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O princípio da dignidade da pessoa humana e a ineficácia da execução da pena devido à ociosidade do condenado

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09/04/2012 às 10:36
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Frente aos direitos inerentes a qualquer cidadão, como resolver o problema da falta de perspectivas do condenado, que possui um imenso tempo disponível ao vazio, e que um dia espera retornar àquela mesma sociedade que o condenou?

Resumo: O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um pilar basilar da República Federativa do Brasil. O pessoa do condenado perde o direito a sua liberdade, mas mantém íntegro todos os direitos inerentes à qualquer cidadão. A lei de execução penal, em corolário com a Carta Constitucional, prevê todos os direitos do condenado, entre eles a educação e o trabalho, os quais dignificam o ser humano, proporciona a ressocialização e resolve, em tese, o problema da falta de perspectiva do condenado ao retornar à sociedade que o condenou. O sistema carcerário do Brasil está em crise, com cadeias superlotadas, rebeliões, falta de motivação e desinteresse do setor público, e não se apresenta como um dos melhores meios para a ressocialização do criminoso, motivo que nos leva a repensar os meios, e manter o condenado na atividade laborativa e educacional, a fim de que possam ingressar na sociedade melhores de que quando saíram, minimizando os efeitos da prisionização, e não o contrário. Todavia, como resolver a questão se o poder estatal não oferece condições básicas para a verdadeira recuperação do criminoso, que morre aos poucos pela incapacidade de sonhar e de querer ser feliz. Para isso, o presente trabalho visa o estudo dos direitos do condenado na Lei de Execuções Penais, em especial o trabalho e o estudo, frente aos Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Humanidade, com o objetivo de realçar a função ressocializadora da pena, atribuindo para tanto, ser necessário mais convênios entre o poder público e particulares, oferecendo-lhes incentivos fiscais, a fim de que o particular se interesse pela ressocialização do delinquente e para que a ociosidade do condenado não seja motivo para sua mente fértil na continuidade e modernização dos crimes, e sim, em busca de uma sonhada vida melhor.

Palavras-chave: Dignidade Humana. Execução da Pena. Direito do Preso. Ociosidade do Condenado. Prisionização.

Sumário: 1. Introdução. 2. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 3. Princípio da Humanidade. 4. Funções da Pena. 4.1. Função Retributiva. 4.2. Função Preventiva. 4.3. Função Ressocializadora. 5. Os Direitos do Preso. 5.1. O Direito ao Trabalho e a Educação do Preso. 6. O Atual Sistema Carcerário Brasileiro. 7. A Ociosidade do Condenado. Conclusão. Referências.


1. INTRODUÇÃO

A vontade e o desejo de qualquer ser humano em busca de fama e sucesso tornam-se motivações: em alguns desencadeia a força para o desenvolvimento intelectual, educacional, profissional, em busca da tão sonhada fortuna, enquanto para outros, mal conseguem a oportunidade de trabalho, desencadeando, assim, a ira e a revolta. Então, a solução encontrada por estes é o crime, caminho talvez mais fácil para as mentes menos desenvolvidas.

Todo o ser humano é dotado de personalidade (desenvolvimento humano). O convívio e seu status social influenciarão no desenvolvimento deste ser. Cada indivíduo reage de uma maneira em relação aos problemas enfrentados durante todo o ciclo da vida, e isso acontece desde a sua concepção.

Vygotsky (apud Bianchi Silva, 2009) “aponta a importância de entender a relação entre aprendizagem e desenvolvimento para conseguir melhor as especificidades humanas. Por essa razão, ao pensar em desenvolvimento humano, estamos construindo uma relação íntima com a educação, que também é vista como ponto central do processo de formação do homem”.

O artigo 1º da Constituição Federal de 1988, no título I – Dos Princípios Fundamentais, diz que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

Atualmente há debates fervorosos sobre a dignidade da pessoa humana e os direitos humanitários, no entanto, vive-se numa verdadeira crise do sistema penal carcerário (numa ótica da pena privativa de liberdade), que se baseia na falta de infraestrutura, superlotação, rebeliões, fugas, torturas e principalmente, ocasionada pela ociosidade e total ausência de perspectivas dos condenados.

Frente aos direitos inerentes a qualquer cidadão (enfoque o direito a dignidade humana), como resolver o problema da falta de perspectivas do condenado, que possui um imenso tempo disponível ao vazio, e que um dia espera retornar àquela mesma sociedade a qual o condenou.

