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Conteúdo dos institutos do plebiscito, referendo e iniciativa popular

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Conclusões

A título de conclusão, pode-se dizer que:

Quanto à iniciativa popular, percebe-se que esta se refere exclusivamente a leis, pelo que se descarta a utilização desta via para a apresentação de atos administrativos, além do que a Lei Federal nº 9.709/98, em seu art. 13, estabeleceu que a iniciativa deve se restringir a projetos de lei, ficando de fora do seu campo de abrangência projetos de Emenda Constitucional.

Na mesma linha, constituiria violação indireta à Constituição permitir-se a iniciativa popular legislativa acerca de matérias de iniciativa privativa de certo órgão ou pessoa (Presidente da República, STF, ...).

Seguindo-se nessa toada, se a Constituição determina a impossibilidade de se legislar sobre determinado conteúdo, como as cláusulas pétreas, previstas no § 4º do art. 60, é lógico que não se pode, por meio dos mecanismos de participação popular, fraudar-se tal vedação.

Ainda nessa linha, a consulta popular não pode alterar as regras de divisão de competências entre os entes federativos, nos termos estabelecidos no texto constitucional, devendo prevalecer no território municipal as questões de preponderante interesse local, nos Estados as questões de interesse regional e no plano nacional questões de interesse nacional.

De outra banda, a participação popular direta pode ocorrer, inclusive, em temas constitucionais, pois ela não elimina a exigência de emenda constitucional, mas apenas acrescenta a consulta popular aos outros requisitos do processo legislativo.

Quanto à iniciativa popular legislativa, é de bom alvitre lembrar-se que esta apenas altera o momento inicial do processo legislativo, quer dizer, ela apenas provoca uma alternância na legitimidade ordinária para a propositura dos projetos de lei. Dessa forma, seria uma contradição em termos torná-la obrigatória, pois seria o mesmo que afirmar que projeto proposto é projeto aceito, passando-se por cima da deliberação, donde ela ser, sempre, consultiva.

No tocante ao plebiscito com objeto especificado no próprio texto constitucional, no art. 18, §§ 3º (c/c 48,VI) e 4º, e repetido na legislação ordinária regulamentadora (Lei nº 9.709/98, arts. 4º, 5º e 7º), há diferença estabelecida pelo legislador quanto a sua vinculabilidade ou não. Explica-se: ao mesmo tempo que o legislador impôs a obrigatoriedade do plebiscito para que haja a incorporação, fusão ou desmembramento, criou também mais um elemento necessário à materialização do fato, qual seja a necessidade de aprovação por meio de lei complementar federal para Estados, e de lei estadual (obedecendo os requisitos estabelecidos em lei complementar estadual) para Municípios.

Pela justificativa da inclusão da exigência de lei complementar percebe-se que o legislador constituinte, nesse caso, elegeu o efeito consultivo para a consulta em questão, uma vez que o poder Legislativo pode deliberar diferentemente do que as populações interessadas decidiram, devido ao aspecto especial de que se reveste a questão (por envolver o princípio federativo, erigido à condição de cláusula pétrea pela CF).

Ademais, decidir que questões devem ser submetidas a plebiscito ou referendo é atitude privativa dos titulares da legitimidade para propositura da consulta, todavia, uma vez que se opte pela sua realização, está-se realizando o princípio da soberania da vontade popular, constante do art. 1º da CF, em seu mais puro significado. Dessa forma, uma vez que se decida a favor da consulta popular, a regra é que a mesma gere efeitos vinculantes, cabendo ao povo a palavra final; só se admitindo a interpretação contrária caso haja ressalva expressa posta na lei.

Outrossim, destaque-se que no plebiscito a consulta é prévia em relação à deliberação quanto ao ato, de forma que o poder público tem uma margem de liberdade um pouco maior do que no referendo, ou seja, o poder competente para a elaboração da lei ou ato vincula-se à vontade popular, mas não nos absolutos termos do que ocorre no referendo, pois ainda haverá a redação do texto, podendo o poder competente, nesse momento, estabelecer um conteúdo eficacial um pouco maior ou menor.

Por outro lado, a regra é a facultatividade da realização das consultas ou apresentação dos projetos populares, pois a manifestação popular só se dá quando a população resolve propor, segundo os requisitos legais, determinada lei, ou quando o titular do poder de convocação da consulta decide realizá-la.

Entretanto, tal regra tem exceção, manifestando-se esta no caso em que a Lei Maior elege a consulta popular elemento do suporte fáctico de determinada normatividade, o que acontece nas normas que se referem a desmembramento, fusão ou incorporação de Estados ou Municípios.


Notas

[2]  FERREIRA, Pinto. Comentários à Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 1990, vol. I, p. 189.

[3] BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A Cidadania Ativa: Referendo, Plebiscito e Iniciativa Popular. São Paulo: Ática, 1998, p. 35.

[4] DANTAS, Francisco Wildo Lacerda. Reflexões Sobre o Processo Legislativo e a Participação Popular, Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 628: 30-62, fev. 1998, p. 105.

[5] Nesse sentido: SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 126. AFFONSO, Almino. Democracia Participativa: plebiscito, referendo e iniciativa popular. Revista de Informações Legislativas. Brasília: Senado, nº 132: 11-27, out./dez. 1996, p. 17. CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989, Vol. II,  p. 1095 s.

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[6] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6ª ed. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p.249.

[7] BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A Cidadania Ativa: Referendo, Plebiscito e Iniciativa Popular. São Paulo: Ática, 1998, p. 139.

[8] COMPARATO, Fábio konder. Emenda e Revisão na Constituição de 1988. Revista de Direito Público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 93: 128, 1990, p. 93.

[9] BRITTO, Carlos Ayres. Inconstitucionalidade do Plebiscito Sobre a Pena de Morte. Revista de Direito Público. São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 60: 70-75, out./dez. 1991, p. 72.

[10] AFFONSO, Almino. Democracia Participativa: plebiscito, referendo e iniciativa popular. Revista de Informações Legislativas. Brasília: Senado, nº 132: 11-27, out./dez. 1996, p. 23.

[11] BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A Cidadania Ativa: Referendo, Plebiscito e Iniciativa Popular. São Paulo: Ática, 1998, p. 135.

[12] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Existência. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 40 s.

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Sobre o autor
Angelo Braga Netto Rodrigues de Melo

Especialista e Mestre em Direito pela UFAL. Professor de Direito Civil, Administrativo e Tributário dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação de diversas instituições de Ensino Superior. Autor do livro "Substituição Tributária Progessiva no ICMS - Teoria e Prática". Procurador de Estado. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Angelo Braga Netto Rodrigues. Conteúdo dos institutos do plebiscito, referendo e iniciativa popular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3780, 6 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25704. Acesso em: 16 abr. 2024.

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