Resumo: O presente estudo versa sobre uma pesquisa bibliográfica, exploratória, que busca recuperar o conhecimento científico em torno do poder diretivo naturalmente adquirido pelo empregador nas relações trabalhistas. Tal poder desdobra-se primordialmente em organização, disciplina e controle sobre o trabalho e o empregado. Ocorre que este poder não é ilimitado. E nem poderia ser de modo contrário, em virtude dos direitos fundamentais garantidos a todos os homens pela Constituição brasileira, em especial, pela primazia do princípio da dignidade da pessoa humana. Muito embora a vida em sociedade exija a imposição de alguns limites e restrições para a convivência entre os seres humanos, nas relações de trabalho não seria diferente. Contudo, a autoridade que é conferida ao empregador na relação empregatícia não pode ser confundida com autoritarismo ilimitado, através da exacerbação do seu poder de direção, como se observa pela prática do assédio moral, que silenciosamente ocasiona sérios danos à saúde física e mental do empregado. Tal comportamento, contrário à moral e ao próprio ordenamento jurídico, que num primeiro momento aparenta ser inofensivo, torna-se destruidor com a reiteração e sistematização de seus atos. Assim, de extrema importância é a delineação e limitação do poder diretivo adquirido pelo empregador, principalmente sob a ótica do princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que este deve fornecer condições dignas de trabalho, não apenas do ponto de vista pessoal, mas também relativo ao próprio ambiente de trabalho, para que o exercício da profissão seja um meio de realização pessoal para o empregado.
Palavras-chave: Poder diretivo. Assédio moral. Dignidade humana.
1 INTRODUÇÃO
O objetivo científico presente trabalho é recuperar o conhecimento científico em torno do poder de direção, adquirido naturalmente pelo empregador nas relações trabalhistas. Além dos conceitos dos referidos temas, serão brevemente apresentados alguns dos limites deste poder decorrentes das relações hierárquicas de emprego, dando aso a criação de uma reflexão sobre a corriqueira e traumática pratica do assédio moral, eventualmente ocasionada por excessos no gozo do referido poder.
Como a vida em sociedade exige a imposição de alguns limites e restrições para a convivência entre os seres humanos, na relação de trabalho não seria diferente. Contudo, a autoridade que é conferida ao empregador na relação empregatícia não pode ser confundida com autoritarismo, através da exacerbação do seu poder diretivo, como se observa com a ocorrência do chamado assédio moral.
Todavia, muito tênue é a linha que separa o assédio moral dos demais atos naturais decorrentes do poder de direção. Por conta disto, deve-se ter todo cuidado para não misturar o que é realmente assédio moral, das demais discussões rotineiras.
Importante desde logo ressaltar que o poder de direção possui certos limites que devem ser respeitados para que sejam garantidos alguns direitos básicos do empregado, em especial a sua dignidade como ser humano, devidamente salvaguardada pela Constituição Federal de 1988 como princípio basilar de orientação do Estado brasileiro.
Por fim, o Método utilizado na fase de Investigação foi o Indutivo e na fase de Tratamento dos Dados o Cartesiano. A base lógica foi a indutiva. As técnicas de investigação utilizadas foram da Pesquisa Bibliográfica em livros, artigos científicos e coletâneas legais.
2 A DIGNIDADE HUMANA
A palavra dignidade é derivada do latim dignitas, podendo ser utilizada como sinônimo de honra, virtude ou consideração. Via de regra, “se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa, serve de base ao próprio respeito em que é tida.”[1]
A partir da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, a dignidade da pessoa humana garantiu reconhecimento universal e, após a Constituição Federal de 1988, assumiu perante o Estado brasileiro um papel de “valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, dede o direito à vida”, conforme expõe José Afonso da Silva.[2]
Pela sua grande carga axiológica, é extremamente difícil conceituá-la em palavras, pois sua amplitude abarca uma série de valores que podem ser objetiva e subjetivamente empregados. Nesse sentido, o jurista Guilherme de Souza Nucci muito bem esclarece que:
Objetivamente, envolve a garantia de um mínimo existencial ao ser humano, atendendo as sua necessidades vitais básicas, como reconhecido pelo art. 7º, IV, da Constituição, ao cuidar do salário mínimo (moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte, previdência social). Inexiste dignidade se a pessoa humana não dispuser de condições básicas de vivência. Subjetivamente, cuida-se do sentimento de responsabilidade e autoestima, inerentes ao ser humano, desde o nascimento, quando passa a desenvolver sua personalidade, entrelaçando-se em comunidade e merecendo consideração, mormente do Estado.[3]
Ao esmiuçar o tema dignidade humana, não há como deixar de expor o pensamento de Ingo Wolfgang Sarlet:
Assim sendo, temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida[4].
