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Guarda unilateral e síndrome da alienação parental

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23/04/2013 às 14:52
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2 A guarda após o fim da união estável ou do casamento

Por disposição expressa do Código Civil atual “[...] o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos.” O artigo 1.632 reforça a manutenção do poder familiar nas mãos de ambos os genitores, mas o que se modifica é a maneira de se exercitá-lo no tocante à guarda.

Neste diapasão o próprio CC/02 vem estabelecer duas modalidades de exercício da guarda, pelo artigo 1583: unilateral ou compartilhada. A doutrina, a despeito da omissão legislativa, ainda elenca a modalidade de guarda alternada. Cada uma possui características que revelam diferenças quanto à distribuição de deveres e direitos parentais, à atribuição da guarda material e à qualidade de convivência entre os filhos e seus genitores.

2.1 A guarda unilateral

É o tipo de exercício da guarda que possui raízes profundas em nosso ordenamento jurídico, posto que, durante décadas chegou a ser o único admitido pelo direito (PERES, 2002). Segundo dados do IBGE, a guarda unilateral ainda é predominante, correspondendo ao tipo de guarda escolhido em 87,6% dos divórcios e separações judiciais que tramitavam no Judiciário em 2009 conforme a última pesquisa do órgão (JORDÃO; RUBIN, 2011).

Um dos genitores estará incumbido de ser o “guardião”, exercendo tanto a guarda jurídica como a física, pois permanecerá no mesmo residindo com a prole. O outro genitor é denominado pela doutrina como “visitante” ou “não guardião” justamente por gozar de forma menos frequente do contato com os filhos, deixando de ter efetivamente a guarda física. Assim define o Código Civil em seu artigo 1.583, § 1º: “Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) [...]”.

 A escolha referente a tal espécie de guarda cabe, primordialmente, ao ex-casal, por força do artigo 1.584, inciso I do CC/02, ou, não havendo consenso, será determinado pelo juiz (inciso II do mencionado dispositivo). Os critérios para a escolha do genitor guardião, à época do Código Civil de 1916 diziam respeito à “inocência” do cônjuge que não deu causa à separação. Somente a este caberia deter a guarda material dos filhos, o que foi, ao longo das décadas, abrandado até chegar à atual disposição do § 2º do artigo 1.584 do CC/02:

“§ 2º  A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: 

 I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; 

 II – saúde e segurança; 

 III – educação.”

O atual Código, ao contrário do anterior, consagra a relevância do interesse do menor na determinação de qual genitor deterá a sua guarda, pois os incisos referem-se a necessidades infanto-juvenis que devem ser supridas. Para Silvio Neves Baptista o guardião será aquele “[...] em cuja companhia o menor se sinta mais feliz e seguro [...]” (2000, p. 43), sendo recomendável, pois, que a guarda seja do genitor que dispuser de maior tempo para estar em companhia do filho. O autor acrescenta outros requisitos: o menor deve ficar com o genitor que continuar residindo no antigo lar do casal, para que não haja perda de relacionamentos com vizinhos, parentes e amigos de escola, e além disso, esteja desprovido do intuito de obstaculizar o convívio dos filhos com o genitor visitante (2000).

O guardião ainda deve ser aquele capaz de dar

“[...] à criança o cuidado no dia-a-dia, tais como higiene, preparação e planejamento das refeições, cuidados médicos, incluindo enfermagem e transporte para o médico, planos para interação social com amigos depois da escola, deitar a criança na cama, disciplina e educação (religiosa, moral, social e cultural), etc (SILVA, D. M. P. da, 2009, p.104).”

Resta notória a concentração de encargos na pessoa do genitor guardião, situação que, à época do casamento, não seria permitida, pois a legislação preceitua que os cônjuges exercerão deveres e direitos de forma igualitária. Para Denise Comel “É possível concluir que, o que se se atribui é o exercício deste poder, ainda que de forma não exclusiva, mas com relativa autonomia e independência diante do outro pai (2003, p. 249).

Ainda no tocante à escolha do genitor que exercerá de fato a guarda prevalece o entendimento de que a mãe é a melhor capacitada para tal responsabilidade. Em que pese a isonomia constitucional, está arraigada na cultura brasileira o pensamento de que à mulher é dada naturalmente a habilidade para cuidar, o que, por sua vez, é fruto da histórica divisão  tradicional de papéis dentro da família (PERES, 2000).