É digno ao condenado a educação e o trabalho? É digno ao condenado, que o Estado lhe dê condições e perspectivas de um futuro melhor?

Em Kant, o que caracteriza o ser humano, e o faz dotado de dignidade especial é que ele nunca pode ser meio para os outros, mas fim em si mesmo. Como diz Kant, "o homem, e, de uma maneira geral, todo o ser racional, existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade”.

Se o homem é um fim em si mesmo, e o Estado opera em função dele, porque não dizer que o próprio Estado ofende o princípio consagrado na Carta Magna, quando não dá soluções aos seus problemas, e faz das prisões um depósito de gente, sem dar-lhes um tratamento humano e justo.

Existe aqui um verdadeiro paradoxo entre a função ressocializadora da pena e o sistema carcerário adotado. Há de levar em consideração o meio em que vive o condenado e suas tarefas, dando-lhe condições dignas de educação e trabalho, como bem institui a Constituição Federal e a Lei de Execuções Penais, caso contrário, não há em um futuro breve solução para o problema da criminalidade. O trabalho do condenado tem que ser visto como finalidade educativa e produtiva, com objetivo de dever social e resgate da dignidade da pessoa humana.

Com isso, é necessária uma revisão em todo o sistema carcerário brasileiro, pois a ociosidade do condenado concretiza a máxima popular de que “mente vazia é a oficina do diabo”, e esta responsabilidade, se dá ao Estado, que nada faz para combater o mal em sua fonte.

Se existem vidas encarceradas por fazer mal a sociedade, por ofensa ao bem jurídico tutelado, podemos dizer o mesmo do Estado, o qual ofende princípios jurídicos constitucionais, e permite que criminosos retornem a sociedade pior do que quando foram condenados. Algo tem que ser feito, e isso acontece por meio da educação e do trabalho digno, caso contrário, a sociedade estará sempre refém de um poder paralelo, que é a indústria do crime.

Assim, o objetivo deste trabalho é debater sobre a ociosidade do condenado e os direitos do ser humano, frente ao atual sistema carcerário, traçando um verdadeiro paradoxo à função ressocializadora da pena e a ociosidade do condenado.

Para isso, é preciso apresentar propostas que favoreçam o verdadeiro resgate do condenado à reinserção social.


2. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A Carta Constitucional trouxe em seu Título I, como fundamento constituído no Estado Democrático de Direito, o princípio da dignidade da pessoa humana. Portanto, é a raiz dos direitos fundamentais de qualquer cidadão, o qual deve ser respeitado quando em confronto com os demais.

Neste sentido, José Afonso da Silva (1999) coloca em posição de destaque a dignidade da pessoa humana, manifestando que “é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem”.

No mesmo raciocínio, Alexandre de Moraes (apud Silva de Moraes. 2011) revela que “a dignidade da pessoa humana concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas” e complementa:

(...) a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

É neste sentido que a dignidade da pessoa humana é considerada inalienável, irrenunciável, intrínseca e inerente a todo o ser, “constituindo elemento que qualifica o ser humano como tal e dele não pode ser destacado, devendo, de todo o modo, ser respeitada, promovida e protegida”. (Wolfgang apud Silva de Moraes, 2011)

Segundo Boldrini (2003), “o texto constitucional consagrou o valor da dignidade da pessoa humana como princípio máximo e o elevou, de maneira inconteste, a uma categoria superlativa em nosso ordenamento, na qualidade de norma jurídica fundamental”.

Por isso, defende Lacambra (apud Ferreira dos Santos, 2001), que "não há no mundo valor que supere ao da pessoa humana", a primazia pelo valor coletivo não pode, nunca, sacrificar, ferir o valor da pessoa. A pessoa é, assim, um minimun, ao qual o Estado, ou qualquer outra instituição, ser, valor não pode ultrapassar.

Defende-se, ainda, que a pessoa humana enquanto valor e o princípio correspondente, de que aqui se trata, são absolutos e há de prevalecer sempre, sobre qualquer outro valor ou princípio.

Segundo Débora Veneral (2011), com base Kantiana, a dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, cujo valor deva manifestar-se na condução de sua própria vida e no respeito à vida dos seres humanos que vivem em sociedade.

Aliás, a finalidade da sociedade humana é a busca pelo bem comum, e isso quer dizer que ela busca a criação de condições que permitam a cada homem e a cada grupo social a consecução de seus respectivos fins particulares. Quando uma sociedade está organizada de tal modo que só promove o bem de uma parte de seus integrantes, é sinal de que ela está mal organizada e afastada dos objetivos que justificam sua existência. (GURVITCH, 1968)

Ainda que o criminoso tenha que pagar pelo mal causado pela sua conduta (típica, antijurídica e culposa), numa ótica de Kant, que “considera que o réu deve ser castigado pela única razão de haver delinquido, sem nenhuma consideração sobre a utilidade da pena para ele ou para os demais integrantes da sociedade”. (BITECOURT, 2008)

Nos dias atuais, o entendimento Kantiano parece ter aflorado, pois esta tem sido a única função da pena (retributiva). A sociedade não mais se indigna dos fatos delituosos ocorridos, e o mal só aumenta (função preventiva especial e geral não tem funcionado adequadamente), mesmo assim, os direitos inerentes a qualquer cidadão não poderão jamais ser ofendidos, ainda mais por aquele que se prestou a dar o mínimo de sobrevivência ao cidadão, ou seja, o Estado.

Este princípio fundamental da república, considerado de curial importância em todos os seguimentos da sociedade, eleva o ser humano a uma condição que lhe pertence, intrínseco à existência do próprio Estado.

Nessa toada, assevera que o entendimento adotado pela Doutrina, como muito bem menciona MARTINS (2003), é:

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Conceber a dignidade da pessoa humana como fundamento da República significa admitir que o estado brasileiro se constrói a partir da pessoa humana, e para servi-la. Implica, também, reconhecer que um dos fins do Estado brasileiro deve ser o de propiciar as condições materiais mínimas para que as pessoas tenham dignidade.

No entanto, não devemos ser hipócritas ao ponto de acreditarmos na solução para todos os problemas, inclusive no que se refere à ofensa a este bem jurídico, que é da maior importância (a dignidade, como ser, como pessoa), pois é cediço que o Estado não propicia um mínimo necessário aos seus administrados, chamados de carentes, livres, porém sem quaisquer garantias de alimentação, vestuário, moradia, assistência médica, lazer, etc.

Porém, o ponto nodal consiste em verificar as condições desumanas que os presos têm vivido nas prisões, segregado de sua liberdade e sob a batuta do Estado, e tendo que cumprir penas, muitas vezes provisórias, sem qualquer garantia mínima de ressocialização e de manutenção do seu ser.

Neste diapasão que o consagrado fundamento da República, a dignidade da pessoa humana, vem para realçar que todos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção, ainda que condenados e segregados de liberdade.

Até aqui, tem-se que a dignidade da pessoa humana independe das circunstâncias concretas de cada indivíduo, uma vez que inerente a toda e qualquer pessoa, não sendo outro, por conseguinte, o entendimento que subjaz ao artigo 1º da Declaração Universal da ONU (1948), segundo o qual “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”.


3. PRINCÍPIO DA HUMANIDADE

Não bastasse o mencionado princípio da dignidade da pessoa humana, tem-se em corolário o princípio da humanidade, que sustenta que o poder punitivo estatal não pode aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a constituição físico-psíquica dos condenados.

Frente a isto, a Constituição da República de 1988 consagrou em seu artigo 5º, incisos XLIX e XLVII, “o respeito à integridade física e moral”, vedando a “aplicação de pena de natureza cruel e degradante” aos presos.

A vedação de penas cruéis, consagrada no artigo 5º, XLIX, da Constituição Federal de 1988, deixa claro o caráter humanitário da pena e, consequentemente, a vedação de conduta comissiva ou omissiva do Estado, causadora de violação aos direitos dos condenados a uma vida digna, mesmo cumprindo pena em regime fechado.

No entanto, segundo o entendimento de Cezar Roberto Bitencourt (2008), em uma visão ampliada, tem que a pena privativa de liberdade, em um contexto global do sistema carcerário, com os fins que a função da pena se presta, fere a carta magna em seu artigo 5º incisos XLIV e XLVII, pois nenhum ser trancafiado em uma cela minúscula superlotada, sem ter o que fazer (trabalho e estudo), consegue superar os traumas que isso lhe acarreta, tornando-se uma pena cruel e desumana.

Ao referir-se sobre as prisões discricionárias dos magistrados, Beccaria (1764) já se referia sobre a importância do princípio humanitário na execução das penas:

À medida que as penas forem mais brandas, quando as prisões já não forem à horrível mansão do desespero e da fome, quando a piedade e a humanidade penetrarem nas masmorras, quando enfim os executores impiedosos dos rigores da justiça abrirem os corações à compaixão, as leis poderão contentar-se com indícios mais fracos para ordenar a prisão.

Seguindo o raciocínio, Bustos Ramires (apud BITENCOURT, 2008), afirma “que o princípio da humanidade recomenda que seja reinterpretado o que se pretende com a reeducação e reinserção social, uma vez que se forem determinados coativamente implicarão atentado contra a pessoa como ser social”.

Temos, portanto, dois princípios humanitários, que asseguram os direitos a qualquer cidadão, mesmo preso, consagrados como direito social no artigo 6º da Constituição da República, como sendo a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados.

Como bem menciona Carvalho (apud Boldrini, 2003):

A dignidade da pessoa humana é a pedra angular sobre que deve ser construído todo o monumento do sistema penal. O princípio constitucional da proteção e da promoção da dignidade do homem é a célula-mãe desse sistema e, por isso, também seu fundamento máximo. E complementa, daí a relação entre o valor jurídico da dignidade do homem e o sistema penal, cuja existência e a dinâmica somente são possíveis se pautadas obrigatoriamente pelos moldes humanitários.

Ocorre que o sistema carcerário no Brasil está longe de ser consagrado como um modelo adequado para a ressocialização dos condenados, pois sequer têm sido respeitados os direitos humanitários e sociais, que seriam a verdadeira fonte de justiça para a recuperação do criminoso.

Nessa toada, convém lembrar a lição de Celso Antonio Bandeira de Melo (apud Capez 2004):

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa ingerência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

A legislação institui direitos ao criminoso, como o seu ingresso ao trabalho e estudo, até como motivo para a remição da pena, todavia, como resolver a questão se o poder estatal não oferece condições básicas para a verdadeira recuperação do criminoso, que morre aos poucos pela incapacidade de sonhar e de querer ser feliz.

Como assevera Débora Veneral (2011), “a execução da pena aplicada ao sentenciado deve obedecer aos parâmetros modernos da humanidade, consagrados internacionalmente, preservando a dignidade humana do condenado”.

Nesse sentido, Wolfgang (apud Savazzoni, 2010), menciona que:

(...) por razões históricas, está assegurado, dentro da topografia constitucional brasileira, no rol dos direitos fundamentais, o direito de nenhum ser humano ser submetido a um tratamento inferiorizado, a ponto de reduzir a identidade e a integridade da pessoa humana.

Por isso, para o que se busca, ou seja, para a verdadeira ressocialização do condenado e a diminuição da criminalidade na sociedade moderna, este é o princípio fundamental da execução da pena, no entanto, ferido pela falência do sistema adotado.


4. FUNÇÕES DA PENA

Convém antes de mais nada, nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt (2008), distinguir a função do conceito de pena.

Segundo seu conceito a pena é “um mal que se impõe por causa da prática de um delito, portanto, conceitualmente, a pena é um castigo”. Porém admitir isto, “não significa como consequência inevitável que a função da pena seja a retribuição”.

Dito isso, numa análise sucinta das teorias jurídicas da pena, a primeira delas é a chamada teoria da retribuição ou absoluta, que a concebe como compensação da culpabilidade.

Tem-se, também, a teoria da prevenção ou relativa, que impõe poder sobre o delinquente a fim de que não volte a delinquir, a qual foi dividida em duas: preventiva geral - a qual destaca a função da pena como intimidação estatal a todos os cidadãos, a chamada “coação psicológica”, e a preventiva especial - tendo como função a prevenção de delitos futuros e evitar a reincidência do criminoso.

Por último, tem-se, quiçá, a mais importante das funções da pena, a ressocializadora, a qual estabelece critérios para que o condenado não volte a delinquir e torne-se um cidadão digno de exercício pleno da cidadania.

4.1. Função Retributiva

Em síntese, Kant e Hegel foram os mais expressivos defensores das teorias absolutas ou retributivas da pena, entendiam que a aplicação da pena decorre simplesmente da ofensa a lei penal, ou seja, o delinquente deve ser punido na medida do injusto praticado, como retribuição do fato ocasionado.

Kant entendia a lei como um imperativo categórico, e a obrigação do soberano é castigar impiedosamente aquele transgressor.

Para Hegel a pena é a lesão, a maneira de compensar o delito e recuperar o equilíbrio perdido. Indo além, Carrara, Binding e Welzel também defendiam o totalitarismo à aplicação da pena, como forma de retribuir ao delinquente o injusto praticado.

