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O renascimento do direito do trabalho no século XXI:

a experiência brasileira de 2003 a 2010

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24/05/2014 às 12:41
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5 O renascimento do Direito do Trabalho no Brasil – alguns contornos acerca da experiência brasileira do período de 2003 a 2010.

As políticas governamentais experimentadas em um período compreendido entre 2003 e 2010 contribuíram para a dignidade e a cidadania do povo brasileiro e repercutiram no renascimento e no prestígio do Direito do Trabalho no Brasil. Sendo assim, provocaram uma verdadeira mudança na história da sociedade brasileira.

Somente no período recente,

[...] o tema da plena ocupação da mão de obra e da injustiça na repartição da renda foi recolocado no centro da agenda nacional. A perspectiva de construção da agenda civilizadora no século XXI, com a promoção e defesa da produção e do emprego nacional, acompanhada da efetivação de reformas patrimoniais modernizantes, passou a encontrar um novo horizonte para a sua reafirmação. A permanente busca da equidade social ganhou impulso positivo, cada vez mais regido pelo reconhecimento e valorização de distintos esforços realizados por variados segmentos sociais, em torno da produção e reprodução das novas fontes de riqueza nacional. (POCHMANN, Márcio. Desenvolvimento, trabalho e renda no Brasil: avanços recentes no emprego e na distribuição dos rendimentos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2010a. P.8).

Especialmente a partir de 2006, verificou-se a implementação de políticas públicas destinadas, prioritariamente, a atender às demandas sociais dos setores subalternos da sociedade, a recuperar e a gerar empregos, a reduzir as taxas de desemprego, a melhorar o salário médio real e a valorizar o salário mínimo, de forma significativamente diversa, e, até, inédita, se comparadas às do governo de Fernando Henrique Cardoso.

Em relação ao número de empregos gerados por governo, verifica-se que no primeiro mandato de FHC foram destruídos mais de um milhão de empregos e que no balanço de oito anos de seu governo criaram-se menos de 800 mil vagas de emprego. Ao contrário, no governo Lula, até fins de 2008, foram criados quase 9 milhões de empregos (com carteira assinada), e no final de 2010 esse número ultrapassou 15 milhões.

A enorme diferença na quantidade de empregos formais criados na primeira década do século XXI (2003-2010) revela uma brutal disparidade de orientação política entre os governos de FHC e de Lula, de forma que, principalmente neste aspecto, não há como se falar em continuidade, e, sim, em mérito, único e exclusivo, do governo Lula, em contraponto à fase imediatamente anterior.

O mais importante foi que a estratégia adotada pelo governo Lula de gerar milhões de empregos não se realizou isoladamente, e, sim, acompanhada de um conjunto de políticas públicas direcionadas às inclusões social e econômica. Neste sentido, há o seguinte diagnóstico:

[...] o principal, sem dúvida, é que por meio dos programas de distribuição de renda e da nova política do salário mínimo, milhões de brasileiros puderam sair da situação de miséria e pobreza em que se encontravam, atingindo níveis de vida e de consumo que os colocam hoje como membros da classe média. Com isso, melhorou a saúde, a educação, o emprego e a autoestima, além de abrir possibilidades de um futuro melhor para todos.(POCHMANN, Márcio. Desenvolvimento, trabalho e renda no Brasil: avanços recentes no emprego e na distribuição dos rendimentos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2010a. P.5, grifo nosso.)

Ainda, urge salientar a análise feita por Mauricio Godinho Delgado acerca da recente conjuntura vivenciada no Brasil:

Reconheça-se que, felizmente, a partir de 2003, deflagrou-se notável processo de formalização empregatícia no Brasil, aumentando-se, em poucos anos, até o final da década, em mais de 10 milhões de pessoas o montante de trabalhadores formalmente incorporados ao Direito do Trabalho na economia e sociedade. Não por coincidência, no mesmo período, o país assistiu a significativo processo de inclusão social e econômica de enorme contingente de pessoas e famílias, permitindo se evidenciar, com clareza, o impressionante papel civilizatório e progressista do Direito do Trabalho também em nossa realidade. (DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 60-61, grifo nosso).

Diante destas considerações iniciais, constata-se que o período de 2003 a 2010 apresentou uma evidente consequência social. Poderia ter obtido melhores resultados se o Brasil estivesse crescendo em consonância com as suas potencialidades e “é claro que muito ainda deve ser feito, mas o que se conseguiu nestes oito anos mostra que é possível implementar mudanças de fundo, que transformam a vida das pessoas e lhes dão mais dignidade e cidadania.” 56

A opção governamental de enfrentar o quadro geral das distorções sociais representou tanto o ponto de ruptura realizado pelo governo Lula em relação à regressão neoliberal, como o “aproveitamento de oportunidades inéditas de correção dos graves defeitos da nação”.57

Nesse contexto, as políticas sociais implementadas assumiram um papel determinante. Inicialmente, orientaram-se em extrapolar o sentido de mera compensação de maneira que passaram a sair “do campo do clientelismo para o campo das políticas públicas normatizadas, com critérios, transparência e prestação de contas.”58

Em um segundo momento, buscaram superar as falsas dicotomias decorrentes do pensamento conservador no Brasil, que sempre impôs, na linguagem de Patrus Ananias, a dualidade de “ou isto ou aquilo”, e não “isto e aquilo”. Em outras palavras, no período de 2003 a 2010, verificou-se que não tinham razão de existir as seguintes separações históricas fortalecidas pelo ideário neoliberal: “crescimento econômico ou desenvolvimento social” e “proteção e promoção social ou direitos trabalhistas”.59

Diante da postura governamental de negar falsas dicotomias e polarizações (essencial para enfrentar o passivo deixado pelas décadas de 1980 e 199060) e vir assumindo a sua responsabilidade pela garantia dos direitos sociais, serão privilegiadas as políticas públicas que, dotadas de dimensão ética e humanitária, visaram a garantir o crescimento econômico sustentável por meio da inclusão socioeconômica.

Destacam-se como principais políticas sociais61 que nesse período realmente contribuíram para o avanço de novos compromissos com o planejamento soberano e sustentável da nação aquelas direcionadas à distribuição de renda.

As políticas de distribuição de renda trouxeram impactos inovadores para a base da pirâmide social, por repercutirem nas reduções da pobreza, da desigualdade social e do desemprego, e implicarem também o incremento da mobilidade social, a geração de empregos e a ampliação do consumo popular.

No âmbito das políticas sociais, particularmente as de distribuição de renda, algumas ações tiveram destaque pelo seu alcance ou caráter inovador: programa Bolsa Família, programa de valorização do salário mínimo e programa de crédito consignado.62 Por meio de análise de dados, de gráficos e de estatísticas, pode-se afirmar que cada uma dessas iniciativas cumpriu um papel próprio no atendimento a diferentes segmentos populacionais e, vistas em conjunto e articuladas com outras políticas públicas, determinaram a marca social do governo Lula ao se encontrarem no centro de sua agenda social.63

A coordenação e a convergência das políticas de distribuição de renda implementadas no período 2003-2010 trouxeram melhoria real na condição de vida64 do povo brasileiro.

Valendo-se de evidências empíricas, privilegiam-se como efeitos positivos decorrentes das políticas públicas direcionadas à inclusão socioeconômica: recuperação e geração de empregos, diminuição do desemprego, redução da desigualdade social e da pobreza, incremento da mobilidade social e expansão do mercado interno de massas.

Em outras palavras, nesse período a iniciativa governamental buscou lidar com diversos problemas que persistem na história brasileira (desigualdade de renda, desigualdade social, pobreza/miséria, desemprego e precarização das relações trabalhistas, entre outros) em um contexto de crescimento econômico.

No presente artigo, apenas se trata da repercussão de geração de empregos e redução de emprego em atenção às limitações editoriais desta Obra.

5.1 Recuperação e geração de empregos e redução do desemprego

No Brasil, há pouco tempo, prevalecia um discurso que apregoava que o emprego (“com carteira assinada”) era um freio à expansão econômica e à concorrência internacional, de forma a ser profetizada a recessão do mundo do trabalho, se não, a sua derrocada.

No entanto, a experiência brasileira recente comprovou o “engano” daqueles que proclamavam o fim do emprego e incentivavam a precarização das relações de trabalho - que são os mesmos, que, a propósito, estimulam a dispensa arbitrária/sem justa causa e a alta rotatividade.

O período de 2003 a 2010 caracterizou-se por um comportamento inédito nas duas últimas décadas da história do Brasil: a expansão do emprego (“formal e regulado”) sem passar por maior precarização dos direitos trabalhistas, o que resultou no aumento da taxa de formalidade da força de trabalho brasileira.

De acordo com Sérgio Mendonça e Ademir Figueiredo, tudo indica que a transformação mais importante ocorrida no mercado de trabalho, no ciclo recente de crescimento da economia brasileira, tenha sido a expansão do emprego e, simultaneamente, a redução significativa da informalidade. Em outras palavras, com base nos dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), estes economistas informam que:

[...] cresceu a proporção de pessoas ocupadas no setor privado com carteira de trabalho assinada. Adicionalmente, cresceu o emprego no setor público, reforçando a tendência de formalização do mercado de trabalho. Cresceram bem menos os autônomos, empregados domésticos e outros, que incluem donos de negócio familiar, profissionais universitários, autônomos, trabalhadores familiares sem remuneração salarial etc. Como ficam, à luz dessas informações, as projeções pessimistas dos analistas que apontavam o fim dos empregos formais? Das 2,9 milhões de ocupações novas criadas entre 2002 e 2008, os empregos com carteira assinada ou empregos no setor público atingiram 2,4 milhões. Pelo menos oito, em cada dez novas ocupações, no período 2003-2008, foram empregos formais, contrariando cabalmente as análises dominantes nos anos 1990 sobre o fim dos empregos formais. Diga-se, a título de registro histórico, que nos anos 1990, em cada dez ocupações criadas, apenas três eram empregos formais. No período 2003-2008 também foram criadas novas ocupações para trabalhadores sem carteira assinada, autônomos ou empregados domésticos. Contudo, essas formas de inserção não representaram mais do que 15% da expansão dos mercados de trabalho metropolitanos. (MENDONÇA, Sérgio; FIGUEIREDO, Ademir. Balanço do mercado de trabalho de 2003 a 2008 e perspectivas. In: GUIMARÃES, Juarez (Org.). As novas bases da cidadania: políticas sociais, trabalho e previdência social. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2010. p. 94-95.)

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No mesmo sentido, estatísticas do MTE e do IBGE atestam a progressiva formalização do mercado de trabalho. Entre 2003 e 2010, o percentual de trabalhadores com carteira assinada ultrapassou 50%, sendo que o número de empregos criados extrapolou 15 milhões e, até meados de 2011, a quantidade de trabalhadores formais superava 45 milhões. 65

Frise-se, o “equívoco” das formulações apologéticas que diziam que a oferta de trabalho assalariado formal iria necessariamente se tornar marginal (ou até extinta) foi combatido na prática:

Depois de um longo período convivendo com baixas taxas de crescimento nas décadas de 1980 e 1990, não soava estranho que o pensamento dominante apontasse para a “maldição” do desemprego como uma fatalidade de nosso padrão de desenvolvimento recente. Complementarmente, a visão sobre o “fim do emprego” influenciou muito o debate público na década anterior, em linha com a interpretação dominante no mundo desenvolvido. Assim, as políticas públicas desenhadas para enfrentar os desafios do mercado de trabalho brasileiro na década anterior foram marcadas predominantemente pelos programas de qualificação profissional, atribuindo aos indivíduos (as vítimas!) a responsabilidade pela superação de seu infortúnio (o desemprego!). O lema recorrente do debate era “estude e se qualifique por sua própria conta, que você encontrará uma oportunidade no mercado de trabalho”. Essa visão fatalista e paralisante começou a mudar com a retomada do crescimento econômico na atual década, notadamente a partir de 2004. Inicialmente estimulado pela demanda externa, o crescimento rapidamente foi internalizado a partir de 2005, ancorado na expansão do mercado interno que, por um lado, beneficiou-se do forte crescimento do conjunto dos rendimentos, tanto dos trabalhadores da ativa quanto dos aposentados. De outro lado, as políticas de valorização do salário mínimo, de transferência de renda (Programa Bolsa Família), de oferta de crédito (em especial do crédito consignado) e a retomada dos investimentos privados e públicos (PAC e estatais) também foram fatores que influenciaram decisivamente esse salto no patamar de crescimento.O mercado de trabalho brasileiro reagiu positivamente a esse novo cenário, mostrando sucessivas melhoras desde 2004. Apenas em 2009, como reflexo da crise internacional, houve uma curta interrupção naquela trajetória de avanços. [...]. A elasticidade produto-emprego modificou-se favoravelmente nesse ciclo recente de crescimento com impactos positivos para a geração de novos empregos e ocupações nos diversos setores. Para cada ponto de crescimento do Produto Interno Bruno (PIB), no ciclo recente, mais ocupações e empregos formais estão sendo criados, inclusive no setor industrial. (MENDONÇA, Sérgio; FIGUEIREDO, Ademir. Balanço do mercado de trabalho de 2003 a 2008 e perspectivas. In: GUIMARÃES, Juarez (Org.). As novas bases da cidadania: políticas sociais, trabalho e previdência social. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2010. p. 90,94.)

De acordo com a notícia “Demanda interna puxa alta de empregos em 2010” publicada no site do MTE em 11/05/2011, dados da RAIS mostram que em 2010, quase todos os setores tiveram empregos expandidos. Beneficiados pelo fortalecimento da demanda interna, as contratações foram puxadas pela elevação real da massa salarial, pela expansão do crédito do sistema financeiro com recursos livres para pessoas físicas e pelo aumento dos investimentos. Ainda, noticia-se que a média anual de geração de empregos foi de 1,923 milhão de vagas, um aumento de 5,51% ao ano, número inédito na história do emprego formal para um período de oito anos consecutivos e que do total de empregos formais criados em 2010, 2,590 milhões foram com carteira de trabalho assinada (celetistas), e 270,4 mil vínculos empregatícios estatutários (servidores públicos).66

No entanto, para que o Brasil mantenha e aumente o seu mercado de trabalho formal e a sua economia dinamizada, medidas devem ser tomadas no sentido de aperfeiçoar e ampliar suas políticas públicas, tais como: promover uma ampla política nacional de emprego e reduzir a rotatividade no mercado de trabalho.

É importante enfatizar que, além de o governo Lula visar à expansão de empregos, também houve, de certa maneira, a preocupação com a qualidade dos empregos gerados.

Em 2003, o presidente Lula assumiu o compromisso do Brasil com a agenda global do trabalho decente67, formalizada pela OIT, por meio da assinatura de um memorando de entendimento para a implementação de uma agenda nacional de trabalho decente no Brasil. No ano de 2006, durante a XVI Reunião Regional Americana da OIT, foi lançada por Luiz Marinho, na época Ministro do Trabalho e Emprego, a Agenda Nacional do Trabalho Decente (ANTD), em um momento em que o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) acabava de aprovar a Agenda Nacional para o Desenvolvimento. A partir de 2007, desenvolveu-se também a experiência de levar essa Agenda de Trabalho Decente para os estados e os municípios, sendo que a experiência brasileira passou a ser uma referência para outros países.68 (ABRAMO, 2010).

Ademais, no contexto de forte impulso à formalização do mercado de trabalho, no período de 2003 a 2010 também houve a redução do desemprego.

A taxa de desemprego foi diminuída em seus dois componentes – desemprego aberto (clássico) e desemprego oculto (trabalho precário e/ou desalento) - de forma semelhante nas regiões metropolitanas (Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, São Paulo) e no Distrito Federal.

Logo, a redução do desemprego total não refletiu um movimento regional ou sazonal, de modo que se constatou:

[...] as oportunidades de novas ocupações não só permitiram que as pessoas que estavam apenas à procura de trabalho fossem absorvidas (desemprego aberto), como também encontrassem trabalho aqueles que combinavam procura por trabalho e realização de algum bico (desemprego oculto pelo trabalho precário). O mesmo ocorreu com a parcela dos trabalhadores desempregados que se encontrava desalentada (desemprego oculto pelo desalento). [...] Ainda que os patamares de desemprego permaneçam muito altos e preocupantes, a queda verificada de 2003 a 2008 colocou o indicador em níveis semelhantes aos verificados na metade dos anos 1990, recuperando mais de uma década de crescimento de desemprego. (MENDONÇA, Sérgio; FIGUEIREDO, Ademir. Balanço do mercado de trabalho de 2003 a 2008 e perspectivas. In: GUIMARÃES, Juarez (Org.). As novas bases da cidadania: políticas sociais, trabalho e previdência social. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2010. p. 93-94.)

De fato, a queda na taxa de desemprego e o crescimento na taxa de ocupação no período de 2003 a 2010 refletem a retomada da valorização das bases do Direito do Trabalho, aqui, por meio da predominância de uma ideologia política favorável ao primado do trabalho, em especial, do emprego.69

Portanto, no período recente, o trabalho, em especial a sua modalidade regulada - o emprego reforça a sua centralidade no capitalismo contemporâneo e o Direito do Trabalho renasce ao proporcionar um inicial patamar civilizatório. Neste sentido, essencial ressaltar a análise feita por Mauricio Godinho Delgado:

O fato é que o Direito Individual do Trabalho superou a crise de afirmação dos anos 1990, época em que se viu refluído não apenas quanto à sua efetividade como também no próprio sentido de sua consistência e direção. Nos últimos anos desta primeira década do século XXI (2003-2010), o grau de generalização e efetividade do Direito Individual do Trabalho espraiou-se pelo Brasil, com o incremento de vários milhões de novos trabalhadores regidos por suas regras e princípios ao longo de todo o imenso território do país. Hoje, são mais de 40 milhões de trabalhadores integrados ao império do Direito do Trabalho no Brasil, o que volta a consolidar o processo de cidadania institucionalizada que tem caracterizado – com períodos de regressão, naturalmente – a história brasileira desde 1930. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. P. 133.