O papel destinado ao genitor visitante é resumido no § 3º do artigo 1.583 do CC/02: “A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos.” Enquanto um dos genitores efetivamente cria, educa e cuida da prole, ao outro resta o dever de fiscalizar em que sentido é dirigida esta criação, e caso discorde da maneira como age o guardião, deve socorrer-se do Poder Judiciário. Na prática o não guardião também fica obrigado a prestar alimentos aos filhos que com ele não residem (DIAS, 2000).

A convivência entre o genitor visitante e seus filhos é mantida através do sistema de visitas, consistindo este em prévia estipulação (pelo próprio ex-casal ou pelo juiz) de quantos e quais dias na semana, no mês e no ano, inclusive dentro de quais horários se darão encontros de crianças e adolescentes com os não guardiões.

A doutrina, ao longo de muitos anos, tem utilizado as expressões “direito de guarda” e “direito de visitas” como se fossem duas prerrogativas contrapostas: a primeira pertencente ao guardião e a segunda ao visitante. Alguns autores, analisando modificações legislativas em torno do direito de família, apresentam posicionamento diferenciado.

“A nosso ver esta é uma visão equivocada do fenômeno, pois enquanto a guarda é um poder-dever do pai, cujo beneficiário da norma é o filho, a visita é um direito de personalidade do filho de ser visitado não só pelos pais, como por qualquer pessoa que lhe tenha afeto (BAPTISTA, 2000, p. 44).”

Atualmente mesmo os juristas que ainda utilizam a expressão “direito de visitas” como sendo prerrogativa dos genitores reconhecem que o objetivo maior do seu exercício é a concretização do direito infanto-juvenil à convivência familiar:

“O novo paradigma legal, privilegiando o interesse dos filhos, hierarquizado superlativamente na ordem constitucional como prioridade absoluta, deverá nortear todas as questões de direito de família envolvendo os filhos, inclusive quanto ao direito de visitas (COSTA, 2001, p. 85, grifo do autor).”

Desta forma, atualmente pode-se falar em “direito à visitação” do filho menor tendo em vista e efetivação do direito fundamental à convivência familiar. Como antes explicado, esta convivência não se restringe ao círculo formado pelos genitores e pelo filho, e por isso o parágrafo único do artigo 1.589 permite que a visitação também seja estabelecida entre netos e avós, observados, em qualquer caso, o interesse infanto-juvenil.

2.2 A guarda compartilhada ou conjunta

A segunda modalidade de guarda foi inicialmente prevista em 1960 pelo direito inglês, tendo se expandido para países europeus, pelo Canadá e alcançado popularidade nos Estados Unidos, vindo a tornar-se a regra neste último país (PERES, 2000). No Brasil, contudo, este tipo de guarda só foi introduzido na legislação a partir de 2008, sendo definido no § 1º do artigo 1.583 como “[...] a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.”

A principal característica da guarda compartilhada é justamente a quebra do padrão tradicional de repartição das responsabilidades parentais. Até a previsão deste novo tipo de guarda compreendia-se que as funções do pai e da mãe, após o fim de sua união, deveriam ser assim divididas: a um deles, geralmente à mulher, caberia a obrigação de fazer (educar, criar e assistir) e ao outro a obrigação de dar (pagamento de pensão alimentícia por ser o genitor visitante) (PERES, 2000). Como resume Denise Perissini da Silva:

“A guarda compartilhada consiste em uma modalidade de guarda [...] que estabelece uma co-responsabilização igualitária e conjunta de ambos os pais nas decisões importantes acerca dos filhos comuns. Nela, não há a figura de um guardião único e o não guardião secundário e periférico; não há divisões rígidas de papéis [...] mas sim o compartilhamento de tarefas referentes à manutenção e cuidado com os filhos menores; nenhuma atitude poderá ser tomada sem o conhecimento e o consentimento do outro pai/mãe; ambos se tornam cientes dos acontecimentos escolares, médicos e sociais dos filhos comuns [...] (2009, p. 111).”

Ao compartilharem a guarda os pais irão permanecer exercendo o poder familiar em moldes muito semelhantes àqueles que vigoravam na constância da sua união. Nessa esteira o contato com a prole se verificará bem mais intenso, mesmo com a ruptura conjugal, pois não se tolhe a autoridade de nenhum dos pais em detrimento do outro. Aqui os genitores “[...] têm períodos de convivência igualitários e não mais restritos a meras ‘visitas’ quinzenais, em horários rigidamente estipulados por sentença judicial [...]” (SILVA, D.M.P. da, 2009, p. 111).

