1. Introdução: segurança jurídica, Justiça material e constitucionalidade dos atos judiciais
O Direito, como fenômeno social que é, essencialmente decorrente da natureza humana, mostra-se, dizia o professor Vicente Ráo (1999), como uma força social em sua origem, em sua essência e em sua finalidade, nascendo e tendo como objetivo precípuo suturar as inquietações e querelas que brotam na arena social. Nesse sentido é que o Estado-juiz, ao ser provocado por via do devido processo no qual coloca à sua apreciação um conflito de interesses marcado por uma pretensão resistida – na clássica concepção de Carnelutti, deve responder com uma decisão, uma resposta àquela situação concreta visando extirpar aquela querela, aplicando o direito que entender cabível ao caso.
Daí que, decidida a questão, e evitando a possibilidade de que a mesma possa a vir se manifestar indefinidamente, esgotados todos os meios recursais que o ordenamento jurídico põe à disposição da parte interessada, é tal decisão acobertada pelo manto da intangibilidade, da imutabilidade; é dizer, não mais poderá ser discutida, levada à apreciação pelo órgão judicial, em louvor à segurança que deve nortear as relações jurídicas, evitando-se, assim, a perpetuação dos litígios.
Nesse sentido, tem-se o fenômeno da coisa julgada material, configurada quando, vencido o prazo preclusivo para interposição de possíveis recursos, sem manifestação do vencido ou depois de decididos todos os recursos interpostos, sem possibilidades de novas impugnações, torna a sentença definitiva e imutável. É o que reza o artigo 467 do CPC, verbis: “denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.
Transitada em julgado a decisão, portanto, restaria, em última análise, e visando evitar que se protraia no tempo uma decisão injusta ou em desacordo com os ditames legais, valer-se o interessado da ação rescisória, nos casos expressamente previstos no artigo 485 do CPC e no prazo decadencial de 2 anos a contar do trânsito em julgado, conforme artigo 495 da Lei Adjetiva.
Casos há, porém, que mesmo decorrido este lapso temporal, mostra-se a sentença transitada em julgado inquinada de vício insanável, como v. g., em total discrepância com o Texto Maior. Ou seja: reconhece-se, posteriormente, que aquela sentença, já sob o manto da coisa julgada, padece de inconstitucionalidade.
Exsurge, então, um aparente conflito entre dois princípios insculpidos na própria Constituição da República, quais sejam: o da segurança jurídica e o da constitucionalidade dos atos do Poder Público (da submissão das decisões judiciais à Constituição), fazendo brotar da seara jurisprudencial e doutrinária posições não convergentes no sentido de abraçar ou não a possibilidade de flexibilizar a coisa julgada para, nos casos em que se reconhecer eivada de inconstitucionalidade, afastar tal decisão a fim de garantir uma outra pautada no respeito à superioridade do texto constitucional (princípio reitor de nosso ordenamento) e na necessidade de se prestar uma efetiva tutela jurisdicional, coadunada com o princípio da justiça, valor maior do ordenamento jurídico, conforme assegurado no preâmbulo da própria Carta Magna.
Nesse sentido, se por um lado é perigoso que o vírus do relativismo contamine fatalmente todo o sistema judiciário, como advogam os que não admitem a relativização da coisa julgada, por outro não se pode olvidar que dentro a sistemática kelseniana, adotada por nosso ordenamento jurídico, está a Constituição Federal sobre todas as outras normas. Estas, por sua vez, devem obediência àquela (CF).
Vige ainda, como consectário do princípio da supremacia da constituição, o princípio segundo o qual os atos do Poder Público deverão ser também proferidos em harmonia com o Texto Maior, não se justificando que o instituto da coisa julgada, embora criado com finalidade nobre, tenha o condão de perpetuar uma situação que, reconhecidamente, afronta os princípios emanados da CF. Como pondera o professor José Cândido Dinamarco, em laborioso artigo sobre o tema, e com a argúcia que lhe é peculiar, “não é legítimo eternizar injustiças a pretexto de evitar a eternização das incertezas”. (DINAMARCO, 2002, p. 4).
É vetusto o ensinamento segundo o qual a coisa julgada material é atributo da sentença (ou qualidade da mesma, como preferem outros) que visa perpetuar não os efeitos endoprocessuais (o que faz a coisa julgada formal) mas os reflexos no meio social; seria, assim, a imutabilidade dos efeitos da sentença, causada na vida das pessoas, ou seja, fora do processo. Casos há, porém, em que só aparentemente as sentenças produzem tais efeitos, pois estes são repelidos por razões superiores, de ordem constitucional, como ensina o citado processualista Cândido Dinamarco.
Frente a este embate é que surgem intrigantes questionamentos: teria a sentença, após o trânsito em julgado, o condão de erradicar a inconstitucionalidade de porventura lhe afeta? Seria a coisa julgada também um direito fundamental estatuído pela Carta Magna de 1988 ou mero recurso técnico-processual, artifício do legislador para não perenizar os conflitos?
