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A legitimidade democrática na jurisdição constitucional

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13/09/2014 às 17:22
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3- DEMOCRACIA SUBSTANTIVA

3.1- PRESSUPOSTOS INICIAIS

A democracia substantiva, surge a partir de um ideal comunitarista, pós traumático aos eventos ditatoriais ocorridos à época. As falhas expostas da democracia naquele período, como a falsa expressão da vontade da maioria, ensejaram argumentos novos, a busca pelo acesso à justiça e uma afirmação dos direitos e princípios fundamentais positivados, assim desaguando no constitucionalismo moderno.

[...] o constitucionalismo moderno, a partir da experiência negativa de legitimação do nazi-facismo pela vontade da maioria, confiou à justiça constitucional a guarda da vontade geral, encerrada de modo permanente nos princípios fundamentais positivados na ordem jurídica. Tais fatores provocam um redimensionamento na clássica relação entre os Poderes do Estado, surgindo o Judiciário (e suas variantes de justiça constitucional, nos países que adotaram a fórmula de tribunais ad hoc) como uma alternativa para o resgate das promessas da modernidade, onde o acesso à justiça assume um papel de fundamental importância, através do deslocamento da esfera de tensão, até então calcada nos procedimentos políticos, para os procedimentos judiciais.[22]

Destarte o papel do Judiciário ganha destaque, como guardião dos direitos adquiridos mediante essa luta, e a necessidade de proteção a esses princípios torna-se basilar, ocasionando uma articulação em que deslocam-se matérias de cunho político para uma discussão de esfera judicial.

Consequentemente, é inexorável que, com a positivação dos direitos sociais-fundamentais, o Poder Judiciário (e, em especial, a justiça constitucional) passe a ter um papel de absoluta relevância, mormente no que pertine à jurisdição constitucional.[23]

Assim sendo, apercebe-se a ampliação do Poder Judiciário, em especial a Jurisdição Constitucional da Corte Suprema, ganhando novos contornos e a sua relevância, frente as análises substantivas do direito.

3.2- CONCEITO DE DEMOCRACIA SUBSTANTIVA

A democracia substantiva é conceituada na ótica da ordem jurídica como fundamento de pressuposto para defesa dos direitos fundamentais. A custódia a esses direitos é foco dessa espécime democrática, sendo de tal modo que para o alcance desse objetivo afirme-se de métodos estritamente substantivos, com a prevalência Constitucional, mesmo que seja imperativo passar por cima do princípio democrático do majoritário.

O novo paradigma do Estado Democrático de Direito, que assenta num regime democrático de garantia dos direitos fundamentais, ensejando uma dificuldade contramajoritária.

As posturas que, de um modo ou de outro, trabalham com essa perspectiva, partem da perspectiva de que a função da jurisdição constitucional deve fazer prevalecer a Constituição contra as maiorias eventuais.[24]

O núcleo de conceituação da corrente substancialista contorna a Constituição e a proteção dos direitos e princípios fundamentais ali positivados. Para o firmamento do explícito na Carta Magna, o Judiciário ganha evidência em sua atuação, assumindo papel de intérprete a fim de efetivar a vontade geral implícita no direito positivado, assim acaba por colocar o princípio democrático da maioria como espectador, face a existência de maiorias meramente eventuais.

Em síntese, a corrente substancialista entende que, mais do que equilibrar e harmonizar os demais Poderes, o Judiciário deveria assumir o papel de um intérprete que põe em evidência, inclusive contra maiorias eventuais, a vontade geral implícita no direito positivo, especialmente nos textos constitucionais, e nos princípios selecionados como de valor permanente na sua cultura de origem e na do Ocidente. Coloca, pois, em xeque, o princípio da maioria, em favor da maioria fundante e constituinte da comunidade política.[25]                    

O princípio do majoritário na persecução procedimental é tratado como secundário frente a existência dos direitos fundamentais que assim ocupam um mais alto escalão, posto que o status pétreo do direitos fundamentais por si condicionam a vontade da maioria dentro do processo de decisão numa democracia.

