1.INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca analisar a incidência do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza sobre as verbas percebidas quando da adesão a plano de demissão voluntária.
Por se tratar de temática extensa, serão abordadas apenas as particularidades consideradas mais pertinentes para o desenvolvimento e entendimento do assunto.
O presente estudo será apresentado em três capítulos. O primeiro trará as premissas básicas do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza e a apresentação do que seriam os chamados planos de demissão voluntária. Já o segundo capítulo apresentará o conceito, propriamente dito, do que são os chamados planos de demissão voluntária. Enquanto isso, o ultimo buscará demonstrar as hipóteses em que cabe a incidência do imposto de renda sobre as verbas recebidas quando da adesão aos planos.
O objeto da presente pesquisa será abordado a partir da análise geral do tema e a aplicação em específico. Verificar-se-á a necessidade da tributação sobre as verbas recebidas pelo empregado do setor privado e público em função da adesão ao plano de demissão voluntária respeitando, com isso o princípio da igualdade tributária e o princípio da proporcionalidade, principalmente.
A incidência ou não da carga tributária está presente em todas as relações e operações existentes, inclusive naquele objeto do presente trabalho. Na elaboração desse estudo não se buscou proteger o fisco ou o contribuinte e sim a interpretação da lei conjugada ao princípios que regram o ordenamento jurídico.
2 IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA
A carga tributária atualmente exigida pelo fisco nacional pode ser considerada como um dos maiores obstáculos para as relações negociais entre as partes. Contudo, não por isso, o Poder Judiciário pode subverter suas limitações e entender diversamente do regimento legal.
A lei ao instituir tributo determinou ser ele toda prestação pecuniária arrecadada pelo Estado de caráter compulsório, que não seja objeto de sanção, arrecadada através do ato administrativo, o lançamento, com fulcro em atender as necessidades do interesse público. O Código Tributário Nacional determina no seu art. 3º que “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.[1]
Ou seja, o Código Tributário Nacional deixa claro ao estabelecer que o tributo só existe e se faz exigível se houver lei que o preveja e o imponha. Estabelece também o caráter pecuniário da prestação a ser paga em moeda de valor corrente, de forma compulsória, opondo-se a voluntariedade das partes envolvidas. Afasta também a idéia de tributo relativo a determinadas sanções impostas pela lei em caso de seu descumprimento como é o caso das multas por infração legal. Por fim, estabelece que o tributo esteja intimamente ligado ao desenvolvimento da atividade administrativa, daí o seu caráter vinculado.
Nesse sentido, Luciano Amaro tratou de reconhecer os elementos caracterizadores do tributo, sem deixar é claro de fazer críticas a prolixa definição legal, como se pode observar:
Ao dizer que o tributo é prestação instituída em lei não apenas se contempla o princípio da legalidade do tributo (no sentido de que cabe à lei instituí-lo, definindo o respectivo fato gerador, o devedor e os elementos necessários a quantificar a prestação), mas também se sublinha a origem legal (e não contratual) do tributo. Por isso, não é necessária a referência à compulsoriedade da prestação tributária. Ou seja, dizer que a prestação tributária é instituída em lei já expressa que o nascimento da obrigação tributária não tem por base a vontade dos sujeitos da relação jurídica, mas sim o comando legal.[2]
Ainda assim, o artigo 3º do CTN continua sendo motivo de grande controvérsia na doutrinária que adota a teoria tripartitide dividindo os tributos em três espécies: imposto, taxa e contribuições de melhoria. Apesar disso, assim como a maioria da doutrina, o mestre Hugo de Brito Machado entende de forma diversa já que adepto à teoria das cinco espécies tributárias:
O tributo, como conceituado no art. 3º do CTN, é um gênero, do qual o art. 5º do mesmo Código indica como espécies os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria.
O art. 217 do CTN, com a redação que lhe deu o Decreto-lei n. 27, de 14.11.1966, estabeleceu que as disposições do Código não excluem a incidência e exigibilidade de outras contribuições, que indica. Isto tornou evidente a existência de uma quarta espécie de tributo, integrada pelas contribuições sociais. Tal conclusão restou reforçada pelo art. 149 da Constituição Federal de 1988.
