídico vigente.

Estas, porém, despontam como aplicações secundárias ou indiretas dos princípios, onde caberá à norma jurídica condicionar o seu manejo.

Retirando-os do papel de coadjuvantes, torna-se mais e mais aceita a ideia de que os princípios funcionam tal como as normas, incidindo diretamente sobre fatos e relações sociais, a fim de regulá-los.

O reconhecimento de que princípios gerais do direito possuem natureza de norma jurídica sobreleva seu cunho prescritivo, ainda que acobertado por comandos mais genéricos do que os observados nas demais regras jurídicas.

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Sobre a autora
Ana Beatriz da Motta Passos

Procuradora do Município de Manaus. Especialista em Direito Tributário pela Universidade Federal do Amazonas. Mestranda em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PASSOS, Ana Beatriz Motta. Responsabilidade ambiental da administração pública por danos decorrentes de condutas omissivas na visão da jurisprudência brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3185, 21 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21336. Acesso em: 2 nov. 2024.

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