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Habeas corpus per saltum: (im)possibilidade de afastamento “hic et nunc” do óbice estabelecido pelo verbete de Súmula nº 691 do Supremo Tribunal Federal

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14/06/2012 às 15:22
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3.HABEAS CORPUS PER SALTUM E A SÚMULA Nº 691 DO STF

3.1.Noções gerais

De início, cumpre salientar que o tema em análise ganhou mais relevo no mundo jurídico após o julgamento do Habeas Corpus nº 95009/SP[57], cujo paciente era um renomado banqueiro do país.

No writ em comento, após a negativa de um pedido liminar no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal concedeu a ordem e determinou a soltura do paciente, antes mesmo de o STJ enfrentar o mérito do habeas corpus impetrado pela defesa.

O Acórdão referente ao caso ilustrado restou assim ementado:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA. CONVERSÃO DE HC PREVENTIVO EM LIBERATÓRIO E EXCEÇÃO À SÚMULA 691/STF. PRISÃO TEMPORÁRIA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA DA PRISÃO PREVENTIVA. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL PARA VIABILIZAR A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO PENAL. GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL FUNDADA NA SITUAÇÃO ECONÔMICA DO PACIENTE. PRESERVAÇÃO DA ORDEM ECONÔMICA. QUEBRA DA IGUALDADE (ARTIGO 5º, CAPUT E INCISO I DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA DA PRISÃO PREVENTIVA. PRISÃO CAUTELAR COMO ANTECIPAÇÃO DA PENA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRESUNÇÃO DE NÃO CULPABILIDADE (ARTIGO 5º, LVII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ESTADO DE DIREITO E DIREITO DE DEFESA. COMBATE À CRIMINALIDADE NO ESTADO DE DIREITO. ÉTICA JUDICIAL, NEUTRALIDADE, INDEPENDÊNCIA E IMPARCIALIDADE DO JUIZ. AFRONTA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS CONSAGRADAS NO ARTIGO 5º, INCISOS XI, XII E XLV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO, DO ACUSADO, DE PERMANECER CALADO (ARTIGO 5º, LXIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL).

CONVERSÃO DE HABEAS CORPUS PREVENTIVO EM HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. O habeas corpus preventivo diz com o futuro. Respeita ao temor de futura violação do direito de ir e vir. Temor que, no caso, decorrendo do conhecimento de notícia veiculada em jornal de grande circulação, veio a ser concretizado. Justifica-se a conversão do habeas corpus preventivo em liberatório em razão da amplitude do pedido inicial e porque abrange a proteção mediata e imediata do direito de ir e vir.

SÚMULA 691. EXCEÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA NA NECESSIDADE, NO CASO CONCRETO, DE PRONTA ATUAÇÃO DESTA CORTE. Esta Corte tem abrandado o rigor da Súmula 691/STF nos casos em que (i) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar e (ii) a negativa de liminar pelo tribunal superior importe na caracterização ou manutenção de situações manifestamente contrárias ao entendimento do Supremo Tribunal Federal.

PRISÃO TEMPORÁRIA REVOGADA POR AUSÊNCIA DE SEUS REQUISITOS E PORQUE CUMPRIDAS AS PROVIDÊNCIAS CAUTELARES DESTINADAS À COLHEITA DE PROVAS. Prisão temporária que não se justifica em razão da ausência dos requisitos da Lei n. 7.960/89 e, ainda, porque no caso foram cumpridas as providências cautelares destinadas à colheita de provas.

PRISÃO PREVENTIVA: Indeferimento, pelo Juiz, sob o fundamento de ausência de conduta, do paciente, necessária ao estabelecimento de nexo de causalidade entre ela e fatos imputados a outros investigados. Reconsideração com fundamento em prova nova consistente na apreensão de papéis apócrifos na residência do paciente. Insuficiência de provas que se reportam a circunstâncias remotas, dissociadas do contexto atual.

FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA: I) CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL PARA VIABILIZAR, COM A COLHEITA DE PROVAS, A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO PENAL. Tendo o Juiz da causa autorizado a quebra de sigilos telefônicos e determinado a realização de inúmeras buscas e apreensões, com o intuito de viabilizar a eventual instauração da ação penal, torna-se desnecessária a prisão preventiva do paciente por conveniência da instrução penal. Medidas que lograram êxito, cumpriram seu desígnio. Daí que a prisão por esse fundamento somente seria possível se o magistrado tivesse explicitado, justificadamente, o prejuízo decorrente da liberdade do paciente. A não ser assim ter-se-á prisão arbitrária e, por conseqüência, temerária, autêntica antecipação da pena. O propalado "suborno" de autoridade policial, a fim de que esta se abstivesse de investigar determinadas pessoas, à primeira vista se confunde com os elementos constitutivos do tipo descrito no art. 333 do Código Penal (corrupção ativa). II) GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL, FUNDADA NA SITUAÇÃO ECONÔMICA DO PACIENTE. A prisão cautelar, tendo em conta a capacidade econômica do paciente e contatos seus no exterior não encontra ressonância na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pena de estabelecer-se, mediante quebra da igualdade (artigo 5º, caput e inciso I da Constituição do Brasil) distinção entre ricos e pobres, para o bem e para o mal. Precedentes. III) GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, COM ESTEIO EM SUPOSIÇÕES. Mera suposição --- vocábulo abundantemente utilizado no decreto prisional --- de que o paciente obstruirá as investigações ou continuará delinqüindo não autorizam a medida excepcional de constrição prematura da liberdade de locomoção. Indispensável, também aí, a indicação de elementos concretos que demonstrassem, cabalmente, a necessidade da prisão. IV) PRESERVAÇÃO DA ORDEM ECONÔMICA. No decreto prisional nada se vê a justificar a prisão cautelar do paciente, que não há de suportar esse gravame por encontrar-se em situação econômica privilegiada. As conquistas das classes subalternas, não se as produz no plano processual penal; outras são as arenas nas quais devem ser imputadas responsabilidades aos que acumulam riquezas.

PRISÃO PREVENTIVA COMO ANTECIPAÇÃO DA PENA. INCONSTITUCIONALIDADE. A prisão preventiva em situações que vigorosamente não a justifiquem equivale a antecipação da pena, sanção a ser no futuro eventualmente imposta, a quem a mereça, mediante sentença transitada em julgado. A afronta ao princípio da presunção de não culpabilidade, contemplado no plano constitucional (artigo 5º, LVII da Constituição do Brasil), é, desde essa perspectiva, evidente. Antes do trânsito em julgado da sentença condenatória a regra é a liberdade; a prisão, a exceção. Aquela cede a esta em casos excepcionais. É necessária a demonstração de situações efetivas que justifiquem o sacrifício da liberdade individual em prol da viabilidade do processo.

ESTADO DE DIREITO E DIREITO DE DEFESA. O Estado de direito viabiliza a preservação das práticas democráticas e, especialmente, o direito de defesa. Direito a, salvo circunstâncias excepcionais, não sermos presos senão após a efetiva comprovação da prática de um crime. Por isso usufruímos a tranqüilidade que advém da segurança de sabermos que se um irmão, amigo ou parente próximo vier a ser acusado de ter cometido algo ilícito, não será arrebatado de nós e submetido a ferros sem antes se valer de todos os meios de defesa em qualquer circunstância à disposição de todos. Tranqüilidade que advém de sabermos que a Constituição do Brasil assegura ao nosso irmão, amigo ou parente próximo a garantia do habeas corpus, por conta da qual qualquer violência que os alcance, venha de onde vier, será coibida.

COMBATE À CRIMINALIDADE NO ESTADO DE DIREITO. O que caracteriza a sociedade moderna, permitindo o aparecimento do Estado moderno, é por um lado a divisão do trabalho; por outro a monopolização da tributação e da violência física. Em nenhuma sociedade na qual a desordem tenha sido superada admite-se que todos cumpram as mesmas funções. O combate à criminalidade é missão típica e privativa da Administração (não do Judiciário), através da polícia, como se lê nos incisos do artigo 144 da Constituição, e do Ministério Público, a quem compete, privativamente, promover a ação penal pública (artigo 129, I).

