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Assédio moral nas relações de trabalho ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho

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17/08/2012 às 14:44
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3 DECISÕES JURISPRUDENCIAIS E SUAS CONTRADIÇÕES

A primeira decisão sobre o assédio moral nas relações de trabalho, deu-se em 2002 no Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, no Espírito Santo, (SALVADOR, 2003, p.10-12), quando se condenou o empregador, como observamos abaixo:

“ASSÉDIO MORAL - CONTRATO DE INAÇÃO - INDENIZAÇÃO POR DANOMORAL - A tortura psicológica, destinada a golpear a auto-estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua auto-estima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por conseqüência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer trabalho, fonte de dignidade do empregado.”[26]

Depois da decisão inovadora deste Tribunal, sobrevieram centenas de milhares de casos, confirmando através de decisões jurisprudenciais, que o assédio moral nas relações de trabalho pode ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Porém há gritantes contradições de nossos julgadores, dependendo muito da sensatez e da observância minuciosa sobre cada caso prático.

A seguir, iremos analisar casos típicos e decisões importantes acerca do presente tema, em cada órgão julgador competente.

3.1 Decisões do Tribunal Superior do Trabalho

Como sabemos, a temática do assédio moral como fator de rescisão indireta do contrato de trabalho é consideravelmente nova, e, portanto, as decisões e entendimentos estão apenas sendo julgadas nos últimos anos. Talvez por isso, que não houve nenhuma súmula ou decisão mais concreta que repercute ligeiramente e integralmente nos processos em andamento nos demais Tribunais Trabalhistas.

Deste modo, podemos avaliar algumas decisões recentes, onde direcionam o nosso estudo nos casos típicos e facilmente encontrado em nossos Tribunais.

“RESCISÃO INDIRETA. CONTRATO DE TRABALHO. FUNÇÃO. MUDANÇA. CAIXA PARA A DE -PROVADOR DE ESTOQUE-. ATIVIDADE INSERIDA NO ROL DE ATRIBUIÇÕES PREVISTAS NO AJUSTE. Não constitui falta grave, configuradora de rescisão indireta do contrato de emprego, conduta do empregador consistente em mudança de função, de caixa para a de atendimento a -provador de estoque-, se ambas as atividades inserem-se no rol de atribuições do cargo para a qual empregada é contratada. Daí por que a conduta do empregador, ao mudar a função do empregado, sem redução de remuneração, encontra-se na esfera do poder diretivo do empregador, configurando o jus variando autorizado por lei. Sobretudo quando se atenta para o fato de que as sanções impostas à reclamante - suspensão e advertência -, por faltas injustificadas ao serviço, guardam estreita proporcionalidade com as faltas. Tal circunstância reforça ainda mais a ausência de qualquer elemento que possa configurar hipótese de rescisão indireta do contrato de emprego. Violação ao artigo 483 do CLT não configurada. Recurso não conhecido. INDENIZAÇÃO. ASSÉDIO MORAL. O direito à indenização por danos advindos de assédio moral, em ambiente de trabalho, supõe, no mínimo, constrangimento ilegal da vítima, vale dizer, qualquer conduta abusiva, hostil, por parte do empregador e/ou de seus prepostos, em relação aos empregados que contrata. O Tribunal a quo, soberano no exame dos fatos e das provas carreadas aos autos, declina que as sanções impostas à demandante, suspensão e advertência, decorreram de faltas injustificadas ao trabalho, que tais medidas guardam estreita proporcionalidade com as faltas cometidas pela empregada. Ressalta que a mudança de função, de caixa para a de atendimento a -provador de estoque-, encontra previsão no rol de atribuições do cargo para o qual empregada fora contratada. Por fim, declina o Tribunal de origem que, mediante a prova testemunhal, produzida por ambas as partes, não resultam evidenciadas quaisquer situações aviltantes que tornem aviltante o ambiente de trabalho, tampouco qualquer conduta abusiva, violadora do patrimônio moral da empregada. Não configurada violação ao patrimônio moral da demandante, não há lugar para acolhimento de pretensão tendente à indenização, fundada em assédio. O TRT de origem, no que exclui a indenização, por assédio moral, não viola os artigos 5º, inciso X, da Constituição Federal. Não conhecido. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DE CUSTAS. O benefício da justiça gratuita pode ser requerido em qualquer tempo ou grau de jurisdição, desde que, na fase recursal, seja o requerimento formulado no prazo alusivo ao recurso. Mencionado requerimento pode ser efetuado mediante declaração de pobreza firmada pelo reclamante ou, ainda, por seu advogado, mesmo que não detenha poderes especiais para tanto. Hipótese de incidência da Orientação Jurisprudencial n.º 269 da SBDI-I do Tribunal Superior do Trabalho. Conhecido e provido, no particular.” [27]

No exemplo jurisprudencial acima, o Reclamante não obteve êxito quanto à rescisão indireta do contrato de trabalho, pleiteada em virtude da troca de tarefas executas diariamente. Considerou o TST, que a simples mudança de função está prevista no rol de atribuições do cargo na qual fora contratado.