Quanto a sua influência na legislação brasileira, em especial perante as normas constitucionais, Nucci explica tratar-se de “um princípio regente, cuja missão é a preservação do ser humano, desde o nascimento até a morte, conferindo-lhe autoestima e garantindo-lhe o mínimo existencial”.[5]
Nesse sentido, Maurício Godinho Delgado, apud Regina Célia Pezzuto Rufino, muito bem reforça a grande relevância do princípio da dignidade humana perante a sociedade:
O princípio da dignidade da pessoa humana traduz a ideia de que o valor central das sociedades, do Direito e do Estado contemporâneo é a pessoa humana, em sua singeleza, independentemente de seu status econômico, social ou intelectual. [6]
Contudo, dentro dos direitos fundamentais atraídos por tal princípio, conforme explicado por José Afonso da Silva, estão os direitos sociais relativos ao trabalhador, que devem respeitar e se orientar pela dignidade da pessoa humana. Assim, de acordo com Rufino, “a dignidade do trabalhador é uma característica inerente ao ser, de valor imensurável, não se resumindo à satisfação dos interesses capitalistas, como se operário fosse uma coisa descartável”. [7]
Ainda quanto à relação entre trabalho e dignidade, importe as considerações de Maria Aparecida Alkimin:
Ora, se o trabalho é fonte de dignidade humana, e se todo homem tem dignidade, o trabalhador, como pessoa humana, tem dignidade, que condiz com a consciência moral e autonomia individual de atuar segundo as regras morais, valores, princípios éticos e costumes no seio da sociedade. A dignidade do trabalhador, como atributo natural e individual, não é valorável ou substitutível, pois a dignidade não tem preço; seu valor é intrínseco, absoluto, não se justificando encarar o trabalho como meio para satisfação dos interesses capitalistas (produção com máximo esforço, sem limite de horas, e com o mínimo custo), considerando o trabalhador como mercadoria descartável do processo produtivo.[8]
Frente ao exposto, facilmente de verifica a importância assumida pela dignidade da pessoa humana junto a legislação brasileira, em especial sua relevância para a construção não apenas das relações de trabalho, mas de todos os elementos que compõem do Estado brasileiro.
3 O PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR
3.1 O EMPREGADO E O EMPREGADOR SEGUNDO A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A relação de trabalho existente entre empregador e empregado cria uma relação jurídica[9] na qual ambas as partes são detentoras de direitos e obrigação recíprocas, com regras previstas tanto da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88), como na própria Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A CLT, segundo Valentin Carrion, “constitui o texto legislativo básico do Direito do Trabalho no Brasil, enriquecido pela legislação complementar e pela Constituição Federal”.[10]
O referido diploma legal, em seu art. 2º da CLT conceitua o empregador nos seguintes termos:
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.
