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A estabilidade da gestante e a superação da Súmula 244 do TST

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27/08/2012 às 09:16
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Em recentes julgados, algumas Turmas do TST afastaram a aplicação da Súmula 244 para o fim de conceder a estabilidade gestacional às empregadas admitidas por contrato a prazo determinado.

INTRODUÇÃO

O artigo 7º da Constituição Federal de 1988 estabelece um patamar mínimo de direitos destinados à melhoria da condição social dos trabalhadores urbanos e rurais. Dentre tais direitos, encontra-se o direito à relação de emprego protegida contra dispensa arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Por se tratar de norma dependente de posterior regulamentação, o Constituinte Originário fez incluir no artigo 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias- ADCT, previsão no sentido de que, até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição Federal, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Trata-se de importante instrumento de proteção à vida que está por vir. De igual modo, significa a garantia de subsistência da mãe durante o período inicial de vida da criança. Assim, a Constituição Federal pretende proteger a mãe e a criança.

Instando a se manifestar quanto à compatibilidade entre a estabilidade conferida à empregada gestante e os contratos a prazo determinado, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 244, a qual, no inciso III, dispõe que não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, ao interpretar a norma constitucional transitória firmou posicionamento no sentido de que o artigo 10, inciso II, alínea “b”, do ADCT, assegura à empregada gestante a estabilidade provisória de até cinco meses após o parto, independentemente do regime jurídico a elas aplicável.

Sensíveis aos fins sociais a que se destina a garantia destinada à empregada gestante, bem como à consolidada jurisprudência do STF, algumas Turmas do TST, passaram a afastar a aplicação do disposto no inciso III da Súmula 244 do TST.

Trata-se do início da superação do inciso III da Súmula 244, em busca da maior efetividade do Texto Constitucional. No entanto, referida mudança de posicionamento tem encontrando resistência por parte de algumas Turmas do TST, as quais, em recentes julgados, têm aplicado o disposto na Súmula 244.


1 – A Estabilidade Gestacional na Constituição Federal de 1988.

A República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito, tem por fundamento a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, a cidadania, a soberania e o pluralismo político. Trata-se de Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, estabelecida na harmonia social.

Nos termos do artigo 6º da Carta Maior, o ser humano apresenta-se como destinatário dos direitos sociais, os quais foram estabelecidos como sendo a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.

Os direitos sociais, aí incluídos os de índole trabalhista, são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como liberdades positivas, as quais são de observância obrigatória pelo Estado. Têm por finalidade a melhoria das condições de vida dos hipossuficientes, visando à materialização da igualdade social. Nas palavras de José Afonso da Silva, “são direitos que se ligam ao direito de igualdade”1.

Por outras palavras, são direitos destinados à proteção das necessidades básicas do ser humano, para que viva com o mínimo de dignidade e com acesso aos bens materiais e morais condicionadores da sua realização enquanto cidadão.

Sob a ótica da pessoa que vive do trabalho, em especial do trabalho empregatício, os direitos sociais são o principal instrumento de concretização dos princípios e regras constitucionais referentes à prevalência da dignidade da pessoa, da valorização do trabalho e do emprego, da submissão da propriedade privada a sua função social, da efetividade da justiça social e da democratização da sociedade civil2.

Do exposto, é possível extrair o especial destaque dado pelo Constituinte Originário ao primado do trabalho humano (art. 193, CF/1988), o qual foi reconhecido como condição de efetiva existência digna.

Segundo as lições de Jorge Luiz Souto Maior "o trabalho é da essência humana, no sentido de dever de valorização pessoal e de integração social, e será ao mesmo tempo um dever e um direito, na relação do indivíduo com a sociedade e o Estado”.3

A esse respeito, Luciano Martinez4 destaca que indicar que o trabalho é um valor de caráter social significa dizer que é um direito social fundamental (art. 6, CF/1988), “sem o qual não se movimentam as estruturas do Estado, sem o qual não se admitem o crescimento econômico e a saúde política de uma sociedade”.

O trabalho é valorizado a tal ponto que teve a essencialidade da conduta laborativa reconhecida pela Constituição Federal como um dos instrumentos mais relevantes de afirmação do ser humano, seja no contexto da própria individualidade, seja no contexto de sua inclusão familiar e social. Constitui-se em um especial veículo de afirmação comunitária da grande maioria das pessoas que compõem a contemporânea sociedade capitalista.

Trata-se de um direito e de um honroso dever do ser humano.

