Capa da publicação Cobrança do uso da água: natureza jurídica
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Natureza e aspectos jurídicos da cobrança do uso da água e sua aplicabilidade prática

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3. Sistema Nacional de Recursos Hídricos e sua aplicabilidade prática

A criação de um sistema de gerenciamento dos recursos hídricos indica a existência de vários órgãos ou entidades atuantes na área e a necessidade de articular ou integrar essa atuação na gestão das águas. Ressalta-se que a Constituição de 1988 incluiu entre as competências da União, a de instituir um sistema nacional de gerenciamento dos recursos hídricos, dentre elas a de instituir a cobrança pelo uso da água.

3.1. Composição do Sistema e sua respectiva competência

A regulamentação do dispositivo constitucional acabou sendo feita pela Lei 9.433/97 que, ao dispor sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), criou também o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos. O artigo 33 da referida Lei, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, fala claramente dos órgãos que compõem o Sistema, tanto que merece ser descrito in verbis:

Art. 33. Integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

I – o Conselho Nacional de Recursos Hídricos;

I-A. – a Agência Nacional de Águas;

II – os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal;

III – os Comitês de Bacia Hidrográfica;

IV – os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos

V – as Agências de Água.

As atividades de formulação da política e de implantação dos instrumentos de gestão, incluindo a cobrança da água, são realizadas pelo Sistema Nacional de Recursos Hídricos.

3.2. Conselho Nacional de Recursos Hídricos

De composição paritária entre membros do Poder Executivo Federal e representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, com reunião ordinária a cada seis meses em Brasília, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos apresenta suas competências na Lei 9.984/[00].

Dentre as inúmeras previstas, destaca-se o poder de estabelecer critérios gerais tanto para a outorga quanto para a cobrança pelo uso da água, obedecendo a lei e regulamentações já existentes. É importante notar que os critérios definidos vincularão os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, os CBHs de domínio da União, os CBHs de domínio dos Estados.

Outra competência importante é ser a última instância da decisão administrativa dos conflitos existentes entre os Conselhos Estaduais ou oriundos de outros órgãos do Sistema, não excluindo a apreciação judiciária.

Também cabe ao Conselho definir prioridades a aplicação dos recursos, incluindo os da cobrança, juntamente com os CBHs, podendo diretamente fixar os valores para a cobrança tanto para a captação, da derivação e da extração de águas e do aproveitamento do potencial hidráulico quanto para o lançamento de esgotos e outras matérias poluentes.

Por fim, destaca-se o poder do Conselho em criar Agências das Águas, quando existente um ou mais CBHs de bacias de domínio da União, e pronunciar-se da criação da CBH da também de dominialidade federal.

3.3. Agência Nacional das Águas (ANA)

Após previsão na Lei 9.433/97, a ANA foi instituída pela Lei n. 9.984/00 obtendo caráter de autarquia federal, com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério de Meio Ambiente. A Agência é gerida por uma diretoria composta por cinco membros, todos nomeados pelo Presidente da República e aprovados pelo Senado Federal.

A ANA é o braço executivo do Conselho Nacional do Meio Ambiente. No âmbito da cobrança pelo uso da água, caberá a ANA elaborar estudos técnicos pra subsidiar a definição pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos dos valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos de domínio da União, com base nos mecanismos e quantitativos sugeridos pelos Comitês de Bacias Hidrográficas.

É importante destacar que, no âmbito das águas da União, e segundo a Lei n. 9.34497, as receitas provenientes ficarão da Conta Única do Tesouro Nacional podendo ser movimentada somente pela ANA. Sabendo que a aplicação do recurso é vinculada, a ANA manterá registros que permitam correlacionar as receitas com as bacias em que forem geradas.

3.4.Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal

De âmbito em águas de dominialidade estadual, tem participação no Conselho Nacional. Sua competência não é plenamente estruturada em lei federal, cabendo aos Estados, em seu caráter suplementar, regularizá-los. Os Conselhos Estaduais podem criar Agências de Águas referentes a CBHs estaduais, e são instância recursais destes.

