A recente aprovação da Lei n. 12.690, de 19 de julho de 2012, cria, finalmente, um marco regulatório para as cooperativas de trabalho, talvez, abrindo um novo tempo para esse setor da economia solidária. A pretensão é a de que, através de tal regulação, se possa claramente demarcar as verdadeiras cooperativas das situações de fraude, que não merecem ser denominadas como trabalho cooperativo.
De fato, a existência das chamadas “fraude-cooperativas” representa, hoje, o principal fator de entrave do desenvolvimento do cooperativismo nas relações de trabalho. A erradicação das cooperativas “de fachada” é fundamental para que, separado o joio do trigo, o cooperativismo passa a ter o mesmo prestígio que goza em outros países e ocupe o espaço que lhe reserva a própria Constituição Federal.
O propósito explícito da nova normatividade é justamente o de “criar as condições jurídicas para proporcionar o adequado funcionamento das cooperativas, de maneira a melhorar a condição econômica e as condições gerais de trabalho de seus sócios” (Exposição de Motivos). Através da lei, cria-se um instrumento jurídico importante de afirmação dos princípios e valores do cooperativismo, pelos quais se evidencia a inteira compatibilidade das cooperativas de trabalho com a legislação trabalhista protetiva, bem como se rechaça a utilização das cooperativas de trabalho como meio de precarização laboral.
Certamente, no debate sobre a nova lei, renovam-se antigas polêmicas a respeito do tema, expressando certo preconceito com o cooperativismo tanto pela simples negação da possibilidade de existência de uma cooperativismo de trabalho[1] como pela inconveniência de que se regulamentem as cooperativas de trabalho, apresentadas como mero aspecto do quadro geral de precarização laboral que assola o mundo do trabalho.
Ainda é bastante cedo para afirmar o quanto a nova lei contribuirá para o aperfeiçoamento das relações de trabalho cooperativo, mas há de se saudar seu surgimento como um passo adiante no caminho certo, talvez gerando uma discussão mais profícua quanto às imensas possibilidades sociais e econômicas abertas pelo cooperativismo.
O cooperativismo como movimento de dimensão mundial
As cooperativas são sociedades de pessoas, de natureza civil, sem fins lucrativos, baseadas na ajuda mútua que, através da auto-organização dos próprios trabalhadores, exercem atividade econômica buscando a melhoria de suas condições econômicas e sociais.
O cooperativismo representa, hoje, um movimento mundial que agrega cerca de um bilhão de trabalhadores em mais de cem países, baseado nos valores da auto-ajuda, da responsabilidade pessoal, da democracia, da igualdade, da equidade, da solidariedade e de uma ética fundada na honestidade, transparência, responsabilidade social e interesse solidário. Em 2010, as 300 maiores cooperativas do mundo tiveram uma movimentação econômico-financeira de US$ 1,6 trilhão.[2] No Brasil, o número de cooperativados passou de 10 milhões em 2011, o que representa um crescimento de 11% em relação ao ano ,anterior, quando foram contabilizados cerca de 9 milhões. [3]
Internacionalmente, o movimento cooperativo se articula através da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), entidade não-governamental, que reúne cooperativas de quase 90 países, representando aproximadamente 800 milhões de pessoas associadas. Pode-se afirmar que se trata da maior organização não-governamental do mundo.[4]
A Organização Internacional do Trabalho, em sua 90ª Conferência (2002), adotou a Recomendação 193, em que se reconhece “a importância das cooperativas na criação de emprego, mobilização de recursos, geração de investimentos e de sua contribuição para a economia” e que elas, “em suas várias formas, promovem a mais plena participação no desenvolvimento econômico e social de todos os povos”.[5]
Em tal documento, definiu-se cooperativa como “associação autônoma de pessoas unidas voluntariamente para satisfazer suas necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais em comum através de uma propriedade conjunta e de gestão democrática”.[6] Conforme a OIT, a promoção das cooperativas, guiada por valores e princípios do movimento cooperativista, deveria ser considerada “um dos pilares do desenvolvimento econômico e social, nacional e internacional” e que os governos “deveriam estabelecer uma política e um marco jurídico favoráveis às cooperativas e compatíveis com sua natureza e função”.[7] Nesse sentido, as cooperativas deveriam beneficiar-se de condições legais e práticas não menos favoráveis às concedidas às empresas e outras organizações sociais. Além disso, as cooperativas deveriam ser apoiadas por políticas públicas, em especial em projetos de promoções do emprego e na redução de desigualdades regionais.[8]
A origem do cooperativismo no movimento de resistência dos trabalhadores.
As primeiras idéias cooperativistas, segundo alguns autores, inspiraram-se no pensamento socialista utópico de Robert Owen e Charles Fourier e no comunista de Karl Marx.
Embora muitos autores entendam que o cooperativismo tem raízes na antiguidade[9], as primeiras experiências do moderno cooperativismo se situam no início no século XIX, na França, Itália e Inglaterra.[10] Basicamente, tratou-se de um movimento urbano operário que buscava resistir à exploração e à deterioração das condições de vida dos trabalhadores que marcaram os primórdios da Revolução Industrial.
Já a matriz teórica do cooperativismo de trabalho parece se encontrar em Philippe Buchez e Louis Blanc, socialistas franceses da primeira metade do século XIX. Buchez idealizou um projeto em que grupos de trabalhadores realizariam a produção por sua conta, desfrutando dos benefícios reservados aos empresários particulares, eliminando a intermediação e adotando como princípios basilares a organização democrática e a distribuição dos excedentes em função do trabalho realizado por cada sócio. Blanc pensou tal projeto aplicado à grande indústria, configurando as chamadas “oficinas sociais”, com forte apoio público.[11]
Desde então, nesses 150 anos, o cooperativismo sempre baseou-se na idéia da solidariedade entre as pessoas e, através dela, tem logrado um notável crescimento tanto em países desenvolvidos como não-desenvolvidos, transformando o corporativismo numa das maiores forças sociais e econômicas a nível mundial.
O cooperativismo mundial tem princípios e valores que orientam as cooperativas em todo os países. Conforme a Declaração de Manchester[12], princípios que, em boa medida, repetem os mesmos ideais de Rochdale:
a) princípio da adesão voluntária e aberta;
b) princípio do controle (gestão) democrática por parte dos associados;
c) princípio da participação econômica dos associados;
d) princípio da autonomia e da independência;
e) princípio da educação, formação e informação;
f) princípio da cooperação entre cooperativas;
g) princípio do interesse pela comunidade.
Ressalte-se, entre tais princípios, os da “gestão democrática por parte do associado”, da “participação econômica dos associados” e da “autonomia e da independência”.
Em relação ao primeiro, diga-se que não existe cooperativa em que o associado não possa desempenhar plenamente seus direitos democráticos participativos. Tem-se como um desvirtuamento inaceitável do cooperativismo a transformação das cooperativas como se empresas fossem, passando a ter “donos” que passam a adotar todas as decisões relevantes, que são homologadas, sem real discussão, pela Assembléia-Geral da cooperativa. O princípio da gestão democrática exige que todas as decisões, especialmente as que deliberam pela adesão a contratos com repercussão econômica, seja adotadas por todos os sócios. Também não é possível a discriminação entre sócios, de forma que alguns tenham acesso a todas as informações e a direitos diferenciados, relegando-se os demais associados a condição de “sócios de segunda classe”. Finalmente, não é compatível com tal princípio a diferenciação remuneratória abusiva a criar graves distorções dentro do quadro social, em geral com diretores com remuneração privilegiada e que contrastam fortemente com a insuficiente remuneração dos demais sócios. Tais práticas que ferem gravemente os valores da igualdade e da solidariedade são fatores decisivos quando se trata de separar as verdadeiras cooperativas das cooperativas fraudulentas.
Já o princípio da participação econômica do associado tem um desenvolvimento no conceito de que, no real cooperativismo, em geral, as condições econômicas do cooperado são melhores do que a dos demais trabalhadores, sendo que uma cooperativa que não alcança tal suficiência econômica não está cumprindo o papel social que lhe cabe na melhoria da condições de vida de seus sócios. Assim, o associado tem direito a uma “remuneração pessoal diferenciada”, pela qual se confirma a adesão do trabalhador à cooperativa como um opção pela ascensão econômica – e não como uma submissão à uma atividade mal-remunerada por falta de melhores alternativas.
Por fim, não há verdadeira cooperativa se esta não é independente e autônoma, tanto em relação aos empresários, mas também em relação ao próprio governo. Nada mais afastado dos princípios do cooperativismo do que a criação de cooperativas de trabalho destituídas de autonomia e independência, muitas vezes a partir das empresas, numa transformação de setores inteiros do quadro de empregados em “associados cooperativados”, numa manobra em que se pretende apenas a redução de custos e que somente ao próprio empresário beneficia. Da mesma forma, não são reais cooperativas as que são formadas a partir da administração pública com o propósito encoberto de burlar as normas que vedam o ingresso sem concurso no serviço público, com manifesto propósito eleitoreiro.
As cooperativas são um patrimônio dos trabalhadores, expressam sua auto-organização democrática por melhores condições de vida e tem, na independência e autonomia, seus valores fundantes.
A base legal das cooperativas de trabalho
As primeiras leis sobre cooperativismo no Brasil datam de 1907 (Lei n. 1.637), sendo de se citar, ainda, o Decreto n. 22.239/32 (que conceitua a sociedade cooperativa como uma forma jurídica “sui generis”, entre as sociedades civil e comercial).
A principal regulamentação está contida na Lei n. 5.764/71, regulamentação que se aplica a cooperativas que tem por objeto “qualquer gênero de serviço, operação ou atividade”.[13]
A Constituição Federal de 1988 incluiu a autonomia das cooperativas no elenco dos direitos e garantias individuais previstos no Capítulo I (art. 5º, XVIII[14]), bem como, no Capitulo da Ordem Econômica e Financeira, expressamente determinou que as cooperativas gozem de “adequado tratamento tributário” (art. 146, III, “c”[15]) e que a lei apóie e estimule o cooperativismo (art. 174, parágrafo 2o[16]).
A nova lei se insere neste contexto de fomento e apoio ao cooperativismo indicado na Constituição Federal.
Conforme ALMEIDA[17], as cooperativas podem assumir as mais diversas atividades, como produção agrícola ou industrial, de beneficiamento de produtos, de compras em comum, de vendas em comum, de consumo, de abastecimento, de crédito, de seguros, habitacionais e de trabalho.
Entre os principais tipos de cooperativas podemos citar:
a) Cooperativas de produção agrícola ou industrial: os associados detém os meios de produção e se organizam de modo a realizar, de forma autogestionária, todas as etapas do processo produtivo, assumindo os riscos da atividade econômica e repartindo os resultados obtidos pela comercialização do produto realizado. Este tipo de cooperativa está expressamente previsto na nova lei, denominada como cooperativa de produção.
b) De consumo: destinam-se a ajuda a economia doméstica de seus associados, de forma que estes possam adquirir variados artigos de consumo, da forma mais direta possível, com melhor qualidade e melhor preço.
c) De crédito: objetivam propiciar crédito a seus associados em melhores condições de mercado;
d) Cooperativas de trabalho: são constituídas com o objetivo de viabilizar que seus associados tenham acesso ao trabalho, dispensando a intervenção de um patrão, podendo realizar obras, tarefas ou serviços públicos ou particular.
Estas últimas são as que “agrupam trabalhadores de uma determinada profissão ou ofício ou de diferentes profissões que se propõem a colocar em comum as suas atividades produtivas ou profissões, com o objetivo de se auto-proporcionar ocupação estável, executar trabalhos ou funções, sem a intervenção de patrão ou empresário”.[18]
Conforme a nova lei, as cooperativas de trabalho podem ser de produção e de serviço. As cooperativas de trabalho “de produção”, por definição legal, são aquelas em que os associados contribuem, com seu trabalho, para produção de bens e a cooperativa detém, a qualquer título, os meios de produção. O exemplo típico parece ser o das cooperativas de coleta de material reciclável, onde os “meios de produção” estão à disposição da cooperativa e os associados contribuem com seu trabalho.
Já as cooperativas de trabalho “de serviço”[19] se organizam de modo a facilitar que os associados encontrem postos de trabalho, captando-os e distribuindo-os entre os cooperados, eliminando intermediários. Quando tais postos de trabalho encontram-se em determinada profissão específica, poderíamos enquadrá-las em um subgrupo (cooperativas profissionais). Quando tais postos de trabalho se encontram em varias atividades funcionais/profissionais, poderíamos enquadrá-la em outro subgrupo (“cooperativas multifuncionais). Em muitos casos, é através das cooperativa de trabalho “de serviço” que os trabalhadores se organizam como empreendimento econômico que passa a competir, no mercado, com as empresas prestadoras de serviço.
Este último grupo é o mais comum e, certamente, é o móvel da inovação regulatória do legislador. Por certo, tais cooperativas de serviço, ao se inserirem no mercado dos serviços terceirizados, são alvo de críticas de parte dos que censuram a terceirização. Porém, a admitir-se a inevitabilidade da terceirização no atual estágio das relações de trabalho, não parece coerente que se pretenda vedar o acesso das cooperativas de trabalho ao mercado das terceirizações, alijando justamente as entidades de economia solidária, o que somente beneficiaria as empresas de prestação de serviços.
O desvirtuamento do cooperativismo através da fraude
Se há uma constatação inequívoca a ser feita na análise da experiência das cooperativas de trabalho nos últimos anos é a de que proliferaram as cooperativas de trabalho fraudulentas, ou seja, aquelas que, a par de não melhorarem as condições de trabalho de seus associados (objetivo primordial das cooperativas), não passam de arapucas jurídicas para o estabelecimento de condições de trabalho bem inferiores as de um trabalhador celetista, mera externalização de riscos e custos empresariais.
Ademais, tais falsas cooperativas se organizam, em geral, de forma bastante afastada dos ideais de gestão democrática por parte dos sócios, não sendo exagerado dizer-se que, em muitas delas, os diretores tornam-se “donos” da cooperativa e seus principais beneficiários. Ainda pior: estas pseudo-cooperativas tornaram-se instrumentos de precarização do trabalho, a mercê de empresas inescrupulosas e de administradores públicos irresponsáveis.
Na prática, tal onda de falsas cooperativas de trabalho se formou a partir da modificação do art. 442 da CLT pela Lei n. 8.943/94, que introduziu um parágrafo único, no qual se explicita que não existe vínculo entre cooperativa e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviço.[20]
Na realidade, a inserção de tal disposição normativa era absolutamente desnecessária ante a clareza do art. 90 da Lei n. 5.764/71[21], sendo claro que este se aplica, evidentemente, apenas nos casos de verdadeiras cooperativas. Da mesma forma, a inexistência de vínculo entre trabalhador terceirizado e o tomador dos serviços é elemento estrutural da própria relação terceirizada, algo que, por óbvio, se aplica somente aos casos de terceirização lícita. Assim, a modificação normativa produzida pela alteração do art. 442 foi completamente desnecessária, já que apenas repetiu o que já estava contido em outros dispositivos legais.
Porém, apenas da inocuidade da norma, operou-se um efeito sociológico negativo, pelo qual passou-se a interpretar como se houvesse produzido uma autorização legal para a intermediação de mão-de-obra através das cooperativas de trabalho, em afronta direta às normas celetistas e a jurisprudência pacífica da Súmula 331, I do TST.
Em uma interpretação reducionista e assistemática, passou-se a entender tal modificação legislativa como uma salvaguarda de toda e qualquer relação de trabalho cooperativada dos riscos de reconhecimento do vínculo empregatício, pretendendo-se afastar tais hipóteses do crivo previsto nos artigos 2º e 3º da CLT. Assim, por tal interpretação, bastaria o simples rótulo de “trabalho cooperativo” para afastar a possibilidade de enquadramento como relação empregatícia, abrindo-se a porta para todo tipo de fraude e de sonegação aos direitos trabalhistas.
Na verdade, o sistema de proteção ao trabalho consagrado pela CLT se destina, fundamentalmente, ao trabalhador assalariado e, portanto, um dos pilares de tal sistema se assenta justamente na possibilidade de desconstituição de situações fraudulentas e no seu reconhecimento como relações empregatícias, assegurando-se ao trabalhador todos os direitos previstos em lei para os empregados (art. 9º CLT).
Assim, numa interpretação mais rigorosa do parágrafo único do art. 442, temos que não se criou uma “imunidade jurídica” à aplicação do art. 9o da CLT. Tal artigo limitou-se a repisar o que a própria legislação sobre as cooperativas já previa, ou seja, a inexistência de vínculo empregatícios entre as cooperativas e seus associados.
Entretanto, a ambigüidade da redação da norma em questão foi utilizada para a “subtração de direitos trabalhistas, provocando em conseqüência uma enxurrada de ação na já assaz congestionada Justiça do Trabalho”.[22] De forma pouco crítica, parte da doutrina e da jurisprudência admitiram a modificação legislativa como uma ampliação sem precedentes das possibilidades de contratação de trabalhadores a margem da CLT. Chegou-se, mesmo, a entender a inexistência de qualquer óbice legal à contratação de trabalhadores cooperativados em relações de terceirização da atividade-fim do tomador dos serviços[23], vulnerando-se à limitação à atividade-meio prevista no Enunciado 331 do TST.
Quanto à inexistência de relação empregatícia entre o cooperado e o tomador dos serviços, por interpretação sistemática, a resposta passa, como em qualquer outra situação de trabalho, pela análise concreta à luz das normas celetistas.
Na esteira da conhecida precarização laboral através da terceirização, a multiplicação das formas cooperativadas de trabalho[24], infelizmente, se deveu mais ao interesse empresarial de redução de custos do que a um verdadeiro movimento em direção a formas autogestionárias de trabalho.
Conforme PAUL SINGER, as próprias empresas
“criavam cooperativas de trabalho, com seus estatutos e demais apanágios legais, as registram devidamente e depois mandam seus empregados se tornarem membros delas, sob pena de ficar sem trabalho. Os empregados são demitidos, muitas vezes de forma regular, e continuam a trabalhar como antes, ganhando o mesmo salário direto, mas sem o usufruto dos demais direitos trabalhistas. Estas são as falsas cooperativas também conhecidas como cooperfraudes e outros epítetos. São cooperativas apenas no nome, arapucas especialmente criadas para espoliar os trabalhadores forçados a se inscrever nelas”.[25]
Com inteira razão, a reação a tais novas formas de precarização surgiram por parte da doutrina, de Auditores-Fiscais do Trabalho, de Procuradores do Trabalho e, também, por parte do Judiciário do Trabalho. Numa ofensiva contra a precarização laboral, o Ministério Público do Trabalho, em inúmeros casos, através de Termos de Ajustamento de Conduta, inviabilizou a continuidade das operações de falsas Cooperativas de Trabalho e a Justiça do Trabalho, em tantos outros casos, reconheceu o vínculo empregatício dos trabalhadores associados de falsas cooperativas diretamente com o tomador dos serviços.
Em relação à pseudo-cooperativas contratadas pela administração pública, a Justiça do Trabalho – provavelmente para evitar os efeitos da Súmula n. 363[26] - tem adotado critério duvidoso de reconhecer o vínculo empregatício diretamente com a falsa Cooperativa e o ente público subsidiariamente. Ainda que se compreenda que tal tipo de decisão logre assegurar aos trabalhadores todos os direitos previstos em lei – escapando do reconhecimento da contratação nula que, segundo a jurisprudência do TST, reduz tais direitos aos salários pactuados e o FGTS -, não se pode deixar de observar a impropriedade técnica de tais decisões, já que, em tais casos – como, de resto, em todos os casos de terceirização ilícita -, o real empregador é o ente público.
Embora plenamente compreensível tal reação contra o falso cooperativismo, não se pode deixar de apontar os excessos e os exageros a que se chegou; tanto na prática, ao pretender apontar todo e qualquer trabalho cooperativado como fraude à legislação celetista; como na doutrina, ao se negar até mesmo a possibilidade de existência das cooperativas de trabalho.
Não há contradição entre o verdadeiro movimento cooperativo e a luta contra a precarização laboral. Na realidade, a eliminação das fraude-cooperativas se constitui hoje no ponto central para a emersão das reais cooperativas de trabalho, seguidoras dos princípios do movimento cooperativo internacional, baseado nos valores do trabalho decente, da solidariedade e na participação democrática.
A questão central que se coloca não é a da compatibilidade das cooperativas de trabalho com o ordenamento jurídico nacional, mas sim, a possibilidade concreta de que cooperativas de trabalho atinjam suas próprias finalidades, em especial a da melhoria das condições de vida e de trabalho de seus associados.