Não por outro motivo, a estabilidade do trabalhador no emprego foi um dos temas que maior controvérsia gerou na Assembleia Nacional Constituinte que resultou na promulgação do atual Texto Maior. Significativas organizações sindicais e Partidos Políticos lograram êxito, ainda no seio da Comissão da Ordem Social, na aprovação de disposições assegurando a estabilidade no emprego com restrições significativas à administração empresarial.5

Posteriormente, na Comissão de Sistematização, devido a pressões exercidas por empresários e alguns setores governamentais, a estabilidade anteriormente prevista foi substituída pela garantia de uma indenização compensatória, além de outros mecanismos, tais como fundo de garantia por tempo de serviço, o seguro desemprego e o aviso prévio proporcional.

Em razão da substituição da estabilidade no emprego, foi estabelecida regra no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (art. 10, inciso I) fixando o valor da indenização até que a lei prevista no art. 7º, I, da Constituição Federal, seja aprovada. Da mesma forma, foi estabelecida regra tornando inválida a dispensa arbitrária ou sem justa causa do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato, bem como da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, inciso II, ADCT).

Nesse ponto, especial destaque merece a proteção conferida à empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Trata-se, inegavelmente, de expressiva garantia de caráter social, cujo gozo depende somente da confirmação objetiva do estado gravídico da empregada, independentemente de sua prévia comunicação ao empregador ou mesmo da modalidade contratual celebrada entre as partes envolvidas no vínculo empregatício.

Quer-se dizer, com isso, que o único requisito exigido pelo Constituinte é a confirmação da gravidez. A estabilidade gestacional não se encontra condicionada à prévia comunicação do estado gravídico ao empregador ou mesmo à celebração de um contrato de trabalho a prazo indeterminado. Exigiu-se apenas a confirmação da gravidez.

A previsão constitucional, para fins de concessão da estabilidade à empregada gestante, não estabeleceu distinção entre contratos a prazo determinado ou indeterminado. O que se pretende proteger é a vida que está por vir, é a garantia de subsistência da mãe durante o período inicial de vida do novo ser. A Constituição Federal protege a mãe e o nascituro.

A garantia constitucional ultrapassa o interesse estrito da empregada gestante, uma vez que possui manifestos fins de saúde e de assistência social não somente em relação às mães trabalhadoras como também em face de sua gestação e da criança recém-nascida.6

Não bastasse isso, não se pode olvidar que o intérprete deve atribuir à norma constitucional o sentido que lhe dê maior eficácia, a mais ampla efetividade. Por outras palavras, em caso de dúvida, deve-se preferir a interpretação que maior efetividade confira à norma constitucional.

Desse modo, o artigo art. 10, inciso II, b, do ADCT, deve ser interpretado da forma que maior efetividade lhe seja concedida, o que, por consequência, resultará em uma proteção mais concreta à empregada gestante e ao nascituro, afastando-se condicionantes não previstas no Texto Constitucional.


3 - A estabilidade da gestante e os contratos a prazo determinado. A Súmula 244 do TST.

Por se tratar de um importante limitador do poder empregatício assegurado ao empregador e de um instrumento destinado à proteção dos direitos dos trabalhadores, as estabilidades provisórias, de um modo geral, sempre mereceram especial atenção dos juristas.

Especificamente quanto à estabilidade gestacional, o Tribunal Superior do Trabalho, por intermédio da Sumula 244, consolidou entendimento no sentido de que o termo final dos contratos de trabalho a prazo determinado não é protraído em virtude da aquisição da estabilidade ora discutida. O que a estabilidade provisória impediria é a dispensa imotivada e não o término natural do contrato de trabalho, o qual não traduziria a ideia de dispensa.

Súmula nº 244 do TST

GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 88 e 196 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT). (ex-OJ nº 88 da SBDI-1 - DJ 16.04.2004 e republicada DJ 04.05.04)

II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. (ex-Súmula nº 244 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)

III - Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa. (ex-OJ nº 196 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)

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Ao tratar da Súmula 244 do TST, acima reproduzida, Bruno Klippel7, leciona que:

“Apesar de o entendimento do TST versar apenas sobre o contrato de experiência, espécie de contrato a prazo determinado, descrito no artigo 443 da CLT, a ideia deve ser aplicada a qualquer espécie desses contratos, pois a predeterminação do prazo já torna a dispensa totalmente lícita, pois quando da contratação a empregada já sabia da data de seu término. Assim, sabia que, independentemente da superveniência de gravidez, o vínculo trabalhista terminaria em uma data certa”.

No mesmo sentido, Aldemiro Rezende Dantas Júnior8 ensina que “a ocorrência de uma das causas de garantia de emprego, no curso do contrato a termo, não assegura a continuidade do contrato, que se extinguirá normalmente no término previsto”. Segundo o mesmo autor, “em relação à gestante, esclarece a Súmula 244, do TST, que não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa”.

Em que pese o entendimento sumulado pelo TST, tem-se verificado, no âmbito do próprio TST, uma mudança de entendimento no sentido de assegurar à empregada gestante a completa estabilidade assegurada pelo Texto Maior, ainda que tenha sido contratada por intermédio de um contrato a prazo determinado.


