Artigo Destaque dos editores

Aplicação da multa do art. 475-J do CPC ao processo laboral

Exibindo página 2 de 3
Leia nesta página:

CAPÍTULO II

APLICAÇÃO DA MULTA DO ART. 475-J DO CPC AO PROCESSO LABORAL

Na esteira do preconizado pela Emenda Constitucional n. 45, de 2004, que - atendendo às diretrizes progressistas instauradas com a promulgação da Carta Magna de 1988 - guindou ao patamar de direito e garantia fundamentais a duração razoável do processo e os instrumentos que tornem certa sua rápida tramitação; adveio a promulgação da Lei n. 11.232/2005, precedida de outras que compõem o complexo normativo reformista experimentado pelo direito processual comum nos últimos anos do século passado, e no decorrer do prelúdio da nova centúria.

A sobredita lei processual alterou o Estatuto Processual Civil Brasileiro instituindo a etapa de cumprimento da sentença no processo cognitivo, revogando preceitos atinentes à execução fulcrada em título judicial, e redesenhando o método processual de materialização das decisões condenatórias de pagar quantia certa.

Historicamente, a parte exequente de um título executivo judicial, que encerrava obrigações de pagar quantia, via-se tolhida por um sem-número de obstáculos que retardava - e muitas vezes impedia - a realização da tutela jurisdicional executiva.

No compasso das mudanças que exsurgiram com o diploma legal em comento, assistiu-se a uma sincretização de tutelas, mediante a qual buscou-se a máxima efetividade da prestação jurisdicional, guardando estreita sintonia com o que já se verifica nas tutelas das obrigações de fazer, negativas e de dar coisa. Decorrente disso, o cumprimento do decisum condenatório dar-se-á no bojo do mesmo liame jurídico-processual regulatório da questão material sob litígio.

Na lição de Ovídio Araújo Baptista da Silva:

Quanto ao interesse prático em estabelecer-se uma forma de tutela jurisdicional que preste satisfatividade final e definitiva a determinados direitos materiais, sem a exigência irracional e mortificante de ter o litigante vitorioso de percorrer o árduo caminho do procedimento executivo autônomo, com todos os percalços e inconvenientes da defesa (embargos) do executado, parece, ao menos aos juristas familiarizados com nossa experiência forense, assunto que dispensa maiores justificações[22]

Conforme ensinamento do jurista paraibano Sérgio Cabral dos Reis:

A aglutinação, na mesma relação processual, entre as atividades cognitivas e executivas impõe uma relativização ou mitigação ao princípio da autonomia7, que, sob certo aspecto, exige a presença de citação específica para a prática dos atos executórios.                                                           É preciso compreender, entretanto, sobretudo na área trabalhista, em que as verbas possuem natureza jurídica alimentar, que o princípio do sincretismo – interpenetração das duas espécies de atividade jurisdicional8, cognição e execução –, observado em diversos institutos processuais, tem como finalidade atingir a plenitude da efetividade na prestação jurisdicional, mormente tendo em vista a necessidade de reaproximação do binômio(cognição-execução) às peculiaridades do direito material a ser tutelado.[23]

A respeito do princípio do sincretismo processual, e aludindo ao art. 475-J do CPC, explica Mauro Schiavi:

O dispositivo acima mencionado alterou de forma significativa a espinha dorsal da execução por título executivo judicial no Processo Civil, que antes era um processo autônomo em face do de conhecimento, tendo início com a petição inicial e terminando por sentença, para transformá-lo numa fase do processo, qual seja, a do cumprimento da sentença. Desse modo, o CPC retornou ao chamado sincretismo processual ou procedimento sincrético, em que as fases de conhecimento e execução se fundem num único processo.[24]

No direito brasileiro, como já expusemos anteriormente, vários institutos processuais já adotam a sincretização das tutelas jurisdicionais de conhecimento e de execução, em face da imprescindibilidade de atendimento às particularidades do direito substancial a ser protegido. Exemplos dessa interpenetração dos provimentos judiciais cognitivo e executivo são: a tutela antecipatória de mérito e as tutelas específicas das obrigações de fazer, não-fazer e de entregar coisa, consoante preceituam os arts. 273, 461 e 461-A do CPC. Nesse sentido, preleciona João Batista Lopes que:

No processo contemporâneo, assistimos à superação do binômio cognição-execução, isto é, não se deve falar em processo de conhecimento e processo de execução como compartimentos estanques. Do mesmo modo que, no processo de conhecimento, é possível praticar atos executivos ou coativos (v.g., medidas liminares), também na execução não se exclui a prática de atos cognitivos (v.g., decisão sobre penhorabilidade de bens ou sobre impugnação à avaliação)[25].

E, à guisa de conclusão, ainda no que respeita à atual ascensão do processo do tipo sincrético e, por outro lado, à consequente relativização do princípio da autonomia das tutelas jurisdicionais, trazemos o magistério de Sérgio Cabral dos Reis, para quem:

Os princípios do sincretismo e da autonomia não são excludentes entre si, pois coexistem no ordenamento processual. Diante da expansão das ações executivas lato sensu e mandamentais, porém, sobretudo em função da relevância da tutela inibitória, há forte tendência na predominância do sincretismo[26].

Em vista da marcante, profunda e concreta tendência reformista do processo comum, emergiram no cenário jurídico brasileiro contemporâneo intensas controvérsias nos meios doutrinários e jurisprudenciais quanto à aplicabilidade do art. 475-J do CPC no processo laboral.