Finalmente, tendo em vista o art. 148 da vigente Constituição Federal, também os empréstimos não podem deixar de ser considerados uma espécie de tributo. Há quem diga que são impostos, mas preferimos colocá-los como espécie distinta, o que é sem dúvida mais conveniente, pelo menos para efeitos didáticos.[3]
Para iniciar a analise do tributo objeto do presente estudo temos que ter concreta e uníssona a ideia compartilhada por todos de que renda é todo acréscimo proveniente do capital ou do trabalho. O imposto de renda é instituído pela própria Constituição Federal que dispões sobre seus critérios. Ele deve atingir a todos os contribuintes que aufiram renda e proventos. Uma de suas principias características é a sua universalidade, ou seja, atinge toda e qualquer renda e proventos recebidos pelo sujeito passivo do imposto.
O imposto de renda tem também como característica sua progressividade. Hugo de Brito Machado exemplifica a progressividade do imposto, vejamos:
É progressivo o imposto cuja alíquota é maior na medida em que aumenta a base de cálculo tributável. Como a base imponível é sempre uma expressão da riqueza de cada um, a progressividade faz com que o imposto onere mais quem tem riqueza maior. Personaliza o imposto (MACHADO, 1998, apud PAULSEN e DE MELO, 2010, p. 56)[4].
Assim, o imposto variará conforme a capacidade econômica do contribuinte, agente passivo do tributo. O imposto de renda deve também obediência à anterioridade legal. Ou seja, para que um determinado tributo possa ser exigido do contribuinte tem que: a) haver lei anterior que o institua; b) tratamento igual entre os contribuintes; c) não incida sobre fatos geradores anteriores à criação da lei que o instituiu; d) respeite a anterioridade do exercício em que foi instituído; e) seja vedada a cobrança sem o respeito à anterioridade de noventa dias da data em que fora instituído, nos termos do próprio artigo 150 da Constituição Federal:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;
IV - utilizar tributo com efeito de confisco;
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
VI - instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I. [...][5]
Assim, ilegal a exigência do tributo no mesmo exercício financeiro. Contudo, admite-se a sua exigência sem o respeito à chamada anterioridade nonagesimal autorizando que o aumento ocorrido ao final de um exercício financeiro produza efeitos no exercício seguinte sem o respeito aos noventa dias entre a publicação da lei e a virada do ano.
Outra característica que deve ser observada á a progressividade do tributo. Em face do princípio da progressividade do imposto de renda a pessoa física receberá a isenção quando seus proventos chegarem até R$ 1.710,78. Desta maneira, quanto maior as rendas e proventos auferidos pela pessoa maior será a alíquota incidente atingindo seu limite de 27,5% para aqueles que, receberem mais que R$ 4.271,59, conforme tabela progressiva do cálculo mensal do imposto sobre a renda da pessoa física para o exercício de 2014, ano calendário 2013.[6]
Tal matriz de incidência do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza é encontrada no art. 153, III e § 2º, I da Constituição Federal:
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
III - renda e proventos de qualquer natureza;
§ 2º - O imposto previsto no inciso III:
I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei;
Nesses termos, como se depreende da orientação constitucional, o objeto de tributação do imposto debatido reside no produto da atividade executada pelo contribuinte que resulte no aferimento de renda. Ainda, uma interpretação sistemática da orientação constitucional, regida pelos critérios da generalidade, universalidade e progressividade, aponta que além de renda e proventos deve haver o acréscimo patrimonial e a disponibilidade dessa verba para ser passível de tributação.
3 PLANO DE DEMISSÃO VOLUNTÁRIA
Em função das constantes e inesperadas crises econômicas que abatem nosso país, cada vez mais os Planos de Demissão Voluntária surgem como instrumentos utilizados, tanto pelas empresas particulares quanto pelas estatais, como modalidade de enxugamento do quadro de pessoas visando à diminuição dos custos.
A adesão ao plano pode representar para a empresa a única estratégia para manter a continuidade das suas atividades além de representar uma maneira mais satisfatória de desligamento do empregado.
O Plano de Demissão Voluntária é um acordo de vontades entre as partes, no qual o empregador, diante da necessidade de redução do contingente da folha de salários, pactua com determinados empregados, geralmente os mais próximos da aposentadoria e que ganham os maiores salários.