No Estado de São Paulo, já existia o Conselho Estadual antes mesmo da edição da Lei 9.433/97, criado pelo Decreto 27.576, de 11 de novembro de 1987, no qual já cria o Conselho Estadual de Recursos Hídricos, dispõe sobre o Plano Estadual de Recursos Hídricos e o Sistema Estadual de Gestão de Recursos Hídricos.

3.5. Comitês de Bacia Hidrográfica (CBHs)

O CBH é um órgão colegiado constituído pelos representantes dos governos municipais, estaduais e federal, pelos representantes dos usuários, e da sociedade civil organizada que deve obedecer a seguinte proporcionalidade entre os representantes dos segmentos envolvidos: os representantes dos usuários serão 40% do número total de representantes do Comitê; o somatório dos representantes dos governos municipais, estadual e federal não poderá ultrapassar 40%; e os da sociedade civil organizada serão no mínimo de 20%. Pela sua composição, Bastos chega a chamar os Comitês de Bacias como “parlamento das águas”. (BASTOS, 2001, p.90)

Édis Milaré vê os CBHs como uma forma diferente de gestão, pois permite a participação dos diversos usuários dos recursos hídricos.

O modelo de gestão proposta pressupõe a institucionalização dos Comitês de Bacias, das agências de águas e ainda dos Conselhos Nacional e Estadual de Recursos Hídricos, nos quais se prevê a participação efetiva dos diversos usuários das águas, do Poder Público e da sociedade civil de uma bacia hidrográfica no processo decisório. O sucesso desse inovador modelo vai depender, portanto, do entendimento e da capacidade da sociedade de se articular através desses órgãos colegiados, onde terá voz e vez. (MILARÉ, Edis in BASTOS, 2001, p. 91)

A área de atuação dos Comitês poderá ser uma bacia hidrográfica, uma sub-bacia hidrográfica ou de um grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas. Os CBHs têm, entre outras atribuições, as de: promover o debate das questões relacionadas aos recursos hídricos da bacia; articular a atuação das entidades que trabalham com esse tema; arbitrar, em primeira instância, os conflitos relacionados a recursos hídricos; aprovar e acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da Bacia; estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo.

O artigo 1º, V da Lei n. 9.433/97 deixa claro que a cobrança, como instrumento de implantação da Política Nacional de Recursos Hídricos, deve ocorrer na unidade territorial bacia hidrográfica. Paulo Affonso Leme Machado, em sua obra Direito Ambiental Brasileiro coloca um aparente “conflito entre as dominialidades das águas” (MACHADO, 2011, p.475), quais sejam federais ou estaduais.

A implantação da cobrança pelo uso da água no Brasil é particularmente complexa devido às peculiaridades jurídicas relativas aos recursos hídricos, notadamente tendo em vista que há águas de domínio da União e águas dos Estados da Federação. Tal discussão é importante, pois para haver cobrança, é necessário determinar quem vai administrá-la. A própria Constituição Federal determina que a competência legislativa é prioritariamente da União e suplementar aos Estados, conforme artigo 24, par. 2º da Carta Magna. Porém, a própria Constituição determina competência administrativa concorrente entre todos os entes federativos, à luz do artigo 23, inciso VI.

Mas essa particularidade implica, de modo geral, a existência de sistemas de cobrança distintos nos níveis federal e estadual, uma vez que os recursos hídricos são divididos em competência federal e estadual, conforme assevera a Constituição Federal em seus artigos 20, inciso III e 26, inciso I. Frisa-se que o Município não possui águas em seu domínio, o que não exclui seu dever na proteção e preservação. Basicamente, a bacia é considerada de domínio da União quando envolve mais de um estado, sirva de limite com outros países ou que tenha participação em território estrangeiro. Logo, é de domínio do Estado quando se localiza inteiramente dentro do mesmo.