§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.[11]
Segundo Amauri Mascaro Nascimento o empregador, neste caso, “é todo ente, dotado ou não de personalidade jurídica, como também o será tanto a pessoa física como a pessoa jurídica. A CLT não é taxativa ao indicar os tipos de empregador.”[12] E, ao final, conclui o referido autor que o “empregador é o ente, dotado ou não de personalidade jurídica, com ou sem fim lucrativo, que tiver empregado.”[13]
Esclarece Carrion, ainda, que o vocábulo empresa, utilizado para conceituar o empregador, “é usado como pessoa física ou jurídica que contrata, dirige e assalaria o trabalho subordinado.” [14]
Já o conceito de empregado está disposto no art. 3º da CLT, in verbis:
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual. [15]
De acordo com Valentin Carrion, o empregado seria o “sujeito de uma relação de trabalho subordinado, protegido pelo Direito do Trabalho”. E, na sequência, explica que “o direito social ampara apenas o trabalho humano pessoal; os serviços prestados por pessoa jurídica não podem ser objeto de um contrato de trabalho.” [16]
Sobre o assunto em comento, Nascimento muito bem sintetiza o conceito de empregado, nos seguintes termos: “empregado é a pessoa física que presta pessoalmente a outro serviços não eventuais, subordinados e assalariados”. [17]
3.2 ASPECTOS DESTACADOS ACERCA DO PODER DIRETIVO
Conforme se pode observar, o poder de dirigir e decidir, compreendido como um poder hierárquico superior, é o que o empregador detém por conta do comando sobre a atividade exercida pelo empregado subordinado, decorrente da relação de emprego.
Em outras palavras, “na relação de emprego, a subordinação é um e o poder de direção o outro lado da moeda, de modo que, sendo o empregado um trabalhador subordinado, está sujeito ao poder de direção do empregador”.[18]
E este poder de direção (também denominado de poder diretivo), pode ser descrito como “a faculdade atribuída ao empregador de determinar o modo como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho, deve ser exercida”, [19] como bem assevera Amauri Mascaro Nascimento.
Sergio Pinto Martins, no mesmo sentido, conceitua o poder de direção como sendo “a forma como o empregador define como serão desenvolvidas as atividades do empregado decorrentes do contrato de trabalho”.[20]
A doutrina, de um modo geral, subdivide tal poder em 3 dimensões distintas: a) Poder de Organização; b) Poder de Controle; e c) Poder Disciplinar. [21]
O primeiro poder que naturalmente aparece ao empregador é o poder de Organização. O empregador, segundo Martins, “tem todo o direito de organizar seu empreendimento, decorrente até mesmo do direito de propriedade. Estabelecerá o empregador qual atividade que será desenvolvida: agrícola, comercial, de serviços etc.” [22]
Nesse sentido, Luciano Martinez leciona que:
O poder de organização é uma variável do poder diretivo que permite ao empregador, dentro dos limites da lei, a expedição de comandos que orientam o modo como os serviços devem ser realizados. Esses comandos podem ser positivos ou negativos, gerais ou específicos, diretos ou delegados, verbais ou escritos. Quando reduzidos a termo, os atos patronais podem ser materializados em ordens de serviço, circulares, avisos, portarias, memorandos, instruções ou comunicados. [23]
Já o poder de Controle (também denominado poder de fiscalização) “permite ao empregador, dentro dos limites da lei, por atuação pessoal, de prepostos ou de aparatos mecânicos/eletrônicos, controlar a execução dos serviços de seus empregados, bem como a maneira como eles foram prestados.” [24]
Em outras palavras, “significa o direito de o empregador fiscalizar as atividades profissionais dos seus empregados”, conforme assevera Nascimento. E, segundo o referido autor, tal poder “justifica-se, uma vez que, sem controle, o empregador não pode ter ciência de que, em contrapartida ao salário que paga, vem recebendo os serviços dos empregados.” [25]
Por fim, o poder Disciplinar é a terceira manifestação do poder de direção e, segundo Nascimento, “é o direito do empregador de impor sanções disciplinares aos seus empregados.” [26]
Sobre a viabilidade deste poder, varias são as teorias existentes, não havendo entendimento pacificado acerca do tema. [27]
Contudo, entre as modalidades punitivas aplicáveis, segundo a legislação pátria, encontra-se a advertência (verbal ou escrita), a suspensão disciplinar e a dissolução contratual por justo motivo. Luciano Martinez[28] ressalta, ainda, embora de modo excepcional, a possibilidade de aplicação de multa punitiva para os atletas profissionais, com base no §1º do art. 15 da Lei n. 6.354/76 e do art. 28, caput, da Lei n. 9.615/98.
Portanto, o poder disciplinar não deixa de ser um complemento do poder de direção, ou seja, do poder do empregador determinar ordens em sua empresa. E se tais ordens não são cumpridas, podem gerar penalidades a serem legitimamente aplicadas aos empregados.[29]
3.3 A LIMITAÇÃO DO PODER DIRETIVO
Conforme anteriormente esmiuçado, a relação de emprego é marcada por polos opostos (de um lado empregador e de outro o empregado), em que há um evidente desequilíbrio de poderes (superior e subordinado).
O Estado garante ao empregador a legitimidade para exercer o seu poder de direção, em especial o poder disciplinar, o qual, por óbvio, deve sempre ser exercido dentro de certos parâmetros limitadores e razoáveis.
Ocorre que, sendo tal poder uma delegação do Estado ao empregador, a fim de possibilitar o exercício da atividade econômica, sua atuação poderia, por certas vezes, extrapolar os limites de sua legitimidade, através do exercício arbitrário, abusivo ou ilegal, atingindo diretamente os direitos de personalidade[30] do empregado.[31]
Assim, na busca da diminuição da desigualdade existente em tais relações trabalhistas, o Estado, conforme explica Rufino, “impôs regras basilares que norteiam as condições mínimas de trabalho, salientando, contudo, a importância da prevalência da dignidade moral da pessoa do empregado”. [32]
Ademais, do próprio desequilíbrio é que emerge a necessidade de serem estabelecidos limites aos poderes por uma das partes adquiridos, conforme sintetizam Bezerra e Ferreira:
A relação de emprego é marcada por dois polos opostos, o empregador, que organiza, controla e dirige a prestação de serviço, e o empregado, que presta serviço em troca de salário. Assim, em virtude desses direitos fundamentais, na relação de emprego há a necessidade de se estabelecer limites ao poder diretivo do empregador, uma vez que o empregado é a parte vulnerável desta relação. Essa limitação se dá de maneira externa, através da Constituição, das leis, norma coletiva, contrato, e de maneira interna, por meio da boa-fé objetiva e o exercício regular do direito.[33]
Desse modo, o poder diretivo deve ser executado pelo empregador com equilíbrio, sem abusos “ou exposição do trabalhador a situações vexatórias, para que os direitos fundamentais do trabalhador, nesta condição e como indivíduo, sejam respeitados e não violados, com a promoção da dignidade humana” [34]
Como forma de imposição de limites ao referido poder de direção do empregador, Maurício Godinho Delgado, citado por Rufino, anuncia o uso da sensatez e da ponderação, nos seguintes termos:
O princípio da proporcionalidade, como mandado de ponderação, atua em qualquer relação de poder, como diretriz fixadora de limitações ao exercício desse poder e suas prerrogativas. Nesta direção, são relevantes diferentes segmentos jurídicos, desde que regulem significativas relações de poder entre seus sujeitos atuantes.