Destas inquietações, desdobram outras no sentido de se perquirir se, em sendo reconhecido o instituto da coisa julgada como realmente direito fundamental assegurado pela Constituição da República, não caberia, nos casos concretos, sopesar os valores e princípios confrontantes para eleger um, haja vista o princípio da unidade da Constituição? Enfim, mostrando-se a sentença, já sob o pálio da res judicata, eivada de inconstitucionalidade (seja por abraçar uma situação de grave injustiça, contrariando diretamente a realidade e os preceitos da Constituição, seja por expresso reconhecimento pelo STF da inconstitucionalidade da lei que a fundamentou) poderia, nestas situações, valer-se da relativização da coisa julgada para desconsiderar esta situação de indiscutibilidade[1]? Que instrumentos processuais, então, disporia o interessado para provocar o Judiciário a reconhecer tal situação?
As possíveis respostas a tais indagações grassam em torno do reconhecimento da possibilidade de relativizar a coisa julgada, mesmo sem descurar de reconhecê-la como direito assegurado na própria Constituição Federal, mas admitindo-se a necessidade de sopesar valores e princípios constitucionais (que se mostram em aparente choque num certo caso concreto) a fim de se eleger um que nos casos de coisa julgada contrária à constituição seria o princípio da supremacia constitucional.
2. Fundamentos para afastamento da imutabilidade da coisa julgada inconstitucional
2.1 Supremacia da Constituição Federal sobre atos normativos e judiciais.
Conforme já observado, impera no Brasil o princípio da Supremacia da Constituição (princípio da constitucionalidade), como mola-mestra a fomentar e fundamentar todo qualquer ato jurídico infraconstitucional.
Neste sentido é que há uma nítida preocupação em conformar todos os atos legislativos ao que estatui a Carta Magna, de maneira que o seu próprio texto traz mecanismos e instrumentos hábeis a impugnar qualquer ato legal que vai de encontro aos mandamentos constitucionais.
Todavia, como bem assevera Paulo Otero, autor lusitano de obra lapidar sobre o assunto, tem-se uma tendência de não indagar sobre a constitucionalidade das decisões do Judiciário. Consagrou-se a ideia de que, uma vez verificada a coisa julgada, sepulta-se com ela toda e qualquer possibilidade de discutir se aquela sentença acoberta ou não um comando que não se sustenta em face do Texto Maior. Reinava majestosamente a ideia de que a coisa julgada era indene a qualquer ataque, mesmo se acobertasse a maior das injustiças e ferisse a Constituição.
Com efeito, no ordenamento jurídico brasileiro, antes de se verificar o trânsito em julgado da decisão judicial pode o interessado, observando as hipóteses e requisitos legalmente previstos, valer-se do Recurso Extraordinário para questionar a constitucionalidade do decisum, perante a Corte Suprema (STF). Todavia, uma vez exauridos os recursos cabíveis ou transcorrido o prazo recursal em branco, não resta alternativa senão resignar-se com o dispositivo da sentença, principalmente depois de decorridos os dois anos decadenciais da ação rescisória, quando então a coisa se torna soberanamente julgada.
Uma análise, mesmo perfunctória, sobre o controle dos demais atos que não os judiciais (mormente os legislativos), demonstra que tal situação não ocorre em relação aos mesmos. Mesmo em plena vigência e eficácia, uma lei ou qualquer outro ato normativo não está indene de verificação quanto à sua constitucionalidade. Não ocorre como a decisão judicial: o controle de constitucionalidade se dá tanto na elaboração do ato (ocorrendo aí o chamado controle preventivo) quanto depois de promulgada, por meio do controle repressivo, exercido preponderantemente[2] pelo Judiciário.
Em analogia, pode-se dizer que a decisão judicial, ao contrário do ato normativo, submete-se, mitigadamente, somente ao controle preventivo, através do recurso que contra a mesma pode ser intentado antes de ocorrer a coisa julgada - o recurso extraordinário. Uma vez verificada a res iudicata, não se vislumbra (pelo menos como outrora imperava) nenhum outro meio de se promover a adequação daquela decisão com os ditames constitucionais, tudo sob a consagração cega do princípio da segurança jurídica, em nome de um formalismo exacerbado e destoante com os princípios basilares das democracias modernas.
Como ensina Paulo Otero (1993), a problemática da inconstitucionalidade das decisões judiciais submeteu-se a um esquecimento quase que total, devido à concepção liberal de que o Juiz é ‘a boca que pronuncia as palavras da lei’ e o poder judicial como ‘invisível e nulo’ (Montesquieu)”. Nesta esteira de entendimento, e valendo-se das palavras de Otero, o processualista Humberto Theodoro Júnior adverte:
Com efeito, institucionalizou-se o mito da impermeabilidade das decisões judiciais, isto é, de sua imunidade a ataques, ainda que agasalhassem inconstitucionalidade, especialmente após operada a coisa julgada e ultrapassado, nos variados ordenamentos, o prazo para a sua impugnação. A coisa julgada, neste cenário, transformou-se na expressão máxima a consagrar os valores de certeza e segurança perseguidos no ideal do Estado de Direito. Consagra-se, assim, o princípio da intangibilidade da coisa julgada, visto, durante vários anos, como dotado de caráter absoluto.