A relevância dos direitos fundamentais alçados à condição de cláusulas pétreas da Constituição, reconhecidos juridicamente e autoaplicáveis, condiciona a vontade da maioria, vez que, quando confrontados os direitos fundamentais com decisões oriundas do processo democrático, aqueles prevalecem, pois fundados nos mais altos compromissos da comunidade.[26]

Para tal, os direitos fundamentais postos como incipientes à ordem jurídica, vinculam todo o ordenamento, reclamando não somente observância subjetiva, bem como reserva objetiva.

Portanto, nesta perspectiva, os direitos fundamentais são identificados como princípios elementares da ordem e, assim, reclamam não só a observância subjetiva, mas igualmente o caráter jurídico objetivo que vincula a formação de todo o conteúdo normativo do ordenamento jurídico.[27]

A democracia substantiva vem com o ideal de frear o majoritarismo irrestrito, enfrentar a permanência de maioria eventuais, constituir que as maiorias não podem legitimamente fazer o que elas quiserem simplesmente pelo fato deserem maiorias.

Desta forma, a democracia não será a simples observância à regra da maioria, mas sim uma democracia constitucional na qual os direitos individuais são trunfos frente à maioria, e a esta se sobrepõe.[28]

Dessa maneira, busca-se relativizar o princípio do majoritário com a existência de direitos a serem efetivamente colocados em prática pelo Poder Judiciário, fazendo com que os cidadãos se tornem autores e não meros destinatários do Direito.

O Judiciário na democracia substantivista alça moldes de escritor, deixando de lado o papel de simples intérprete, contrapondo o princípio da Separação dos Poderes e invadindo uma ótica diferente a sua função estritamente típica de julgador.

A pauta de realização dos direitos fundamentais reclama e guia toda atuação estatal, e o intuito de promovê-la perpassa qualquer limite anteriormente estabelecido pelo Estado liberal, inclusive a rigidez do princípio da separação dos poderes. Assim, como a democracia substantiva se assenta no desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais e em virtude destes possuírem uma natureza principiológica, para sua aplicação, exige-se do intérprete uma interpretação construtiva.[29]

Assim a soberania do Legislativo foi substituída pela soberania e supremacia da Constituição, em que a ideia da separação dos poderes não pode sobrepor-se a realização dos direitos fundamentais.

Portanto, o produto das decisões judiciais embaraçadas pelo substancialismo será dotado de uma atuação criativa do jurista, que busca a efetivação a qualquer custo de um direito fundamental.

Assim, as decisões judiciais coadunadas aos propósitos de uma democracia substantiva dão espaço a uma jurisdição criativa que no momento da interpretação responda e complete o sentido do princípio constitucional o qual se intenta efetivar.[30]

De acordo com a concepção substantivista, dado que o objetivo final do Estado de Direito é obrigar o respeito aos direitos consagrados no texto da Constituição, é indispensável introduzir um corpo independente, que seriam os tribunais judiciais, dotado da faculdade de controlar o respeito efetivo à Constituição por parte do resto das autoridades políticas, incluídos os poderes Executivo e Legislativo.

Os juízes estão autorizados a limitar a vontade das maiorias parlamentares através do controle de constitucionalidade, sempre que forem negligenciadas as condições democráticas postas.

A ideia é que os juízes esclarecidos e abertos à deliberação racional contenham os impulsos autoritários dos políticos profissionais que povoam os demais poderes do Estado. Em termos institucionais, esta aposta se expressa na defesa de um ativo controle judicial da constitucionalidade das leis.

A soberania popular, nesse contexto, é preservada a partir da consideração de que defender as minorias significa proteger a Constituição como um todo. Neste contexto, no que tange a característica contramajoritária da jurisdição constitucional, Dworkin sustenta que a democracia constitucional é compatível com uma concepção substancial dos juízes acerca dos valores morais, o que os permite a adoção de posições contramajoritárias. O autor propõe como lembra Leal, o que se convencionou chamar de leitura moral da Constituição, não podendo ser separar direito e moral, devendo tais aspectos morais estarem presentes no juiz por ocasião da aplicação do direito.[31]

Sintetizando os argumentos postos, temos que dado a consolidação democrática depender da existência prévia de um Estado Constitucional de Direito, e atendido a que este ultimo só seria possível com a existência de órgãos judiciais que controlem a constitucionalidade das leis, a atuação substântiva seria um meio necessário para a consolidação da democracia.