A cobrança pelo uso da água é estabelecida a partir de um pacto entre os usuários da água, sociedade civil e poder público no âmbito do CBH, instância regional de gestão. Ainda segundo Paulo Affonso Leme Machado, a Lei n. 9.433/97 não definiu mais especificamente o que é bacia hidrográfica, caracterizando apenas as bacias como “principal” e/ou “tributário” e nenhuma outra égide normativa. Porém essa discussão não é cabível no momento, uma vez que o próprio autor afirma que as definições de dominialidade só serão definidas com o passar do tempo.

O futuro vai dizer se a idéia dessa nova administração hídrica ficou só no terreno da imaginação ou se uma nova descentralização pode ser realizada, com alteração constitucional da partilha das águas entre a União e Estados, para que estas sejam realmente geridas pelos novos organismos hídricos. (MACHADO, 2006, p.475)

Referente ao caso da Bacia do Rio Paraíba do Sul, podemos observar a existência de um Comitê Federal, o CEIVAP, e comitês estaduais, no caso de São Paulo, o CBH-PS. O próprio autor reconhece a existência de um “duplo domínio público”. (MACHADO, 2011, p.536) Logo, deverá haver uma “gestão compartilhada”. “As ações dos diferentes Comitês não podem ser antagônicas, mas integradas ou articuladas”. (MACHADO, 2011, p.537)

3.6. Órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos

Nesse ponto se enquadram claramente os órgãos do Poder Executivo, federal, sejam o Ministério do Meio Ambiente e Ministério de Minas e Energia, estadual, sejam as Secretarias Estaduais de Meio Ambiente e Secretaria Estadual de Energia e Saneamento, como a existente no Estado de São Paulo, e municipal como as Secretarias Municipais de Meio Ambiente ou outras correlatas.

3.7. Agências de Água

Assim como os CBHs, as Agências de Água ou Agências de Bacia são instituições inteiramente novas no quadro administrativo brasileiro. Paulo Affonso Leme Machado define o próprio termo “agência” é uma novidade no Direito brasileiro (MACHADO, 2011, p. 547).

As Agências têm a função de atuar como secretaria executiva dos respectivos CBHs. Além disso, a Lei n.9.433/97 atribuiu às Agências de Água várias competências: manter o balanço da disponibilidade hídrica atualizado; manter um cadastro de usuários; estabelecer os valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos e efetuar a cobrança; gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos; elaborar e propor o Plano de Recursos Hídricos ao CBH competente; encaminhar proposta de enquadramento dos cursos d’água aos devidos Conselhos de Recursos Hídricos, entre outros.

Para que exista uma agência é necessário a existência prévia de um Comitê de Bacia e que exista uma viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso da água.

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Vale lembrar que a ANA, embora esteja especificada em Lei, não passa de uma Agência de Águas, podendo ter sido perfeitamente enquadrada no inciso V, do artigo 33 da Lei n.9.433/[97].

3.8. Bacia do Rio Paraíba do Sul

A bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul localiza-se na região Sudeste, uma das mais industrializadas do País, responsável por 12% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Abrange 184 municípios, sendo 88 em Minas Gerais, 57 no Rio de Janeiro e 39 no Estado de São Paulo, somando-se em toda a bacia aproximadamente 5 milhões de habitantes.

Acrescenta-se a este número cerca de 9 milhões de pessoas da Região Metropolitana do Rio de Janeiro que também dependem das águas do Rio Paraíba do Sul, abastecidas pela transposição pelo Sistema Lages/Guandu. Uma grande discussão está vigente, pois existe séria possibilidade de haver mais uma transposição do Rio para a Região Metropolitana de São Paulo, mas essa questão não é objeto de estudo no momento.

A extensão territorial da Bacia corresponde a 0,7% da área do País e 6% da região Sudeste. Seu ponto mais alto é o Pico das Agulhas Negras com 2.787 metros de altitude.

