Artigo Destaque dos editores

O direito à visita íntima e a ressocialização do indivíduo submetido à pena privativa de liberdade

Exibindo página 4 de 5
23/04/2013 às 16:01
Leia nesta página:

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por mais avançada em termos de globalização econômica e mundializada culturalmente que a sociedade atual possa estar, muitos tabus e estigmas permanecem tendo acesso, muitas vezes, sem qualquer barreira, no senso comum e nos valores introjetados individualmente.

Se aos cidadãos livres ainda persiste a razão de ser desses tabus, nos locais de confinamento em que são submetidos os indivíduos que transgridem a ordem jurídico-legal, a imposição destas marcas sociais é ainda mais violenta.

Questões como a sexualidade ainda são envoltas por concepções discriminantes e eivadas de “pré-conceitos”, reproduzindo no cárcere práticas historicamente rechaçadas por seu caráter retrógrado nos demais espaços sociais, teoricamente livres.

Vê-se, que o microssistema prisional ainda representa a margem das margens sociais, tanto quanto à consolidação de direitos de garantia essenciais, tão comumente introduzidos nas relações consuetudinárias da sociedade além de seus muros, como quanto à representação das camadas sociais mais desprivilegiadas.

E é nesse momento, que retratar a problemática da aplicação dos direitos do preso nos leva corriqueiramente a princípios básicos combalidos, trazendo luz aos olhos dos que começam agora a caminhada do direito.

Retirar seus estigmas e marcas dos crimes, posto que muitas vezes cometem-no por um crime anterior de omissão estatal e social, continuado durante a execução da sanção, e após seu cumprimento, pelo simples fato de terem sido habitantes da ilha dos excluídos.

Em nenhum momento pretendemos dar a esse trabalho um enfoque às avessas, exaustivamente humanista, “vitimizando” ofensores da ordem, e limpando-lhes o passado de culpa.

Mas não pudemos, durante sua realização, fechar os olhos para a condição do sistema prisional no Brasil, cuja precariedade e violência contra a dignidade física, psíquica e moral daqueles que ali coabitam é o verdadeiro mal pagando o mal anterior.

Contudo, não se pode negar que a tão atacada prisão, centro criminógeno, por fabricar novos “produtos sociais” com os valores que lhes são próprios e por sê-lo receptáculo de muitos atos de omissão, esquecimento e ação abusiva do poder soberano estatal e da própria sociedade, por mais falha e degradante que seja, ainda não pode ser abolida no atual sistema político-criminal, posto que ainda não existem alternativas para a reinserção dos delinqüentes de alta periculosidade, nem estrutura social e cultural para  receber de braço e cabeça abertos, os mais de 400 mil condenados submetidos à pena privativa de prisão no Brasil.

Alertar para a falência da pena de prisão e o sistema que a envolve é um dever científico e social daqueles que entendem a magnitude e os efeitos colaterais desse inchaço penitenciário.

Mas a luta apenas começa com a visualização da problemática, para que não se caia no mesmo erro de teorias ideológicas que retiram do indivíduo sua força e a transportam para o Estado, que encaram o problema de frente, e com muita razão, o destroem para depois reconstruir, mas, às vezes, se esquecem dessa última etapa, e também de propiciar sua aplicação prática com vistas à qualidade de vida aos reeducandos.

Da sustentação de que o problema da prisão é a própria prisão, infere-se que o problema da visita íntima pode ser a própria visita íntima, quando obstaculizada por meio de argumentos que ressaltam o seu incentivo à prostituição nos presídios e o tráfico de drogas. Não se pode deixar de aplicar um direito inerente ao ser humano, como é o exercício livre de sua sexualidade, pela precariedade das condições em que ocorre um direito anterior a ele, como o é o tratamento digno e a assistência durante a execução da pena, condições essas inerentes aos estabelecimentos prisionais, ou derivadas de uma problemática social e econômica muito mais abrangente que levam à prostituição e ao tráfico, em muitos casos, as únicas fontes de renda de famílias à beira da miséria.

Quanto à administração penitenciária, a melhor saída parece ser a intervenção e o tratamento por todos os lados possíveis; assistencial, normativo, terapêutico, laboral, etc, que levem a uma convivência pacífica no interior das prisões, engrandecendo seu papel ressocializador. Seguir o exemplo otimista da legislação espanhola, interligando tratamento e regulamento, de forma que se entrelacem num emaranhado de possibilidades, peculiar ao próprio conceito ressocializador.

Para o instituto da visita íntima, que o desenvolvido nesse trabalho possa servir como base para se pensar no enfrentamento direto ao tabu sexual, consolidando-a como direito expresso em lei, reduzindo drasticamente polêmicas e mais polêmicas em torno da questão, como o terreno em que se lança o permissivo da visita íntima durante aplicação de medida socioeducativa. Sendo considerado um direito do preso, a visita íntima obrigatoriamente poderá ser oportunizada aos jovens emancipados ou que comprovem a manutenção de relação afetiva continuada.

