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Sua Excelência, o voto em branco

29/01/2014 às 13:33
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A inclusão – justa, legítima e oportuna – dos votos em branco para fins de votos válidos representará uma espécie de legítima clausula de barreira, dificultando o tão danoso fracionamento partidário.

O voto em branco é dado quando o eleitor não especifica na cédula o candidado a ser votado. Na urna eletrônica, quando se pressiona a tecla "branco", ao invés do número do candidato, e o voto é assim confirmado.

Nas eleições de 2012, para vereador (proporcional), foram considerados 107.316.764 votos válidos. Os votos em branco totalizaram 4.888.450 e os votos nulos, 5.046.608.

Nesse tipo de manifestação (voto em branco) o eleitor comparece porém não escolhe nenhum dos candidatos.

De acordo com a lei 9.504, de 30 de Setembro de 1997, o voto em branco não é computado para candidato nem partido político. Assim, tanto os votos em branco como os votos nulos não possuem validade de seleção de candidatos (Lei 9.504/97, arts. 2º, 3º e art. 5º; CF/88, art. 77§ 2º). Enfim, os votos brancos e nulos não são computados para fins de “votos válidos”.

Apesar dos efeitos serem os mesmos (não se escolhe nenhum candidato), no voto nulo se digita, na urna eletrônica, o número de um partido que não existe ou se rasura a cédula eleitoral. No voto em branco, o eleitor efetivamente comparece mas não escolhe nenhum candidato. Pressiona conscientemente a tecla Branco na urna e finaliza sua participação. Pode até significar que, caso houvesse outros candidatos, poderia votar neles.

Diferentemente do voto em branco, o voto nulo é um protesto do eleitor que pode ser facilmente entendido como sua insatisfação até mesmo ao seu mero comparecimento. Ou seja, apesar desse eleitor ter comparecido na eleição, em tese ele disse que “não compareceu”, eis que poderia ter registrado a opção “branco”.

Posto haver diferenças entre ambos (voto branco e nulo), pensamos ser relevante (e justo) dar um tratamento igualmente diferente a ambos, privilegiando o comparecimento dos eleitores (que registraram o voto em branco) dos que “não compareceram” (voto nulo).

No caso dos votos em branco, considerando que os eleitores efetivamente compareceram e manifestaram-se, entendemos que devem ter, na eleição proporcional (deputados e vereadores), importância para fins de determinação do coeficiente eleitoral e, por extensão, do coeficiente partidário, como era previsto no Código Eleitoral (Parágrafo único, art. 106) antes do advento da Lei 9.504/97:

Contam-se como válidos os votos em branco para determinação do quociente eleitoral”.

Esse Parágrafo único foi revogado (equivocadamente, ao nosso ver) pela Lei 9.504/97, no seu art. 5º, que tem o seguinte teor:

nas eleições proporcionais, contam-se como válidos apenas os votos dados a candidatos regularmente inscritos e às legendas partidárias”.

Vale dizer que o coeficiente eleitoral é regulado pelo art. 106 do Código Eleitoral:

Art. 106. Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior.

O coeficiente eleitoral é (em tese) o número mínimo de votos que cada candidato precisa obter para se eleger, sem depender de ninguém.  

Importante lembrar que o art. 2º e 3º da Lei 9.504/97 mais o art. 77§ 2º, CF/88 tratam da eleição majoritária (Presidente da República, Senador, Governador e Prefeito)

Ao se considerar os votos em branco como votos válidos – e não temos nenhuma dúvida quanto a isso -, teremos como consequência lógica a elevação da base de cálculo (dos votos válidos), ou seja, um dividendo maior, uma vez que os votos em branco somaram aos votos dados aos candidatos.

Tendo por base os números das eleições de 2012, caso os votos em branco fossem válidos, o dividendo passaria de 107.316.764 para 112.205.214, representando um acréscimo de 4,55% na base.

Dessa forma, teremos a elevação do coeficiente eleitoral (votos válidos/lugares a preencher), conferindo maior legitimidade aos eleitos. Dito de outro modo, serão necessários mais votos para que o candidato se eleja. Considerando as eleições de 2012, seria necessário, na média, um esforço e resultado 4,55% maior.   

Por sua vez, o coeficiente partidário é determinado pelo art. 107 do Código Eleitoral:

Art. 107 - Determina-se para cada Partido ou coligação o quociente partidário, dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas, desprezada a fração.

A importância do coeficiente partidário é que esse número é que determinará a quantidade de parlamentares que cada partido (ou coligação) político terá direito, na respectiva eleição.

Ora, ao se elevar o coeficiente eleitoral (art. 106), temos que o valor do divisor (do art. 107) será maior. Ao se dividir o número de votos válidos (que é o dividendo) dado para a legenda (partido), pelo coeficiente eleitoral (que nessa operação matemática é o divisor, ampliado pela inclusão dos votos em branco), temos que o resultado (quociente) dessa divisão será um número obviamente menor.

Ou seja, sucintamente, quanto menos votos os partidos/coligações receberem (dividendo), e quanto maior for o número de votos válidos (divisor), menor será o quociente (vagas conquistadas pelo partido/coligação).

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A inclusão – justa, legítima e oportuna – dos votos em branco para fins de votos válidos representará uma espécie de legítima clausula de barreira, dificultando o tão danoso fracionamento partidário (que implica na excessiva divisão das forças políticas), além de mitigar o surgimento dos denominados “partidos de aluguel”.

É essa excessiva divisão das forças políticas que, nas palavras do saudoso Pinto Ferreira,

“cria assembleias tão fragmentárias, que só se consegue chegar à formação das maiorias e, consequentemente, à organização de governos mediante coligações aleatórias, precárias e não raro, imorais” (...) o excesso de grupos enleia e esteriliza a ação governamental”. (Cod. Eleit. Coment., 1991)

Afirmamos tratar-se de “legitima clausula de barreira”, porque teria sido definida pelo próprio eleitorado que compareceu às eleições, não por uma lei supostamente casuística, como muitos afirmam sempre que se discute uma forma de se evitar a proliferação de partidos políticos.

Por consequência, a inclusão dos votos em branco nos votos válidos, para fins de coeficiente eleitoral, fortalece a Democracia.

Tão importante quanto, é uma forma de ouvir a voz das ruas eis que, sem duvida alguma, o voto em branco é, por analogia, semelhante às recentes manifestações populares que fizeram das ruas a sua tribuna.

Portanto, deve retornar ao art. 106, do Código Eleitoral, o Parágrafo único, com a seguinte redação:

Contam-se como válidos os votos em branco para determinação do quociente eleitoral

A Democracia agradece.

(*) Voto em branco, no caso do título, é o eleitor que compareceu às eleições e, conscientemente, manifestou-se, não votando em nenhum dos candidatos.  

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Sobre o autor
Milton Cordova Junior

Advogado, Mestrando em Estudos Jurídicos Avançados, pós-graduado em Direito Público, com Extensão em Defesa Nacional pela Escola Superior de Defesa, extensões em Direito Constitucional e Direito Constitucional Tributário. Empregado de empresa pública federal. Recebeu Voto de Aplauso do Senado Federal por relevantes contribuições à efetivação da cidadania e dos direitos políticos (acesso in http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2007/09/26/ccj-aprova-voto-de-aplauso-ao-advogado-milton-cordova-junior). Idealizador do fundo de subsídios habitacional denominado FAR - Fundo de Arrendamento Residencial, que sustenta o Programa Minha Casa Minha Vida, implementado por meio da Medida Provisória 1.823/99, de 29.04.1999.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORDOVA JUNIOR, Milton. Sua Excelência, o voto em branco. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3864, 29 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26539. Acesso em: 18 abr. 2024.

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