Inicialmente, prudente estabelecer um norte para a discussão da matéria da proposta de alteração do Código Florestal de 1965, instituído pela Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.
Constitui o art. 1º do Código Florestal que as florestas existentes no território nacional e demais formas de vegetação são bens de interesse comum de todos os habitantes do País. Impõe limitação administrativa de uso desse bem.
Segundo Hely Lopes Meirelles[1], a “Limitação Administrativa é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício dos direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social”. Mais adiante[2], assevera que a limitações administrativas protegem genericamente a coletividade, forte arts. 5º, XXIII, e 170, III, ambos da Constituição Federal de 1988.
Atribui à obrigação de manter na propriedade pública ou privada área de Reserva Legal e de manutenção de Áreas de Preservação Permanente.
São esses os principais pontos do Código Florestal em evidência na atualidade, como veremos. No contexto relacionamos pontos importantes a serem observados.
Acerca da natureza jurídica das florestas, a novel proposta mantém na integra o regime de proteção. Não obstante, os limites intrínsecos de proteção são alterados.
A proposta de alteração do Código Florestal inova estipulando data que servirá para determinar o momento da ruptura entre o passado que financiava a supressão de florestas em desacordo com o Código Florestal com o conceito de desenvolvimento sustentável abarcado pela Constituição Federal de 1988.
A data determinante é a encontrada no conceito de área rural consolidada: “ocupação antrópica consolidada até 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias e atividades agrossilvipastoris, admitida neste último caso a adoção do regime de pousio”.
Nas hipóteses de atividades agrossilvipastoris, é admitida a prática de interrupção temporária de atividades agrícolas, pecuárias ou silviculturais por até dez anos, objetivando a recuperação do solo (capacidade do uso do solo), conforme o próprio conceito de pousio[3] traçado na proposta de alteração do Código.
Conceitua, também de forma inovadora, de interesse social, para fins de intervenção em Área de Preservação Permanente, a regularização fundiária de assentamentos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, desde que observado as condições da Lei Federal nº 11.977, de 7 de julho de 2009, que versa sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas.
Outro aspecto a ser retratado é alteração do conceito de pequena propriedade rural ou posse rural que altera, ao final e ao cabo, consubstancialmente o rigor da legislação ambiental no que concerne a limitação administrativa em comento.
O Código Florestal atual conceitua pequena propriedade rural ou posse rural de forma subjetiva, dificultando o Poder Público auferir quais realmente se enquadram nesse conceito. A pequena propriedade rural ou posse rural para o efeito da Lei florestal vigente é àquela em que se dá exploração da propriedade mediante o trabalho pessoal do proprietário ou posseiro e de com sua família, admitindo a ajuda de terceiro, desde que seja eventual (não pode ser contínua e repetitiva) e cuja renda bruta da propriedade seja proveniente de atividade agroflorestal ou do extrativismo de no mínimo em oitenta por cento.
Limita, ainda, quanto à área. As propriedades com área maior de cento e cinquenta hectares que se localizem nos Estados do Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e nas regiões situadas ao norte do paralelo 13º S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de 44º W, do Estado do Maranhão ou no Pantanal mato-grossense ou sul-mato-grossense; ou de cinquenta hectares que se localizem no polígono das secas ou a leste do Meridiano de 44º W, do Estado do Maranhão; ou de trinta hectares que se localizem em qualquer outra região do País não são consideradas para o efeito do atual Código como pequena propriedade rural ou posse rural.
A atual proposta de forma objetiva define a pequena propriedade rural ou posse rural o imóvel com até 4 (quatro) módulos fiscais. Com a nova proposta, s.m.j., não haverá como os órgãos públicos darem tratamento distinto daquilo que a Lei quer impor e aos beneficiados comprovar de forma singela (matrícula do imóvel) o seu enquadramento.
Sobre as faixas consideradas de Área de Preservação Ambiental, as alterações propostas são consubstanciais.
A proposta do novo Código estabelece que nos cursos d’água com menos de 5 (cinco) metros de largura a área a ser preservada seja de 15 (quinze) metros. O Código vigente firma que em curso d’água de menos de 10 (dez) metros de largura a área de preservação é de 30 (trinta) metros. Entre a metragem de curso d’água de 5 (cinco) metros a 10 (dez) metros de largura, a atual proposta mantém a mesma porcentagem de área a ser preservada pelo Código em vigor, ou seja, 30 (trinta) metros de largura.