 Com o fito de atender à manutenção desta convivência peculiar às separações e divórcios onde se adota a guarda conjunta, existem pelo menos três espécies de ajustes no tocante à residência dos filhos: podem continuar no mesmo domicílio em que já moravam; deverão alternar períodos entre os domicílios do pai e da mãe ou ainda poderão morar conforme o sistema de aninhamento.

A primeira forma de arranjo da guarda compartilhada consiste em fixar um domicílio para a prole, inicialmente a exemplo do que ocorre na guarda unilateral, com a diferença de que o outro genitor que não reside mais no mesmo endereço manteria diariamente contato com os menores, sem a necessidade de obedecer a ordem judicial alguma (DINIZ, 2007, v. 5). Existe uma flexibilidade, na qual os pais poderão acordar como as crianças e adolescentes irão conviver em seu cotidiano com ambos.

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É possível que os filhos tenham dois domicílios, alternando os dias em que passarão na casa do pai ou da mãe, conforme o relato abaixo publicado na Revista Isto é:

“Há cinco anos o cotidiano dos irmãos Gabriela, 14 anos, Carolina, 12, e Gustavo, 10, é dividido em duas casas. Eles mantêm quartos, computadores, roupas e objetos pessoais num apartamento na Vila Mariana, bairro paulistano onde moram com a mãe, a juíza Fernanda Pernambuco, e no Morumbi, onde está o pai, o empresário Roberto Moron. Dormem cada dia na residência de um e alternam os fins de semana entre eles. Um motorista particular, contratado pelos pais, é responsável pelo transporte da prole. À primeira vista inusitada e confusa, a rotina – muito bem organizada, por sinal, - desse trio tem se tornado cada vez mais comum entre filhos de pais separados que optaram por acabar com o casamento, mas não com a família. Para isso, adotaram a guarda compartilhada ou conjunta [...] (JORDÃO; RUBIN, 2011, p. 68).”

Ainda é possível encontrar na doutrina a definição da guarda compartilhada desta vez por aninhamento: “O filho permanece na residência e são os genitores que se revezam, mudando-se periodicamente cada um deles para a casa em que o filho permanece.” (DIAS, 2010, p. 437). Neste caso, contudo, existe a necessidade de manutenção de três residências, o que demanda situação econômica favorável de ambos os pais.

A escolha por este tipo de guarda obedece à regra do consenso do casal, a mesma que vale para a opção pela guarda unilateral (art. 1.584, inciso I do CC/02). Mas percebe-se que o legislador dá prioridade à guarda conjunta, vide a redação do § 1º do art. 1584: “Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.”

Ainda deve-se ressaltar um fenômeno chamado “guarda compartilhada de fato”, que não consta nos números oficiais, mas pode se verificar em casos de guarda unilateral: os pais acordam sozinhos, a despeito da estipulação do sistema de visitas, que a repartição de responsabilidades e a convivência entre eles e a prole será semelhante ao sistema de guarda conjunta (QUINTAS, 2010).

2.3 A guarda alternada

A legislação não a prevê expressamente mas a doutrina a elenca como um dos possíveis tipos de guarda por estar presente em legislações estrangeiras. Neste caso o menor passará um período preestabelecido de tempo, geralmente longo (um mês, um semestre ou um ano) residindo com a mãe, e outro período equivalente residindo com o pai. Quem detiver a guarda física da criança e do adolescente também deverá incumbir-se dos deveres de educa-lo, vigiá-lo, enfim, suprir todas as suas necessidades, enquanto que o outro genitor poderá, até ser a sua vez que ter a guarda física, contribuir financeiramente.

O exercício efetivo do poder familiar alterna-se, encontrando-se ora nas mãos maternas, ora concentrado na figura paterna. Quando a mãe, por exemplo, detiver a guarda, ao pai caberá visitar o filho, e a situação inverte-se, quando ao pai couber deter a guarda. É um sistema de revezamento, portanto, da autoridade parental.

A guarda alternada assemelha-se ao tipo unilateral, “[...] com a diferença de que neste, a guarda é exercida por um único genitor indefinidamente, enquanto naquele ocorre alternância de guarda entre os pais por períodos equitativos.” (SILVA, D. M. P. da, 2009, p. 115). Também não se deve confundir a alternada com a guarda conjunta:

“A ideia principal de compartilhar a guarda é tomar decisões e assumir responsabilidades em conjunto, o que não ocorre se a guarda for alternada, em que cada um dos pais assume os deveres para com seu filho sozinho, enquanto estiverem em sua companhia [...] (QUINTAS, 2010, p.30).”