Esta teoria sofreu muitas críticas, não sendo aceitável por não contemplar a culpabilidade, como pressuposto da pena, pois pressupõe o que deveria demonstrar, e somente estaria enraizada na seguinte máxima “um mal (o crime) seria destruído por outro mal (a pena)”; e isso, em uma atitude totalmente irracional, inspirada no divino e incompatível com a justiça realizada pelo Estado em nome do povo.

Somente por pagar pelo mal causado ao bem jurídico tutelado, que esta função sofreu tantas críticas, e os estudiosos passaram a dedicar sobre o tema como forma de superar e prevenir o crime.

4.2. Função Preventiva

A partir disso, a teoria relativa ou preventiva da pena, defendida por Feuerbach, manifestava no sentido de que a pena se impõe para que não se volte a delinquir.

Com o entendimento de Feuerbach, esta teoria se dividiu em duas: A prevenção geral e prevenção especial.

A prevenção geral sustenta que é através do Direito Penal que se pode dar uma solução ao problema da criminalidade, isto porque, aplicando-se a pena ao indivíduo delinquente, o caráter pedagógico da pena influenciaria aos demais a não delinquirem, a chamada, “coação psicológica” (Fueurbach).

Para esta teoria a ameaça da pena produz no indivíduo uma espécie de motivação para não cometer delitos. No entanto, alguns entraves circularam sobre esta teoria, tais como o fato de que somente pelo fato da imposição da pena o indivíduo deixaria de cometer delitos.

A prevenção especial, ao contrário da geral, aplica a pena diretamente ao indivíduo delinquente, para que não volte a cometer mais delitos. Segundo Von Liszt, mede-se com critérios preventivos especiais, segundo os quais a aplicação da pena obedece a uma ideia de ressocialização e reeducação do delinquente, à intimidação daqueles que não necessitem ressocializar-se e também para neutralizar os incorrigíveis.

Nesta concepção, o delito praticado não afeta somente o bem jurídico individual, mas a sociedade como um todo, por isso, a pena aplicada deveria restabelecer a ordem social, sendo aplicada diretamente ao delinquente.

Mas esta teoria também sofreu críticas, pois não respondeu a tantas perguntas, sobre como fazer com que não se volte a delinquir (intimidar e ressocializar).

Então, surgiu a teoria mista e unificadora da pena.

Esta teoria entendeu que a retribuição, a prevenção geral e a especial são distintos aspectos da pena. Sob a argumentação de adotar uma teoria que abranja a pluralidade da pena, estabeleceram diferença entre fundamento e fim da pena, ou seja, centralizou o fim do Direito Penal na ideia de prevenção, e a retribuição apenas como limite das exigências de prevenção.

Todas estas teorias, até então não foram suficientes para sanar as dúvidas e problemáticas existentes no meio social, e a unificação dessas teorias resultou em considerar as finalidades da pena às teses prevencionistas, tendo a retribuição apenas como limite de mínimo e máximo de sua aplicabilidade (Bitencourt, 2008).

Surge neste contexto, a teoria da prevenção geral positiva, dividida em fundamentadora e limitadora, em que a primeira, para Welzel, o Direito Penal cumpre uma função ético-social para a qual mais importante que a proteção de bens jurídicos é a garantia dos valores de ação da atitude jurídica, pois não visa a intimidação ou a proteção de bens jurídicos, apenas a afirmação de vigência da norma perante a sociedade.

Já a prevenção geral positiva limitadora deve expressar-se com sentido limitador do poder punitivo do Estado. Os limites em que o Estado deve atuar punitivamente deve ser uma realidade concreta, e esses limites referidos materializam-se através dos princípios consagrados da intervenção mínima, proporcionalidade, culpabilidade, etc., inerentes ao Estado Democrático de Direito, o qual exige respeito às referidas limitações.

Sob os aspectos alinhavados das teorias mencionadas, tem-se que é inegável o caráter da pena, no sentido de que a grande maioria da sociedade (inconscientemente) sabe e conhece os danos que o delito possa causar a sua pessoa (moral e direito a liberdade – numa ótica das penas restritivas de liberdade).

Por assim ser, o caráter retributivo da pena não passa de um simbologismo, pois se trata do inimaginável para o delinquente e para a sociedade. No entanto, o homem como ente social, deve ter o conhecimento de que feito o mal estará suprimido do mundo social, simplesmente, porque deve pagar pelo ato. Em seu imaginável, pensa que o Estado lhe estará dando chances de ressocialização, por isso o caráter preventivo limitador deve ser a melhor finalidade da pena, em respeito ao próprio ser humano e aos direitos e garantias fundamentais do cidadão.