Os pactuantes recebem as verbas trabalhistas previstas para a dispensa sem justa causa e outros valores que serão pagos por mera liberalidade do empregador, além de, em alguns casos, outros benefícios, como planos de saúde e complementação de aposentadoria.
Importante ressaltar que o montante é pago em razão das atividades exercidas pelo empregado bem como com base na remuneração que percebia por isso. A rescisão é pactuada entre as partes diante da extraordinária urgência que tem o empregador de reduzir despesas com pessoal para continuar prestando a devida manutenção à empresa ou entidade envolvida.
4 INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE VERBAS RECEBIDAS QUANDO DA ADESÃO AO PLANO
Apesar da doutrina, composta por advogados a favor dos contribuintes, defenderem a não incidência do imposto de renda sobre as verbas recebidas quando da adesão a planos de demissão voluntária, discordo, respeitosamente, entendendo que há uma situação em que o imposto de renda incidirá sim sobre o valor percebido.
Antes de demonstrar isso, digno ressaltar que o professor e advogado tributarista, Roque Antonio Carrazza partilha o entendimento daqueles que defendem veementemente a não incidência do imposto sobre tais verbas. Em sua brilhante doutrina ele dita o seguinte:
Pois bem, perquire-se se tais valores devem ser levados à tributação por meio do IR.
Adiantamos que não. Estamos, sim, em face de meras indenizações, que, compensando-lhes perdas, não trazem aos empregados ou aos servidores públicos efetivos acréscimos patrimoniais. O que há – também aqui – é a substituição da proteção constitucional da relação empregatícia contra a despedida arbitrária por uma indenização.
Eventual imposto que incidir sobre tais verbas indenizatórias – que não revelam capacidade contributiva, mas apenas compensam dano sofrido – não está gravando a renda do empregado, mas, sim, confiscando parte de seu patrimônio. Não será um imposto sobre renda, mas um tributo confiscatório – e, nesta medida, inconstitucional.[7]
Outros doutrinadores que perfilam entendimento nesse sentido são os professores Leandro Paulsen e José Eduardo Soares de Melo, que exararam entendimento de que o valor percebido quando da adesão ao plano tem caráter indenizatório, por isso, não implicaria em acréscimo patrimonial e sim em recomposição patrimonial, in verbis:
Por constituírem indenização é que não incide imposto de renda sobre conversão em dinheiro de férias vencidas e não gozadas, sobre o pagamento de férias proporcionais e sobre o acréscimo de 1/3 e de licenças-prêmio não gozadas. O mesmo ocorre com os valores pagos por ocasião da adesão a planos incentivados de demissão de servidores públicos (PDV) e de aposentadoria de servidores públicos (PAI), enquanto as verbas pagas por incentivo a demissão ou aposentadoria por pessoas jurídicas de direito privado tem sido submetidas â tributação.[8]
Além disso, após de reiteradas dúvidas levantadas que acabaram por chegar ao Poder Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça lançou mão de precedentes para os mais diversos sentidos. Contudo, no fim dos anos noventa, sedimentou o seu entendimento no sentido de que as verbas recebidas teriam caráter indenizatório e que, por tal motivo, sobre elas não cabia a incidência do imposto sobre a renda, editando a Súmula nº 215, a qual dita que “a indenização recebida pela adesão a programa de incentivo à demissão voluntária não está sujeita à incidência do imposto de renda.”[9]
Por respeito à argumentação e a fidelidade aos fatos, honesto admitir também que seguindo esse mesmo entendimento do STJ a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional editou Parecer nº 1278/98[10], através do Ato Declaratório nº 3 de 12-08-02, dispensando os procuradores da fazenda nacional de recorrerem quando sentença determinar a isenção das verbas recebidas pela adesão aos planos de demissão voluntária.
Entendo que quando da adesão aos PDV as verbas percebidas pelos servidores públicos tem caráter meramente indenizatório livres de qualquer incidência enquanto que - com toda vênia, discordo tanto dos ilustres doutrinadores acima que influenciaram a tese do STJ, bem como do próprio Tribunal – pois, aquelas verbas recebidas pelos empregados da iniciativa privados na sua adesão não se vislumbra nítido o caráter indenizatório. E, sobre essas verbas, deverá sim incidir imposto sobre a renda.
Ninguém discute que o imposto de renda previsto no Código Tributário Nacional, deve obrigatoriamente obedecer os estritos termos da Constituição Federal, tanto é assim que o art. 43 dita, categoricamente, o seguinte sentido:
Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
§ 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.
§ 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo.[11]
Destarte, como bem se depreende do dispositivo acima exposto, o imposto de renda incide sobre a renda e os proventos de qualquer natureza e o valor recebido como produto do capital, do trabalho ou de ambos. Isso significa dizer que quando a renda auferida se tratar de prestação contínua ou periódica, provenientes do exercício de um ofício ou mesmo quando os proventos se tratarem de ingressos financeiros que representam riqueza nova em decorrência de atividade exercida pelo agente haverá a incidência do imposto de renda.
A verba paga a título de plano de demissão acresce o patrimônio do contribuinte e é paga por mera liberalidade do empregador. Diferentemente do posicionamento adotado pela maioria, os valores recebidos pelos empregados privados não assumem caráter indenizatório.
É sabido que um dos princípios primordiais do contrato de trabalho é a sua continuidade, ou seja, em regra, a relação de emprego tem período indeterminado. Contudo, há situações emergenciais que ele tem que ser rescindido e, essa rescisão, não é considerada arbitrária. O interesse que tem o empregador em dar continuidade as suas atividades supera a manutenção do contrato de trabalho com o empregado trazendo benefícios para a sociedade como um todo.
Esse é o sentido do princípio da proporcionalidade, também chamado por alguns de postulado normativo. As máximas do princípio da proporcionalidade são regras e o ato para ser proporcional tem que ser adequado (meio apto para fomentar o fim almejado); tem que ser necessário (dentre os meios aptos para fomentar um determinado fim deve se optar por aquele que seja o menos gravoso possível para a sociedade); e, proporcional em sentido estrito (deve ser aferida a relação custo benefício através de uma ponderação entre as vantagens promovidas pelo meio e as desvantagens que ele provoca).
Assim, nesses casos o desfazimento da relação empregatícia é mal necessário para a manutenção das atividades empresárias, por isso que as verbas recebidas na adesão aos planos de demissão não podem ser consideradas indenização isentas de imposto de renda.
Os valores recebidos pelos empregados são meticulosamente calculados sobre as características e status que o empregado detinha enquanto vinculado à empresa. Para pagamento das verbas se leva em consideração toda a carreira construída pelo empregado dentro da empresa, seu tempo de serviço e salários. É comum os empregados receberem, além de plano de saúde, complementação da previdência, um salário por ano trabalhado, por exemplo.
Caso não houvesse a pactuação, o empregado seria demitido recebendo apenas as verbas trabalhistas devidas em face da rescisão sem justa causa. Assim, tendo em vista as bases para a concessão do benefício, em caso de rescisão unilateral, o empregado não faria jus a qualquer benefício diferente daqueles previstos pela legislação trabalhista (os quais não sofrem incidência do imposto de renda).
Ainda, sobretudo, caso a rescisão bilateral não ocorresse e o empregado continuasse a desempenhar suas atividades na empresa, ele continuaria percebendo salário passível de incidência do imposto sobre renda. Assim, inadmissível que as verbas percebidas pela adesão ao plano, além das verbas indenizatórias trabalhistas, deixem de sofrer a incidência do referido tributo.
Admitir essa disparidade é ignorar o princípio da igualdade tributária, explicado de forma brilhante pelo saudoso Hugo de Brito Machado, in verbis:
O princípio da igualdade é a projeção, na área tributária, do princípio geral da isonomia jurídica, ou princípio pelo qual todos são iguais perante a lei. Apresenta-se aqui garantia de tratamento uniforme, pela entidade tributante, de quantos se encontram em condições iguais. Como manifestação desse princípio temos, em nossa Constituição, a regra da uniformidade dos tributos federais e, todo o território nacional.
[...]
Em matéria tributária, há problema em saber se a regra de isenção fere, ou não, o princípio da isonomia. A questão é difícil porque envolve a valoração dos fins pretendidos pela norma isentiva. Essa valoração é que vai preencher o vazio da postura puramente normativista, e tudo terminará sendo uma questão de justiça, ou de injustiça da isenção.
A propósito de isenções, mais relevante e operativo é o princípio da capacidade contributiva, que adiante será examinado.[12]
É inaceitável que ao fim da relação jurídica de empregado e empregador, rescindida de forma voluntária de ambas as partes, o valor recebido, diverso daquelas com natureza trabalhista, não seja alvo da incidência do imposto sobre a renda. A rescisão é bilateral. Não se trata de rescisão unilateral sem justa causa. O valor percebido pelo empregado é pago por mera liberalidade do empregador. É inadmissível que a demissão pactuada gere valores com caráter indenizatórios além daqueles previstos pela legislação trabalhista!
Em não havendo a adesão a rescisão seria unilateral e a indenização estaria adstrita às verbas trabalhistas, as quais, aí sim, são livres da incidência do imposto de renda. Caso o trabalhador não fosse demitido e continuasse empregado ele continuaria a perceber renda e proventos plenamente passíveis de imposto de renda.
Admitir a não incidência do imposto de renda sobre as verbas aqui discutidas fere além do princípio constitucional da igualdade o princípio da capacidade contributiva. Nesse sentido, trago a baile, agora em favor, a lição de Roque Antonio Carrazza. Ele mesmo apresenta que o princípio da capacidade contributiva vem expresso na primeira parte do §1º do art. 145 da Constituição Federal e está intimamente ligado ao princípio da igualdade e da não confiscatoriedade e, além de terem eficácia plena e aplicação imediata são cláusulas pétreas da nossa Constituição Federal.[13]
Nesse sentido, não se faz justiça social quando se desonera os valores recebidos quando da adesão a plano de demissão voluntária, conforme acentua o professor Humberto Ávila, in verbis:
A norma tributária que tem por fim obter receitas é denominada norma com finalidade fiscal (Fisckalzwecknorm) ou norma repartidora de encargo (Lastenausteilungsnorm) e deve ser avaliada de acordo com um parâmetro de justiça – a capacidade contributiva. Para a interpretação dessas normas tributárias a finalidade – obtenção de receitas – não é adequada, porque não pode esclarecer por quê determinado dispositivo foi configurado deste ou daquele modo. A presunção desse objetivo conduziria a uma ampliação ainda maior das obrigações tributárias. Por isso, essas normas devem ser medidas pelo parâmetro da igualdade.[14]
Dessa maneira, de acordo com o princípio da igualdade não há justiça quando não há incidência do tributo analisado sobre a verba recebida pelo empregado da iniciativa privada que adere ao plano.
Sobre as verbas oriundas da adesão ao Plano de Demissão Voluntária deve sim incorrer o imposto sobre a renda, pois, com seu recebimento o empregado adquire capacidade econômica igualmente se continuasse na relação empregatícia. Se nessa última haveria a obrigação tributária de recolhimento do imposto naquela também deve haver.
Importante ressalvar que diferentemente do que foi até agora exposto em relação ao empregado privado que adere ao plano de demissão voluntária e sofre a incidência sobre a verba recebida em função da adesão, o servidor público estatutário que adere, nos termos do seu estatuto, a plano de demissão voluntária, não pode sofrer a incidência do imposto de renda sobre os valores percebidos pela adesão.
O servidor que ingressa no cargo através de certame público e atinge a estabilidade, nos termos da lei, pode vir a aderir ao seu plano de demissão voluntária em casos de extrema necessidade financeira do Poder Público.
Contudo, a diferença é que nesse caso a verba tem sim um caráter meramente indenizatório já que a “demissão” sem respectiva previsão no estatuto do servidor público e na lei fere o princípio da estabilidade do servidor titular de cargo público.
O professor Celso Antonio Bandeira de Mello[15] ensina que, conforme Emenda Constitucional nº 19, após três anos de exercícios subseqüentes à nomeação por concurso o servidor gozará de estabilidade desde que seja aprovado na avaliação especial de desempenho. Após esse período, somente nos casos previstos no §1º, do artigo 41, da Constituição Federal, poderá o servidor perder o cargo.
Como a adesão ao plano de demissão voluntária, regulamentada pela Lei 9.468/97, não consta como causas de perda do cargo previstas no §1º do artigo 41 da Constituição Federal de 1988, a verba recebida na adesão ao PDV tem nítido e exclusivo caráter indenizatório, motivo pelo qual não sofre qualquer incidência do imposto sobre a renda e proventos.