Na jurisprudência não se costuma verificar julgados favoráveis à adoção deste tipo de guarda, como no exemplo abaixo:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – FILHO MENOR (5 ANOS DE IDADE) – REGULAMENTAÇÃO DE VISITA – GUARDA ALTERNADA INDEFERIDA – INTERESSE DO MENOR DEVE SOBRESSAIR AO DOS PAIS – AGRAVO DESPROVIDO. Nos casos que envolvem guarda de filho e direito de visita, é imperioso ater-se sempre ao interesse do menor. A guarda alternada, permanecendo o filho uma semana com cada um dos pais, não é aconselhável pois as repetidas quebras na continuidade das relações e ambivalência afetiva, o elevado número de separações e reaproximações provocam no menor instabilidade emocional e psíquica, prejudicando seu normal desenvolvimento, por vezes retrocessos irrecuperáveis, a não recomendar o modelo alternado, uma caricata divisão pela metade em que os pais são obrigados por lei a dividir pela metade o tempo passado com os filhos (Agravo de Instrumento nº 00.000236-4, Tribunal de Justiça de SC,   Relator: Alcides Aguiar, Julgado em 26.06.2000).”

A doutrina majoritária percebe que este tipo de guarda apresenta mais problemas do que vantagens. Primeiro, a criança como ser em fase de formação da personalidade necessitaria criar vínculos mais firmes e constantes com os pais, a comunidade, os amigos de escola, e as constantes mudanças por tempo prolongamento acarretariam a perda de um referencial de comportamento (DIAS, 2010). Também haveria um terreno fértil para contendas entre os pais, pois cada um educaria o filho à sua maneira quando detivesse a guarda, e o outro ver-se-ia obrigado a modificar todo o sistema implantado na residência do genitor que antes deteve a guarda (PERES, 2000).

2.4 Comparações entre a guarda unilateral e a guarda compartilhada

Com a previsão de dois tipos de guarda em nossa lei civil iniciou-se um debate em várias áreas do conhecimento ligadas à questão da guarda (psiquiatria, psicologia, serviço social, etc.). Tanto juristas como outros profissionais que lidavam com o direito de família começaram a traçar paralelos entre a guarda unilateral e a compartilhada, percebendo as vantagens e prejuízos de cada uma.

A guarda compartilhada seria aquela que mais atenderia ao melhor interesse infanto-juvenil, segundo significativa parcela da doutrina. Embora dificilmente algum autor defina em que consiste tal interesse, a explicação de Maria Helena Diniz esclarece em que sentido uma decisão tomada pelos genitores pode atender a este interesse:

“Atenderá ao superior interesse do menor se levar em conta todos os elementos conducentes ao seu bom desenvolvimento educacional, à sua saúde física e psíquica, à sua realização pessoal, ao respeito à sua dignidade como ser humano, etc (2007, p. 303, v. 5).”

Inegavelmente a manutenção da convivência familiar é imprescindível ao atendimento deste interesse, tendo em vista que a necessidade que o menor possui de estar em companhia de ambos os pais:

“A estrutura emocional de uma criança deve ser bem cuidada e ao mesmo tempo, esta deve ter o direito de tecer suas próprias impressões sobre o par parental que deve neste lugar. O que finda é a relação conjugal do casal. A relação enquanto ‘pais’, essa é para sempre (SILVA, D. M. P. da, 2009, p. 128).”

Nesse diapasão percebe-se que a guarda compartilhada, por conferir aos pais um período de tempo mais igualitário de contato com a prole, é a mais indicada para a efetivação do direito fundamental à convivência familiar insculpido no artigo 227 da Constituição Federal.

Outro ponto em que a guarda unilateral se revela menos benéfica relaciona-se com a distribuição de responsabilidades entre o pai e a mãe. Antes da atual Constituição os papéis desempenhados pelos genitores eram nitidamente distintos, pois a cultura brasileira tradicionalmente confere à mulher o papel de cuidadora, e ao homem o de provedor (VALENTE, In: PAULINO, 2008, p. 82). Tais funções engessadas encontram-se em desacordo com a isonomia entre os sexos consagrada na Carta Magna de 1988:

“A igualdade entre homem e mulher e sua consequente atribuição de direitos e responsabilidades encontra na expressão compartilhar uma solução quando se trata de guarda de filhos. [...] a guarda compartilhada é a que melhor se adequará à realidade atual, na maioria dos casos. Afinal, se distribui de forma mais justa aos pais os poderes e deveres em relação aos filhos, não permitindo a criação de estereótipos rígidos entre os sexos, proporcionando à criança a visão real do mundo de hoje (QUINTAS, 2010, p.55).”

