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O direito de manifestação no Brasil

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4.      AS TENTATIVAS DE REGULAMENTAÇÃO DO DIREITO DE MANIFESTAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Em razão das questões levantadas no tópico anterior, os movimentos de 2013 trouxeram à tona a premente necessidade de regulamentação e estabelecimento de limites acerca do direito de livre manifestação, com o intuito de garantir e proteger este e os demais direitos constitucionalmente garantidos. Na atualidade, não há legislação vigente no Brasil que regulamente o direito à livre manifestação e, dada a essa ausência, os manifestantes em 2013 foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional nº 7.170/1983 e na Lei de Organização Criminosa nº 12.850/2013, o que trouxe indignação dos partidários dos movimentos sociais, uma vez que não se mostra razoável enquadrar os militantes democráticos com base em lei que contém resquícios ditatoriais ou como criminosos, respectivamente (PROCESSAR..., 2013).

Diante desse contexto, segundo informações da ONG ARTICLE 19 (2013), quatorze projetos de lei propondo a regulamentação do direito de manifestar foram apresentados no Congresso Nacional, a maioria enviada após as manifestações de junho de 2013, sendo que dez desses projetos estão tramitando na Câmara de Deputados e quatro no Senado Federal. Os assuntos tratados nos projetos são diversos e envolvem o mesmo tema: regulação geral dos protestos, proibição o uso de máscaras, proibição do uso de armas de baixa letalidade e alteração ou criação de novos crimes.

No que tange aos projetos que tramitam na Câmara dos Deputados, pode-se destacar, por exemplo, o projeto de lei nº 6198/2013, que apresenta a seguinte ementa:

Inclui o art. 40-A ao Decreto-lei 3.688, de 3 de outubro de 1941, que trata das Contravenções Penais para proibir o uso de máscaras e outros materiais usados para esconder o rosto durante manifestações populares definidas como a união de três ou mais pessoas que têm o intuito de perturbar a paz pública (MUDALEN, 2013)

Na justificação do mencionado projeto de lei foi citado o fato de que diversos países como Canadá, EUA, França e Chile, possuem legislação que veda o uso de máscaras em manifestações públicas, frisando que a lei canadense o fez com o intuito de inibir manifestações violentas. Destaca-se que o referido projeto de lei não visa restringir a liberdade de expressão e sim garanti-la ao identificar os indivíduos que atentarem contra a ordem social. Nesse ínterim, cabe ressaltar que o texto constitucional relaciona o direito de manifestação de pensamento com a identificação do autor, uma vez que veda o anonimato. A legislação brasileira não proíbe o uso de máscaras, o que se busca atualmente é uma regulamentação no sentido da identificação daqueles indivíduos que estejam cobrindo o rosto em manifestações e, em caso de negativa da identificação, essas pessoas serão conduzidas à delegacia para serem identificados, sendo a atuação policial registrada. Por consequência, em caso de atos de violência durante as manifestações populares, será possível a identificação dos autores dos atos e a respectiva punição, evitando assim que o movimento social legítimo e pacífico seja corrompido, assegurando o exercício desse direito constitucional. (MUDALEN, 2013). Nesse sentido, dispõe o texto abaixo:

O Projeto de Lei não fere direito à liberdade de expressão, e tem o propósito único de evitar que vândalos insiram nos movimentos para depredar, para furtar e mesmo manchar o espírito democrático da manifestação. O objetivo é impedir atos de violência e proteger os cidadãos (MUDALEN, 2013).

Outro exemplo de projeto encaminhado à Câmara dos Deputados que merece destaque é o projeto de lei nº 6500/2013, que dispõe sobre a “aplicação do princípio da não violência e garantia dos direitos humanos no contexto de manifestações e eventos públicos, bem como na execução de mandados judiciais de manutenção e reintegração de posse” e visa regulamentar o uso da força pelos agentes do Poder Público durante manifestações e eventos públicos (ALENCAR, 2013).