A proposta dá tratamento distinto para as frações de Áreas de Preservação Permanente entre os lagos artificiais e os naturais que o atual Código não versa. Para os lagos e lagos naturais em zonas urbanas a metragem a ser preservada é de 30 (trinta metros), enquanto que nas áreas rurais é de 100 (cem) metros, exceto se a superfície do lago ultrapassar 20 (vinte) hectares, ocasião que a faixa de preservação passa para 50 (cinquenta) metros. Mesmas metragens de preservação auferidas pela Resolução Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA nº 303, de 20 de março de 2002.
A diferença é que a proposta versa somente de preservação de faixa de lagos e lagos artificiais em área urbana, excluindo a expressão “consolidada”.
Infere, entretanto, a novel proposta que no caso de áreas urbanas consolidadas, conforme os termos estipulados pela Lei Federal nº 11.977/2009, as limitações das Áreas de Preservação Ambiental deverão ser firmadas nos Planos Diretores ou nas Leis municipais de uso do solo, respeitando os limites da Legislação Federal. Ou seja, não poderá a municipalidade propor alterações nos limites de Áreas de Preservação Ambiental contrários às normas do Código Federal. Gize-se tal arcabouço já vem impresso no atual Código Florestal (parágrafo único do art. 2º), causando divergência de posições.
São duas as posições[4]. A primeira versa no sentido de que a regra diz a mesma coisa já expostas nas normas da própria Lei. Ou seja, não há excepcionalização aos limites impostos pela Lei. A segunda aduz que devem ser observados os objetivos das políticas locais, sendo os limites da Lei o máximo de restrição a ser imposta e observada pelo administrado. Essa segunda perde força com a proposta em comento. Versa na proposta de forma expressa, não dando margem para discussões, que as áreas em zonas urbanas e rurais, pelo só efeito da Lei, são consideradas Áreas de Preservação Permanente. Incluiu na proposta de forma taxativa que as Áreas de Preservação Permanente se estendem para os limites das áreas urbanas.
O Código atual é omisso quanto à aplicação da regra restritiva (Áreas de Preservação Permanente) para as áreas localizadas em zonas urbanas.
Não obstante, ajustamos uma terceira posição. Devemos observar os limites da Lei mais àqueles impostos pelas políticas locais. A diferença é que as políticas locais não devem se limitar ao máximo da restrição da Lei. Ao contrário. Devem as políticas locais serem mais restritivas quanto aos limites, podendo estabelecer, conforme o caso da Áreas de Preservação Permanente, faixas maiores de proteção, forte anúncio das disposições do art. 24, inc. VI, culminado com as regras dos parágrafos do mesmo artigo, todos disposições da Constituição Federal.
A Constituição Federal amolda a legislação concorrente entre a União, os Estados e Distrito Federal acerca da proteção do meio ambiente e conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais. Assim, em havendo restrição na norma Federal, aos Estados e Distrito Federal restam legislar observando-as, sob pena de ver suas regras sem eficácia.
Retomamos a discussão sobre as Áreas de Proteção Ambiental ao redor de lagos. A matéria sobre os limites (faixas) de preservação dos lagos artificiais atualmente é estabelecido via Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente, Resolução CONAMA nº 302, de 20 de março de 2002. O que ocorre no atual Código e a omissão acerca dos limites de Área de Preservação Ambiental a ser observado para os lagos artificiais. Facultou ao CONSEMA dispor sobre esses limites, dado margem para contendas sobre a legalidade da imposição dos limites via Resolução, pois não teria competência o Conselho para estabelecer restrições ao direito de propriedade.
Aos lagos artificiais, a proposta assevera que na licença ambiental do empreendimento o órgão licenciamdor estipule a faixa de Área de Preservação Ambiental. A faixa de preservação, no entanto, em hipótese alguma, poderá ser aquém das estipulações da própria Lei e dos limites previstos nos Planos Diretores ou nas leis municipais de uso do solo, conforme já esboçado.
Vai além a proposta acerca dos lagos. Dispõe que os lagos artificiais ou naturais com superfície inferior a 1 (um) hectare fica dispensada da constituição de faixa de Área de Preservação Ambiental. Essa norma vai beneficiar claramente as pequenas propriedades rurais as quais já possuem pequena extensão de área cultivada.
Em sequência, adota a obrigação para o empreendedor da implementação e funcionamento de reservatório d’água artificial à aquisição, desapropriação ou remuneração por restrito uso das faixas marginais a serem instituídas como de Áreas de Preservação Ambiental. O limite mínimo de faixa de preservação ambiental é de 30 (trinta) metros quando o empreendimento estiver em área rural e de no mínimo 15 (quinze) metros quando alocado em área urbana.