3.3- FUNDAMENTOS DA DEMOCRACIA SUBSTANTIVA

O fundamento basilar da democracia subtantivista é a existência de uma Ordem Jurídica embasada por princípios fundamentais que norteiam toda a sistemática, com status de clausula pétreas e que ensejam uma efetivação plena.

[...]democracia substantiva que se fundamenta em uma ordem jurídica geral de princípios fomentados coma  sistemática de direito implantada pelo Estado Social que põe em pauta a realização e irradiação dos direitos fundamentais, reconhecidos além das liberdades individuais, para todas as esferas do direito.[32]

Dado a dificuldade de aplicação da lei no caso em concreto, posto que essa é formulada de modo objetivo podendo atingir uma amplitude de situação que se coadunam em circunstâncias específicas a cada fato narrado, a democracia substantiva fundamenta que há a necessidade da faceta criativa do Juiz, funcionando não somente como intérprete, mas implicando a ele uma posição de legislador, com concepções substantivas.

Existe sempre uma inadequação da matéria a julgar, quanto à forma da própria lei, dado que a primeira é necessariamente concreta e singular enquanto a segunda é abstrata e universal. Essa inadequação só pode ser resolvida pelo trabalho criativo do juiz, que se coloca “no lugar do legislador” – o que implica que tenha de recorrer a considerações substantivas.[33]

Assim a atuação dentro do processo esvaíra sempre numa participação plenamente substantiva, pois mesmo tem-se como base do processo direitos tidos como fundamentais.

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Certamente, diz Tribe, decidir que a classe de participação demanda a Constituição requer uma teoria dos valores e dos direitos plenamente substantiva, assim os direitos ao procedimento do devido processo têm em sua base a dignidade pessoal (ser ouvido é parte do que significa ser pessoa).[34]

Assim como a validação processual, desde o modus como foi alcançada aquela formulação, através do sufrágio, por exemplo, aprecia-se também um caráter substantivo.

[...] do mesmo modo, a questão “de quem vota” ou a regra “um homem, um voto” possuem caráter substantivo. As teorias procedimentalistas não parecem apreciar que o processo é algo em si mesmo valioso; porém, dizer que o processo é em si mesmo valioso é afirmar que a Constituição é inevitavelmente substantiva.[35] 

Apercebe-se que a fundamentação da democracia substantivista é formulada no entorno ao embate frente a democracia procedimentalista, avaliando sempre a posição dos direitos fundamentais frente ao princípio majoritário, assim perfazendo um Juiz criativo para o alcance da efetividade dos direitos supracitados completando sua interpretação até ser atingido o almejado.


4  DEMOCRACIA PROCEDIMENTAL

4.1 SURGIMENTO DA DEMOCRACIA PROCEDIMENTAL

A ideia de democracia procedimental, surge atrelada a ideia do Estado Social de Direito, uma defesa de um sistema jurídico mais rígido remontam ao final do século XX, atraindo a concepção procedimentalista do Direito a realidade vivida a época.

Parte da ideia de que os sistemas jurídicos surgidos no final do século XX, nas democracias de massas dos Estados Sociais, denotam uma compreensão procedimentalista do Direito.[36]

O Alemão Jurgen Habermas traz consigo a Teoria do Discusso abrangendo em seu estudo da tese procedimentalista, ele critica a mescla ocorrida entre política e direito, ocorrida com o substancialismo exacerbado, defendendo que deve-se dar interpretação diversa à política e ao direito, fragmentando seus devidos papéis para que se alcance uma efetividade sociedadedemocrática.

Sustentando a tese procedimentalista, Habermans critica com veemência a invasão da política e da sociedade pelo Direito. O paradigma procedimentalista pretende ultrapassar a oposição entre os paradigmas liberal/formal/burguês e o do Estado Social de Direito, utilizando-se, para tanto, da interpretação da distinção entre política e direito à luz da teoria do discurso.[37]

Portanto, pela visão procedimentalista do Direito, apreende-se que deve-se haver uma distanciação entre política e direito, posto que se tratam de atribuições de poderes diversos, com suas devidas delimitações no Ordenamento Jurídico moderno.

4.2- DEFINIÇÃO DA DEMOCRACIA PROCEDIMENTALISTA

A definição para a democracia procedimental parte de uma análise do estudo de Habermas acerca do tema, afronte a tese substancialista, ele critica a ideia do Juiz criativo, devendo ser dado a este um caráter de interpretador da norma, sem valoração de próprio punho do exposto na lei.

Habermas recusa peremptoriamente tanto o processo hermenêutico de aplicação de normas como se fossem valores, como critica duramente o enfoque monológico e hercúleo de “um juiz que sobressai por sua virtude e acesso privilegiado à verdade”.

Habermas ingressa no debate sobre a legitimidade da jurisdição constitucional destacando que ainda não fora resolvida a questão de como tal prática de interpretação pode operar no âmbito da divisão de poderes do Estado de direito, sem que a justiça lance mão de competências legislativas.

O Tribunal Constitucional não deve ser um guardião de uma suposta ordem suprapositiva de valores substanciais. Deve, sim, zelar pela garantia de que a cidadania disponha de meios para estabelecer um entendimento sobre a natureza dos seus problemas e a forma de sua solução.[38]

O enfoque principal da Democracia Procedimental paira na garantia dos meios necessários para se garantir um processo correto e justo, fazendo com que a democracia não se submeta a uma simples ideia do princípio majoritário cercado de decisões pautadas em maiorias eventuais.

A tese procedimentalista ataca sempre a figura do Juiz como substituidor da ideia principal tratada no texto constitucional, não admite uma hermenêutica além dos moldes abordados, portanto acredita que o Juiz não pode entrar no lugar do decisor político, podendo apenas assumir um papel de auxiliar.

Ele não pode assumir o papel de um regente que entra no lugar de um sucessor menor de idade. Sob os olhares críticos de uma esfera pública jurídica politizada – da cidadania que se transformou na “comunidade dos intérpretes da constituição – o tribunal constitucional pode assumir, no melhor dos casos, o papel de um tutor.”[39]

Outra crítica abordada dentro deste tipo de democracia é quanto a concretização dos valores materiais, posto que segundo Habermas dada esta Competência ao Tribunal Constitucional, estar-se-ia dando poder demasiado a Corte, transformando a numa instância autoritária.

Critica, assim, a ideia de concretização dos valores materiais constitucionais, aludindo que, “ao deixar-se conduzir pela ideia da realização de valores materiais, dados preliminarmente no direito constitucional, o tribunal constitucional transforma-se numa instância autoritária”[40]

A participação popular na formação das leis acaba por ser intimidada com o agir criativo freqüente do Judiciário, cria-se, portanto um comodismo, tendo em vista que as referências serão definidas de certo modo por essas decisões juristas.

A invasão da esfera de competência dos tribunais, mediante concretizações materiais de valores, desestimula o agir orientado para fins cívicos, tornando-se o juiz e a lei as derradeiras referências de esperança para indivíduos isolados.[41]

Atribuindo-se uma competência estritamente política à Corte Constitucional, teremos uma desvalorização da lei impressa, dando abertura para a referência maior ser dada jurisprudencialmente, a partir duma reanalise do já imposto, ou duma criação a partir das lacunas existentes.

4.3 FUNDAMENTOS QUE NORTEIAM A DEMOCRACIA PROCEDIMENTAL

A democracia procedimental se funda em procedimentos que assegurem a formação democrática da opinião partindo da vontade dos cidadãos, exigindo assim uma participação política, da mais pura ideia de democracia, onde o o povo é o soberano poder e cabe a ele decidir os anseios da sociedade e os moldes a ela cabidos.

Habermas propõe um modelo de democracia constitucional que não tem como condição prévia fundamentar-se nem em valores compartilhados, nem em conteúdos substantivos, mas em procedimentos que asseguram a formação democrática da opnião e da vontade e que exige uma identidade política não mais ancorada em uma “nação de cultura”, mas, sim, em uma “nação de cidadãos”.[42]

Objurga, Habermas, a jurisprudência de valores, o Juiz criativo, extrapolando sua esfera de interpretação, execra o modelo substancialista de valores constitucionais superiores ao processo democrático.