[omissis]

AFRONTA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS CONSAGRADAS NO ARTIGO 5º, INCISOS XI, XII E XLV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. De que vale declarar, a Constituição, que "a casa é asilo inviolável do indivíduo" (art. 5º, XI) se moradias são invadidas por policiais munidos de mandados que consubstanciem verdadeiras cartas brancas, mandados com poderes de a tudo devassar, só porque o habitante é suspeito de um crime? Mandados expedidos sem justa causa, isto é sem especificar o que se deve buscar e sem que a decisão que determina sua expedição seja precedida de perquirição quanto à possibilidade de adoção de meio menos gravoso para chegar-se ao mesmo fim. A polícia é autorizada, largamente, a apreender tudo quanto possa vir a consubstanciar prova de qualquer crime, objeto ou não da investigação. Eis aí o que se pode chamar de autêntica "devassa". Esses mandados ordinariamente autorizam a apreensão de computadores, nos quais fica indelevelmente gravado tudo quanto respeite à intimidade das pessoas e possa vir a ser, quando e se oportuno, no futuro usado contra quem se pretenda atingir. De que vale a Constituição dizer que "é inviolável o sigilo da correspondência" (art. 5º, XII) se ela, mesmo eliminada ou "deletada", é neles encontrada? E a apreensão de toda a sorte de coisas, o que eventualmente privará a família do acusado da posse de bens que poderiam ser convertidos em recursos financeiros com os quais seriam eventualmente enfrentados os tempos amargos que se seguem a sua prisão. A garantia constitucional da pessoalidade da pena (art. 5º, XLV) para nada vale quando esses excessos tornam-se rotineiros.

DIREITO, DO ACUSADO, DE PERMANECER CALADO (ARTIGO 5º, LXIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). O controle difuso da constitucionalidade da prisão temporária deverá ser desenvolvido perquirindo-se necessidade e indispensabilidade da medida. A primeira indagação a ser feita no curso desse controle há de ser a seguinte: em que e no que o corpo do suspeito é necessário à investigação? Exclua-se desde logo a afirmação de que se prende para ouvir o detido. Pois a Constituição garante a qualquer um o direito de permanecer calado (art. 5º, LXIII), o que faz com que a resposta à inquirição investigatória consubstancie uma faculdade. Ora, não se prende alguém para que exerça uma faculdade. Sendo a privação da liberdade a mais grave das constrições que a alguém se pode impor, é imperioso que o paciente dessa coação tenha a sua disposição alternativa de evitá-la. Se a investigação reclama a oitiva do suspeito, que a tanto se o intime e lhe sejam feitas perguntas, respondendo-as o suspeito se quiser, sem necessidade de prisão. Ordem concedida.

(HC 95009, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2008, DJe-241 DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-12-2008 EMENT VOL-02346-06 PP-01275 RTJ VOL-00208-02 PP-00640 – sem destaque no original)

Ao enfrentar o mérito do referido HC, antes mesmo de o outro Tribunal se manifestar acerca da viabilidade ou não de se conceder a ordem, o Supremo Tribunal demonstrou considerável mudança em sua própria jurisprudência encartada no verbete de súmula nº 691.

Demais disso, o escopo desta pesquisa é exatamente verificar a que pé anda a jurisprudência do Pretório Excelso quando da aplicação ou não das disposições da cártula de jurisprudência nº 691.

Por fim, é de destacar que a composição plenária é bastante diversa daquela que foi responsável pela aprovação da súmula ilustrada.

3.2.Súmula 691

O verbete de súmula nº 691, cuja redação estabelece que “não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de ‘habeas corpus’ impetrado contra decisão do relator que, em "habeas corpus" requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar”, foi aprovado na Sessão Plenária de 24/09/2003, em razão de uma série de pessoas começarem a ingressar com uma ação de habeas corpus diretamente no Supremo Tribunal antes mesmo do julgamento do mérito pelos Tribunais Superiores, após estes negarem o pedido liminar.