No atual Código, as hipóteses eram somente duas. A desapropriação ou aquisição das faixas marginais objetivando a formação de Área de Preservação Ambiental. O Código expressa que os parâmetros de metragem para a formação de Áreas de Preservação Ambiental são os estabelecidos por Resolução do CONAMA.
Assim, a atual proposta inova ao estabelecer terceira hipótese de pagamento (remuneração) de área afetada pelas restrições do regime de proteção das Áreas de Preservação Ambiental. Também não deixa margem para posterior regulamentação, com exceção das vezes que o próprio órgão licenciador entender por bem aumentar essa restrição.
Observamos que a novel proposta aumenta a autonomia do órgão licenciador acerca das Áreas de Preservação Permanente. Outorga força para determinar que área relevante ambientalmente seja preservada, desde que essas áreas sejam atreladas ao empreendimento ou atividade objeto do licenciamento ambiental.
Outro ponto importante. A proposta dispõe que os empreendimentos hidrelétricos ou de abastecimento público ou de interesse público, desde que vinculados às concessões, não estão sujeitos a formar Reserva legal, outra imposição do Código Florestal vigente.
No Código Florestal vigente tem-se dificuldade de definir o que seria restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues, para o efeito de Área de Preservação Ambiental. A atual proposta, a fim de sanear eventuais divergências, de forma expressa, conceitua o que é restinga; “depósito arenoso paralelo a linha da costa, de forma geralmente alongada, produzido por processos de sedimentação, onde se encontram diferentes comunidades que recebem influência marinha, com cobertura vegetal em mosaico, encontrada em praias, cordões arenosos,dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio sucessional, estrato herbáceo, arbustivos e abóreo, este último mais interiorizado;”.
Outro ponto que a proposta inova. No Código Florestal de 1965 considera-se, ainda, como Área de Preservação Ambiental, desde que haja imperativamente ato do Poder Público pelo reconhecimento, as florestas e demais formas de vegetação natural destinada a fixar as dunas. Na atual prospectiva, foi excluída essa hipótese e incluída quando se objetiva a proteger as restingas e várzeas.
As dunas, para efeito da proposta, são consideradas Área de Preservação Ambiental em toda a sua extensão, independente do tamanho de suas faixas (metragem). Grifa-se que essa regra vai ensejar para o Estado do Rio Grande do Sul reavaliar o seu zoneamento costeiro, se houver.
As várzeas, porção de área plana às margens de um rio que em época de enchente é inundada com as águas deste, não são consideradas para o efeito da proposta como Área de Preservação Ambiental, desde que fora dos limites impostos pela largura dos cursos d’água natural. Com a exceção de ato do próprio Poder Público dispor em contrário como, por exemplo, no ato de licenciamento ambiental ou estabelecido nos Planos Diretores municipais.
As veredas, para o efeito da proposta, são consideradas como Área de Preservação Ambiental. No atual Código, inexiste essa previsão.
Com a novel proposta, propõe-se excluir toda a área com florestas e demais formas de vegetação natural no topo de morros, montes, montanhas e serras, bem como as situadas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, nesta hipótese, qualquer que seja a vegetação, como Área de Preservação Ambiental.
Mantém a atual proposta a controvérsia acerca das áreas com declinação superior a 45º (quarenta e cinco graus), equivalente a cem por cento na linha de maior declive, mantendo, inviabilizada, as atividades agrícolas, pecuárias ou silviculturais. Imposição idêntica do atual Código que versa sobre a limitação de conversão de florestas nativas situadas em áreas de inclinação entre 25º (vinte e cinco graus) e 45º (quarenta e cinco graus), com exceção da prática de manejo sustentável.
Sobre o regime de proteção, assevera a proposta que a supressão de Áreas de Preservação Ambiental poderá (faculdade) ser autorizada pelo órgão do Poder Público que se encontre competente, consoante competência dada pelo SISNAMA. Elenca a supressão de Área de Preservação Ambiental em caso de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto.
Correlaciona os casos de supressão de baixo impacto ambiental com a supressão eventual e assevera que as hipóteses desses casos serram regulamentadas. Grifa-se que hipóteses de supressão de baixo impacto ambiental é tratado no próprio texto da proposta, ao afirmar que será permitido o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Ambiental para obtenção de água.