Figura 01: Mapa da bacia do rio Paraíba do Sul

Fonte: Sítio do CEIVAP. Disponível em: <https://ceivap.org.br/downloads/mapa2.jpg>. Acesso em 23 de setembro de 2011.

Da Serra da Bocaina, no município de Areias, a 1800m de altitude, desce o rio Paraitinga rumo a sudoeste em vale estreito e encaixado entre a Serra do Mar e seus contrafortes (Serras da Bocaina, Quebra-Cangalha e Jambeiro). Em vale proximamente paralelo ao primeiro, a partir do município de Cunha, desce o rio Paraibuna (SP) até encontrarem-se próximos à cidade de mesmo nome, dando origem assim ao rio Paraíba do Sul. Seu início já conta com expressiva contribuição hídrica dos cerca de 4.000 km2 das bacias de seus formadores. Após percorrer alguns quilômetros, inverte o sentido de seu escoamento em aproximadamente 180º ao encontrar os maciços graníticos da Serra de Guararema (município de mesmo nome), passando a adotar o rumo nordeste, caminhando entre as Serras do Mar e da Mantiqueira até sua foz.

Na bacia como um todo, envolvendo São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, a falta de tratamento de esgotos domésticos é o maior causador de impacto na qualidade dos corpos d’água.

A implantação da cobrança pelo uso da água no Brasil é particularmente complexa devido às peculiaridades jurídicas relativas aos recursos hídricos, notadamente tendo em vista que há águas de domínio da União e águas dos Estados da Federação. Tal discussão é importante, pois para haver cobrança, é necessário determinar quem vai administrá-la. A própria Constituição Federal determina que a competência legislativa é prioritariamente da União e suplementar aos Estados, conforme artigo 24, par. 2º da Carta Magna. Porém, a própria Constituição determina competência administrativa concorrente entre todos os entes federativos, à luz do artigo 23, inciso VI.

Mas essa particularidade implica, de modo geral, a existência de sistemas de cobrança distintos nos níveis federal e estadual, uma vez que os recursos hídricos são divididos em competência federal e estadual, conforme assevera a Constituição Federal em seus artigos 20, inciso III e 26, inciso I. Frisa-se que o Município não possui águas em seu domínio, o que não exclui seu dever na proteção e preservação. Basicamente, a bacia é considerada de domínio da União quando envolve mais de um estado, sirva de limite com outros países ou que tenha participação em território estrangeiro. Logo, é de domínio do Estado quando se localiza inteiramente dentro do mesmo.

A cobrança pelo uso da água é estabelecida a partir de um pacto entre os usuários da água, sociedade civil e poder público no âmbito do CBH, instância regional de gestão.

Os principais usos da água na bacia são: abastecimento público, diluição de efluentes domésticos e industriais, irrigação, mineração e geração de energia elétrica. Também se observa a utilização das águas, em menor escala, para a pesca, aqüicultura, recreação e turismo.

3.9. Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (CEIVAP)

O CEIVAP começou na década de 80 sendo chamado de CEEIVAP (Comitê Executivo de Estudos Integrados da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul). Foi a primeira tentativa de implantar uma gestão de recursos hídricos com o recorte de bacia hidrográfica. Com o advento da Lei federal 9.433/97, foi extinto o CEEIVAP, e no seu lugar foi criado o atual CEIVAP (Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul), através do Decreto Federal 1.842/96, que foi resultado de intensas negociações envolvendo os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e o Governo federal.

O CEIVAP, que fora instalado apenas em dezembro de 1997, iniciou a sua atuação de acordo com os preceitos da lei federal 9433/97, buscando a integração da bacia, criando Unidades de Gestão do Programa – UGPs por cada um dos três Estados.

O CEIVAP, como órgão colegiado, tem como finalidade promover a viabilização técnica e econômico-financeira de programas de investimento e a consolidação de políticas de estruturação urbana e regional, além de realizar a articulação interestadual de modo a garantir que as iniciativas regionais de estudos, projetos, programas e planos de ação sejam partes complementares, integradas e consonantes com as diretrizes e prioridades que vierem ser estabelecidas para a bacia.

Conhecida como “Parlamento das Águas”, o CEIVAP é formado por 60 membros e respectivos suplentes, sendo três representantes da União e 19 de cada estado (MG, RJ e SP). Tem composição paritária, sendo: 40% de usuários de água, como indústrias, agricultores, hidrelétricas e companhias de saneamento básico; 35% de órgãos da União, estados e municípios; e 25% de sociedades civis organizadas.

Seus membros são eleitos para mandato de dois anos, no qual se forma uma diretoria colegiada com assessoramento direto da Câmara Técnica Consultiva (CTC) e Grupos de Trabalhos (GTs).

Na Bacia do Rio Paraíba, como agência de águas, existe a AGEVAP, que recebe integralmente os recursos arrecadados da cobrança. De início era apenas um escritório técnico. Em 2002, passou a ser uma Associação. Até que em 2004, adquiriu personalidade jurídica de agência estabelecendo contrato direto com a ANA.

Para simplificar, segue o seguinte procedimento: o CEIVAP define o orçamento através de um plano, a AGEVAP lança os editais e os interessados apresentam suas propostas para captação de recursos e, de volta, o Comitê de Bacia prioriza as intervenções de acordo com o Plano de Bacia.

Em 2001, o CEIVAP deliberou pela implementação da cobrança, que foi efetivamente iniciada em março de 2003. Foi uma atitude pioneira no País. A cobrança foi instituída com base nos critérios, metodologia e valores foram propostos pelo CEIVAP e aprovados pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos.

Segundo Revista Pelas Águas do Paraíba (CEIVAP, 2011, p. 8), para se ter uma noção do montante de recursos arrecadados, repassados pela ANA, de 2004 até 2010, na Bacia do Rio Paraíba do Sul, é de R$ 67,8 milhões, sendo R$ 57.184.276,72 de arrecadação em si e R$ 10.652.485,78 de rendimentos. Desse montante foram aplicados ou desembolsados R$ 21,8 milhões em ações de implantação e operacionalização e mobilização social da Agência da Bacia, o restante foi comprometido com propostas apresentadas pelos mais diversos tomadores. Segue tabela de arrecadação dos recursos:

Tabela 01 – CEIVAP Estimativa de arrecadação por estados

Estimativa de arrecadação (R$)

MG

RJ

SP

TOTAL

Valor nominal do boleto

1.303.626,52

8.716.598,99

3.052.593,67

13.072.789,18

Fonte: CEIVAP, 2011, p.8 e 9

Tabela 02 – CEIVAP Arrecadação efetiva por estados

Arrecadação efetiva

MG

RJ

SP

TOTAL

Receita nominal

1.063.672,08

6.255.542,90

2.728.429,45

10.047.644,43

Pagamento de juros e multa

4.177,00

120.187,50

1.052,25

125.416,75

Exercícios anteriores

1.021,35

290.005.32

16.431,51

307,458,18

Parcelamento de débitos

134.063,30

1.685.714,83

111.856,66

1.931.634,79

Outras deduções, compensações e restituições

-

-

-

-

Total pago no exercício

1.202.933,73

8.351.450,55

2.587.769,87

12.412.154,15

Fonte: CEIVAP, 2011, p.8 e 9

De modo a analisar a aplicação desses recursos, segundo o CEIVAP, já foram aprovados cerca de 100 projetos para recuperação da bacia até o ano de 2010. Nesse mesmo período, já foram concluídos 41 projetos de recuperação da bacia, sendo a maioria deles propostas de estações de tratamento de esgotos, que visam remoção de Demanda Bioquímica de Oxigênio dos corpos d’água.