Com base nos projetos de lei acima relatados, resta evidente a existência de tentativas de regulamentação desse direito constitucional, tanto no sentido de proteção dos manifestantes como no sentido de punição daqueles que praticarem atos criminosos. Nesse sentido, no início de 2014 o Governo anunciou que iria encaminhar ao Congresso um projeto de lei regulamentando o direito de manifestar e que o mesmo seria aprovado até a Copa do Mundo da FIFA de 2014™:

"Nos próximos dias vamos mandar para o Congresso um projeto lei, em caráter de urgência, que trata dessa questão, regulamentando o direito de manifestação como boa parte dos países democráticos faz. A ideia é garantir a segurança ao cidadão que participa, dos jornalistas e, ao mesmo tempo, fazendo que não se tolere atos de vandalismo inaceitáveis que acabam atingindo pessoas, causando lesões e até mesmo a morte de algumas, como nós vimos, lamentavelmente, no caso do jornalista", disse o ministro. Ele se referiu ao cinegrafista da TV Bandeirantes, Santiago Ilídio Andrade, 49 anos, atingindo por um rojão num protesto no Rio de Janeiro, no dia 6, uma quinta-feira (CARAM, 2014).

Entretanto, posteriormente, o Governo desistiu da proposição de novo projeto de lei e anunciou o apoio ao Projeto de Lei do Senado nº 508 de 2013, de autoria do senador Armando Monteiro (PTB-PE), que “tipifica como crime de vandalismo a promoção de atos coletivos de destruição, dano ou incêndio em imóveis públicos ou particulares, equipamentos urbanos, instalações de meios de transporte de passageiros, veículos e monumentos.” (MONTEIRO, 2013). O referido projeto apresenta em sua justificação o argumento de que a maioria da população brasileira condena os atos de vandalismo e que a proposição “tem por objetivo justamente suprir a grave omissão da legislação em relação aos freqüentes atos coletivos de vandalismo, mediante a sua tipificação como uma nova modalidade de crime, com o qual não convivíamos até os dias de hoje” (MONTEIRO, 2013). Contudo, em seguida o Governo abandonou a idéia de apoiar qualquer proposição que regulamente o direito de manifestar, conforme anunciado na mídia:

16/05/2014 - O governo federal colocou uma pá de cal sobre o projeto de lei do Senado (PLS 508/2013) que aumenta penas para quem cometer crimes em manifestações. O ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral da presidência da República, comunicou nesta quinta-feira (15.5) que o governo desistiu de apoiar projetos no Congresso para combater o vandalismo.“Essa é a nossa posição, vamos caminhar nessa perspectiva e temos confiança de que sairemos bem lá no final”, disse Carvalho, que esclareceu que a posição do governo mudou após discussões internas e consultas à sociedade. As informações foram divulgadas pela Agência Brasil.

(...)

O objetivo era fazer com que as regras já valessem para os jogos da Copa do Mundo, que começam no dia 12 de junho. A mudança de posição do governo ocorreu diante da reação de movimentos sociais. (TAVARES, 2014)

O recuo do governo brasileiro no que se refere à regulamentação do direito de manifestar pode ser analisado como uma estratégia para enfraquecer as manifestações populares, uma vez que a restrição de tal direito constitucional se faz controversa e trata-se de medida impopular, como praticamente toda medida que vise restringir liberdades individuais. Dessa forma, a regulamentação do direito de manifestar não mais é uma opção do Poder Executivo e passa a ser questão de tramitação de projetos de lei do Poder Legislativo, ou seja, a Administração Pública não estaria se posicionando favoravelmente à regulamentação desse direito. O anúncio da mudança de posição no dia 15 de maio de 2014, dia denominado “Dia Internacional de Lutas contra a Copa” pelos Comitês Populares da Copa, no qual manifestantes de todo o mundo iriam às ruas para protestar contra o torneio, reforça o argumento da estratégia governamental de enfraquecimento dos movimentos. (ITRI, 2014).

Além disso, em oito de maio de 2014 teve início a campanha pela Anistia Internacional, que solicitava ao governo brasileiro que a assegurasse a liberdade de manifestação durante a Copa do Mundo, sob o lema “Brasil, chega de bola fora!”, coordenada pela seção nacional da ONU e apoiada por 20 países (ITRI, 2014). A posição da ONU, assim como de militantes dos direitos humanos, é que os governos devem apoiar as manifestações e não criminalizá-las. Logo, a circunstância demonstrada pedia um posicionamento do governo no sentido de garantir o livre exercício desse direito. (MONTENEGRO, 2014).

Pode-se dizer que o “Dia Internacional de Lutas contra a Copa” não teve tanto apoio como esperado. A população, com receio da violência, evita as ruas (MARTINS, 2014), principalmente a classe média. Nesse sentido, o Prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, declarou que as manifestações populares estão perdendo força com a proximidade da Copa, pois o povo brasileiro é contra manifestações populares violentas e apoiará o torneio pela sua importância no ambiente mundial e devido ao seu afeto pelo futebol (CLIMA..., 2014).


5.      TERRORISMO, MANIFESTAÇÃO E COPA DO MUNDO

Em 30 de outubro de 2007 a FIFA anunciou o Brasil como sede da Copa do Mundo 2014, sendo a escolha muito comemorada pela população do país à época. Nessa medida, a realização de um megaevento internacional no Brasil exigia a adoção de diversas medidas para atender às exigências FIFA no que se refere à realização do campeonato mundial. Nesse contexto, uma preocupação internacional comum era a possibilidade de ataque terrorista durante o evento, tendo em vista que após o atentado terrorista às Torres Gêmeas nos EUA, em 11 de setembro de 2001, o terrorismo tornou-se uma ameaça constante em grandes reuniões de alcance mundial (BRASIL..., 2012).

No que se refere ao tema, a Constituição brasileira (BRASIL, 1988) expressa repúdio ao terrorismo em seu artigo 4º, VII, tornando-o crime inafiançável insuscetível de graça ou anistia em seu artigo 5º, XLIII. Todavia, a matéria se faz um tanto controversa, uma vez que o terrorismo não tem uma definição consensual, pois seu conceito pode divergir de acordo com o tempo e espaço e, sendo assim, apresenta um caráter mais político do que jurídico. No que se refere ao terrorismo, o Código Penal brasileiro apenas dispõe sobre os requisitos de livramento condicional e a Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, estabelece que esse é insuscetível de graça, anistia, indulto e fiança. Porém, a única tipificação do crime de terrorismo existente na legislação brasileira está contida no artigo 29 da Lei nº 7.170/1983, que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências (FONSECA, 2014).

Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.

Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.

Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo (grifo nosso) (BRASIL, 1983).

Porém, a referida legislação apresenta resquícios ditatoriais, sendo que tal tipificação carece de ajustes, uma vez que não oferece o conceito de terrorismo, além de estar relacionada ao inconformismo político, critério demasiadamente subjetivo e perigoso em uma democracia. Assim, vários projetos de lei já foram submetidos ao Congresso Nacional para tratar da matéria, sendo a tentativa de tipificar o terrorismo na atualidade orientada por três projetos em tramitação no Senado (FONSECA, 2014). Nessa linha de raciocínio, o Projeto de Lei do Senado 728/ 2011 apresenta a seguinte ementa:

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Define crimes e infrações administrativas com vistas a incrementar a segurança da Copa das Confederações FIFA de 2013 e da Copa do Mundo de Futebol de 2014, além de prever o incidente de celeridade processual e medidas cautelares específicas, bem como disciplinar o direito de greve no período que antecede e durante a realização dos eventos, entre outras providências.(AMÉLIA, CRIVELLA e PINHEIRO, 2011)

            Portanto, percebe-se que a preocupação de tipificar o terrorismo estaria voltada para as Copas da FIFA que seriam realizadas no Brasil, assim como outros eventos internacionais, como as Olimpíadas de 2016 do Rio de Janeiro, justamente pelo caráter internacional do evento que atrai a atenção de todo o mundo. Alguns dias após a proposição do referido projeto, foi apresentada outra proposta bem similar tratando do mesmo tema, o PLS 762/11, com a ementa “Define crimes de terrorismo”. Os dois projetos foram anexados ao PL 236/12, o novo Código Penal Brasileiro. Ou seja, sua tramitação agora corre em conjunto, sendo pouco provável a tipificação do crime de terrorismo por meio desses projetos antes da Copa do Mundo de 2014 da FIFA™ (FONSECA, 2014).

Em 2013, o mais comentado projeto de lei sobre o terrorismo foi apresentado por comissão mista de senadores e deputados, com a estratégia de ser avaliado e votado pela própria comissão que propôs o projeto no Senado e na Câmara, sem a necessidade de ser submetido à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ): o Projeto de Lei nº 499/2013, que visa justamente à revogação do artigo da Lei de Segurança Nacional e propõe um conceito de terrorismo amplo. O mencionado projeto tem sido acusado pela mídia de ser uma maneira de se repreender às manifestações populares que estão acontecendo no Brasil. Parece haver uma confusão entre a regulamentação do direito de manifestar e a regulamentação do crime de terrorismo (FONSECA, 2014).

Nesse sentido, cabe esclarecer que a previsão legal do crime de terrorismo estava sendo debatida no Congresso Nacional muito antes da eclosão das manifestações de 2013, como se pode verificar pela data de propositura dos projetos de lei e pelo contexto internacional. A necessidade de regulamentação do direito de manifestar se tornou forte após a ocorrência de incidentes de violência e vandalismo nas manifestações populares de 2013. Como esses acontecimentos ocorreram concomitantemente ao período de realização das Copas da FIFA e em decorrência dos protestos contra o desembolso de recurso pelo Governo para realização do evento, muitos concluíram que o Estado estaria proibindo a população de exercer seu direito de manifestar devido à realização do mundial, no sentido de enquadrar os participantes de movimentos sociais como terroristas. Dessa forma, há um grande debate instaurado.

A respeito do tema, Leandro Piquet Carneiro, professor do Instituto de Relações Internacionais de Universidade de São Paulo (USP), defende a existência de legislação que trate da matéria de terrorismo pelo contexto internacional e não acredita que a norma será aplicada contra manifestantes políticos, conforme disposto abaixo:

 Fica claro que atos como os que os black blocs organizam são um ato de violência política – que deveriam ser assunto do legislativo – mas não terrorismo. Não vejo aonde essas coisas poderiam ser confundidas. Quem não gosta da legislação antiterror criou essa falsa confusão, uma coisa é voltada para proteger Estado e sociedade de um tipo de ameaça muito específica, que é absurdamente necessária, versus uma onda de violência política praticada por organizações novas que não são terroristas. São conversas paralelas (FONSECA, 2014).

Do outro lado do debate, representantes de alguns movimentos sociais, como Juliana Machado, membro do Comitê Popular da Copa de São Paulo e da articulação nacional, teme o enquadramento de manifestantes políticos como terroristas devido à amplitude da legislação.  

A pergunta que nós, dos Comitês Populares da Copa, e os movimentos populares tem feito é: como você vai separar o joio do trigo se o projeto é absolutamente genérico? A legislação não pode ser uma previsão genérica que busque abarcar todos os casos. Quando o Projeto de Lei coloca uma tipificação tão genérica e aberta, é impossível para nós termos a ilusão [de] que não há a intenção do Estado de criminalizar os movimentos populares – e isso não apenas pela legislação do terrorismo, mas por conta de outras iniciativas que temos observado, como o Decreto de Lei e Ordem, que diz, com todas as letras, que movimentos sociais são forças oponentes do Estado (FONSECA, 2014)

O Decreto de Lei e Ordem, citado acima pela representante, na realidade é a publicação “Garantia da Lei e da Ordem”, o anexo da Portaria Normativa nº 3.461, de 19 de dezembro de 2013 e também tem sido referenciado como norma que inibe a realização das manifestações populares durante a Copa do Mundo da FIFA de 2014™. O documento anexo teve uma segunda edição em 2014, por meio da Portaria Normativa nº 186, de 31 de janeiro de 2014.

O Decreto nº 3.897/2001 fixa as diretrizes para o emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem e dá outras providências, mas não dispõe sobre forças oponentes, apenas regulamenta a Lei Complementar nº 97/ 1999, que dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas. O único documento que cita força oponente é a primeira edição do anexo “Garantia da Lei e da Ordem”, apresentando o seguinte conceito:

Forças Oponentes (F Opn) são pessoas, grupos de pessoas ou organizações cuja atuação comprometa a preservação da ordem pública ou a incolumidade das pessoas e do patrimônio.

4.3 Forças Oponentes

4.3.1 Em Op GLO não existe a caracterização de “inimigo” na forma clássica das operações militares, porém torna-se importante o conhecimento e a correta caracterização das forças que deverão ser objeto de atenção e acompanhamento e, possivelmente, enfrentamento durante a condução das operações.

4.3.2 Dentro desse espectro, pode-se encontrar, dentre outros, os seguintes agentes como F Opn:

a) movimentos ou organizações;

b) organizações criminosas, quadrilhas de traficantes de drogas, contrabandistas de armas e munições, grupos armados etc;

c) pessoas, grupos de pessoas ou organizações atuando na forma de segmentos autônomos ou infiltrados em movimentos, entidades, instituições, organizações ou em OSP, provocando ou instigando ações radicais e violentas; e

d) indivíduos ou grupo que se utilizam de métodos violentos para a imposição da vontade própria em função da ausência das forças de segurança pública policial. (grifo nosso) (MINISTÉRIO DA DEFESA, 2013)

Pode-se constatar pela publicação das referidas portarias, a finalidade de orientar os agentes públicos quanto ao planejamento e emprego das forças armadas em caso de possível conflito, no sentido de evitar os embates entre policiais e manifestantes nos mesmos moldes daqueles ocorridos em junho de 2013. Trata-se de documentos técnicos de operação policial que guiam a conduta dos agentes públicos, pautada na legalidade, no respeito à hierarquia e na busca por soluções pacíficas. Percebe-se que a divulgação do documento de 2013 causou polêmica entre os manifestantes sociais que, talvez por desconhecimento, distorceram a finalidade do trabalho e seu conteúdo. (MINISTÉRIO DA DEFESA, 2013 e 2014).

Além disso, a notícia de limitação do direito de manifestação durante as Copas ainda se baseia no fato de existir uma área de segurança do evento. O documento da FIFA que oferece esclarecimentos sobre a “Área de restrição comercial” durante as Copas traz o conceito do perímetro de segurança, conforme trecho abaixo:

O perímetro de segurança é parte do “estádio” e inclui todas as áreas oficiais do evento (centros de mídia, hospitalidade, etc.) e, por isso, precisam ser não apenas seguros, como também livres de qualquer tipo de comércio, por questões operacionais. Qualquer tipo de estabelecimento eventualmente localizado dentro do perímetro de segurança precisará ser fechado durante as Competições. Como o acesso ao perímetro de segurança dependerá de ingresso ou credencial, freqüentadores usuais de estabelecimentos localizados no interior de tal perímetro não terão acesso aos mesmos. (FIFA)

 A Lei Geral da Copa (Lei nº 12.663/2012) é anterior às manifestações populares de 2013 e dispõe sobre áreas de restrição comercial e vias de acesso, restringindo esse espaço ao perímetro máximo de 2 km (dois quilômetros) ao redor dos Locais Oficiais de Competição, conforme determinação da autoridade competente. A referida lei garante o direito de manifestação em seu artigo 28, mas em nada dispõe sobre crimes decorrentes desse: “§ 1º  É ressalvado o direito constitucional ao livre exercício de manifestação e à plena liberdade de expressão em defesa da dignidade da pessoa humana.” A lei apresenta o aspecto administrativo do evento, como regras sobre a proteção e exploração dos direitos comerciais, vistos de entrada e permissões de trabalho, venda de ingressos, condições de acesso e permanência nos locais oficiais de competição, etc. (BRASIL, 2012). Cumpre destacar que houve inclusive o pedido de estabelecimentos comerciais, localizados fora da área de segurança, para inclusão no espaço devido aos prejuízos sofridos em 2013 com as manifestações (FERREIRA, 2014). Logo, cumpre reforçar que tais áreas são comuns em qualquer evento que exija a apresentação de ingresso e são delimitadas conforme o acordado previamente com o Estado.

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Sobre a autora
Thaísa Ferreira Amaral Gomes Espínola

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG (em curso). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, em exercício na Coordenação Especial da Copa do Mundo na Secretaria de Estado de Turismo e Esportes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESPÍNOLA, Thaísa Ferreira Amaral Gomes. O direito de manifestação no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4005, 19 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29506. Acesso em: 6 mai. 2024.

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