No que concerne especificamente ao poder de Organização, Amauri Mascaro Nascimento esclarece, de antemão, não sê-lo absoluto, muito embora seja diretamente atrelado a atividade do empregador. Expõe, na sequência, que ele “vem sofrendo crescentes limitações impostas pelas leis, convenções coletivas e sentenças normativas, levando-se em conta a necessidade de proteger o empregado”. [35] Para tanto, aduz que:
Há, por força da legislação de alguns países, uma reforma estrutural de base na organização da empresa, para que, além de cumprir os seus fins econômicos, possa desempenhar o importante papel social a que está destinada. Assim, a organização social da empresa é uma ideia cada vez mais difundida. Significa a estruturação da empresa de modo a permitir que o trabalhador, pelos seus órgãos de representação, possa influir nas decisões. Desse modo, hoje é um verdadeiro princípio organizacional da empresa o direito de participação do trabalhador nos seus órgãos de deliberação, com o que ganha corpo e representação dos trabalhadores na empresa. [36]
E quanto à limitação ao poder Disciplinar, Martins adverte sobre a necessidade de sê-lo exercido com boa-fé. Segundo o referido autor:
O objetivo da punição deve ser pedagógico, de mostrar ao funcionário que está errado e que não deve cometer novamente a mesma falta. O uso do poder de punição por parte do empregador em desacordo com suas finalidades implica excesso ou abuso de poder. É claro que o Poder Judiciário poderá controlar a pena aplicada pelo empregador, como ocorreria se o empregado não tivesse cometido a falta ou a falta fosse inexistente. O mesmo pode-se dizer se o poder disciplinar for exercido ilicitamente ou arbitrariamente pelo empregador. [37]
O respeito aos direitos fundamentais do homem, em especial, do trabalhador, também pode ser considerado como limite ao poder diretivo do empregador. Nesse enfoque, muito bem explicam Bezerra e Ferreira que:
Um dos limites que o poder diretivo enfrenta, é de ordem pública, qual sejam os direitos e garantias fundamentais do trabalhador, de modo que, toda e qualquer atitude do empregador, ainda que no sentido de fiscalizar a atividade do trabalhador, não pode exceder os limites do razoável. No que respeita aos direitos fundamentais, vale ressaltar que a dignidade humana, consagrada na Constituição Federal de 1988, é o pilar de sustentação do ordenamento jurídico brasileiro. [...] Desse modo, a eficácia dos direitos fundamentais nestas relações deve estar diretamente ligada à proteção da liberdade e da dignidade do trabalhador, existindo a obrigação de respeito a tais direitos. [38]
Maria Aparecida Alkimin também defende a limitação do poder diretivo pelo respeito à dignidade e aos direitos de personalidade do empregado. Segundo a referida autora:
[...] o reconhecimento dos direitos de personalidade na relação de emprego tem, como consequência, a limitação ao exercício do poder de direção do empregador e a limitação ao princípio da autonomia de vontade, devendo organizar o trabalho e destinar ordens de serviço que atentem à devida consideração à dignidade do trabalhador, e, consequentemente aos seus direitos de personalidade. [39]
Outra forma de limitação do referido poder, amplamente aceita pela doutrina, refere-se a função social da empresa. Nesse passo, leciona Regina Célia Pezzuto Rufino que:
A função da empresa se torna completa quando fornece condições para seus empregados se sustentarem, além de proporcionar uma maior qualidade de vida, visando, inclusive, o lado mental e psicológico do trabalhador, além de não descuidar da sua função social, que é a de auxiliar na inserção de seus subordinados na sociedade em que vive. [40]
No mesmo sentido, defendem Bezerra e Ferreira que “entender a função social da empresa é essencial para maior compreensão dos limites do poder diretivo do empregador”.[41] Para as referidas autoras, “mais do que representar fator essencial da economia de mercado a empresa deve cumprir com sua função social, se ajustando aos interesses da coletividade e atendendo suas necessidades básicas, para, assim, promover um acréscimo à cidadania, justiça e igualdade.” Por fim, concluem que “a empresa só cumpre sua função social se for gerida da maneira correta, com vistas aos preceitos constitucionais, focada no principio da boa-fé, que a exemplo da função social, insere-se em nosso ordenamento jurídico como cláusula geral.” [42]
Assim, como a vida em sociedade exige a imposição de alguns limites e restrições para a convivência dos seres humanos, na relação de trabalho não será diferente. “Contudo, nem sempre o Estado é capaz de organizar e fiscalizar todas as relações sociais, por isso, ele concede ao particular a prerrogativa de criar algumas regras que discipline determinada atividade.” [43]
Pode-se claramente perceber que o poder diretivo não pode ser exercitado de forma aleatória ou totalmente desmedida. Isso porque, conforme já apontado, esse poder não é ilimitado. E nem poderia ser de modo contrário, em virtude da necessidade de serem resguardados os direitos fundamentais de todo e qualquer empregado, em especial a sua dignidade. Assim, a mera subordinação do empregado, decorrente da relação de emprego, por si só, não pode servir de substrato para eventuais excessos do poder de direção, em verdadeira afronta aos direito fundamentais do empregado, como ocorre nos casos de assédio moral.