Ao se compartilhar a guarda este tratamento isonômico restará efetivado pois a escolha pelo tipo unilateral invariavelmente leva a uma sobrecarga de obrigações nas mãos do genitor guardião, enquanto que confere ao outro genitor o papel de mero expectador da criação de seus filhos (PERES, 2000).

Apesar dos inconvenientes apontados quando da opção pela guarda unilateral alguns autores defendem que este tipo será o único passível de verificar, na prática, em função do grau de animosidade que por ventura exista na relação que se estabeleceu entre o casal: “[...] para que os pais possam compartilhar a guarda dos filhos é importante que tenham maturidade emocional, que possam separar suas questões conjugais de suas questões parentais [...]” (FÉRES-CARNEIRO, In: Paulino, 2008, p.67). Em sede de jurisprudência existem aqueles que adotam tal pensamento:

“EMENTA:  GUARDA COMPARTILHADA. LITÍGIO ENTRE OS PAIS. DESCABIMENTO. [...] 3. Para que a guarda compartilhada seja possível e proveitosa para o filho, é imprescindível que exista entre os pais uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, onde não existam disputas nem conflitos. 4. Quando o litígio é uma constante, a guarda compartilhada é descabida. Recurso desprovido (Apelação Cível Nº 70031179252, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 28/04/2010).”

Contrapondo-se a tal posição existem os que defendem que o imperativo a ser obedecido é o melhor interesse da criança, que, por sua vez, é atendido na medida em que a separação dos pais não prejudicar o seu direito de conviver com ambos. A simples existência de desacordos entre os pais não ensejaria a opção pela guarda unilateral, tendo em vista que o cenário no qual se desenrola a ruptura conjugal quase sempre é desfavorável ao diálogo entre os genitores (DIAS, 2010). Decisão da ministra Nancy Andrighi do Superior Tribunal de Justiça é nesse sentido:

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE. [...] 3. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial. 4. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso. 5. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole [...] (REsp 1251000/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/08/2011, DJe 31/08/2011).”

Outro aspecto que desperta opiniões contrárias diz respeito à necessidade de, após a ruptura conjugal, os genitores morarem na mesma cidade para possibilitar a adoção da guarda compartilhada, já que é característica deste modelo o contato intenso com ambos os pais (PERES, 2000; QUINTAS, 2010). Para Rodrigo da Cunha Pereira a distância por si só não é impedimento para que a guarda conjunta seja efetivada pois acima de qualquer obstáculo deve estar o respeito ao direito infanto-juvenil à convivência familiar (JORDÃO; RUBIN, 2011). Dependendo dos casos concretos verifica-se que a disponibilidade de horários, a condição financeira dos ex-cônjuges e a disponibilidade de meios de transporte suplanta este eventual empecilho (DIAS, 2010).

Apesar de tais aspectos polêmicos e da tradição pela escolha da guarda unilateral, nota-se um crescimento, em termos estatísticos, da adoção da modalidade conjunta em separações e divórcios ocorridos no país, segundo o IBGE. Do ano de 2004 ao ano de 2009 a opção por este tipo de guarda subiu de 2,4% para 4,7%. (JORDÃO; RUBIN, 2011).

2.5 Principais disposições do código civil de 2002 sobre a guarda

Consoante já mencionado, pela regra do inciso I do art. 1.584 do CC/02 o consenso entre os pais deve ser respeitado, no tocante à escolha da modalidade de guarda. Em caso de divergência cabe ao magistrado determinar o tipo de guarda “[...] em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.” (inciso II do art. 1.584). Aqui alguns juristas, conforme também já visto, afirmam que, mesmo diante da discórdia entre os pais deve o magistrado impor que a guarda seja conjunta, posição esta que não é expressamente acolhida pela lei.

Mesmo diante de consenso entre os genitores, o que for acordado deverá passar pelo crivo do juiz. Considerando que a avença não respeita os interesses dos menores (parágrafo único do art. 1.574), a dissolução da sociedade conjugal não poderá ser homologada.