4 – Tribunal Superior do Trabalho: a superação da Súmula 244

Com o intuito de conferir maior efetividade ao Texto Constitucional, bem como se adequar à consolidada jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, algumas Turmas do Tribunal Superior do Trabalho têm repensado o entendimento consolidado por intermédio da Súmula 244 do TST. Em recentes julgados, afastou-se a aplicação da Súmula para o fim de conceder a estabilidade gestacional às empregadas admitidas por intermédio de um contrato a prazo determinado.

A nova diretriz jurisprudencial pretende resguardar a subsistência da mãe e da criança que está por vir. Além disso, ostenta manifestos fins assistenciais e de saúde não somente em relação à mãe trabalhadora como também em face de sua gestação e da criança recém-nascida.

Maurício Godinho Delgado9, ao tratar da estabilidade da gestante nos contratos a termo, leciona que:

“Havendo, desse modo, evidente interesse público com vistas às proteções à mãe trabalhadora, sua gestação e o parto, além do período inicial da maternidade, interesse público que se pretende também à criança nascitura, ganha destaque a garantia constitucional, afastando o óbice criado pela Consolidação das Leis do Trabalho com respeito aos contratos a termo (art. 472, §2º, CLT).”

Nessa ordem de ideias, cumpre citar trecho do Voto proferido pelo Ministro Celso de Mello, no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 634.093/Distrito Federal:

“Em suma: as gestantes – quer se trate de servidoras públicas, quer se cuide de trabalhadoras, qualquer que seja o regime jurídico a elas aplicável, não importando se de caráter administrativo ou de natureza contratual (CLT), mesmo aquelas ocupantes de cargo em comissão ou exercentes de função de confiança ou, ainda, as contratadas por prazo determinado, inclusive na hipótese prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição, ou admitidas a título precário – têm direito público subjetivo à estabilidade provisória, desde a confirmação do estado fisiológico de gravidez até cinco (5) meses após o parto (ADCT, art. 10, II, “b”), e, também, à licença-maternidade de 120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o art. 39, § 3º), sendo-lhes preservada, em consequência, nesse período, a integridade do vínculo jurídico que as une à Administração Pública ou ao empregador, sem prejuízo da integral percepção do estipêndio funcional ou da remuneração laboral.

O Supremo Tribunal Federal possui consolidada jurisprudência no sentido de assegurar à gestante a estabilidade provisória prevista no artigo 10, inciso II, alínea b, do ADCT, conforme recentes arestos a seguir reproduzidos:

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Servidora gestante. Cargo em comissão. Exoneração. Licença-maternidade. Estabilidade provisória. Indenização. Possibilidade. 1. As servidoras públicas, em estado gestacional, ainda que detentoras apenas de cargo em comissão, têm direto à licença- maternidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, e art. 10, inciso II, alínea b, do ADCT. 2. Agravo regimental não provido. (RE 420839 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 20/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-081 DIVULG 25-04-2012 PUBLIC 26-04-2012)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE n. 600.057-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009 e RMS n. 24.263, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 9.5.03. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI 804574 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 30/08/2011, DJe-178 DIVULG 15-09-2011 PUBLIC 16-09-2011 EMENT VOL-02588-03 PP-00317 RT v. 100, n. 913, 2011, p. 491-494)

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDORAS PÚBLICAS E EMPREGADAS GESTANTES. LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, "B", do ADCT. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição do Brasil e do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 600057 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 29/09/2009, DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-10 PP-02124)

Consoante noticiado linhas acima, algumas Turmas do Tribunal Superior do Trabalho passaram a seguir o entendimento jurisprudencial consolidado na Corte Maior, o que pode ser apreendido a partir da leitura dos arestos abaixo reproduzidos:

RECURSO DE REVISTA - GESTANTE - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. Estabelece o art. 10, II, "b", do ADCT/88 que é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, não impondo nenhuma restrição quanto à modalidade de contrato de trabalho, mesmo porque a garantia visa, em última análise, à tutela do nascituro. O entendimento vertido na Súmula nº 244, III, do TST encontra-se superado pela atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que as empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime de trabalho, têm direito à licença maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Dessa orientação dissentiu o acórdão recorrido, em afronta ao art. 10, II, -b-, do ADCT/88. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 1520-32.2010.5.04.0511, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 27/06/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 03/08/2012)