No caso específico objeto deste modesto estudo, cingir-nos-emos, como proposto preambularmente, a discorrer sobre a multa de 10% inserta no art. 475-J do CPC, e acerca da possibilidade de esta ser aplicável ou não ao processo trabalhista. Neste capítulo, trataremos dos seus contornos característicos, da sua finalidade e da viabilidade de seu manejo na seara trabalhista.

Obviamente, ao tratarmos da natureza jurídica dessa multa, intrinsecamente, lidaremos com o seu caráter teleológico, porquanto tais aspectos se afiguram essencialmente ligados.

O art. 475-J do CPC preceitua que,

Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

Quanto à natureza jurídica da multa, há autores que entendem constituir-se a aludida multa numa espécie de penalidade imputada aos devedores refratários ao cumprimento do decisum condenatório, dentre os quais destacamos: Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery[27]4 e Daniel Amorim Assumpção Neves.[28]

Carlos Henrique Bezerra Leite, também, assim entende:

A natureza jurídica da multa ora focalizada é punitiva, isto é, aflora-se como uma sanção processual, em valor prefixado pela lei (10% sobre o montante devido), ao devedor que se nega a cumprir espontaneamente a obrigação (líquida) de pagar quantia já fixada na sentença e retardar a prestação da tutela jurisdicional.[29]

Corrente oposta considera que tal multa tem cunho coercitivo (astreintes) e não punitivo. Nessa vertente figuram: Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arrruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina[30]7; Asdrubal Franco Nascimbeni[31]8 e outros.

Por fim, tem-se observado que uma terceira vertente doutrinária, com a qual compartilhamos, reputa que a multa pecuniária sob exame traduz natureza mista, pois traz o propósito finalístico de tornar o cumprimento espontâneo da sentença mais proveitoso e, por outro lado, inibir o devedor renitente com um acréscimo no valor da condenação. Nesse sentido, também se posicionam  Arakem de Assis[32]9 e Sérgio Shimura10[33]. Sobre esse caráter misto da comentada multa, assim se pronuncia Cléber Lúcio de Almeida:

A multa aludida no texto legal em questão é imposta como medida de pressão psicológica, destinada a compelir o devedor a cumprir a sua obrigação de pagar quantia certa (trata-se de medida de coerção indireta, por incidir sobre a vontade do devedor). Se, mesmo diante da cominação da multa, a obrigação não for cumprida, a multa será cumulada ao valor do crédito (nesse momento, a multa assume a feição de sanção pecuniária pelo inadimplemento da obrigação imposta na decisão judicial).[34]

Sobre o mesmo aspecto, Mauro Schiavi posiciona-se:

A multa de 10% tem natureza jurídica híbrida, tanto de “astreinte”, ou seja, de coerção pecuniária para cumprimento da obrigação, como de sanção pecuniária pelo não cumprimento espontâneo do pagamento. Portanto, a natureza da multa é inibitória (evitar que a obrigação não seja cumprida) e sancionatória (pena para o descumprimento da obrigação). O valor da multa será revertido para o exequente[35]

Quanto ao momento de incidência da multa de 10%, há doutrinadores que defendem a intimação pessoal ao devedor como sendo o dies a quo, para contagem do prazo de 15 dias[36], via postal[37]. Outros, entendem que o limite inicial é a partir da intimação ao advogado do devedor[38].

Conforme se depreende do texto legal, entendemos que o prazo iniciar-se-á da publicação de sentença líquida, ou a partir da fixação inapelável do quantum debeatur em liquidação de sentença, independente de intimação. Nesse sentido, pontifica Sérgio Cabral dos Reis em abalizado comentário:

Preferimos, particularmente, o entendimento de que o marco inicial do prazo em tela é o momento em que a obrigação reúne todas as condições de exigibilidade. Isso normalmente ocorre após a publicação da sentença, ou após a definição irrecorrível da liquidação. Observe-se que, no processo do trabalho, por força do art. 899 da CLT, os recursos são dotados de efeito meramente devolutivo. Assim, ao contrário do que ocorre em relação à apelação no processo comum (art. 520 do CPC), o recurso ordinário  trabalhista  não  impede a eficácia imediata da sentença condenatória, inclusive no que concerne à incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC. Essa situação jurídica só não se concretiza, se o TRT, excepcionalmente, conceder uma liminar no bojo de uma ação cautelar incidental ou em sede de mandado de segurança em sentido oposto. Para não gerar dúvida, é impositivo que se defina a questão no dispositivo da sentença. Assim, como regra, a incidência da multa é automática, dispensando-se nova intimação. Vale observar que esse entendimento converge para os objetivos da reforma processual, não havendo que se falar em violação ao princípio do devido processo legal, pois decorre de uma interpretação sistemática da ordem jurídica, cujos ditames o executado não pode alegar desconhecimento. Se não quiser sofrer a incidência da multa, o executado deve ser previdente, acompanhamento o processo, a fim de cumprir, de logo, a obrigação. Exigir esse encargo do Poder Judiciário, atribuindo, por conseqüência, o ônus do tempo do processo, desnecessariamente, ao exeqüente, constitui uma inadmissível inversão de valores[39].

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

No tocante à citação, tendo em vista a sincretização dos provimentos judiciais condenatórios e de realização creditícia, figurando, portanto, no mesmo liame processual as atividades de cognição e execução, infere-se que aquele ato processual é prescindível, excepcionando-se o processo executivo contra a Fazenda Pública.

Nessa linha de raciocínio, leciona Sérgio Cabral dos Reis:

[...] com exceção das execuções contra a Fazenda Pública, impõe-se perceber que, tratando-se de sentença civil condenatória, inclusive as prolatadas na Justiça do Trabalho, não há mais a necessidade de citação do executado, pois as atividades jurisdicionais inerentes à condenação e à satisfação do crédito (execução) realizam-se na mesma relação jurídica processual. [...][40]

Ainda em relação ao prazo de incidência da multa de 10% no que se relaciona à aplicação ao processo do trabalho, há opiniões divergentes na doutrina e na jurisprudência: para uns é de 15 dias (concorde com o preceituado no art. 475-J do CPC); para outros, 08 dias (por analogia à maioria dos prazos recursais trabalhistas); e para os demais é de 48 horas. Acostamo-nos aos que entendem ser este o lapso temporal a observar-se, pelo fato de o crédito em questão se constituir em instrumento de sobrevivência do trabalhador, proporcionando-lhe a preservação mínima de sua dignidade como pessoa humana.

Além dessa circunstância vital para o laborista, outra emerge da necessidade de imprimir maior efetividade processual, pressuposto determinístico para o atingimento da satisfação do sobredito crédito alimentar, conforme relata Sérgio Cabral dos Reis:

O prazo de incidência, a despeito de respeitável entendimento em sentido contrário, deve ser o de 48 horas após a decisão ou da fixação definitiva da liquidação (art. 880 da CLT). A aparente contradição com o art. 475-J do CPC desaparece, a partir do momento em que se interpreta a finalidade da multa em consonância com os princípios do processo do trabalho. De pronto, recorda-se que, como regra, os créditos alimentares, em razão da sua própria natureza, carecem de uma satisfação mais rápida do que os demais. Em consonância com esse fato, relembra-se que a multa prevista no art. 475-J do CPC tem dupla finalidade: estimular a rapidez no adimplemento da obrigação e, caso isso não venha a acontecer, punir o devedor voluntariamente recalcitrante. Quando a decisão reúne todos os elementos necessários ao seu cumprimento, a penalidade em apreço torna-se exigível. Ora, no processo comum, isso ocorre no prazo de 15 dias, a contar da publicação da sentença ou da fixação do valor na fase de liquidação (art. 475-J do CPC). No processo do trabalho, tratando-se de decisão contendo obrigação liquidada, o prazo é de 48 horas após a intimação (art. 880 da CLT). Se a obrigação determinada na sentença, por outro lado, ainda não estiver liquidada, o prazo de 48 horas deve ser contado a partir da definição do valor a ser executado. 

Segundo pensamos, a interpretação que prima pela utilização de prazos distintivos (15 dias, oito dias e/ou 48 horas) favorece a criação de uma “burocracia processual”, acarretando, inevitavelmente, o surgimento de novos incidentes e, por consequência, de mais atos processuais, em detrimento da efetividade do processo. Como não existe violação à ampla defesa e ao contraditório, deve-se buscar a interpretação que melhor atinja o valor efetividade, evitando-se, assim, a prática de atos processuais desnecessários e valorizando a maior eficácia das decisões de primeiro grau.[41]

Quanto à possibilidade de vir o devedor a solver parcialmente o débito no prazo cominado pelo art. 475-J do CPC, a penalidade pecuniária sob exame terá repercussão tão-somente sobre o saldo remanescente, conforme preceitua o § 4º., do precitado dispositivo processual civil.

Entrementes, nesse particular, não se pode ficar indiferente ao fato de que o devedor, externando boa-fé, tome a iniciativa de pagar o quantum que considere legítimo, embora num importe um pouco aquém do total da dívida exequenda. Neste caso, atentando-se para o princípio da proporcionalidade, vislumbramos a irrazoabilidade da incidência da coima em comento, valendo-nos do ensinamento do jurista Sérgio Cabral dos Reis:

Se o executado demonstrar interesse no cumprimento voluntário da obrigação, depositando a quantia que entende devida, ainda que em valor um pouco inferior, verificado à luz do princípio da razoabilidade, a multa não deverá ser aplicada. Havendo alguma dúvida sobre o valor devido, a interpretação deve ser favorável ao executado (art. 620 do CPC). Devem prevalecer, portanto, os princípios da boa-fé e da lealdade processual. Com efeito, só haverá a execução da multa sobre o restante, se o executado, ao seu alvedrio, injustificadamente não cumprir a obrigação de maneira integral[42].

No que diz respeito à possibilidade de aplicação da multa no âmbito de execução provisória, a despeito das divergências doutrinárias presentes, reputamos perfeitamente possível: se a dívida principal o pode, não há motivo plausível de a multa de 10% não seguir o mesmo caminho. Maior razão apresenta-se no processo laboral, tendo em vista a característica inata ao recurso trabalhista de produzir, em regra, efeito meramente devolutivo, conforme preceitua o art. 899 da Consolidação,[43] e em face da natureza do crédito exequendo.

Na lição de Mauro Schiavi:

Mesmo que se trate de execução provisória, incidirá a multa, pois o art. 475-J não faz qualquer ressalva, tampouco o art. 475-O do CPC. Além disso, no Processo do Trabalho, os recursos não têm efeito suspensivo (art. 899, da CLT). Ainda que se possa argumentar que a decisão poderá ser alterada, o prosseguimento da execução é medida que se impõe rumo à efetividade processual e prestígio da decisão de primeiro grau.

De outro lado, em se tratando de execução provisória, por não haver certeza da obrigação e pela responsabilidade objetiva que pode acarretar ao exequente pelos danos causados ao executado caso seja alterada a decisão, a iniciativa dos atos executivos depende de requerimento do reclamante no Processo do Trabalho. Portanto, o executado deverá ser intimado, na pessoa de seu advogado, para depositar em juízo o valor da execução provisória, no prazo de 15 dias, sob consequência de multa de 10%. O valor depositado poderá ser liberado ao reclamante se presentes as hipóteses do § 2º. do art. 475-O, do CPC.[44]

Júlio César Bebber posiciona-se contrariamente à incidência da multa de 10% em sede de execução provisória:

Na execução antecipada (provisória), a meu ver, não haverá a imposição imediata da multa de 10% sobre o montante da condenação (CPC, art. 475-J), uma vez que a obrigação ainda não restou consolidada pelo trânsito em julgado. Verificado este, caberá ao executado, no primeiro dia útil imediato, e independentemente de intimação, efetuar o pagamento do débito, sob cominação de incidência de 10%.[45]

Ultrapassados os posicionamentos vários adotados na doutrina acerca da aplicabilidade ou não da multa do art. 475-J ao processo do trabalho, tendo em cada ponto do estudo externado o nosso entendimento, passemos, agora, a percorrer o caminho que tem palmilhado a jurisprudência dos Tribunais do Trabalho e, nesse compasso, trazer a tendência atual da Corte Superior Trabalhista referente à matéria.

 Vejamos algumas decisões desfavoráveis[46] à aplicação subsidiária da multa de 10% ao procedimento executivo trabalhista:

PROCESSO DO TRABALHO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO ARTIGO 475-J DO CPC. A Consolidação das Leis do Trabalho não é omissa quanto ao procedimento a ser observado na execução dos valores devidos, havendo previsão expressa em seu artigo 880, quanto à expedição de mandado de citação ao executado, a fim de que este pague o valor devido em quarenta e oito horas ou garanta a execução, sob pena de penhora, rezando o parágrafo único desse artigo que "a citação será feita pelos oficiais de justiça". Prosseguindo, a Norma Consolidada disciplina que, no caso do executado não pagar a quantia devida, poderá garantir a execução mediante depósito da mesma ou nomear bens à penhora, não o fazendo, seguir-se-á a penhora dos seus bens (artigos 882 e 883). Ressalte-se, ainda, que a execução trabalhista é muito mais rigorosa do que a processual comum, valendo lembrar que, para interposição de recurso ordinário é exigido o depósito recursal prévio e, ainda, que os recursos na esfera da Justiça do Trabalho não possuem efeito suspensivo, permitindo  a  execução até a penhora (artigo 899 da CLT). Logo, a disposição contida no artigo 475-J do CPC é manifestamente incompatível com o processo do trabalho, tendo em vista as suas peculiaridades. (Acórdão nº: 20070270133, nº de Pauta: 085, Processo TRT/SP nº: 00147200305202009, Agravo de Petição – 52ª VT de São Paulo, Agravante: Telecomunicações de São Paulo SA Telesp, Agravado: Gerson Roberto Roque)[106]

PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DIREITO AO PROCEDIMENTO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO PROCESSO COMUM. MULTA DO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INCOMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO. De acordo com a regra do artigo 769 da Consolidação, a aplicação dos preceitos do processo comum justifica-se no caso de lacuna do processo do trabalho. A Consolidação tem um regime próprio de execução forçada que não comporta a aplicação subsidiária da multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil. Ao contrário do regime do cumprimento de sentença adotado pela Lei nº. 11.232, de 22-XII-2005, o regime de execução da Consolidação assegura ao executado o direito à nomeação de bens à penhora, o que logicamente exclui a ordem para imediato pagamento sob pena de aplicação da multa de 10% sobre o valor da dívida. As regras que instituem punições exigem interpretação restritiva, excluindo qualquer alargamento exegético que se destine a aplicá-las por analogia a situações que não estejam clara e expressamente definidas na lei. Apelo do executado a que se dá provimento para o fim de excluir da execução a multa fundada no artigo 475-J do Código de Processo Civil. (Acórdão nº: 20070961250 Nº de Pauta: 050, Processo TRT/SP nº: 01985200608902011, Agravo de Instrumento em Agravo de Peticao - 89 VT de São Paulo, Agravante: La Glória Pizza Bar Ltda. Epp, Agravado: Luciano Sales)[107]

AGRAVO DE PETIÇÃO. MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC. INAPLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. As disposições do Código de Processo Civil na fase de execução são aplicáveis subsidiariamente ao Processo do Trabalho apenas na hipótese de omissão da Consolidação das Leis do Trabalho e da Lei nº 6.830/1980, conforme art. 889 da CLT. No caso em questão não há omissão da CLT, eis que o art. 883 da CLT é enfático ao estipular que no caso do executado não pagar a quantia cobrada, nem garantir a execução, seguir-se-á a penhora de bens suficientes ao pagamento do valor executado, não havendo qualquer previsão de multa processual no caso de inadimplemento do valor cobrado, o que por si só desautoriza a utilização subsidiária do art. 475-J do CPC. Por fim, vale acrescentar que a disposição contida no art. 475-J do CPC é absolutamente incompatível com a execução trabalhista, pois enquanto nesta o art. 880 da CLT concede ao executado o prazo de 48 horas para pagar a dívida ou garantir a execução, naquele dispositivo do CPC o prazo é de 15 dias. Assim, por qualquer ângulo que se examine a questão fica evidente a incompatibilidade do art. 475-J do CPC com a execução trabalhista. (Acórdão nº: 20070206001, Processo TRT/SP nº: 02563199805202003, Agravo de Petição, 52ª VT de São Paulo, Agravante: Telecomunicações de São Paulo S/A Telesp, Agravado: Alfredo Le Pera Tozo)[108]

AGRAVO DE PETIÇÃO DO EXEQUENTE – QUANTIFICAÇÃO DO NÚMERO DE HORAS EXTRAS DECORRENTES DA INFRAÇÃO AO INTERVALO – Do art. 66 da CLT. O agravante inova na fase de execução, alegando a existência de pedido na petição inicial de que os intervalos entre uma jornada e outra fossem arbitrados como 50% usufruídos, a fim de gerar 5,5 horas extras diárias, que sequer foram aventados na fase de conhecimento. Agravo não provido. AGRAVO DE PETIÇÃO DA EXECUTADA – DA MULTA DO ARTIGO 475-J DO CPC – Não há falar em aplicação subsidiária ao Processo do Trabalho da norma inserta no artigo 475-J do CPC, na medida em que o ordenamento jurídico trabalhista não é omisso, no particular, possuindo regramento próprio que disciplina a execução, ex vi dos artigos 876 a 892 da CLT. Agravo de petição da executada a que se dá provimento, no particular. (TRT 4ª R. – AP 00346-2003-511-04-00-1 – Relª Juíza Laís Helena Jaeger Nicotti Vinculada – J. 10.04.2008)[109]

ARTIGO 475-J DO CPC - INAPLICABILIDADE NO PROCESSO DO TRABALHO. Não há omissão na norma especial, no particular, e há incompatibilidade das disposições contidas no artigo 475-J do CPC com as regras vigentes e expressas na CLT, que tratam da matéria, por isso, inaplicável esse dispositivo do CPC no processo do trabalho. Num confronto com o princípio da celeridade dos atos processuais, prevalece o princípio da legalidade, sob pena de violação direta a um princípio maior, o do devido processo legal. (TRT 9ª R., TRT-PR-02728-2006-513-09-00-8-ACO-19643-2008 - 1ª Turma, Relator: Tobias de Macedo Filho, Publicado no DJPR em 10-06-2008)[110]

MULTA DO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – JUSTIÇA DO TRABALHO – INAPLICABILIDADE – Conquanto tenha o artigo 475-J do Código de Processo Civil o escopo de dar maior efetividade à execução quando a condenação implicar quantia certa ou já fixada em liquidação, tem-se não ser aplicável nesta seara por existir um sistema próprio de execução na Justiça Trabalhista que busca também a efetividade do processo utilizando outros meios, nos termos dos artigos 876 a 892 da CLT. (TRT 20ª R. – RO 00729-2006-005-20-00-2 – Rel. Des. João Bosco Santana de Moraes – J. 21.08.2007)[111]

Outras[47] que se afiguram concordes, denotando a tendência evolutiva da jurisprudência trabalhista em relação à matéria:

MULTA - ARTIGO 475-J DO CPC. A multa prevista no art. 475-J do CPC, com redação dada pela Lei 11.232/05, aplica-se ao Processo do Trabalho, pois a execução trabalhista é omissa quanto a multas e a compatibilidade de sua inserção é plena, atuando como mecanismo compensador de atualização do débito alimentar, notoriamente corrigido por mecanismos insuficientes e com taxa de juros bem menor do que a praticada no mercado. A oneração da parte em execução de sentença, sábia e oportunamente introduzida pelo legislador através da Lei 11.232/05, visa evitar arguições inúteis  e  protelações desnecessárias, valendo como meio de concretização da promessa constitucional do art.5,  LXXVIII  pelo qual "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados  o  tempo razoável  do  processo  e  os  meios  que  garantam  a  celeridade  de     sua tramitação."Se o legislador houve por bem cominar multa aos créditos cíveis, com muito mais razão se deve aplicá-la aos créditos alimentares, dos quais o cidadão-trabalhador depende para ter existência digna e compatível com as exigências da vida. A Constituição brasileira considerou o trabalho fundamento da República - art.1, IV e da ordem econômica - art.170. Elevou-o ainda a primado da ordem social - art. 193. Tais valores devem ser trazidos para a vida concreta, através de medidas objetivas que tornem realidade a mensagem ética de dignificação do trabalho, quando presente nas relações jurídicas. AGRAVO - O art. 557/CPC determina ao relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante. Trata-se de mais um esforço do legislador, visando atender ao clamor da sociedade por uma justiça mais rápida que tem agora, inclusive, respaldo constitucional no art. 5º., LXXVIII, que diz: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação". LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. O Ministro Marco Aurélio, em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 20.11.00, expõe: "Cumpre aos jurisdicionados atentar para o verdadeiro sentido do acesso ao Judiciário, abandonando posição que, em última análise, tem como objeto a projeção, no tempo, do desfecho da controvérsia, do restabelecimento da paz social momentaneamente abalada. A impressão que fica é da aposta na morosidade da máquina judiciária, driblando-se as dificuldades encontradas para o imediato cumprimento da obrigação declarada no título judicial. Impõe-se tomada de posição a respeito, afastando-se o mal maior que é a apatia no ofício judicante; impõe-se atuação rigorosa em tais casos, acionando-se os artigos 14, 16, 17 e 18 do CPC (Código de Processo Civil), no que, em linha adotada pela legislação comparada, rechaçam a litigância de má-fé. O Judiciário, ante uma interposição sucessiva de recursos sem uma justificativa latente, sem qualquer base legal a respaldar o inconformismo, está à beira do colapso, se é que já não podemos proclamá-lo. (...)". O Ministro Oreste Dalazen acrescenta: "Na Justiça do Trabalho também concorre para emperrá-la a complacência em sancionar-se a litigância de má-fé manifestada quer em reclamações aventureiras, em que se formulam pedidos que muitas vezes esgotam o abecedário (tudo favorecido pelas comodidades da informática!), quer no exercício patronal abusivo do direito de defesa, especialmente procrastinando-se a interminável execução trabalhista " Revista do TST, v.67, n.1, jan- mar. de 2001 (...)". O Ministro Celso de Mello finalmente confirma: " O processo não pode ser manipulado para viabilizar o abuso de direito, pois essa é uma idéia que se revela frontalmente contrária ao dever de probidade que se impõe à observância das partes. O litigante de má-fé - trate-se de parte pública ou parte privada - deve ter a sua conduta sumariamente repelida pela atuação jurisdicional dos juízes e dos tribunais, que não podem tolerar o abuso processual como prática descaracterizadora da essência ética do processo.'' AG ( Edcl- AgRg) n. 2000.691-DF. A estes argumentos, acrescente-se agora o princípio do art. 5º, LXXVIII, introduzido pela EC 45/04, pelo qual a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam sua rápida tramitação. O Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, afirma que cabe ao aplicador da lei transformar de potência em ato o comando constitucional, acrescentando que "os principais meios atualmente oferecidos ao julgador ao enfrentar os expedientes protelatórios são as multas previstas nos artigos 18, 538, parágrafo único, e artigo 557, parágrafo 2º do CPC, cuja aplicação se mostra essencial para a implementação do ideal constitucional da celeridade processual"  (ED/processo nº 790568.2001). Portanto, deve o juiz  zelar  pelo  rápido andamento  das  ações, aplicando  sanções  a  quem demanda por emulação, interpondo recursos indefinidamente, levando o Judiciário ao colapso e fazendo da duração das ações um instrumento de rolagem de dívida e retardamento na execução das obrigações. Ao direito de defesa da parte, que ninguém pode negar, contrapõe-se o direito do Estado em aplicar as leis, o qual possui também relevante significado social, já que importa na eficácia do próprio ordenamento jurídico. Conciliar a ambos é dever do juiz no seu ofício de julgar. (TRT 3ª R. nº: 00987-1998-103-03-00-6 AP. Data de Publicação: 02/12/2006, Órgão Julgador: Quarta Turma, Juiz Relator: Desembargador Antonio Alvares da Silva)[112]

MULTA DO ARTIGO 475-J DO CPC. APLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. Ainda que inexistente qualquer pedido na petição de ingresso acerca da aplicação da multa prevista no art. 475-J, do CPC, não há que se cogitar de julgamento extra petita, pois o Magistrado a quo aplicou penalidade condicionada prevista legalmente, tratando-se de matéria processual de ordem pública, a ser empregada mesmo sem a provocação das partes. E ainda que a CLT possua conteúdo normativo versando sobre os critérios a serem obedecidos na fase de execução da sentença, instituído nos arts. 876 e seguintes da CLT, tal fato não impede o implemento da multa do art. 475-J, do CPC, pois a própria CLT permite através dos seus arts. 769 e 889 a aplicação subsidiária do CPC na execução trabalhista, desde que haja omissão celetária acerca da matéria e compatibilidade do artigo jurídico que se deseja utilizar. Assim, como não existe no processo trabalhista e na lei de execução fiscal qualquer disposição prevendo a aplicação de multa pelo descumprimento da obrigação de pagar, plenamente cabível a aplicação supletiva do caput do art. 475-J, do CPC. Além do mais, é necessário considerar que o crédito trabalhista tem natureza alimentícia, sendo inclusive prevista a prioridade de seu pagamento no caso de insolvência do devedor (conforme arts. 709, inc. II e 711 do CPC e art. 186 do CTN). Portanto, a aplicação da multa prevista no art. 475-J, do CPC, mostra-se plenamente exequível no Processo do Trabalho, justamente como forma de efetivar os direitos sociais constitucionalmente estabelecidos. Ainda quando se constata que, ao contrário do processo civil, na Justiça do Trabalho é nítida  e  clara a desproporcionalidade de condições entre as partes litigantes, sendo a imposição da pena condicionada forma de efetivação da tutela jurisdicional prestada. Observe-se que no âmbito trabalhista, através da edição da Emenda Constitucional nº 45, de dezembro de 2004, consolidaram-se entre os princípios fundamentais da Carta  Magna de 1988, pelo disposto no art. 5º, inc. LXXVIII, os princípios  da  celeridade processual e da economia processual, identificados na "razoável duração do processo" e na  "celeridade de sua tramitação". Destarte, necessária a utilização pelo Juiz do Trabalho de ferramentas e meios processuais que busquem dar maior efetividade aos princípios normativos basilares citados, seja pela aplicação na fase de execução da ferramenta da penhora on line, através do conhecido "Convênio Bacen-Jud", seja pela utilização de artigos processuais civis que visem compelir o devedor ao pagamento, desde que não haja qualquer restrição ou incompatibilidade com o rito processual trabalhista. (TRT 9ª R., TRT-PR-00220-2005-671-09-00-3-ACO-10440-2007 – 3ª Turma, Relator: Celio Horst Waldraff, Publicado no DJPR em 27-04-2007)[113]

13º SALÁRIO PROPORCIONAL – RESILIÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR ATO DO EMPREGADO – DEVIDO – É DEVIDO O 13º SALÁRIO PROPORCIONAL AO EMPREGADO QUE PÕE TERMO AO CONTRATO DE TRABALHO POR FORÇA DO DISPOSTO NO ART. 3º DA LEI N. 4.090/62 C/C ART. 7º DO DEC – N. 57.155/65 – APLICAÇÃO DO ART. 475-J DO CPC AO PROCESSO DO TRABALHO – LACUNA ONTOLÓGICA-AXIOLÓGICA – LEGALIDADE – É perfeitamente compatível com o processo do trabalho a dicção do Art. 475-J do Diploma Processual Civil, não afrontando o disposto nos art. 8º, 769 e 880 da CLT, Haja vista que este ramo especializado do processo, por tutelar direitos de caráter eminentemente alimentar, cujos titulares, via de regra, são hipossuficientes, clama por uma prestação jurisdicional célere e efetiva, louvando-se das inovações implementadas no processo comum, sobretudo quando tais alterações acompanham o espírito de aceleração da tutela jurisdicional do estado, consagrado através da elevação a nível constitucional do princípio da razoável duração do processo. Recurso ordinário conhecido e improvido. (TRT 16ª R. – Proc. 01984-2006-015-16-00-1 – (2007) – Rel. Juiz José Evandro de Souza – J. 23.10.2007).[114]

MULTA – ARTIGO 475-J DO CPC – APLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO – DISPENSA EM CONDENAÇÃO EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA – A multa prevista no art. 475-J do CPC, com redação dada pela Lei 11.232/05, aplica-se ao Processo do Trabalho, diante da existência de omissão na legislação trabalhista e de compatibilidade entre esta e a mencionada multa, sendo dispensada apenas na execução em face da Fazenda Pública ante a existência de regramento próprio para o  cumprimento da condenação. (TRT 20ª R. – RO 00016-2007-006-20-00-6 – Rel. Des. Jorge Antônio Andrade Cardoso – J. 26.11.2007)[115]

Alfim, o posicionamento atual[48] do Egrégio TST não se mostra consonante com a incidência subsidiária da multa tipificada no CPC:

ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I — dar provimento ao Agravo de Instrumento para mandar processar o Recurso de Revista e determinar seja publicada certidão, para efeito de intimação das partes, dela constando que o julgamento do recurso dar-se-á na primeira sessão ordinária subsequente à data da publicação, nos termos da Resolução Administrativa nº 938/2003 desta Corte; II — conhecer do Recurso de Revista por ofensa ao artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da República e, no mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação a multa fixada sob a égide do artigo 475-J do CPC. (Acórdão, Proc. nº TST-RR-765/2003-008-13-41.8, 3ª Turma, Relatora Maria Cristina Peduzzi, Recorrente: Companhia Energética da Borborema – CELB, Recorridos: Antônio Silva Vicente e Campina Prest Service Ltda.)

RECURSO DE REVISTA. MULTA DO ART. 475-J DO CPC. INCOMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO. REGRA PRÓPRIA COM PRAZO REDUZIDO. MEDIDA COERCITIVA NO PROCESSO TRABALHO DIFERENCIADA DO PROCESSO CIVIL O art. 475-J do CPC determina que o devedor que, no prazo de quinze dias, não tiver efetuado o pagamento da dívida, tenha acrescido multa de 10% sobre o valor da execução e, a requerimento do credor, mandado de penhora e avaliação. A decisão que determina a incidência de multa do art. 475-J do CPC, em processo trabalhista, viola o art. 889 da CLT, na medida em que a aplicação do processo civil, subsidiariamente, apenas é possível quando houver omissão da CLT, seguindo, primeiramente, a linha traçada pela Lei de Execução fiscal, para apenas após fazer incidir o CPC. Ainda assim, deve ser compatível a regra contida no processo civil com a norma trabalhista, nos termos do art. 769 da CLT, o que não ocorre no caso de cominação de multa no prazo de quinze dias, quando o art. 880 da CLT determina a execução em 48 horas, sob pena de penhora, não de multa. Recurso de revista conhecido e provido para afastar a multa do art. 475-J do CPC.[116]

Nesse contexto, Mauro Schiavi[49] alude a julgados do Tribunal Superior do Trabalho e de Tribunal Regional, buscando evidenciar a posição hodierna da mais alta Corte Trabalhista, ainda refratária à inserção da multa - objeto deste estudo – na seara juslaborista e, por outro lado, demonstrar a tendência hermenêutica das instâncias de base do Judiciário Trabalhista, num labor incessante de integrá-la ao subsistema jurídico laboral:

INAPLICABILIDADE DO ART. 475-J DO CPC AO PROCESSO DO TRABALHO - EXISTÊNCIA DE REGRA PRÓPRIA NO PROCESSO TRABALHISTA. 1. O art. 475-J do CPC dispõe que o não pagamento pelo devedor em 15 dias de quantia certa ou já fixada em liquidação a que tenha sido condenado gera a aplicação de multa de 10% sobre o valor da condenação e, a pedido do credor, posterior execução forçada com penhora. 2. A referida inovação do Processo Civil, introduzida pela Lei n. 11.232/2005, não se aplica ao Processo do Trabalho, já que tem regramento próprio (arts. 880 e seguintes da CLT) e a nova sistemática do Processo Comum não é compatível com aquela existente no Processo do Trabalho, onde o prazo de pagamento ou penhora é apenas 48 horas. Assim, inexiste omissão justificadora da aplicação subsidiária do Processo Civil, nos termos do art. 769 da CLT, não havendo como pinçar do dispositivo apenas a multa, aplicando, no mais, a sistemática processual trabalhista. 3. Cumpre destacar que, nos termos do art. 889 da CLT, a norma subsidiária para a execução trabalhista é a Lei 6.830/80 (Lei da Execução Fiscal), pois os créditos trabalhistas e fiscais têm a mesma natureza de créditos privilegiados em relação aos demais créditos. Somente na ausência de norma específica nos dois diplomas anteriores,  o  Processo

Civil passa a ser fonte informadora da execução trabalhista, naqueles procedimentos compatíveis com o Processo do Trabalho (art. 769 da CLT). 4. Nesse contexto, merece reforma o acórdão recorrido, para que seja excluída da condenação a aplicação do disposto no art. 475-J. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido (TST – RR – 2/2007-038-03-00.0 – Data de Julgamento: 14.5.2008 – Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho – 7ª. T. – DJ 23.5.2008).  

honorários periciais. Nos termos do art. 790-B da CLT, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, que, no caso dos autos recai sobre a executada. Multa – Art. 475-J do CPC. A Multa prevista no art. 475-J do CPC, com  redação dada pela Lei n. 11.232/05, aplica-se ao Processo do Trabalho, pois a execução trabalhista é omissa quanto a multas e a compatibilidade de sua inserção é plena, atuando como mecanismo compensador de atualização do débito alimentar, notoriamente corrigido por mecanismos insuficientes e com taxa de juros bem menor do que a praticada no mercado. A oneração da parte em execução de sentença, sábia e oportunamente introduzida pelo legislador através da Lei n. 11.232/05, visa evitar arguições inúteis e protelações desnecessárias, valendo como meio de concretização da promessa constitucional do art. 5º., LXXVIII, pelo qual “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados o tempo razoável do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” Se o legislador houve por bem cominar multa aos créditos cíveis, com muito mais razão se deve aplicá-la aos créditos alimentares, dos quais o cidadão-trabalhador depende para ter existência digna e compatível com as exigências da vida. A Constituição brasileira considerou o trabalho fundamento da República – art. 1º. , IV e da ordem econômica – art. 170. Elevou-o ainda a primado da ordem social – art. 193. Tais valores devem ser trazidos para a vida concreta, através de medidas objetivas que tornem realidade a mensagem ética de dignificação do trabalho, quando presente nas relações jurídicas. (TRT – 3ª. R. – 4ª. T. – AP n. 1263/2003.111.03.00-2 – Rel. Antonio Álvares da Silva – DJ 2.12.06 – p. 17) (RDT n. 01 – Janeiro de 2007)  

Por tudo que expusemos neste estudo, chegamos à conclusão de que o direito processual do trabalho tem que se abrir às transformações pelas quais passa o direito comum, devendo a interpretação do art. 769 da Consolidação ser conduzida de forma a absorver as inovações legislativas promotoras de celeridade e de efetividade na relevante atividade estatal de distribuir justiça. Aqui, peculiarmente, trata-se da prestação de uma justiça estritamente social, pois, via de regra, perfila-se no polo ativo da relação jurídico-processual um trabalhador que subsiste unicamente do produto do seu trabalho.

Discorremos sobre o fenômeno do sincretismo das tutelas de cognição e execução, interpenetração esta já adotada há alguns anos pela processualística comum, e, desde a sua promulgação, pela CLT.

Demonstramos que a multa prevista no art. 475-J do CPC é cabalmente aplicável ao processo laborista, cuja natureza jurídica consideramos ser mista (coercitiva-punitiva); entendemos que seu momento de incidência inicia-se na publicação de sentença líquida ou da fixação do crédito liquidando; acostamo-nos à posição de que o prazo de incidência é de 48 horas; pontificamos pela dispensabilidade de citação, em face do caráter sincrético do processo, excetuando-se as execuções contra a Fazenda Pública; reputamos que a referida multa incidirá apenas sobre o saldo restante a ser pago, quando o devedor de boa-fé solve parcialmente o débito e, finalmente, posicionamo-nos favoráveis à sua aplicação no âmbito de execução provisória.

Enquanto a legislação trabalhista permanece sem alterações marcantemente inovadoras, cabe à doutrina e, principalmente, à jurisprudência promoverem as mudanças conducentes a atender ao comando normativo emanado da Carta Constitucional Brasileira vigente, colmatando as lacunas do subsistema processual trabalhista com as normas do processo comum, possibilitando ao trabalhador alcançar uma pronta e efetiva resposta do Judiciário às suas pretensões.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
João Marcos Esmeraldo Albuquerque

Técnico Judiciário(TRT 13a. Região) Graduação em Direito(UEPB-1993.1) Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho(UNIPE-2010)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALBUQUERQUE, João Marcos Esmeraldo. Aplicação da multa do art. 475-J do CPC ao processo laboral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3681, 30 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24463. Acesso em: 19 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos