A teoria da aparência aplicada nas citações postais de pessoas jurídicas recebidas por pessoa que não tem poderes de representação

26/04/2014 às 08:58
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O artigo busca demostrar os diferentes entendimentos sobre a validade a respeito da citação feita por correio para pessoas jurídicas quando recebidas por pessoas que não possuem poderes de representação.

Segundo o CPC, a citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender, sendo que para a validade de um processo judicial, é indispensável a citação inicial do réu. É através dela que tem início o contraditório e dando oportunidade para que o réu possa se defender, exercendo assim a ampla defesa. Note-se que majoritariamente a citação é tratada como requisito de validade e não de existência do processo. 

O Código de Processo Civil dispõe:

Art. 213. Citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender.

Art. 214. Para a validade do processo é indispensável a citação inicial do réu. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

É um ato processo de fundamental importância e devido a este caráter deve cumprir determinadas formalidades impostas pela lei. Quando não presentes estas formalidades pode acarretar prejuízo ao processo fazendo com que haja nulidade absoluta do mesmo.  A lei processual prevê, portanto que a citação deve ser feita pessoalmente ao réu, ao seu representante legal ou ao procurador legalmente autorizado. 

Note-se assim, a impossbilidade do porteiro, por exemplo, receber a citação em nome de um morador do condomínio. As citações de pessoas físicas devem ser feitas diretamente a elas, com exceções permitdas pela lei quando tratar de pessoa representada ou de procurador. Isso porque, não se pode ter como presumida a citação dirigida a uma pessoa física quando a carta citatória é simplesmente deixada em seu endereço, com qualquer pessoa, seja o porteiro ou qualquer outra que não efetivamente o citando.

Súmula 429 “A citação postal, quando autorizada por lei, exige o aviso de recebimento”.

Ela expressa um entendimento reiterado do STJ sobre o tema. Não tem poder vinculante, mas de orientação. É uma posição que deverá ser adotada em julgamentos nas demais instâncias da Justiça Federal e dos estados.

Não são apenas pessoas físicas que podem figurar como parte em um processo, assim, as pessoas jurídicas, uma vez dotadas de capacidade jurídica por meio de seus representantes e procuadores também podem reclamar em juízo e figurarem como réus. Dessa forma, é necessária a citação para a empresa também. 

O instituto da citação pode ocorrer de três formas: por correio, por oficial de justiça ou ainda, por edital. No entanto, o estudo em tela preocupa-se apenas com um: o primeiro. citação por correio para pessoa jurídica. 

Ao citar uma pessoa jurídica oportuniza-se à ela a ampla defesa e o contraditório, assim como acontece quando a citação é dirigida para pessoa física. O problema surge quando quem assina o Aviso de Recebimento não é o procurador ou representante legal da empresa. 

Neste sentido, a Teoria da Aparência é predominante e as citações recebidas por pessoas sem poderes epecíficos para tal ato passam a ser válidas. Nesse sentido: 

(3ª Turma, REsp 11.914/SP, Rel. Min. Waldemar Zveiter,por maioria, DJ de 16.12.1991)

"PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE DESPEJO - RETOMADA DE IMÓVEL COMERCIAL - PESSOA JURÍDICA - ESTABELECIMENTO COMERCIAL - CITAÇÃO PELO CORREIO - TEORIA DA APARÊNCIA - ARTIGOS [221], I, E [222], DO CPC - SENTENÇA PROFERIDA DURANTE AS FÉRIAS - VALIDADE - ART. [173], DO CPC.

I - Consolidado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido da admissibilidade da citação, por viapostal, de pessoa jurídica, se ou quando recebida a carta por simples funcionário da empresa. Desnecessário que se o faça,exclusivamente, por pessoa ou pessoas que, instrumentalmente ou por delegação expressa, representam a sociedade.

II - Consoante a melhor doutrina, não e nula a sentença proferida nas férias, pelo juiz competente naquele período, entendendo-sepublicada no primeiro dia útil subseqüente.

III - Recurso não conhecido." 