Assim, a referida súmula teve por escopo evitar a supressão de instâncias naturais do Poder Judiciário, em estrito respeito ao artigo 5º, inciso LIII, da Constituição de 1988.

Ainda hoje, é de se afirmar que o objetivo é o mesmo, todavia, com efeitos mitigados pelo próprio Supremo Tribunal Federal.

Ademais, não tão simples afirmar e reconhecer a chamada superposição de decisão e nem mesmo violação ao princípio da hierarquia ou da competência, como alguns afirmam, uma vez que o direito de liberdade e locomoção se sobrepõe à eventual conflito.

É bem verdade que os ministros quase a revogaram durante o julgamento do HC 95.009/SP, no qual figurava como paciente o dono do Banco Oportunity, Daniel Valente Dantas.

Em meio as discussões, entendeu-se por bem manter válida a jurisprudência consolidada no verbete nº 691, com o fito de transparecer a jurisprudência da Excelsa Corte.

Portanto, é imperioso lembrar que as disposições da referida súmula continuam a ser aplicadas nos casos de denegação do pedido liminar em Tribunal Superior, cujo recurso natural seria dirigido ao Supremo Tribunal.

3.3.Leading case

Não se sabe ao certo qual seria o leanding case em que se presenciou a primeira mitigação do teor da súmula de jurisprudência nº 691 do STF.

Mas se verifica casos na evolução jurisprudencial do Supremo em que se aventou certa relativização das disposições da súmula.

Dentre eles, merece destaque o Acórdão resultante do julgamento do HC nº 84.014, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Mello. Nele, resta patente que o STF não editou a súmula para petrificar sua jurisprudência. Confira-se a ementa do Acórdão mencionado:

HABEAS CORPUS - OBJETO - INDEFERIMENTO DE LIMINAR EM IDÊNTICA MEDIDA - VERBETE 691 DA SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

A Súmula do Supremo Tribunal Federal revela, como regra, o não-cabimento do habeas contra ato de relator que, em idêntica medida, haja implicado o indeferimento de liminar. A exceção corre à conta de flagrante constrangimento ilegal que, uma vez não verificado, impede a seqüência do habeas corpus.

(HC 84014 AgR, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 30/03/2004, DJ 25-06-2004 PP-00017 EMENT VOL-02157-02 PP-00325 – sem grifo no original)

Posteriormente, no Acórdão oriundo do HC nº 87.468, de relatoria do Ministro Cezar Peluso, ficou mais nítido o posicionamento sufragado no sentido da possibilidade de relativização das vedações, antes impostas pela súmula nº 691.

De sua ementa, verifica-se que

o enunciado da súmula 691 do Supremo não o impede de, tal seja a hipótese, conhecer de habeas corpus contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido ao Superior Tribunal de Justiça, indefere pedido de liminar.[58]

No mesmo sentido, o Acórdão assim ementado no julgamento do writ constitucional nº 91.241, relatado pelo Ministro Ayres Brito:

EMENTA: HABEAS CORPUS. AGRAVO REGIMENTAL. ABRANDAMENTO DA SÚMULA 691. POSSIBILIDADE. ALEGADA AFRONTA À JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. WRIT INTERPOSTO PARA TRANCAR AÇÃO PENAL JÁ TRANSITADA EM JULGADA. PRETENSÃO DESPIDA DE PLAUSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.

1. A via processualmente restrita do habeas corpus não é de ser usada indiscriminadamente para impedir, material ou empiricamente, o trânsito em julgado das condenações criminais.

2. Transitada em julgado a condenação sem qualquer insurgência contra a denúncia, não há que se falar em falta de justa causa para a persecução penal.

3. O enunciado da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal comporta relativização tão-somente quando, de logo, avulta o cerceio à liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder (inciso LXVIII do art. 5º da CF/88).

4. Agravo improvido.

(HC 91241 AgR, Relator(a):  Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 07/08/2007, DJE-065 DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT VOL-02314-04 PP-00760)

É bem verdade também que houve Ministros que tentaram reforçar o entendimento esposado no enunciado sub examine, indo de encontro com a novel jurisprudência que, pouco a pouco, ia se formando.

Nessa linha, o julgamento monocrático proferido em face do habeas corpus nº 93.653, da lavra da e. Ministra Ellen Gracie, assim ementado:

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DIREITO PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. DECISÃO MONOCRÁTICA DO STJ. SÚMULA 691, STF. NÃO CONHECIMENTO DO HABEAS CORPUS.

1. Obstáculo intransponível ao conhecimento do habeas corpus (enunciado 691, da Súmula do Supremo Tribunal Federal: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em sede de habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar").

2. Decisão do STJ não é flagrantemente ilegal, teratológica, não cabendo a relativização da orientação contida na referida Súmula 691, desta Corte.

3. O STF tem adotado orientação segundo a qual há proibição legal para a concessão da liberdade provisória em favor dos sujeitos ativos do crime de tráfico ilícito de drogas (art. 44, da Lei n 11.343/06), o que, por si só, é fundamento para o indeferimento do requerimento de liberdade provisória.

4. O critério da razoabilidade deve nortear a aferição do prolongamento do processo penal. Apenas o excesso injustificado da instrução processual se afigura constrangimento ilegal, hábil à concessão da ordem para fins de cassação do decreto prisional.

5. Habeas corpus não conhecido.

(HC 93653, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 03/06/2008, DJe-117 DIVULG 26-06-2008 PUBLIC 27-06-2008 EMENT VOL-02325-04 PP-00715 – sem grifo no original)

De mais a mais, pouco importa precisar em qual julgamento se originou o entendimento que possibilitou enxergar que as disposições encartadas no enunciado nº 691 da jurisprudência do Supremo Tribunal não poderiam ser tidas como um óbice intransponível quando se estivesse diante de grave e patente ilegalidade.

3.4. Entendimento predominante

Extrai-se do julgamento do habeas corpus nº 91.078 o entendimento de que a “jurisprudência do STF, sempre em caráter extraordinário, tem admitido o afastamento, hic et nunc, da Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte.[59]

Ademais, o Ministro Celso de Mello (relator) ainda faz alusão aos casos em que seja evidente e manifesto o abuso de poder ou a manifesta ilegalidade.

Hodiernamente, a jurisprudência no âmbito do Pretório Excelso é remansosa em afirmar a mitigação do seu verbete de súmula nº 691, destaque-se, excepcionalmente.

E, conforme dito alhures, esse entendimento ganhou musculatura após o julgamento do habeas corpus nº 95.009/SP, no qual o banqueiro Daniel Dantas figurou como paciente. E frise-se que esse caso emblemático foi diuturnamente repercutido pela mídia brasileira.

Destaque-se dos fundamentos carreados pelo Ministro relator, Eros Grau, quando do julgamento do writ:

Esta Corte tem abrandado o rigor da Súmula 691/STF nos casos em que (i) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar e (ii) a negativa de liminar pelo tribunal superior importe na caracterização ou manutenção de situações manifestamente contrárias ao entendimento do Supremo Tribunal Federal.[60]

Fica claro que essa mitigação ostenta cunho eminentemente processual, extraído diretamente da Carta Maior de 1988.

Não obstante a isso, essa conclusão torna evidente que a súmula não foi superada, quissá revogada.

Outro ponto interessante de se anotar é que esse abrandamento do enunciado só ocorre em casos de excepcionalidade.

Por fim, é importante também fazer alusão às decisões teratológicas,[61] as quais por serem verdadeiras aberrações também autorizam o abrandamento hic et nunc[62] da súmula 691 do Supremo Tribunal Federal.

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Sobre o autor
Joabson Carlos Pereira Silva

Técnico Judiciário do Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDFT. Especialista em Direito Público pelo Instituto Processus de Direito. Pós-graduando (lato sensu) em Direito e Contemporaneidade pela Escola da Magistratura do Distrito Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Joabson Carlos Pereira. Habeas corpus per saltum: (im)possibilidade de afastamento “hic et nunc” do óbice estabelecido pelo verbete de Súmula nº 691 do Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3270, 14 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22006. Acesso em: 7 mai. 2024.

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