Enfim, que a sociedade livre adentre ao espaço do encarceramento por meio da ciência e das lutas comunitárias, dando voz e vez a quem errou, e que mesmo podendo errar novamente, posto que humano, tenha assegurado o direito de se comunicar com o outro e se comunicar com o mundo.


REFERÊNCIAS

AGÊNCIA ESTADO. Prisão feminina libera visita íntima para homossexuais. 27 abr. 2006. Disponível em: <http://www.athosgls.com.br/noticias_visualiza.php?contcod=16946>. Acesso em: 5 fev. 2009.

ASSIS, Jorge César. Direito Militar: Aspectos Penais, Processuais Penais e Administrativo. 2. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2007. 272 p.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1993. 396 p.

BAPTISTA, Renata. Justiça de Alagoas libera visita íntima para homossexuais. Agência Folha. Out. 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u333057.shtml >. Acesso em: 5 fev. 2009.

BETTIOL, Giuseppe. Direito penal. São Paulo: Red Livros, 2000. 789 p.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. 352 p.

______. Juizados especiais criminais e alternativos à pena de prisão. 3. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. 321 p.

BOSCHI, José Antônio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. 440 p.

BRASIL. Governo (2006 – ANTICO, Carlos Martins; LEAL, César Oliveira de Barros; VIEIRA, Carla Polaine L. Fabrício). Relatório de Inspeção: Estabelecimentos Penais do Estado de Tocantins. Brasil: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, MJ, 2006.

BRAZ, Mirele Alves. Os princípios orientadores da medida sócio-educativa e sua aplicação na execução. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/2282>. Acesso em: 17 jun. 2009.

BUGLIONE, Samantha. A mulher enquanto metáfora do Direito Penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 38, jan. 2000. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/946>. Acesso em: 13 mar. 2009.

CATÃO, Érika Soares. A pena privativa de liberdade sob o enfoque de suas finalidades e a visão do sistema punitivo pela comunidade discente da UEPB. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1026, 23 abr. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8284>. Acesso em: 10 abril 2009.

CIPRIANI, Mário Luís Lírio. Das penas: suas teorias e funções no Direito Penal. 1. ed. Canoas: Editora da Ulbra, 2005. vol. 1. 136 p.

CREMONEZE, Paulo Henrique. A aplicação da teoria da guerra justa nas políticas de segurança pública no combate da criminalidade no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1948, 31 out. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/11912>. Acesso em: 31 mar. 2009.

DIÓGENES, Josiê Jalles. Tráfico ilícito de drogas praticado por mulheres no momento do ingresso em estabelecimentos prisionais: uma análise das reclusas do Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa - IPFDAMC. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/main.asp?Team={F8BD53AD-14D1-4B0E-BA06-547DF317C888}>. Acesso em: 5 mar. 2009.

EGYDIO DE CARVALHO, Pedro Armando. Visita íntima: direito ou regalia? Boletim IBCCrim, São Paulo,  nº. 43, jul. / 96. p. 3.

FERNANDES, Stanley Botti. Da fundamentação racional do jus puniendi. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 976, 4 mar. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8070>. Acesso em: 2 abr. 2009.

FERREIRA, Gilberto. Aplicação da pena. Rio de Janeiro: Forense, 1997. 290 p.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 1994. 280 p.

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986. 618 p.

GARCIA, Antônio Carlos. Casal gay recebe direito a visita íntima na prisão. Estado de São Paulo. 12 dez. 2004. Disponível em: <http://www.sistemas.aids.gov.br/imprensa/Noticias.asp?NOTCod=61713>. Acesso em: 5 fev. 2009.

GARCÍA-PABLO DE MOLINA, Antônio; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: introdução a seus fundamentos teóricos. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. 517 p.

GUIMARÃES, Claudio A. G. A função neutralizadora como fonte de legitimação da pena privativa de liberdade. Revista Jurídica (Porto Alegre), PORTO ALEGRE - RS, v. 292, p. 75-84, 2002.

HERKENHOFF, João Baptista. Crime: tratamento sem prisão. 3. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. 187 p.

______. Mulheres que julguei. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1411, 13 maio 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/9881>. Acesso em: 3 abr. 2009.

HUMAN HIGHTS WATCH. Relatório. O Brasil atrás das grades: uma análise do sistema penitenciário (online), [ca. 1998]. Disponível em: < http://199.173.149.120/portuguese/reports/presos/sistema.htm>. Acesso em: 3 abr. 2009.

LEAL, César Barros. Um direito do preso: visita íntima. Revista Consulex, a. IV, nº. 41, mai. 2000.

LIMA, Márcia de. Da visita íntima à intimidade da visita: a mulher no sistema prisional. 2006. 106 f. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) – Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo.

MADEIRO, Lenise Alves. Autópsia da política prisional brasileira. Revista Consulex: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítica judiciária. Ano 49, nº. 290, dezembro de 2001, p. 76-81.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei nº. 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. rev. atual. São Paulo: Atlas, 2004. 874 p.

MISCIASCI, ELIZABETH. A perspectiva da mulher na prisão e voluntariado. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/main.asp?Team={F8BD53AD-14D1-4B0E-BA06-547DF317C888}>. Acesso em: 06 de abr. 2009.

NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal: Lei nº. 7.210, de 11.7.1984. 3 ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1996. 409 p.

NOLETO, Gilvan. Tocantins inaugura o primeiro Presídio de Segurança Máxima da região Norte. Jan. 2005. Disponível em: <http://secom.to.gov.br/noticia.php?id=4986>. Acesso em: 12 mar. 2009.

OLIVEIRA, Edmundo. Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro: Forense, 1997. 330 p.

PAIXÃO, Antônio Luiz. Recuperar ou punir? Como o Estado trata o criminoso. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1991 (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, v. 21)

ROMA, Keity. Projeto é causa de polêmica nacional. Diário de Cuiabá. 15 mar. 2009. nº. 12.366. Disponível em: < http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=341664&edicao=12366&anterior=1>. Acesso em: 24 mar. 2009

Shecaira, Sergio Salomão; Corrêa Junior, Alceu. Teoria da pena. São Paulo, RT, 2002, p.132.

SILVA, JORGE VICENTE. Manual da Sentença Penal Condenatória: requisitos e nulidades. Curitiba: Juruá, 2003. 476 p.

SPRICIGO, Dunya Wieczorek. O sexo nas prisões. 2000. 37 f. Monografia – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas – Fundação Universidade de Gurupi, Gurupi. 2000.

VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 368 p.


ANEXO A – FORMULÁRIO DE VISITA AO REEDUCANDO DAS PENITENCIÁRIAS FEDERAIS

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL

Solicitação para Cadastro - Visitante

Penitenciária Federal: ____________________

Nome do Reeducando:     

Solicito inscrição no rol de visitantes na Penitenciária Federal para contato com o reeducando acima identificado.

Dados Básicos

Nome:

     

 

RG

     

Órgão Emissor:

     

 

Data de Emissão:

     

UF:

     

 

CPF:

     

 

Categoria Visita Íntima

 Cônjuge

 Companheiro (a)

 

Categoria Visita Familiar

Parentesco

     

 Amigo

 

E-mail:

     

 

Endereço Residencial:

     

 

Cidade:

     

UF:      

CEP:

     

 

Tempo de Residência:

     

anos e

     

meses

Telefones:

       -

     

residência

   
 

       -

     

celular

   
 

       -

     

outro

     

 
                               

Profissão:

     

Empresa:

     

Endereço Comercial:

     

Cidade:

     

UF:      

CEP:

     

Tempo de Empresa:

     

anos e

     

meses

Telefone:

       -

     

   
         
         
                         

Documentação Comprobatória Original para Apresentar na Penitenciária:

§Cédula de Identidade ou Carteira Nacional de Habilitação;

§2 fotos 3x4 iguais e recentes;

§CPF;

§Certidão de antecedentes criminais da comarca onde residiu nos últimos 5 anos;

§Comprovante de residência (conta de água, luz ou telefone);

§Carteira de Trabalho ou  Declaração da Empresa que trabalha (se for o caso);

§Certidão de Casamento (cônjuge);

§Certidão de Nascimento (filho (a));

§Declaração de Coabitação ou União Estável com assinatura de duas testemunhas (Formulário DEPEN);

§Autorização Judicial para visita íntima (menor de 18 anos);

§Atestado médico para visita íntima.

Observações

1.                  Envie o Formulário para o e-mail: [email protected];

2.                  Envie Fax pelo número: (61) 3429-9340;

3.                  Entregue o Formulário no DEPEN/MJ em Brasília ou na Penitenciária Federal e

Aguarde contato oficial para prosseguir ao processo de aceitação de visitante.

ANEXO B – TERMO DE RESPONSABILIDADE PARA VISITA ÍNTIMA AO REEDUCANDO DAS PENITENCIÁRIAS FEDERAIS

(Minuta)

Termo de Responsabilidade para Visita Íntima

Eu, (identificação do(a) interno(a): nome e RG)  e (qualificação da (o) companheira (o), a fim de manter relações íntimas no interior desta Penitenciária Federal, assumimos a responsabilidade por  quaisquer riscos à saúde que a prática do ato sexual possa acarretar, seja em virtude de doenças pré-existentes ou que venham a ser contraídas pela inobservância das medidas preventivas necessárias.

Declaramos ainda que nos submeteremos às regras de segurança, exigidas para efetivação do encontro íntimo.

______________ ______de_________ de ______

_______________________­­­­­­­______                       ______________________________

               (interno) (a)                                (companheira)(o)

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Priscila Wieczorek Spricigo

Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Federal do Tocantins - UFT, Especializanda em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral pela Universidade Federal do Tocantins - UFT, Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Tocantins - UFT, Bacharel em Comunicação Social - Habilitação em Publicidade e Propaganda pelo Centro Universitário Luterano de Palmas (CEULP/ULBRA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SPRICIGO, Priscila Wieczorek. O direito à visita íntima e a ressocialização do indivíduo submetido à pena privativa de liberdade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3583, 23 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24246. Acesso em: 10 mai. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos