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Do sujeito ativo nos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional

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01/02/2002 às 01:00
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CAPÍTULO 2 - SOCIETAS DELINQUERE NON POTEST

2.1. Princípio da societas delinquere non potest

Discute-se muito, hoje, se é possível impor uma sanção penal à pessoa jurídica, relegando a segundo plano o princípio da Societas delinquere non potest.

O momento é bastante oportuno para tal discussão, pois, modernamente, é muito grande o número de pessoas que criam uma pessoa jurídica para delinqüir. Desse modo, pensam que podem sair ilesos de uma condenação, ou mesmo, se acobertam com o manto da pessoa jurídica para se eximir de qualquer punição.

É, por isso, que há muitos juristas que defendem a imposição de sanção penal à pessoa jurídica.

Por outro lado, aqueles que defendem que não é possível punir penalmente uma pessoa jurídica têm argumentos contundentes, pois, amparam-se na exegese da própria Constituição de 1988 e do Código Penal Brasileiro.

2.2. Posição doutrinária

Acentua o eminente penalista Francisco de Assis Betti:

"Nos países cujos sistemas penais seguem princípios de direito continental europeu rege o princípio societas delinquere non potest, não sendo admitida a punição das pessoas jurídicas ou das associações despersonalizadas, a não ser por sanções administrativas" (7)

Portanto, não podemos cogitar de responsabilidade penal da pessoa jurídica em nosso sistema jurídico, pois, o direito penal assenta-se no princípio da culpabilidade. O nosso sistema jurídico não acolheu a responsabilidade objetiva ou qualquer espécie de responsabilidade pelo resultado. Vige, assim, o princípio da culpabilidade que requer a subjetividade da responsabilidade penal.(8)

Assim, quando se refere à responsabilidade penal, esta será sempre a subjetiva. Por isso, afirma-se que será sempre uma pessoa, o sujeito ativo de um ilícito penal, nunca uma pessoa jurídica que é uma ficção de direito. Esta não pode agir sem que uma pessoa o faça em seu nome.

Desse modo, aqueles que afirmam que a pessoa jurídica não tem capacidade penal filiam-se à teoria da ficção, tendo como principal expoente Savigny.

A discussão acerca da natureza da pessoa jurídica está longe de acabar. É certo que a lei é que atribui capacidade de exercer direitos e contrair obrigações.(9) Desse modo, não se pode dizer que a pessoa jurídica se equivale ao homem, apenas tem alguma capacidade semelhante à da pessoa natural. Obviamente, não deriva de tal capacidade existência visível ou mesmo pessoa natural ou física.

A pessoa jurídica, sempre, existirá através da criação do legislador. Como já foi dito, é um ente, uma ficção jurídica que existe para o atingir os interesses coletivos.

Dificilmente, poderá se imputar uma sanção penal a um ser inanimado, tal é a pessoa jurídica; pois, aquela sempre pressupõe privação ou restrição de liberdade; perda de bens; prestação social alternativa, suspensão ou interdição de direitos.

Por conseguinte, a partir do conceito de pena, não se pressupõe que uma pessoa criada pela ficção jurídica possa ser destinatário dela. Pois, pena é uma sanção do Direito Penal imposta pelo Estado ao infrator da lei.(10)

Assim, pode-se afirmar que uma pessoa jurídica, ficção que é, não conseguiria sentir como um ser humano, e, conseqüentemente, entenda que a pena infligida seja uma retribuição pelo ilícito cometido. Desse modo, não venha a delinqüir mais, por causa, do sofrimento imposto pelo Estado.

Naturalmente, embora se negue a imputabilidade criminal à pessoa jurídica, pode ela sofrer sanção civil e administrativa, inclusive ser extinta quando o seu objeto for ilícito. Nesse sentido, preceitua o art. 21, do Código Civil:

"Art. 21. Termina a existência da pessoa jurídica:

III – pela sua dissolução em virtude de ato do Governo, que lhe casse a autorização para funcionar, quando a pessoa jurídica incorra em atos opostos as seus fins ou nocivos ao bem público".

Nesse sentido dispõe o Decreto-lei n.º 9.085/46.(11)

Tal sanção é de natureza civil ou mesmo administrativa; neste caso, o fim a que foi criada a pessoa jurídica é ilícito.

Vale ressaltar aqui que toda teoria criada em torno da pessoa jurídica aplica-se no direito civil e, inclusive, no direito administrativo. Por outro lado, o escopo do direito penal é o "homem". Pois, somente este pode agir ou não agir (omitir).

Existem doutrinadores que admitem a capacidade penal da pessoa jurídica, embasado na teoria da realidade das instituições jurídicas ou da realidade jurídica. Fala-se que essa teoria é a mais aceita hodiernamente. Realmente, pode ser no âmbito do direito civil. Segundo a teoria da realidade, tanto as pessoas jurídicas quanto as pessoas físicas são criadas pelo Direito que lhes confere personalidade.(12) Assim, ambas podem ser sujeitos ativos de um crime, e por conseguinte, sofre a sanção penal.

Acrescente-se, ainda, que no Direito Penal anglo-americano, cujo sistema é o da "Common Law", que consiste em analisar os "Precedent Cases" para interpretar o caso concreto, vige a responsabilidade penal da pessoa jurídica.

No sistema penal português, a responsabilidade penal da pessoa jurídica não é clara, está implícita na lei. Preceitua o art. 11 do Código Penal Português de 82: "Salvo disposições em contrário, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal".(13)

O professor Francisco de Assis Betti assevera que existe a responsabilidade penal das pessoas coletivas no sistema português, em lei especial (14)

Algumas legislações estrangeiras, realmente, acolhem a responsabilidade criminal das pessoas coletivas, todavia, não deixa claro como será impingido uma sanção penal a elas.

No Direito Penal Brasileiro, depara-se com a Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que trata dos crimes ambientais, que preceitua em seu art. 3º, parágrafo único que as pessoas jurídicas respondem administrativa, civil e penalmente e, não excluindo a responsabilidade de qualquer pessoa que participe do ilícito; o art 4º dispõe sobre a desconsideração da pessoa jurídica.

Note-se que a própria lei 9.605/98 preceitua que as pessoas jurídicas responderão penalmente "nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade."

Assim, há uma certa ambigüidade na redação desta lei. Todavia, não há de se falar em imputação criminal diretamente à pessoa jurídica. Ocorre que, na verdade, o legislador restringiu a responsabilidade da pessoa jurídica, respondendo ela, apenas, civil e administrativamente. Desse modo, o legislador estabeleceu um liame jurídico entre a pessoa coletiva e seu representante legal ou

contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Ele apenas estabeleceu uma relação mais estreita entre a pessoa jurídica e aqueles

que a administram.

O parágrafo único da Lei em comento não acrescenta nada. Pois, sempre que uma pessoa jurídica estiver envolvida em crime, haverá por detrás dela uma pessoa física que a administra, controla. Enfim, a pessoa jurídica serve somente como meio para o cometimento do ilícito penal.

Veremos que o capítulo II que trata da aplicação da pena não impingiu nenhuma sanção penal às pessoas jurídicas, somente sanção administrativa.

Observe-se que as penas impostas no arts. 11, 21, 22, 23 e 24, da mesma Lei, são administrativas. Além do mais, estas estão no Capítulo II, que trata da Aplicação da Pena,

Impende salientar que as penas de perda de bens, multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade são administrativas.

No que tange à imputação penal à pessoa física, note-se que o legislador colocou no Capítulo V, dando o seguinte título: Dos crimes contra o meio ambiente. Assim, aqui, tem-se o crime cometido pelo homem não a pessoa jurídica. As penas nesse capítulo variam de detenção à reclusão.

Por conseguinte, não foi intenção do legislador impor sanção penal às pessoas coletivas. Pois, não poderia aplicar-lhes a pena de detenção ou reclusão.

Cumpre, outrossim, salientar o ensinamento do penalista Francisco Munoz Conde(15) "Do que foi até agora exposto se depreende que só a pessoa humana, considerada individualmente, pode ser sujeito de uma ação penalmente relevante."

O Direito Penal "regula as relações do indivíduo com a sociedade."(16) Assim, ao cometer um delito a pessoa física fica exposta ao jus puniendi do Estado. Da punição do Estado, sempre, advirá uma sanção penal, caso se prove autoria e materialidade do crime.

Portanto, a sanção penal não é impingida aleatoriamente. Haverá um processo antecedendo toda punição do Estado. Desse modo, existirá para o Estado a "pretensão punitiva" contra aquele que pratica a conduta proibida. Todavia, ao mesmo tempo que surge a pretensão punitiva para o Estado, este, também, tutela o jus libertatis do autor do crime. Há uma relação complexa entre Estado e autor do crime.(17)

Desse modo, há por um lado os interesses do autor do crime e por outro os interesses do Estado, os quais são interesses da sociedade representada pelo Estado. Na verdade, as partes (autor do crime, juiz-estado, promotor representante do jus puniendi do Estado) vão construir o provimento final do dado pelo Juiz (sentença condenatória ou absolutória).

Por conseguinte, à luz da moderna teoria do processo penal, não se admite uma pessoa jurídica, ente inanimado, coisa ou mesmo um animal participasse de um processo penal, compondo uma lide penal em perfeita simetria entre as partes. Pois, o escopo do processo é preparar o provimento jurisdicional, exigindo, desse modo, para atingir seu fim "a participação dos destinatários da sentença em sua própria formação".(18)

Dificilmente, a pessoa jurídica poderia ser parte no processo penal, pois, não tem vontade própria para percorrer os vários estágios do processo até o atingimento do provimento jurisdicional.

Já ensinava, há muitas décadas, Clóvis Bevilaqua que as pessoas jurídicas não têm vida, "não tem existência biológica das pessoas naturais."(19)

Assim, os ensinamentos de direito civil, de há muito tempo, ainda reverberam na doutrina penal de hoje.

Por fim, vige no Direito Penal moderno, o caráter pessoal do ilícito penal, o princípio da culpabilidade, o princípio da personalidade da sanção penal e sua individualização conforme nossa Constituição da República Federativa do Brasil.(20)

Por conseguinte, a questão das sanções impingidas à pessoa jurídica não deve ser tratada no âmbito do Direito Penal, pois, há outros meios de puni-la sem desprezar os postulados da responsabilidade subjetiva.

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2.3. O Código Penal Brasileiro

A legislação brasileira não acolheu a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Analisando-se o Código Penal Brasileiro no que se concerne ao crime e a pena, concluímos que aquele não faz qualquer alusão à sanção penal das pessoas jurídicas.

Mormente, os artigos 18, inciso I, II e parágrafo único; 19; 20, § 1º, 2º e 3º; 21, parágrafo único que tratam da imputabilidade penal. Ademais cite-se o artigo 59 que trata da pena.

Assim, estabelece o art. 18, I, do Código Penal:

"Art. 18: Diz-se o crime:

I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

II - Culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente."

Desse modo, para se punir o agente de um crime, é necessário que ele tenha consciência e vontade para realizar o tipo penal.(21)

A primeira parte do art. 18, inciso I, "doloso, quando o agente quis o resultado", traduz-se na vontade do agente em realizar a conduta proibida, isto é, há um ato volitivo para cometer o crime.

A segunda parte, "ou assumiu o risco de produzi-lo", diz que o agente não quer realizar o tipo penal, quer algo diferente, todavia, assume o risco de produzir o resultado perpetrado pelo tipo penal.

Conforme Julio Fabbrini Mirabete, a primeira parte do art. 18, I, há dolo direto e na segunda parte, há dolo eventual.(22)

Com salienta o eminente penalista Cézar Roberto Bitencourt: "O dolo é constituído por dois elementos: o cognitivo e o volitivo."(23)

Em relação ao art. 18, II, é a doutrina é que vai definir o que é imprudência, negligência e imperícia.

A doutrina define culpa como sendo "a inobservância do dever objetivo de cuidado manifestada numa conduta produtora de um resultado não querido, objetivamente previsível."(24)

Ademais, para responsabilizar penalmente um agente, é necessário, também, levar em consideração o artigo 20, § 1º, 2º e 3º; 21, parágrafo único em cotejo com as terias sobre dolo e culpa já apresentadas.

Assim, depreende-se dos artigos analisados que para realizar o tipo penal, na parte especial do Código Penal, é mister ser uma pessoa.

As normas contidas no Código Penal em relação ao crime doloso e culposo são de observância obrigatória no momento da adequação do fato típico.

Por isso, não de cogitar da responsabilidade penal das pessoas jurídicas por não terem elas capacidade de ação.

As normas contidas no Código Penal acerca da responsabilidade penal é harmoniosa. Elas se autocompletam na aplicação da pena.

Harmonizando com os artigos estudados, também, há de se observar o art. 59, para a fixação da pena.

O art. 59 estabelece os limites em que o juiz fixará a pena do autor do ilícito penal.

O primeiro critério para fixar a pena é o da culpabilidade. Assim, para que o agente responda penalmente, é necessário que haja culpabilidade.(25)

Além do mais, na reconstrução do "fato histórico", o juiz há de inquirir acerca do dolo e culpa do agente.(26) Todavia, mesmo havendo dolo, o agente não responde pelo crime, quando estiver amparado pelas excludentes de antijuridicidade. (27)

Assim, pergunta-se como as pessoas jurídicas poderiam ser responsáveis penalmente sem que tenham dolo ou culpa. Portanto, nosso sistema jurídico nem sequer cogita da responsabilidade penal desses entes por ser inconcebível como o modelo jurídico vigente no Brasil.

Além do mais, os artigos 1º ao 4º da Lei 7.210, de 11 de julho de 1984, de execução penal, dá nos uma idéia de que o objetivo da execução penal é a reeducação e a reinserção do preso na sociedade.(28)

Por isso, dificilmente, poder-se-ia harmonizar os dispositivos do Código Penal e da Lei de execução penal para imputar responsabilidade penal à pessoa jurídica.

Por conseguinte, o melhor a se fazer é deixar a responsabilidade das pessoa jurídicas no âmbito civil e administrativo. Pois, o direito penal moderno repugna a responsabilidade objetiva que, em última análise, em se admitindo a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, estar-se-ia acolhendo a responsabilidade objetiva.

2.4. A Constituição da República Federativa do Brasil e a responsabilidade das Pessoas Jurídicas no Direito Penal

Dispõem o art. 173, § 5º e 225, § 3º, da Constituição da República Federativa do Brasil:

"Art. 173, § 5º: A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-se às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular."

"Art. 225, § 3º: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."

Discutem os doutrinadores, se, a partir, dos artigos 173, § 5º e 225, § 3º, passou-se a admitir a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. São muitos os que respondem positivamente. Todavia, entende-se que não pode haver responsabilidade penal às pessoas jurídicas, pois, se se admitisse tal situação, estar-se-ia ferindo o princípio da culpabilidade o qual está implícito na Constituição da República. Inferindo-o, também, através do princípio da personalidade da pena, insculpido no art. 5, XLV, da Carta Magna.

Ademais, as normas constitucionais têm de ser interpretadas harmonicamente com o todo. De acordo com a exegese de outros artigos da Constituição que tratam da matéria penal, depreende-se que somente o homem tem capacidade penal.

Além dos o art. 5º, XLVIII preceitua que a pena será cumprida em estabelecimento distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; art. 5º, LXII – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.

Não se admite pena privativa de liberdade de liberdade das pessoas jurídicas nem sequer no âmbito do Direito Econômico. (29)

Ademais, através de uma análise minuciosa das leis especiais que tratam dos crimes contra a ordem econômica, não se vislumbrou, em momento algum, a responsabilidade penal da pessoa jurídica. As várias sanções mencionadas nessas leis são civis ou administrativas.

Portanto, observe-se que as seguintes leis não fazem nenhuma alusão à responsabilidade penal da pessoa jurídica de modo a comprometer o ordenamento brasileiro: a) Lei 7.492, de 16 de junho de 1986; b) Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990; c)Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990; e ) Lei 9.069, de 29 de junho de 1995; f) Lei 9.613, de 3 de março de 1998; g) Lei 4.357, de 16 de junho de 1964; h) Lei 4.729, de 14 de julho de 1965; i) Lei 7.505, de 2 de julho de 1986; j) Lei 8.884, de 11 de junho de 1994; l) Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.

Desse modo, não há crime praticado pela pessoa jurídica, pois, ela não responde penalmente.

Acrescente-se que a teoria da desconsideração da pessoa jurídica foi desenvolvida pelos tribunais americanos e alemães porque, muitas da vezes, não se conseguia encontrar os responsáveis pela sociedade, pois, era muito fácil ocultar o verdadeiro proprietário dos bens.(30) Entretanto, é óbvio que não podemos transportar tal teoria para o Direito Penal, pois, os bens jurídicos protegidos por ambos são completamente díspares.

A discussão em torno da responsabilidade penal das pessoas jurídicas sempre foi muito inflamada, no Brasil. Havia doutrinadores adeptos e contrários a essa idéia. Todavia, no Brasil, não há notícias de nossos Tribunais, de que alguma pessoa jurídica tenha sido responsabilizada penalmente.

Convém lembrar que no campo da responsabilidade penal internacional não foi tão pacífico.

O professor Carlos Augusto Canêdo Gonçalves da Silva, em brilhante tese de doutorado expõe a experiências da justiça penal internacional, externalizada pelo julgamento da Alemanha e do Japão por crimes de Guerra (2º guerra mundial). Assim, assevera o ilustre professor que o Tribunal de Nuremberg pecou em não ter observado "o princípio da legalidade e da irretroativadade da lei penal mais grave." Por fim, ao examinar o sujeito ativo do crime de genocídio, Carlos Augusto Canêdo Gonçalves Silva conclui afirmando que: "Só a pessoa física poderá ser sujeito ativo do crime de genocídio.(31)

O ilustre penalista José Cirilo de Vargas é contundente ao comentar o rompimento do princípio da legalidade e da Societas delinquere non potest pelo Tribunal de Nuremberg.(32)

Portanto, os argumentos dos doutrinadores são vários, entretanto, os mais contundentes são do princípio da culpabilidade, da individualização da pena. Assim, em nosso sistema penal, a sanção penal está intimamente ligada à conduta do homem.

2.5. Considerações finais

Vimos que a posição doutrinária majoritária é contrário à responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Também, o Código Penal e a Constituição da República Federativa do Brasil não fazem referência à responsabilidade penal delas. Todavia, o art. 225, § 3º, da Constituição de 1988 é ambíguo ao se referir à criminalização da pessoa jurídica. Porém, a melhor exegese tem mostrado que o art. em comento, embora eivado de imperfeição jurídica, não se acolhe a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Ocorre que ele discrimina sanção penal à pessoa física e sanção civil e administrativa às pessoas jurídicas.(33)

É importante asseverar que os delitos só podem cometidos por seres humanas, portanto, os delitos são condutas humanas.(34)

E, ainda, poderíamos, imputando responsabilidade penal à pessoa jurídica, irromper com o princípio nullum crimen sine culpa que é fulcro do Direito Penal Brasileiro.(35)

Não resta dúvida que a solução à responsabilidade de pessoas jurídicas, no sistema penal brasileiro, está afeta ao direito civil e administrativo, como já ocorre nas diversas legislações especiais. Pois, somente encontramos, em nosso ordenamento, sanções civis e administrativas às pessoas jurídicas.

Urge, na verdade, efetivar a aplicação das sanções civis e administrativas às pessoas jurídicas que através de seu de controladores e administradores cometam ilícitos. Assim, as pessoas jurídicas, associações responderiam com o capital social constituidor das mesmas. E, as pessoa físicas, na medida de sua culpabilidade responderiam, também, civil, administrativa e penalmente.

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Sobre o autor
Reginaldo Gonçalves Gomes

analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, especialista em Ciências Penais Penais pela Fundação Escola Ministério Público de Minas Gerais, licenciado em Letras pela UFMG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Reginaldo Gonçalves. Do sujeito ativo nos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2655. Acesso em: 24 abr. 2024.

Mais informações

Monografia apresentada à Fundação Escola Superior do Ministério Público, em julho de 2001, para obtenção do grau de Especialista em Ciências Penais, sob a orientação do Professor Túlio Lima Vianna.

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