E ainda:

(STJ - REsp: 178324 SP 1998/0044116-6, Relator: Ministro NILSON NAVES, Data de Julgamento: 06/04/1999, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 21.06.1999 p. 153)

Citação pelo correio. Pessoa jurídica. Cód. de Pr. Civil, art. 223, parágrafo único. A propósito da entrega da carta, entendeu-se, na instância ordinária, que havia "Presunção idônea de entrega da carta registrada ao representante legal da empresa". Em tal aspecto, é válido e eficaz o ato de citação, porquanto, conforme a orientação da 2ª Seção do STJ, "quando o acórdão recorrido afirma que a pessoa que recebeu a citação pelo correio era o responsável no momento, não há razão alguma para invalidar o ato" (REsp-119.818). Recurso especial não conhecido.

Ora, se para pessoa física não há presunção de citação quando recebida por pessoa diferente do réu não deveria haver igualmente presunção quando se trata de pessoa jurídica e quem recebe a citação não tem poderes para representar a empresa. Respeitando opiniões em contrário, acredito ser muito mais fácil um porteiro entregar a citação ao citado que mora no condomínio, do que um empregado de uma grande empresa conseguir entregar a citação para o representante ou administrador da empresa.  

O Direito não pode ser visto como presumido. Assim como não é permitido na citação de pessoa física não deveria ser presumido quando se tratar de pessoa jurídica. Acredito, portanto, que a decisão do STJ ao decretar a nulidade do processo de conhecimento em razão á citação ter sido recebida por empregado sem poderes para seu recebimento, foi acertada. 

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(STJ unânime, REsp 16.125-0 SP, rel. Min. Athos Carneiro, j. 16.2.93, deram provimento, DJU 22.3.93, pág. 4.547).

Nesse sentido, o aresto que vai a seguir transcrito: “O princípio do due process of law tem como um de seus principais fundamentos a regularidade da citação. Efetuada esta na pessoa do empregado, sem poderes para representar a empresa citanda, que não compareceu ao processo, e não comprovada outrossim de modo inequívoco a ciência da demanda pela ora embargante e recorrente, impõe-se decretar a procedência dos embargos à execução e a nulidade do processo de conhecimento”.

Diante do exposto é possível perceber que majoritariamente tem-se aceitado e decretado a validade de citações de pessoas juridicas recebidas por pessoas que não tenham poderes pata tal. No entanto, parece-me que esta diferenciação entre pessoa física e pessoa jurídica não é cabível uma vez que o Direito, diante do princípio da isonomia deve conceder as mesmas condições ao tratar da citação por correio para pessoas jurídicas. 


Fontes

IORIO, Luiz Carlos da Cruz. A Análise técnico-jurídico da Teoria da Aparência como princípio de direito. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 fev. 2012. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.35785&seo=1>. Acesso em: 24 abr. 2014.

YOSHIKAWA, Daniella Parra Pedroso. Nova Súmula 429 do STJ consolida que a citação pelo correio exige a assinatura do recibo pelo citando. LFG. 26 mar. 2010. Disponível em: <http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20100326162154797&mode=print>. Acesso em 24/ abr. 2014. 

LEÃO, Marjorie. Análise da citação pelo correio da pessoa jurídica e a nulidade insanável ab initio. EscritórioOnline. 22 maio 06. Disponível em: <http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=7033&>. Acesso em 24 abr. 2014. 

(3ª Turma, REsp 11.914/SP, Rel. Min. Waldemar Zveiter,por maioria,DJ de 16.12.1991) http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/16090008/ag-1243964

STJ - REsp: 178324 SP 1998/0044116-6, Relator: Ministro NILSON NAVES, Data de Julgamento: 06/04/1999, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 21.06.1999 p. 153 http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/420520/recurso-especial-resp-178324-sp-1998-0044116-6

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Sobre a autora
Caroline Meith de Souza

Advogada, especialista em Direito Tributário. Atualmente, pós graduanda em Direito Empresarial com foco na Gestão de Crise, ocasionada pelo COVID-19. Durante a formação, atuei junto à órgãos Públicos, tais como a Delegacia da Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Tive atuação na área Tributária, Cível em geral e na área Criminal. No momento, trabalho dedicado ao Direito Tributário Empresarial no escritório Blazius&Lorezentti.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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