Tal é o resultado da idéia, data vênia, equivocada e largamente difundida, de que o Poder Judiciário se limita a executar a lei, sendo, destarte, defensor máximo dos direitos e garantias assegurados no ordenamento jurídico e, por conseguinte, na própria Constituição.
(...)
Contudo, não se pode olvidar que, segundo bem lembra PAULO OTERO, “como sucede com os outros órgãos do poder público, também os tribunais podem desenvolver uma actividade geradora de situações patológicas, proferindo decisões que não executem a lei, desrespeitem os direitos individuais ou cujo conteúdo vá ao ponto de violar a Constituição. (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2002, p. 02, grifos nossos)
Em que pese todo o zelo na interpretação e aplicação do direito pelos juízes e Tribunais, da árdua tarefa de julgamento - que não se resume a mero silogismo aristotélico - pode surgir decisões que vão frontalmente de encontro aos princípios constitucionais ou pode ter como fundamento uma lei que, posteriormente, seja reconhecida, com efeitos ex tunc, como inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Julgamentos deste jaez, por razões cristalinas, não podem estar imunes ao controle de constitucionalidade.
Ideias neste sentido sempre colocarão em confronto os princípios da segurança jurídica e o da constitucionalidade e, sobretudo, da efetiva justiça. Estes últimos, todavia, em face daquele há de, insofismavelmente, prevalecer no sopesar dos interesses em questão, como tem acudido a mais abalizada doutrina e mesmo decisões dos tribunais superiores brasileiros, especialmente o Superior Tribunal de Justiça, com a voz expressiva e pioneira do Ministro José Delgado Filho.
É que, como salienta o mestre português Paulo Otero, admitir, resignados, a insindicabilidade de decisões judiciais inconstitucionais seria conferir aos tribunais um poder absoluto e exclusivo de definir o sentido normativo da Constituição: Constituição não seria o texto formalmente qualificado como tal; Constituição seria o direito aplicado nos tribunais, segundo resultasse da decisão definitiva e irrecorrível do juiz” (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2002, p. 05).
Qualquer ato contrário à Constituição, neste sentido, implica ocorrência do vício da inconstitucionalidade, inquinando-o de invalidade perante o ordenamento, já que a Constituição, como alhures referido, “é o fundamento da ordem jurídica do Estado, atuando como pressuposto de existência, de validade e de eficácia de todo o ordenamento infraconstitucional.” (MELLO FILHO, 1984, p. 255 apud ALMEIDA JUNIOR, 2006, p. 183)
Com efeito, em que pese deter o Poder Judiciário a prerrogativa de produzir a coisa julgada, não pode o mesmo se afastar do Estado de Direito. É um poder como qualquer outro que compõe a República Federativa do Brasil, não podendo se sobrepor aos demais, pelo que seus atos também devem ser passíveis de apreciação de constitucionalidade, sem o que implicaria “proclamar como divisa do Estado de Direito a seguinte ideia: todos os poderes públicos constituídos são iguais, porém, o poder judicial é mais igual do que os outros” (PAULO OTERO, 1991, p. 10).
De fato, não se pode aventar, nem de longe, a ideia de que o fato de ter a sentença passada em julgado suplanta e liquida a inconstitucionalidade que a inquina. O princípio de que os atos emanados do Poder Público devem se revestir de constitucionalidade, possibilita um viés de raciocínio no sentido de que a coisa julgada não pode estar acima da Carta Magna, em tema de inconstitucionalidade, sob pena de transformá-la em um instituto mais elevado e importante que a lei e a própria Constituição. “Se a lei não é imune, qualquer que seja o tempo decorrido desde a sua entrada em vigor, aos efeitos negativos da inconstitucionalidade, por que o seria a coisa julgada”? (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2002, p. 07)
Em face de tais questões, sapiente se mostra a assertiva do imortal Pontes de Miranda (1961) no sentido de que "levou-se muito longe a noção de res judicata, chegando-se ao absurdo de querê-la capaz de criar uma outra realidade, fazer de albo nigrum e mudar falsumin verum” (MIRANDA, 1961, apud DINAMARCO, 2001, p.04).
Imperioso reconhecer, atualmente, que a coisa julgada será intangível enquanto tal apenas quando conforme a constituição.