A doutrina elenca alguns critérios cuja observação pelo magistrado se faz imperiosa na determinação ou aceitação do que os cônjuges resolverem acerca da guarda: a idade do filho menor, a existência de irmãos, a oitiva do menor e a conduta dos pais (SILVA, D. M. P. da, 2009). Enquanto a criança contar com até 24 meses é recomendável que a mãe detenha a guarda, conforme entendimento pacífico da jurisprudência. Também é solidamente firmada pelos tribunais a opinião de que irmãos não devem ser separados, ou seja, devem todos estar sob o mesmo modelo de guarda (se for unilateral, todos devem estar sob a guarda da mesma pessoa) (DIAS, 2010). Quanto à oitiva do menor, a legislação silencia a respeito de qual a faixa etária em que tal prática deve ser permitida. Se for constatado que o menor possui uma certa maturidade, o juiz certamente levará em conta a sua vontade ao prolatar a sentença. (FÉRES-CARNEIRO, In: Paulino, 2008).

Verificado algum comportamento que implique em desconsideração aos deveres inerentes ao poder familiar, o exercício deste último poderá ser limitado ou mesmo suprimido pelo Estado, através do Poder Judiciário. O CC/02 e o ECA apresentam dispositivos referentes à suspensão e à perda do poder familiar, que são espécies de sanções aplicadas àqueles que descumprirem as obrigações parentais.

A suspensão pode ser resumida em medida de limitação de todas ou somente algumas das prerrogativas da autoridade parental, alcançando todos ou somente alguns dos filhos. Suas causas estão elencadas no art. 1.637 do Código Civil de 2002: quando os genitores abusam de sua autoridade ou forem condenados criminalmente, por crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. Na primeira hipótese, o próprio texto legal configura como abuso, o ato de faltar com os deveres inerentes ao poder familiar ou arruinar os bens dos filhos. Os referidos deveres não se limitam àqueles elencados no Código Civil em seu art. 1634, a exemplo da obrigação de criar e educar os filhos. Também é incumbência dos pais “[...] assegurar aos filhos o direito à vida, à saúde, lazer, profissionalização, dignidade, respeito, liberdade, convivência familiar e comunitária [...]” (GONÇALVES, 2005, p. 376, v. 6, grifo nosso).

A perda constitui a destituição do poder familiar, em relação a todos os filhos, sendo justificada por razões de maior gravidade. O art. 1.638 cuida das situações que justificam a sanção mais severa direcionada aos titulares do poder familiar:

“Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I – castigar imoderadamente o filho;

II – deixar o filho em abandono;

III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.”

Em quaisquer dos dois casos, observa-se que um ou ambos os pais poderão ser privados de prerrogativas inerentes ao poder familiar, dentre elas a guarda e companhia da prole. O juiz pode restringir ou proibir a convivência familiar quando imprescindível à preservação do “[...] interesse dos filhos, afastando-os de influências nocivas” (DIAS, 2010, p. 427).  A doutrina admite a “[...] adoção de qualquer medida restritiva necessária para proteger os interesses do incapaz, coibindo o comportamento abusivo do pai que seja faltoso aos deveres paternos ou ruinoso aos bens do filho” (COMEL, 2003, p. 280, grifo da autora). Voltará a gozar da guarda e da companhia da prole aquele genitor que comprovar em juízo a cessação das causas que provocaram a perda, desde que atendido o superior interesse do menor (GONÇALVES, 2005, v. 6).

Imaginando-se que nem o pai nem a mãe podem exercer em sua plenitude o poder familiar (afetando diretamente a guarda dos filhos) por meio de suspensão ou por perderem tal poder, o § 5º do art. 1.584 prevê que será escolhida outra pessoa, de preferência da família, para exercer o guarda do menor. A legislação, percebe-se, mantêm dispositivos que regulam a guarda de modo a não permitir que o exercício do poder familiar comprometa o saudável desenvolvimento de crianças e adolescentes, inclusive prevendo que o juiz não está adstrito à escolha consensual feita pelo casal que se divorcia, nem deve possibilitar que a guarda permaneça nas mãos de pais negligentes e abusadores.

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Sobre a autora
Aniêgela Sampaio Clarindo

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Pós-graduanda em Direito de Família pela Universidade Regional do Cariri.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CLARINDO, Aniêgela Sampaio. Guarda unilateral e síndrome da alienação parental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3583, 23 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24254. Acesso em: 22 nov. 2024.

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