Critica a assim denominada “jurisprudência de valores” adotada pelas cortes europeias, especialmente a alemã. Uma interpretação constitucional orientada por valores que opta pelo sentido teleológico das normas e princípios constitucionais, ignorando o caráter vinculante do sistema de direitos constitucionalmente assegurados, desconhece, na opnião de Habermas, não apenas o pluralismo das democracias contemporâneas, mas fundamentalmente a lógica do poder econômico e do poder administrativo.[43]

Ele critica a doutrina da ordem de valores, pois na medida e que o mesmo adota a doutrina de ordem de valores e toma como base de sua prática de decisão, cresce o perigo dos juízos irracionais, posto que neste caso os argumentos funcionalistas prevalecem sobre os normativos.

O Professor Lênio Luiz Streck, traz a tona questionamentos a respeito da eficácia desse modelo de democracia, partindo do pressuposto de como poderia-se conseguir que essa prática de interpretação operasse sem que a justiça adentrasse na competência legislativa, fazendo-se valer do princípio da Separação dos Poderes.

[...] como uma tal prática de interpretação (que proceda construtivamente), pode operar no âmbito da divisão de Poderes do Estado de Direito, sem que a justiça lance mão de competências legislativas e sem fazer com que se soterre a ligação estrita que deve haver entre a administração e a lei?[44]

Nesta seara de indagações, Habermas aduz na teoria do discusso que é possível a preservação da tripartição dos poderes, não existindo a necessidade de invasão de competências, pois assim como dita a teoria do checkand balance, os outros poderes servem para supervisionar, e garantir a harmonia, não devendo impor decisões.

Na visão da teoria do discurso sustentada por Habermas, a lógica da divisão de poderes exige uma assimetria no cruzamento dos Poderes do Estado: em sua atividade, o Executivo, que não deve dispor das bases normativas da legislação e da justiça, subjaz ao controle parlamentar e judicial, ficando excluída a possibilidade de uma inversão dessa relação, ou seja, uma supervisão dos outros dois Poderes através do Executivo. A lógica da divisão de Poderes não pode ser ferida pela prática de um tribunal que não possui meios de coerção para impor suas decisões contra uma recusa do parlamento e do governo.[45]

Habermas defende a teoria da ação comunicativa que se funda, sinteticamente, na tentativa de solução de um problema de cunho político, qual seja, o da legitimidade da ordem jurídica e os conflitos entre facticidade e validade, seguindo uma perspectiva sociológica.

Visualizando a democracia sob o enfoque do precedimento pelo qual as decisões são formadas, Jurgen Habermas defende uma opção de democracia deliberativa, que legitima as decisões pela discussão pública e argumentativa e se preocupa mais com a regularidade do precedimento de debate do que com a substância das conclusões.[46]

Observa-se assim quanto ao modelo de democracia deliberativa trabalha e valoriza o espaço de discussão pública, compreendendo-a como uma arena na qual os indivíduos, como iguais liberdades subjetivas de ação, se associam para debater questões de interesse coletivo por meio de um processo argumentativo em que se acolhe a decisão de maior consenso.

A validade do direito esta necessariamente atrelada a observância do procedimento democrático de sua produção, o qual se qualificará com a manifestação intersubjetiva dos cidadãos na sua criação. Esta validade será operacionalizada com a adoção do princípio de discurso, institucionalizado juridicamente pela figura de um princípio da democracia, que confere legitimidade ao processo de normatização.[47]

A compreensão de Habermas acerca do potencial democratizante da Constituição, como um verdadeiro espaço de debate entre os diversos segmentos das comunidades contemporâneas corresponde a uma concepção pluralista da sociedade atual. Muito embora sua aplicação no Brasil esbarre em questões práticas, como por exemplo a baixa capacidade de mobilização política da massa de eleitores, como decorrência direta da deficiência estrutural dos meios de distribuição dos bens culturais, é válida como uma concepção de constituição que impõe uma importante tarefa aos juízes, qual seja, a de não ceder à tentação de um ativismo judicial sem antes recorrer a argumentos democráticos que justifiquem sua intervenção em sede de políticas públicas.

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Sobre o autor
Kamilla Garcez

Advogada. Ambientalista. Graduada no Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais Professor Camillo Filho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARCEZ, Kamilla. A legitimidade democrática na jurisdição constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4091, 13 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29648. Acesso em: 28 mar. 2024.

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