Segundo Mezger, como instrumento de prevenção, a pena deve "atuar social e pedagogicamente sobre a coletividade" (prevenção geral) e deve "proteger a coletividade ante o condenado e corrigir a este" (prevenção especial).

4.3. Função Ressocializadora

A crença na ressocialização do apenado iniciou-se a partir do século XIX, talvez como a mais importante função da pena.

Por muitos anos, acreditou-se que a prisão seria um ótimo remédio para reabilitar o condenado. No entanto, hodiernamente, afirma-se que o sistema penal brasileiro encontra-se em grande crise, pois o Estado não consegue, nem nunca conseguiu, implantar atividades que concretizassem a finalidade da pena, ou seja, devolver o condenado à sociedade melhor do que saiu.

A grande verdade, está estampada na falência administrativa dos órgãos estatais, corrupções, desvios de verbas públicas e de finalidades, motivos estes que levam a crença sobre os investimentos dos recursos capitados, os quais operam em vultosa soma de dinheiro (trilhões de reais), arrecadados dos cidadãos de bem, trabalhadores, através do pagamento de numerosos tributos, não estão sendo direcionados de maneira a operar na base do problema.

Não se tem dúvidas nos dias atuais, que o condenado, em regime fechado, está em uma situação que não favorece sua condição de ser humano, pois a pena em si, lhe empobrece e o torna ainda mais violento.

Bitencourt (2008), menciona que “é indispensável que se encontrem novas penas compatíveis com os novos tempos, mas tão aptas a exercer suas funções quanto as antigas, que, se na época não foram injustas, hoje, indiscutivelmente, o são”.

O mesmo autor, complementa:

Como se percebe, há um grande questionamento em torno da pena privativa de liberdade, e se tem dito reiteradamente que o problema da prisão é a própria prisão. Aqui, como em outros países, avilta, desmoraliza, denigre e embrutece o apenado. Por isso, o centro de gravidade das reformas situa-se nas sanções, na reação penal; luta-se contra as penas de curta duração. Sabe-se, hoje, que a prisão reforça os valores negativos do condenado. O réu tem um código de valores distinto daquele da sociedade. Daí a advertência de Claus Roxin de “não ser exagero dizer que a pena privativa de curta duração, em vez de prevenir delitos, promove-os”.

Ainda na visão de Cezar Roberto Bitencourt, a prisão, em vez de conter a delinquência, tem lhe servido de estímulo, convertendo-se em um instrumento que oportuniza toda espécie de desumanidades. Tem-se atribuído ao condenado a culpa exclusiva pela reincidência criminal, ignorando-se por completo que é praticamente impossível ingressar no sistema penitenciário e não sair de lá pior do que entrou.

Antigamente, como dito alhures, a única finalidade da execução da pena era o próprio cumprimento da sentença penal condenatória (função retributiva da pena), o que, hodiernamente, em uma visão humanitária e com enfoque no princípio da dignidade da pessoa humana, agrega-se uma função social que consiste na tentativa de ressocializar o condenado, o qual deve participar voluntariamente de todos os recursos colocados a sua disposição.

Estes recursos, colocados a disposição do condenado pelo Estado e previstos na legislação em vigor, variam desde a religiosidade, o trabalho, o estudo, as atividades desportivas, a visita íntima, o contato com o mundo exterior, etc, com o fim de demonstrar ao condenado que a pena humanizada é capaz de transformar sua pessoa para a inserção social.

É neste cenário que hoje tem-se que todos os meios são admitidos para a ressocialização do condenado, colocando-o mais próximo possível do mundo exterior, minimizando assim os efeitos da prisionização e demonstrando que o ser humano é capaz de transformação, porém estes recursos não devem violar a ética, os direitos humanos, os direitos fundamentais e a voluntariedade do condenado, tampouco a segurança individual e coletiva.

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Sobre o autor
Vanderley Doin Pacheco

Graduado em Direito pela Universidade Norte do Paraná – UNOPAR em Londrina – Paraná - Brasil. 2009. Especialista em Direito e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina. 2011. Advogado atuante no Estado do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PACHECO, Vanderley Doin. O princípio da dignidade da pessoa humana e a ineficácia da execução da pena devido à ociosidade do condenado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3204, 9 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21456. Acesso em: 22 dez. 2024.

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