Ainda segundo relatório da ANA, considerando a finalidade educativa da cobrança, se verificou, numa comparação dos anos de 2007 a 2009, uma “redução no lançamento de carga orgânica, tanto no saneamento, quanto na indústria, de 3% e 18%, respectivamente”. (ANA, 2010, p.45). Redução esta atribuída ao instituto da cobrança.

3.10. Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul (CBH-PS)

O Estado de São Paulo aprovou sua legislação de recursos hídricos em 1991, portanto, antes da Lei Federal n. 9.433/97. Após grande mobilização regional, nasceu o Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul e Serra da Mantiqueira (CBH-PSM), em novembro de 1994, na cidade de Guaratinguetá. Alguns anos depois a Serra da Mantiqueira desmembrou-se do Paraíba formando o seu Comitê da Unidade Geográfica de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHI-1), sendo renomeado o Comitê do Paraíba para Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul (CBH-PS).

Com a criação do Comitê na parte paulista da bacia, ficou incumbido de articular a participação paulista no âmbito do CEIVAP. A partir de 1996, o CBH-PS passou a receber os recursos advindos do FEHIDRO, que já possuía recursos oriundos da cobrança pelo potencial energético nas usinas hidrelétricas, com os quais exerceu o aprendizado de priorizar a aplicação de recursos na bacia.

O suporte à Secretaria Executiva vem sendo feito pelo Departamento Estadual de Água e Energia Elétrica (DAEE), que disponibiliza pessoal e logística, complementado com recursos financeiros de custeio do FEHIDRO. Os assuntos ligados à cobrança pelo uso dos recursos hídricos vêm sendo debatidos na bacia do Paraíba com bastante intensidade desde o ano de 2000 e ainda se perfaz nos dias de hoje.

Como já citado anteriormente, a principal função do CBH-PS, no trecho paulista, é priorizar os projetos apresentados no recebimento dos recursos, incluindo os oriundos da cobrança.

A cobrança pelo uso da água no CBH-PS ocorreu a partir da sua definição através da Deliberação n.5/2006. Em 2007 iniciou-se a cobrança na bacia no trecho paulista. No tocante a aplicação dos recursos oriundos da cobrança, observa-se o enquadramento dos projetos a serem contemplados referentes a recuperação, conservação e proteção dos corpos d´água e prevenção e defesa contra eventos hidrológicos extremos. Segue tabela com os valores arrecadados até 2010.

Tabela 03 – CBH-PS Arrecadação

Ano

Nº de usuários sujeitos à cobrança

Nº de usuários pagantes

Arrecadação prevista (R$)

Montante arrecadado (R$)

Inadimplência (R$)

2007

185

183

2.247.200,77

2.177.770,32

69.430,45

2008

271

269

2.503.364,21

2.367.685,62

135.678,59

2009

268

267

2.646.316,85

2.568.909,28

77.407,57

2010

341

340

3.202.611,33

3.095.522,31

107.089,02

Total

1065

1059

10.599.493,16

10.209.887,53

389.605,63

Fonte: Dados fornecidos pelo CBH-PS em setembro de 2011.

Um projeto que merece destaque foi a remoção de plantas aquáticas (macrófitas) do leito do rio Paraíba em toda sua extensão. Tais plantas são um agente prejudicial peculiar ao rio Paraíba, afetando a dinâmica de escoamento da água, provocando erosões e danificando pontes. O projeto inicial foi de R$ 8 milhões, sendo que 50% são oriundos da cobrança.

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Sobre a autora
Tatianna Rangel Mello de Azevedo Madsen

Advogada. Bacharela em Direito pelo Centro Universitário Salesiano.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MADSEN, Tatianna Rangel Mello Azevedo. Natureza e aspectos jurídicos da cobrança do uso da água e sua aplicabilidade prática. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3228, 3 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21663. Acesso em: 20 abr. 2024.

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito no Centro Universitário Salesiano, sob a orientação da Profa. Dra. Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida.

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