“RECURSOS DE REVISTA DAS RECLAMADAS - DANOS MORAIS - ASSÉDIO MORAL E SEXUAL - ÔNUS DA PROVA.

1. A prova das alegações incumbe à parte que as fizer, sendo certo que o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito. Inteligência dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC.

2. Na hipótese dos autos, o Regional majorou - de R$ 5.000,000 para R$ 10.000,00 - a condenação por danos morais decorrentes de assédio moral praticado pelo superior hierárquico da Obreira, que, ao cobrar metas, proferia xingamentos e agressões verbais aos empregados. Quanto ao assédio sexual, reformou a sentença para deferir indenização de R$ 30.000,00 por danos morais no particular, entendendo que, em que pese a Trabalhadora não ter comprovado os fatos narrados na inicial, a prova testemunhal indicou a ocorrência de outros fatos que demonstraram o desrespeito à intimidade da Empregada.

3. Verifica-se que, como a decisão guerreada fundamentou-se na prova oral produzida no processo, incólumes os arts. 818 da CLT e 333 do CPC.

4. De outra parte, a generalidade da cobrança de metas não tem o condão de excluir sua ilicitude, mormente diante da inércia da Empregadora em coibir as agressões e os xingamentos praticados pelo superior hierárquico após reclamação dos trabalhadores.

5. Acrescenta-se, ainda, que, à luz do que estabelece o art. 5º, X, da CF, revela-se acertada a conclusão a que chegou a Corte de origem, pois o Empregador, que é responsável direto pela qualidade das relações e do ambiente de trabalho, deveria ter adotado medidas compatíveis com os direitos da personalidade, tendo a Empresa se quedado silente nos aspectos, embora alertada sobre os fatos. Recursos de revista das Reclamadas não conhecidos.”[28]

Nesta recente decisão, não houve apenas o assédio moral, mas também o assédio sexual, o que foi comprovado testemunhalmente, ocasionando indenização a ser pago pela Reclamada.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. 1. HORA EXTRA. BANCO DE HORAS. O Regional concluiu que foi desvirtuado o acordo de compensação, portanto, não há falar em contrariedade à Súmula nº 85, I, do TST nem em divergência jurisprudencial. 2. INTERVALO INTRAJORNADA. Decisão regional em consonância com a Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1/TST. 3. DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. De acordo com as provas dos autos, no ambiente de trabalho, a reclamante era submetida a constrangimentos decorrentes de atos dos superiores hierárquicos, na frente de colegas de trabalho. Assim deve ser mantida a condenação em reparação indenizatória, fixada em parâmetros razoáveis e proporcionais. 4. RESCISÃO INDIRETA E CONSECTÁRIOS LEGAIS. Evidenciado que a reclamada incorreu em falta grave, art. 483, b, da CLT, sujeita inclusive a indenização por danos morais, deve ser mantida a rescisão indireta. Agravo de instrumento conhecido e não provido.” [29]

Este caso é o mais comum quanto ao assédio moral nas relações de trabalho, onde o trabalhador é insultado através de palavras de baixo escalão na frente de outros funcionários, o que irá caracterizar a rescisão indireta.

Portanto, apesar de muitas vezes o Tribunal Superior do Trabalho ser o órgão que é mais moroso a atender o anseio dos novos entendimentos, estas decisões irão causar efeitos nos Tribunais Regionais de Trabalho de todo o país, influenciando decisões e sentenças.

3.2 Decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região

Obviamente não diferente do Tribunal Superior do Trabalho, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, pois as decisões deferidas acerca da temática exposta, ou seja, a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral exercido sobre o trabalhador baseia-se fundamentalmente na qualidade das provas juntadas ao processo, importando a sua caracterização através dos requisitos já estudados.

Como observamos nas recentes decisões abaixo, a falta de provas pode trazer enormes prejuízos ao Reclamante:

“DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. RESCISÃO INDIRETA. Prova oral que não convence quanto à veracidade da alegação da inicial, de excessivo controle do horário nas idas ao banheiro, e pressão por produtividade que justifique assédio ou dano moral.”[30]

No caso acima, a testemunha trazida pelo Reclamante, não conseguiu apresentar em juízo provas evidentes dos fatos colacionados na exordial, como controle de horários nas idas ao banheiro. Deste modo, o Juízo de Erechim-RS, não deferiu o assédio moral nos atos da empresa ou de seus responsáveis.

“ASSÉDIO MORAL. OPERADOR DE TELEMARKETING. PRESSÕES PARA CUMPRIMENTO DE METAS. Prova insuficiente. Não demonstrada suficientemente a alegada prática de cobranças exacerbadas e de humilhações, no intuito do cumprimento de metas de vendas, de modo a tipificar o assédio moral, confirma-se a sentença que rejeitou o pedido de indenização por dano moral.”[31]

O Reclamante, no caso acima exposto, não conseguiu comprovar a prática do assédio moral, e por isso teve seu pedido judicial de rescisão indireta pelo assédio moral negado em grau de recurso ordinário.

Em muitos casos, a única prova do fato caracterizador do assédio moral é através de testemunhas, porém elas devem presenciar todos os fatos e saber detalhadamente das agressões, pois é comum ocorrerem casos, como os abaixo citados, onde as testemunhas relatam outras atividades e não caracterizam as violências realmente sofridas.

“DANO MORAL. RECONHECIMENTO DA RESCISÃO INDIRETA. AUSÊNCIA DE PROVA. Assédio moral não provado, ônus que incumbia ao reclamante, por ser fato constitutivo ao direito postulado, conforme disciplina o art. 818 da CLT e art. 333, inciso II do CPC, aplicável de forma subsidiária por força do disposto no art. 769 da CLT. Rescisão indireta do contrato de trabalho não reconhecida. [...] No caso em tela, diante do conjunto probatório, constata-se que não estão presentes o ato ilícito, o dano moral e o nexo causal entre ambos. Verifica-se, isto sim, que a reclamada exerceu o regular poder de comando, dentro de limites razoáveis. O fato de o autor ter sido advertido na frente dos demais colegas por conversar demais, decorreu de atitude inadequada do mesmo em seu local de trabalho, conforme a testemunha João Airton, ao afirmar que [...] quando o reclamante ia tomar água no galpão, ficava conversando com os empregados;”. A atitude da reclamada é compreensível para zelar pelo bom andamento do trabalho. O fato de mudar o local de trabalho do autor e deixá-lo sozinho empilhando madeiras, não demonstra tratamento diferenciado, uma vez que ficou comprovado pelas testemunhas que era uma atividade de rotina um empregado só realizar a tarefa. [...]”[32].”

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Neste caso prático, o Reclamante tentou por todos os meios, caracterizar o assédio moral em virtude das adversões sofridas pelo simples fato de conversar bastante. Porém, concluiu o juiz e o magistrado que a atitude da empresa se deu em virtude da pretensão ao bom andamento do trabalho de seus funcionários.

“RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DANOS MORAIS. Não provados os fatos narrados na inicial, indeferem-se as pretensões ao reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho e à indenização por danos morais. Inaplicável ao caso, dessa forma, o art. 932, III, do Código Civil. Recurso não provido. [...] Com efeito, no caso, o depoimento da testemunha convidada do autor, Luiz Carlos da Silva Pereira, além de frontalmente contrariado pelo da outra testemunha ouvida, Sandro Santos da Silva, convidada pela ré, mostra-se frágil para comprovar suficientemente a alegação de ter sido o reclamante hostilizado, destratado ou humilhado pelo diretor da empresa, nos termos relatados na petição inicial. “[33]

Na decisão acima, embora o Reclamante tenha conseguido apenas uma testemunha para configurar o assédio moral, esta foi obviamente contrariada pela testemunha levada pela Reclamada, o que fragilizou as suas alegações para o entendimento do juiz. Caso dispusesse de mais testemunhas para esta violência sofrida, poderia se dar uma sentença diferente.

Em outros casos pesquisados, o Reclamante não consegue comprovar a situação de violência em virtude da caracterização do assédio moral[34], conforme estudo anterior.

“RESCISÃO INDIRETA. AMEAÇAS. APELIDO. O tratamento descortês por parte da chefia da reclamante na atribuição de apelido, embora deva ser prática coibida pela empresa, não possui gravidade suficiente para determinar a rescisão indireta do contrato de trabalho.”[35]

No caso exposto, o Reclamante tentou a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral exercido através de ameaças e apelidos impostos pela empresa, o que não caracteriza o assédio moral.

“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL. Não se configura o assédio moral quando a alegada discriminação do trabalhador não resta demonstrada nos autos, ônus que compete ao reclamante, nos termos do art. 818 da CLT, c/c o art. 333, I, do CPC. Registra-se que o pleito de despedida indireta depende da caracterização do alegado assédio moral, razão por que se impõe, inicialmente, a análise dessa questão. O assédio moral consiste na conduta patronal insidiosa, que tem por finalidade levar o empregado a desistir do emprego. E, para isso, se utiliza das mais diversas práticas aviltantes ou afrontosas, expondo o trabalhador a humilhações de toda a ordem. Com o menoscabo prolongado, o obreiro vai perdendo a autoconfiança e se desgostando com o ambiente de trabalho até chegar ao ponto de preferir se afastar, mesmo precisando do emprego, ou nele se mantém, com elevado custo emocional. No caso dos autos, os fatos narrados pelo autor na petição inicial não restam demonstrados, porquanto a prova produzida é insuficiente para a formação do convencimento sobre a veracidade desses fatos.”[36]

Depois de todo estudo acerca do assédio moral e da rescisão indireta, comprova-se na pesquisa prática jurisprudencial, que a caracterização destes conceitos faz-se necessário, assim como o conjunto probatório.

Destarte, as decisões de nosso Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, traduzem as decisões e entendimentos dos demais entes federados, onde as provas apresentadas são de suma importância para o deslinde processual.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BENDER, Mateus. Assédio moral nas relações de trabalho ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3334, 17 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22435. Acesso em: 28 mar. 2024.

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