Dessa forma, percebe-se o círculo virtuoso em que o Brasil se inseriu no período 2003-2010, já que, principalmente por meio de políticas de distribuição de renda, um mercado adicional foi criado, que começou a demandar, a demanda gerou produção, que gerou emprego e aumentaram a massa salarial e a renda da classe trabalhadora.

Segundo João Lopez Feijóo, esta é a lógica de uma verdadeira política de desenvolvimento, diversa daquela de que “vamos fazer o bolo crescer para depois dividir”. Para Feijóo, “[...] à medida que o bolo cresce, divide-se. [...]. É verdade, ele também cresce porque se divide. Primeiro porque se divide o que existia, e essa divisão gera autoestima, gera mercado, gera consumo e tudo isso reunido gera produção e emprego.”70

O compromisso político em torno da retomada do emprego nacional, aliado aos esforços de redução da desigualdade social e de melhor repartição de renda nacional, especialmente para os segmentos populacionais mais vulneráveis, apresentou-se mais efetivo no enfrentamento das distorções sociais.71

Especificamente, o Brasil voltou a recuperar a trajetória de construção do projeto da sociedade salarial, caracterizado por forte elevação do emprego formal, bem como pela importância do movimento de ascensão social. Neste sentido, Márcio Pochmann pontua:

Esse novo quadro social do Brasil encontra-se fortemente impulsionado pelo avanço do emprego assalariado, especialmente com carteira assinada. A forte expansão do emprego formal, que responde por oito a cada grupo de dez novos postos de trabalho gerados no Brasil no governo Lula, implica a retomada da marcha em prol da sociedade salarial. Com isso, o assalariamento ganha parcelas crescentes das ocupações, impondo novo ritmo de rendimento que contribui decisivamente para a massificação das normas de consumo de massa em todo o país. A ampliação generalizada do consumo popular, sobretudo no interior do terço de menor renda, explica a recente inflexão do trabalho com a marcha do novo ciclo de desenvolvimento nacional. POCHMANN, Márcio. Desenvolvimento, trabalho e renda no Brasil: avanços recentes no emprego e na distribuição dos rendimentos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2010a. p. 56.

Logo, a coordenação das políticas implementadas no período 2003-2010 traduziu-se em melhor condição de vida para o povo brasileiro.

Nesta linha, Patrus Ananias discorre que os efeitos positivos ora abordados traduzem um esforço conjunto de governo e são fruto de uma condução acertada das políticas econômicas, articulada com vigoroso investimento nas políticas sociais. Ainda, reconhece que, embora não se tenha um efetivo Estado de Bem-Estar Social, o avanço da recente experiência brasileira nesta direção é notório.72

Superada a falsa dicotomia expansão econômica e desenvolvimento social, deve-se caminhar no sentido da generalização e do aperfeiçoamento das políticas públicas, de maneira que o seu beneficiário ultrapasse a condição de consumidor e atinja a cidadania em sua plenitude. Garantir o ingresso no mercado de trabalho por meio de um emprego digno é também garantir cidadania.73

De acordo com Márcio Pochmann: “A economia é um meio e não um fim, mas pode ser meio ou fim dependendo da governança política. O desafio que temos é de uma maioria política que tenha compromisso com o desenvolvimento”.74

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Sobre a autora
Roberta Dantas de Mello

Doutoranda em Direito do Trabalho pela PUC/Minas. Mestre em Direito Privado com ênfase em Direito do Trabalho pela PUC/Minas sob orientação acadêmica de Mauricio Godinho Delgado. Especialista em Direito do Trabalho e em Direito Previdenciário. Especialista em Direito Processual Constitucional. Pesquisadora da CAPES (2010-2012). Professora de Direito do Trabalho. Advogada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELLO, Roberta Dantas. O renascimento do direito do trabalho no século XXI:: a experiência brasileira de 2003 a 2010. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3979, 24 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28741. Acesso em: 5 nov. 2024.

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