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE DA GESTANTE. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. Demonstrado que a decisão regional viola, em princípio, o art. 10, II, b, do ADCT, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE DA GESTANTE. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. NORMATIZAÇÃO ESPECIAL E PRIVILEGIADA À MATERNIDADE CONTIDA NA CARTA DE 1988. ARTS. 10, II, B, DO ADCT, ARTS. 7º, XVIII E XXII, 194, 196, 197, 200, I, 227, CF/88. RESPEITO, FIXADO NA ORDEM CONSTITUCIONAL, À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, À PRÓPRIA VIDA AO NASCITURO E À CRIANÇA (ART. 1º, III, E 5º, CAPUT, DA CF). Em princípio, a lógica dos contratos a termo não permite qualquer possibilidade de maior integração do trabalhador na empresa, além de já preestabelecer o final do próprio vínculo empregatício. Em face disso, em regra, o instituto da garantia de emprego é inábil a produzir, no contexto dos contratos a termo, a mesma extensão de efeitos que seguramente propicia na seara dos contratos indeterminados. Por outro ângulo, contudo, é certo dizer que a lógica dos contratos a termo é perversa e contra ela se contrapõe todo o Direito do Trabalho, já que esse ramo jurídico especializado busca aperfeiçoar as condições de pactuação da força de trabalho no mercado. Por essas razões, a legislação busca restringir ao máximo suas hipóteses de pactuação e de reiteração no contexto da dinâmica justrabalhista. Note-se que a CLT não prevê a situação da gravidez como situação excepcional a impedir a ruptura contratual no contrato a termo. Contudo o art. 10, II, do ADCT da Constituição, em sua alínea b, prevê a estabilidade provisória à -empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto-. Estipula, assim, a vedação à dispensa arbitrária ou sem justa causa. Ressalte-se que a maternidade recebe normatização especial e privilegiada pela Constituição de 1988, autorizando condutas e vantagens superiores ao padrão deferido ao homem - e mesmo à mulher que não esteja vivenciando a situação de gestação e recente parto. É o que resulta da leitura combinada de diversos dispositivos, como o art. 7º, XVIII (licença à gestante de 120 dias, com possibilidade de extensão do prazo, a teor da Lei 11.770/2008, regulamentada pelo Decreto 7.052/2009) e das inúmeras normas que buscam assegurar um padrão moral e educacional minimamente razoável à criança e ao adolescente (contidos no art. 227, CF/88, por exemplo). De par com isso, qualquer situação que envolva efetivas considerações e medidas de saúde pública (e o período de gestação e recente parto assim se caracterizam) permite tratamento normativo diferenciado, à luz de critério jurídico valorizado pela própria Constituição da República. Note-se, ilustrativamente, a esse respeito, o art. 196 que firma ser a saúde -direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos...-; ou o art. 197, que qualifica como de -relevância pública as ações e serviços de saúde...-, além de outros dispositivos, como artigos 194, 200, I, e 7º, XXII, CF/88. A estabilidade provisória advinda da licença maternidade decorre da proteção constitucional às trabalhadoras em geral e, em particular, às gestantes e aos nascituros. A proteção à maternidade e à criança advém do respeito, fixado na ordem constitucional, à dignidade da pessoa humana e à própria vida (art. 1º, III, e 5º, caput, da CF). E, por se tratar de direito constitucional fundamental, deve ser interpretado de forma a conferir-se, na prática, sua efetividade. Nesse sentido, entendo que não pode prevalecer o posicionamento adotado pelo TRT, que conferiu preponderância aos efeitos dos contratos a termo - especificamente em relação à garantia de emprego - em detrimento da estabilidade assegurada às gestantes, na forma do art. 10, II, b, do ADCT. Nessa linha, está realmente superada a interpretação exposta no item III da Súmula 244 do TST. Inclusive o Supremo Tribunal Federal possui diversas decisões - que envolvem servidoras públicas admitidas por contrato temporário de trabalho -, em que expõe de forma clara o posicionamento de garantir à gestante o direito à licença-maternidade e à estabilidade, independentemente do regime jurídico de trabalho. Sob esse enfoque, o STF prioriza as normas constitucionais de proteção à maternidade, lançando uma diretriz para interpretação das situações congêneres. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 21700-25.2009.5.01.0079, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 08/02/2012, 6ª Turma, Data de Publicação: 13/04/2012).10

No entanto, algumas Turmas do Tribunal Superior do Trabalho, em recentes julgamentos, ainda têm dado plena aplicabilidade ao inciso III da Súmula 244, no sentido de negar o direito à estabilidade gestacional quando a contratação se der por intermédio de contrato de experiência11.

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Sobre o autor
Henrique França Ribeiro

Advogado atuante na área trabalhista, consultiva e contenciosa; Graduado em Direito pela Universidade Federal do Amazonas – UFAM; Pós-Graduado (lato sensu) em Direito Público: Constitucional e Administrativo pelo CIESA; Pós-Graduado (lato sensu) em Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Direito Previdenciário pelo CIESA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Henrique França. A estabilidade da gestante e a superação da Súmula 244 do TST. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3344, 27 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22487. Acesso em: 22 nov. 2024.

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