No atual Código, a assertiva é diversa. Condiciona o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Ambiental para obtenção de água a não supressão e que não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa daquela área.
As demais hipóteses de supressão eventual de Área de Preservação Permanente de baixo impacto ambiental a serem regulamentadas passarão pelo crivo do CONAMA, pois vigente é a Resolução nº 369, de 28 de março de 2006, que dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente-APP. Essa Resolução, s.m.j., deverá passar por leves alterações/adaptações, pois a atual proposta mantém a natureza jurídica do Código vigente.
Abre-se um parêntese. A atual proposta não mais adjudica de forma tangente que a supressão de Área de Preservação Ambiental passe, em certo momento, pelo crivo do órgão ambiental estadual ou mesmo exigindo para o prosseguimento do licenciamento ambiental, objetivando a supressão dessas Áreas, a análise em conjunto do órgão federal ou mesmo municipal. Retoma de certa forma a autonomia e independente dos entes federados alocados na Constituição Federal, onde que os municípios podem e devem de forma autônoma proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, preservar as florestas, a fauna e flora.
Com a seguinte exceção trazida pela própria proposta. É condição o licenciamento do Estado nos casos em que se requer a supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo de várzeas. Nesses casos, os Municípios somente poderão licenciar se for formalizado ato administrativo do respectivo Estado para este. Ou seja, atribuir parcela da obrigação imposta pela Lei ao Estado para o Município através de ato próprio, que no caso indicamos o ato denominado Convênio.
Ainda, sobre as Áreas de Preservação Ambiental e que se presta para a limitação denominada Reserva Legal, em espécie sobre a necessidade de regularização, a proposta inova substancialmente do Código atual. Propõe o Programa de Regularização Ambiental – PRA, de competência da União, dos Estados e do Distrito Federal, objetivando adequar os imóveis que tiveram a vegetação nativa suprimida irregularmente até 22 de julho de 2008. Esse é um dos limites, a data de 22 de julho de 2008.
Em vista desse Programa, os proprietários firmaram com o órgão da administração Termo de Adesão e Compromisso, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias da data em que forem estabelecidos os Programas pela União, Estados e Distrito Federal. Estes, no entanto, possuem 5 (cinco) anos para edição dos PRA ou em havendo omissão, o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contar-se-á do encerramento desse prazo dado aos órgãos da administração.
Ou seja, por pior que seja, os proprietários terão prazo dos 5 (cinco) anos e 180 (cento e oitante) dias para promover a firmatura do PRA. Prazo esse em que os proprietários poderão continuar a utilizar áreas rurais restritas de uso, respeitando obrigações já assumidas pelos proprietários, sendo vedada a expansão da área já ocupada.
Apresenta, também, como condição de uso das áreas rurais restritas de uso, inscrição do proprietário em cadastro do órgão Estadual. Após a inscrição, o proprietário ficará protegido de eventuais autuações às infrações cometidas até 22 de julho de 2008, bem como em virtude das atuações já aplicadas, sendo estas cobranças suspensas. Com exceção de apreensões e embargos. Nos casos dessas duas hipóteses, o proprietário se submete a aplicação de sanções independente da firmatura dos Termos.
Além dos prazos já elencados, no próprio PRA será estabelecido prazo para ser levado A registro junto ao cartório de registro de imóveis os Termos de Adesão e Compromisso firmados pelos proprietários, documento este considerado como hábil para averbar área de Reserva Legal.
Outro ponto importante. Em havendo cumprimento integral das obrigações assumidas perante o PRA e os Termos de Compromisso e Adesão, as multas cometidas até 22 de julho de 2008 serão consideradas como convertidas em serviço de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
Após a adesão ao PRA os proprietários poderão solicitar retificação da averbação da Reserva Legal. Hipótese essa vedada na legislação atual.
Na espécie, o PRA poderá permitir que as atividades econômicas nas Áreas de Preservação Ambiental em área rural consolidada continuem, desde que fundamentado em estudos socioambientais e econômicos previstos na proposta. Os proprietários contemplados por essa medida serão obrigados à regra de compensação a ser definido no PRA.
Quanto às áreas denominadas Reserva Legal, além de já ter apresentado comentários acerca, inferimos que as pequenas propriedades ou posses rurais não são mais obrigadas a implementarem as denominadas Reservas Legais em suas propriedades. Não obstante, não estão afastadas das implicações das normas acerca das Áreas de Preservação Permanente. Com exceção que as vegetações nativas existentes nas pequenas propriedades deverão ser preservadas, independente de serem Áreas de Preservação Permanente, nos limites apregoados para formação de Reserva Legal. Ou seja, a atual proposta viabiliza a supressão de vegetação nativa existente nas pequenas propriedades acima do limite das disposições de Reserva Legal.
Admitido na proposta o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da Reserva Legal, condicionando a não conversão de novas áreas para uso alternativo do solo e desde que a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação, bem como o requerente esteja cadastrado no cadastro ambiental estadual referido no PRA.
No Código atual as condições são distintas. Somente é permitido se o cômputo da vegetação nativa em Área de Preservação Permanente e Reserva Legal exceder: a) oitenta por cento da propriedade rural localizada na Amazônia Legal; b) cinquenta por cento da propriedade rural localizada nas demais regiões do País; e c) vinte e cinco por cento da pequena propriedade definidas assim: cinquenta hectares, se localizada no polígono das secas ou a leste do Meridiano de 44º W, do Estado do Maranhão; ou trinta hectares, se localizada em qualquer outra região do País.
A proposta, como se esperava, propõe alterações quando a percentagem da propriedade que deve ser levada a registro a título de Reserva Legal. A novel divide em duas hipóteses, sendo que na primeira se subdivide em três distintas.
Vejamos. Para os imóveis localizados na Amazônia Legal, 80% (oitenta por cento) da propriedade situada em área de florestas, 35% (trinta e cinco por cento) da propriedade situada em área de cerrado e 20% (vinte por cento) da propriedade situada em área de campos gerais devem ser levadas a registro a título de Reserva legal. Enquanto que as propriedades localizadas nas demais regiões do País, a percentagem da área passa a ser e sem distinção de 20% (vinte por cento).
No Código vigente a divisão distinta da proposta atual é a seguinte: a) para os imóveis localizados na Amazônia Legal e em área de cerrado é faculta a compensação de parcela (15%) da Reserva Legal em outra área do imóvel original; e b) para os imóveis localizados em floresta ou outras formas de vegetação nativa, independente de localizar na Amazônia Legal, localizada nas demais regiões do País o percentual é de 20% (vinte por cento) da propriedade para o efeito de Reserva Legal.
Acerca da localização da área de Reserva Legal, a atual proposta exclui da observância o requisito das disposições do Plano Diretor do Município, abarcando o critério formação de corredores ecológicos com outra área legalmente protegida.
Diferentemente do Código Florestal, o qual define como órgão competente somente o Estado para fazer frente à análise dos requerimentos de formação e implementação da Reserva Legal, a proposta versa que tanto o Estado como o Município poderá fazer às vezes da análise dos requisitos para a averbação de Reserva Legal.
Essa atribuição inovadora aos Municípios contribui expressivamente para a efetivação dos requerimentos de análise dos requisitos para se proceder a averbação da Reserva Legal, em especial para o Estado do Rio Grande do Sul, visto que dos 496 (quatrocentos e noventa e seis) Municípios que integram o Estado, 281 (duzentos e oitenta e um) Municípios realizam plenamente a gestão do meio ambiente das atividades e empreendimentos de impacto ambiental local.
Mantém a proposta da possibilidade de terceiro ente realizar a análise dos requerimentos de averbação de Reserva Legal, desde que seja habilitado para o fim proposto, ou seja, suas competências institucionais açambarcam de forma direta ou indireta da probabilidade em analisar os requisitos impostos pela norma como, por exemplo, localização da reserva legal em detrimento do Plano de Bacia Hidrográfica, mediante a formalização de ato administrativo denominado Convênio.
Conserva a proposta a possibilidade de exploração econômica da área de Reserva Legal via plano de manejo florestal. Apresenta inovação quanto à indicação dos limites da Reserva Legal; infere que os limites podem ser georreferenciadas ou referenciados através de memorial descritivo. Essa segunda hipótese, entretanto, deve ser amarrada com pelo menos um ponto georreferenciado.
Limita de forma expressa que em eventual alteração de área rural afetada por Reserva Legal para perímetro urbano não muda a natureza jurídica dessa, devendo o proprietário cumprir com a obrigação de mantê-la.
Infere a proposta prazo de 120 (cento e vinte) dias para o proprietário promover a averbação da Reserva Legal. Esse prazo não se confunde com o prazo de 180 (cento e oitenta) dias previstos para a formalização do Termo de Compromisso e Adesão asseverado no PRA.
Sobre a regularização de Reserva Legal, também é importante inferir que independente da adesão ao PRA, os proprietários podem (dever) adotar, alternativamente, isoladas ou conjuntamente, regra da recomposição, regeneração natural e/ou compensar a área. Mudança do atual Código versa sobre o prazo de recomposição, passando dos 30 (trinta) anos o prazo máximo para 20 (vinte) anos, sendo que, conclusivamente, a cada 2 (dois) anos devem comprovar a recomposição de 1/10 (um décimo) da área total, e sobre os critérios de utilização da recomposição mediante plantio intercalado de espécies nativas e exóticas. Desta feita determina critérios que devem ser seguidos.
O Plano de Manejo Florestal Sustentável – PMFS, documento que habilita o proprietário a explorar florestas nativas e formações sucessoras, via proposta, isenta o proprietário que busca a supressão para uso alternativo do solo; manejo de florestas plantadas localizadas fora de Reserva legal e para exploração florestal não comercial realizadas por pequenas propriedades ou populações tradicionais. Faculta aos órgãos ambientais do SISNAMA (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) aprovar o PMFS.
Isenta as pequenas propriedades da obrigação de formar reposição florestal em virtude da supressão de matéria-prima florestal, com a condição de supressão para consumo próprio, desde devidamente autorizadas.
De forma inovadora o projeto visa autorizar que o Poder Público implemente instrumentos para incentivar a preservação voluntária, proteção de espécies da flora nativa ameaçada de extinção, recuperação ambiental das Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, de recuperação de áreas degradadas, etc..
A proposta impõe que num período de cinco anos, de sua vigência, não será permitida a supressão de florestas nativas objetivando o estabelecimento de atividades agropastoris. Excetua, com razão, as supressões necessárias ao atendimento de obras e atividades de interesse social, bem como àquelas já licenciadas.
Ao cabo, referimos que no Código Florestal, Lei nº 4.771/65, não havia expressamente previsão que as ações e omissões contrárias às disposições da Lei Florestal sejam tratadas como atos de natureza penal e administrativa na forma da Lei nº 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e seu respectivo regulamento. A proposta, diversamente, propõe que os demais membros federativos, além da obrigação de observar os dispositivos da Lei Federal nº 9.605/98, observem o seu regulamento.
O Decreto regulamentador da Lei Federal nº 9.605/98, o Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelecendo o processo administrativo federal para apuração destas infrações.
Vejam que o Decreto além de regular as partes importantes da Lei de sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, versa sobre o procedimento administrativo federal para apuração destas infrações.
Assim, de pronto concluímos que parte do regulamento, o Decreto nº 6.514/2008, não se aplica (taxativo) para auferimento das infrações e demais condutas lesivas ao meio ambiente.
Uma, porque o Decreto não regula somente disposições da Lei de sanções penais e administrativas no âmbito do meio ambiente. Regula parte da Lei que dispõe do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal (Lei 9.784/99); da Lei que versa sobre a cobrança e a atualização dos créditos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Lei nº 8.005/90) e da Lei que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta (Lei nº 9.873/99).
Portanto, recomendamos muita cautela na aplicação do Decreto Federal nº 6.514/2008, pois a administração pública local, tanto as Estaduais, Distrito Federal e Municipais, estabelecem prazos diferentes para a prescrição das dívidas de natureza não-tributária, atualizações e formas de cobranças das dívidas, bem como em muitas das vezes as leis locais não versam sobre a caducidade (prescrição) para o exercício da ação punitiva a ser implementadas pela administração.
Ocorre que as Leis Federais asseveradas (Lei 9.784/99; Lei nº 8.005/90 e Lei nº 9.873/99) não são de aplicação cogente aos demais entes da Federação. São Leis de aplicações no âmbito Federal, diferentemente da Lei nº 9.605/98 que sua aplicação é NACIONAL.
São estas as considerações acerca do atual Código Florestal em referência ao Projeto de Lei nº 1.876 do ano de 1999, nos termos do substitutivo do Deputado Federal Aldo Rebelo adotado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados.
Notas
[1] Direito Administrativo Brasileiro, 30ª Edição, Malheiros Editores, 2005, p. 612.
[2] p. 618.
[3] Pousio: “prática de interrupção temporária de atividades agrícolas, pecuária ou silviculturais por até dez anos, para possibilitar a recuperação da capacidade de uso do solo.”
[4] MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, Glossário. 6ª Ed. rev., atual. e ampl. São Pauto. Editora RT, 2009. p. 748.