Concatenando todo o fundamento da necessidade de relativização da coisa julgada eivada de inconstitucionalidade, explicita Bruno Boquimpani Silva (2005), em magistral artigo, textualmente:
A noção de que a coisa julgada não deve mais ser tratada como um sacramento intangível advém da percepção de que os atos judiciais, assim como todos os atos do Poder Público, encontram-se subordinados ao princípio da constitucionalidade, não prevalecendo mais a tese de que o Poder Judiciário, por ser mero reprodutor da vontade da lei, seja incapaz de cometer inconstitucionalidades. Desta forma, a decisão judicial que avilta a constituição, assim como qualquer ato administrativo ou legislativo, é ato inválido. Não obstante, enquanto tradicionalmente desenvolveram-se inúmeros instrumentos de controle dos atos normativos, sempre que se fala em decisão judicial se tem a falsa impressão de que o seu controle de constitucionalidade, em nosso direito, somente é possível enquanto não operada a coisa julgada, através do recurso extraordinário ou, ainda mais excepcionalmente, através da via rescisória e desde que no prazo preclusivo previsto em lei. Tal concepção levaria, entretanto, a admitir-se que a coisa julgada poderia se sobrepor à própria Constituição, de modo que aos juízes caberia, em última instância e com exclusividade, definir o que é a Constituição, estando seus atos imunizados da mácula da inconstitucionalidade, noção esta não concebível em um sistema onde vige o princípio da supremacia constitucional. (SILVA, 2005, p. 17)
Valder do Nascimento (2004), um dos próceres na doutrina pátria no tema de relativização da coisa julgada inconstitucional, seguindo o rastro de Paulo Otero (1993), enfatiza que
Sendo certo que as decisões jurisdicionais configuram atos jurídicos estatais posto reproduzir a manifestação da vontade do Estado, sua validade pressupõe estejam elas em consonância com os ditames constitucionais. Por esse motivo, não se pode convalidar sua inconstitucionalidade, visto ser improvável abrir mão de mecanismos susceptíveis de permitir a efetivação de modificações imprescindíveis ao seu ajustamento aos cânones do direito constitucional. (NASCIMENTO, 2002, p. 09)
Como alhures referido, a Constituição, como norma suprema, pelo princípio da constitucionalidade dos atos do Poder Público, exige que todos os atos infraconstitucionais sejam com a mesma condizente, sob pena de ser declarados inconstitucionais e, consequentemente, afastados do ordenamento. A tal princípio se submete o Poder Legislativo, o Executivo e, inclusive, o Poder Constituinte derivado, que não pode desbordar dos limites e princípios da Carta Maior, como fruto do Poder Constituinte originário. Assim, também não foge de tal regra o Poder Judiciário. Seus atos hão de ser compatíveis com o texto maior sob pena de, assim como os textos legislativos, serem alvo de questionamento e, sendo o caso, eliminação do ordenamento, posto que não encontrando respaldo na Constituição, são atos que não podem prosperar.
Theodoro Júnior e Faria (2002), analisando a questão, de forma muito clara, se manifestam:
A coisa julgada não pode suplantar a lei, em tema de inconstitucionalidade, sob pena de transformá-la em um instituto mais elevado e importante que a lei e a própria Constituição. Se a lei não é imune, qualquer que seja o tempo decorrido desde a sua entrada em vigor, aos efeitos negativos da inconstitucionalidade, por que o seria a coisa julgada? (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2002, p. 07).
De fato, se assim acontecesse, a Constituição passaria a ser nada mais que a manifestação casuística dos magistrados nos casos concretos a eles submetidos, valendo a coisa julgada mais do que o próprio Texto promulgado pelo Constituinte, que, por sua vez, se mostraria como mero caminho a ser seguido, uma carta de recomendações. Isso, é óbvio, fere de morte os princípios da constitucionalidade, da força normativa da constituição e da máxima efetividade das normas constitucionais.
Na verdade, Paulo Otero (1993) atribui a existência da coisa julgada inconstitucional à falta de garantia de fiscalização das atividades produzidas pelo Poder Judiciário, ensejando a falsa impressão de que o que os Juízes e Tribunais decidissem, uma vez transitado em julgado, estaria indene a quaisquer questionamentos. Nada mais errôneo, acentua o jurista lusitano, uma vez que o Poder Judiciário não detém a soberania e, como tal, não pode se justificar o mito da intangibilidade da função jurisdicional, enquanto manifestação do exercício da atividade estatal.
Os atos jurisdicionais, portanto, para serem válidos hão de estar condizentes com a Lei Maior e com o que a Corte Suprema (guardiã da Carta Magna) entender que é a Constituição, tendo em vista que, como anota Luigi Ferrajoli (1997):
a sujeição do juiz a lei já não é de fato, como no velho paradigma juspositivista, sujeição a letra da lei, qualquer que seja o seu significado, mas sim sujeição a lei somente enquanto válida, ou seja coerente com a Constituição. E a validade já não é, no modelo constitucionalista-garantista, um dogma ligado a existência formal da lei, mas uma sua qualidade contingente ligada a coerência - mais ou menos opinável e sempre submetida a valoração do juiz - dos seus significados com a Constituição. Daí deriva que a interpretação judicial da lei é também sempre um juízo sobre a própria lei, relativamente a qual o juiz tem o dever e a responsabilidade de escolher somente os significados válidos, ou seja, compatíveis com as normas constitucionais substanciais e com os direitos fundamentais por elas estabelecidos. (FERRRAJOLI, 1997. p. 90-91, grifos nossos)
2.2. Valor Justiça como supremo a qualquer princípio
Dentre os diversos valores que o sistema jurídico abraça, um sobrepaira sobre todos: a justiça. Todo ordenamento, seja escrito, seja consuetudinário, busca este ideal, essa forma de manter a ordem e a estabilidade pautadas no sentido do equânime, do justo. Assim é desde a Antiguidade, quando filósofos já debruçavam sobre a essência de tal noção, e persegue o homem até os dias atuais, como acontece com nossa Carta Magna de 1988, que já no seu preâmbulo estatui que a República Federativa do Brasil é um Estado Democrático de Direito destinado a assegurar, também, a justiça como valor supremo da sociedade.
É, todavia, conceito aberto, impossível de se delimitar em poucas palavras, principalmente porque variável a depender do contexto histórico, dos valores e da práxis de cada povo. Seja na concepção kelseniana, no sentido de que Justiça é felicidade social, é a felicidade garantida por uma ordem social, seja na visão de Chaim Perelman[3] para quem ser justo é tratar da mesma forma os seres que são iguais em certo ponto de vista, que possuem uma mesma característica, a única que se deve levar em conta na administração da justiça, seja, enfim, na ideia do autor da mais moderna teoria da justiça da atualidade, John Rawls (2000, p. 03 apud NUNES JUNIOR, 2003, p. 07), que defende o ideal de justiça como equidade, uma justiça estabelecida numa posição inicial de perfeita equidade entre as pessoas, e cujas ideias e objetivos centrais constituem uma concepção para uma democracia constitucional, o certo é que a ideia de justiça é imanente a todo ser humano em sua perspicácia subjetiva de apreendê-la - e está acima de qualquer critério de formalidade ou regra positivada.
Por isso que a Justiça há de estar presente em toda e qualquer decisão judicial, já que esse o ideal maior que se presta o Judiciário e disso deve ser servo o processo[4], não podendo uma decisão proferida com base em lei que concretize manifesta injustiça ser válida, mormente quanto fundada em lei tido por inconstitucional, mesmo porque “num Estado de Direito material, tal como a lei positiva não é absoluta, também não o são as decisões judiciais. Absoluto, esse sim, é sempre o Direito ou, pelo menos, a ideia de um direito justo.” (OTERO, 1993, p. 41)
O direito justo se sobrepõe, assim, ao princípio da segurança jurídica, já que esta em nada valerá se permanecer a inquietação de um cometimento de injustiça. Neste sentido é que no Estado de Direito, especialmente no Estado brasileiro, a justiça é também um valor perseguido (Preâmbulo da Constituição da República). O que se busca, hodiernamente, é que se aproxime ao máximo do Direito justo; e “nada mais injusto que uma decisão judicial contrária aos valores e princípios consagrados na Constituição Federal” (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2003, p. 18).
Mesmo porque a segurança jurídica não pode se realizar plenamente se não atende aos valores de equidade e justiça, consoante ensinamento lapidar de Paulo Nader:
A justiça é o valor supremo do Direito e corresponde também à maior virtude do homem. Para que ela não seja apenas uma idéia e um ideal, necessita de certas condições básicas, como a da organização social mediante normas e do respeito a certos princípios fundamentais; em síntese, a justiça pressupõe o valor segurança. Apesar de hierarquicamente superior, a justiça depende da segurança para produzir os seus efeitos na vida social. Por este motivo se diz que a segurança é um valor fundante e a justiça um valor fundado. Daí Wilhelm Sauer ter afirmado, em relação ao Direito, que ‘a segurança jurídica é a finalidade próxima; a finalidade distante é a justiça’”. (NADER, 1997, p. 139 apud SILVA, 2005, p. 12, realces nossos)
Ratifica tal entendimento o insigne constitucionalista Celso Ribeiro Bastos (1999), quando reza que:
A própria segurança jurídica busca a realização da justiça. Na medida em que não há nenhuma segurança, é praticamente certa a ausência também da justiça. O que ocorre é que nem todo Direito seguro será inexoravelmente um Direito justo. Reconhece-se, pois, que o princípio da segurança jurídica exerce um papel mínimo, posto que sem ele não será possível realizar os demais elementos, tais como a justiça, a liberdade, a igualdade, etc. (BASTOS, 1999, p. 31, realces nossos)
Uma decisão se mostrará injusta, portanto, quando houver, por exemplo, feito tábula rasa do direito objetivo inserido em dispositivos e princípios constitucionais ou quando se pautar em norma que seja declarada contrária aos ditames da Carta Maior, impondo-se, nestes casos, reapreciação do caso para imperar a justiça.
2.3 Efetividade da prestação jurisdicional: princípio reitor do ordenamento
Sendo o Judiciário o Poder incumbido de resolver as controvérsias jurídicas e, nas lides a ele apresentadas, dizer o Direito no caso concreto, tem o nobre poder-dever de, na situação concreta, efetivar e garantir o direito material posto sob sua análise. O processo, neste sentido, tem caráter instrumental, sendo meio para consecução da Justiça, que só quando efetivamente declarada, desincumbir-se-á o Judiciário de seu papel.
As formalidades processuais, portanto, não devem ser apresentadas como óbices à concretude da Justiça e à prestação jurisdicional efetiva, de maneira que nem mesmo a coisa julgada, que se mostra também como instituto processual - hábil a pôr fim àquela discussão e evitar que a mesma seja reavivada noutra ocasião - deve sobrelevar-se em face de situações de flagrante descompasso entre a decisão formal e o direito material (realidade fática) que se mostra, muitas vezes, como o óbvio ululante perante as partes e o Judiciário.
Convém trazer à baila, neste ponto, a inestimável contribuição do citado professor Dinamarco (2002), quando, de forma irretocável, explica que
o logos de lo razonable, da notória e prestigiosa obra de Recaséns Siches, quer que se repudiem absurdos agressivos à inteligência e aos sentimentos do homem comum, sendo absurdo eternizar injustiças para evitar a eternização de incertezas. [...] Não é lícito entrincheirar-se comodamente detrás da barreira da coisa julgada e, em nome desta, sistematicamente assegurar a eternização de injustiças, de absurdos, de fraudes ou de inconstitucionalidades.” (DINAMARCO, 2002, p. 19)
Abraçando tal entendimento, o Ministro José Delgado (2002), assim se posiciona:
não protege a sentença judicial, mesmo transitada em julgado, que bate de frente com os princípios da moralidade e da legalidade, que espelhe única e exclusivamente vontade pessoal do julgador e que vá de encontro à realidade dos fatos. (DELGADO, 2002, p.
Continua o preclaro professor Dinamarco, com a sagacidade que lhe é peculiar, verbis:
A partir dessas ideias, em uma obra ainda inédita proponho a interpretação sistemática evolutiva dos princípios e garantias constitucionais do processo civil, dizendo que "nenhum princípio constitui um objetivo em si mesmo e todos eles, em seu conjunto, devem valer como meios de melhor proporcionar um sistema processual justo, capaz de efetivar a promessa constitucional de acesso à justiça (entendida esta como obtenção de soluções justas – acesso à ordem jurídica justa). Como garantia-síntese do sistema, essa promessa é um indispensável ponto de partida para a correta compreensão global do conjunto de garantias constitucionais do processo civil", com a consciência de que "os princípios existem para servir à justiça e ao homem, não para serem servidos como fetiches da ordem processual". (DINAMARCO, 2002, p. 02, grifos nossos)
E conclui, defendendo como mais um dos fundamentos da possibilidade de estremecer os dogmas da coisa julgada, a garantia constitucional do acesso à ordem jurídica justa, que repele a perenização de julgados aberrantemente discrepantes dos ditames da justiça e da equidade. Em verdade, a opção por deixar-se de lado, pelo menos em parte, o valor segurança em favor do valor efetividade mostra-se necessária, posto que não mais concebível um quadro em que se privilegia a resolução ”formal” dos conflitos: “o que se quer são soluções reais, ainda que ocorram num esquema de menor segurança” (WAMBIER e MEDINA, 2003, p. 174).
Por fim, sintetiza este sentimento, de forma completa e concisa, o advogado Bruno Boquimpani Silva (2005), em respeitável artigo intitulado O princípio da segurança jurídica e a coisa julgada inconstitucional, quando arremata que
o papel e o alcance atual da segurança jurídica no processo passa por uma fase de total reavaliação, de forma que se busca valorizar mais o princípio contraposto da efetividade do processo, ressaltando-se cada vez mais o seu caráter instrumental de realização dos direitos. (SILVA, 2005, p. 09).
2.4 Ponderação de princípios: coisa julgada e a segurança jurídica como preceitos não absolutos
Já não paira dúvidas quanto à normatividade dos princípios. Pacífico é, atualmente, que aos mesmos se devem obediência, já que enfeixam sobre o ordenamento jurídico as diretrizes que deverão delinear a conduta do construtor e, sobretudo, do aplicador do direito, máxime quando se tratar de princípios expressamente insculpidos na Carta Magna ou que decorram implicitamente do sistema constitucional, como imprescindíveis à manutenção do Estado Democrático de Direito. Neste caminho é que o notável administrativista Bandeira de Mello (2005), esclarece que:
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçadas.” (MELLO, 2005, p. 883)
Na realidade, todo o sistema jurídico está pautado por princípios e são estes os responsáveis pela manutenção da estrutura do Estado, em seu fim precípuo que diz respeito ao bem comum, consubstanciado, na área do Direito, pela efetiva prestação jurisdicional, pela busca da justiça e pela coerência sistemática do sistema, verificada pela compatibilidade de decisões com as normas superiores.
Nada mais esclarecedor, neste ponto, do que as palavras do jurista que mais contribuiu para reconhecimento da normatividade dos princípios, o professor italiano Crisafulli, para quem princípio é toda norma jurídica considerada como “determinante de outra ou outras que lhe são subordinadas, que a pressupõem, desenvolvendo-se e especificando ulteriormente o preceito em direções mais particulares” (BONAVIDES, 2003, p. 245). Para tal jurista, os princípios, sejam expressos numa formulação legislativa, seja implícito ou latente num ordenamento jurídico, constitui norma, aplicável como regra.
Mesmo porque,
a importância vital que os princípios assumem para os ordenamentos jurídicos se torna cada vez mais evidente, sobretudo se lhes examinarmos a função e presença no corpo das Constituições contemporâneas, onde aparecem como os pontos axiológicos de mais alto destaque e prestígio com que fundamentar na Hermenêutica dos tribunais a legitimidade dos preceitos da ordem constitucional. (BONAVIDES, 2003, p. 260)
Neste sentido, o princípio da constitucionalidade - supremacia da Constituição - exsurge como decorrente da própria organização do Estado brasileiro como Estado Democrático de Direito, que pauta suas ações nas leis e estas, por sua vez, haurem seus fundamentos na Carta Magna, de maneira que extirpado do ordenamento e do sistema deverá ser todo e qualquer ato que contrarie a Constituição ou que se fundamente em dispositivo que fere a Lei Maior.
A necessidade de se reconhecer e dar eficácia aos princípios, portanto, é inconteste. Ocorre, todavia, que a Constituição alberga em seu bojo matizes as mais diversas de direitos - fruto da complexidade ideológica da Constituinte de 1988, de maneira que, em determinado caso concreto, possível se mostre um choque, aparente, de princípios. É dizer: tem-se a possibilidade de em determinadas situações o aplicador detectar confronto entre dois princípios, situação em que, feitas a valorações devidas, deverá preterir um princípio naquele caso para que outro incida, por se mostrar de maior relevância.
Isso não implica nulificar o princípio não aplicado, nem que uma cláusula de exceção nele se introduza: apenas em circunstâncias determinadas um princípio cede ao outro[5], mesmo porque os princípios não são absolutos, nem a constituição alberga disposições contraditórias. Imperioso entender a Constituição como um todo, sistematicamente, já que é uma unidade. Este princípio da unidade da Constituição sugere, então, seja efetuado um sopesamento dos valores aparentemente em conflitos para se eleger um - tarefa a ser engendrada pelo intérprete, valendo-se do princípio da Concordância Prática.
É o que a doutrina defende quando se depara com situações em que se encontram, de um lado a defesa dos princípios da supremacia da constituição e da efetiva prestação jurisdicional e, sobretudo, da justiça e, de outro, o princípio da segurança jurídica, exteriorizado na defesa ferrenha da imutabilidade da coisa julgada.
Pondera, neste sentido, o eminente constitucionalista Canotilho (2001), quando ensina que “reduzido ao seu núcleo essencial, o princípio da concordância prática impõe a coordenação e combinação de bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício (total) de uns em relação aos outros” (CANOTILHO, 2001, p. 1150).
Em suma, situações e circunstâncias há em que imperiosa se mostra a primazia a ser dispensada a um interesse jurídico em detrimento momentâneo de outro, sob pena de se consagrar uma aberração no sistema, ou, enfim, uma contradição no ideal de justiça, fim maior de todo o arcabouço jurídico.
Nessa toada, e considerando a necessidade de se sopesar os valores aparentemente conflitantes por força do princípio da unicidade da Constituição[6], aponta os doutrinadores que a intangibilidade da coisa julgada deve ser sustentada até quando não albergue decisão teratológica, despropositada e, sobretudo, quando não fere a Constituição.
Nesta esteira de entendimento é que em determinados casos, optar pelo abalo da coisa julgada,
não é desprezar o valor segurança! Quem fica com a possibilidade de impugnar tais decisões opta não só pelo valor justiça, mas pelos valores justiça e segurança, num sentido um pouco diverso do tradicional. Segurança, com os olhos voltados para o futuro, segurança no sentido de previsibilidade. É só parcialmente verdadeiro dizer-se que quem opta pela imutabilidade ou pela impossibilidade de se impugnarem decisões baseadas em leis tidas (incidenter tantum, reiteradamente) por inconstitucionais estaria optando pelo valor segurança. Que segurança é essa? Segurança da subsistência do que já há, do que já existe, do que é já conhecido, ainda que não se trate do melhor? Segurança com os olhos voltados só para o passado. A segurança pela qual optamos, que não é segurança por si mesma, mas segurança de se ter conseguido o melhor, portanto segurança com conteúdo. Ao nos posicionarmos no sentido da impugnabilidade de tais decisões, optamos pela segurança ligada ao princípio da isonomia, à necessidade de uniformidade das decisões judiciais proferidas em face dos mesmos fatos e do mesmo texto legal, à segurança de que a decisão que prevalecerá será a melhor, e alcançará a todos quantos estejam na mesma situação (WAMBIER e MEDINA, 2003, p. 71).
Na mesma esteira de entendimento, Theodoro Júnior e Faria (2002), defendendo, inclusive, a inexistência de proteção constitucional à coisa julgada, assim se posicionam:
A inferioridade hierárquica do princípio da intangibilidade da coisa julgada, que é uma noção processual e não constitucional, traz como consectário a idéia de sua submissão ao princípio da constitucionalidade. Isto nos permite a seguinte conclusão: a coisa julgada será intangível enquanto tal apenas quando conforme a Constituição. Se desconforme, estar-se-á diante do que a doutrina vem denominando coisa julgada inconstitucional. (THEODORO JUNIOR e FARIA, 2002, p. 15).
Corolário da alegação do douto constitucionalista José Afonso da Silva (1999), no sentido de que a coisa julgada não goza da imutabilidade como pregam outros, apregoando que não pode ser suscetível de mitigação, tem-se, além da rescisória (instituída por lei infraconstitucional e que possibilita rescindir a sentença já transitada em julgado), a disposição expressa do Código de Processo Civil, ínsita em seu artigo 475-L, § 1o, instituído pela Lei 11.232/2005.
De fato, defende o notável autor que
A proteção constitucional da coisa julgada não impede, contudo, que a lei preordene regras para a sua rescisão mediante atividade jurisdicional. Dizendo que a lei não prejudicará a coisa julgada, quer-se tutelar esta contra atuação direta do legislador, contra ataque direto da lei. A lei não pode desfazer (rescindir ou anular ou tornar ineficaz) a coisa julgada. Mas pode prever licitamente, como o fez no art. 485 do Código de Processo Civil, sua rescindibilidade por meio de ação rescisória. (SILVA, 1999, p.437)
Valendo de tal possibilidade (restrição dos efeitos da coisa julgada) é que o legislador, já reconhecendo a impossibilidade de uma decisão judicial que fere a Constituição se firmar e produzir efeitos normalmente, face à gravidade que acoberta, reconheceu a possibilidade de se questionar tal decisão condenatória, esvaziando a força imperativa que possivelmente irradiaria se se mostrar desconforme a Carta Magna. Assim, em 26.01.2001 foi editada a Medida Provisória 2.180-35, que permaneceu em vigor por força da Emenda Constitucional no 31, de 11.09.2001, estabelecendo que considera-se “inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal”.
Ou seja: em que pese algumas vozes contrárias, o ordenamento passou a positivar, de forma expressa, a impossibilidade de permanecer no sistema uma sentença contrária ao Texto Maior, prestigiando o princípio da supremacia da constituição e outros por ela albergados, como o da proporcionalidade e da igualdade, permitindo, pelo antigo artigo 741, parágrafo único do CPC, que o executado pudesse apresentar embargos à execução contra decisão judicial fundada em lei tida por inconstitucional pela Corte Suprema, reconhecendo de forma meridiana que tal decisão padecia de vício insanável e, portanto, não era dotada de exigilidade.
Tal disposição foi mantida na reforma processual quanto ao processo de execução, tendo a Lei 11.232/2005, que entrou em vigor em junho do ano corrente, instituído o artigo 475-L, § 1o do CPC, dispondo:
Art. 475-L. A impugnação somente poderá versar sobre:
[...]
II – inexigibilidade do título;
[...]
§ 1o Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.
Tal dispositivo, portanto, joga uma pá de cal no entendimento outrora prevalente de que a declaração abstrata de inconstitucionalidade feita pelo STF mesmo com efeitos ex tunc e erga omnes, não afetava a coisa julgada, que permanecia a tais efeitos. Ou seja, tal declaração não tinha o poder de alterar em nada a decisão com trânsito em julgado. Com o dispositivo em comento, amplia-se, portanto, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade feita pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, em louvor ao princípio da supremacia da Constituição.
Portanto, uma vez declarada a inconstitucionalidade, pelo STF em sede de controle abstrato (tendo a doutrina se manifestado que cabe aplicação de tal dispositivo também quando a declaração de inconstitucionalidade for feita incidentalmente se o Senado Federal fizer uso do art. 52, X, da CF/88, compreendendo também o processo inverso, ou seja, o caso em que o juiz afastou a aplicação de uma lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais e o STF, posteriormente, julgou procedente a ADECON), poderá o executado impugnar o título executivo judicial, posto que se tem que o mesmo é inexigível, já que acoberta situação contradizente com o sentimento constitucional, de maneira que se prevalecer estaria sobrepondo-se à própria Constituição, o que um sistema Democrático de Direito não comporta.
Assim, a sentença considerada inconstitucional (seja por ter como fundamento lei considerada posteriormente como incompatível com a Constituição, seja por não aplicar lei reconhecendo ser a mesma inconstitucional, advindo decisão declarando sua constitucionalidade – na clássica classificação de Paulo Otero), não tem o condão de sustentar uma execução, já que se mostra como título executivo inexigível, nos termos da referida Lei 11.232/2005: dispositivo do artigo 475-L, § 1º do CPC[7].
Tal alteração legislativa configurou-se como verdadeira inovação no sistema, tendo em vista que foi a introdução, no ordenamento jurídico pátrio, do reconhecimento, de forma expressa, da relativização da coisa julgada inconstitucional.
Sobrelevando o princípio da constitucionalidade, o dispositivo esclarece que o juízo de inconstitucionalidade da norma, na qual se funda o provimento exequendo, “atuará no plano da eficácia da coisa julgada, desfazendo-a retroativamente e apagando o efeito executivo da condenação, tornando inadmissível a execução” (ASSIS, 2004, p.51), conforme bem asseverou o a decisão abaixo transcrita:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DO DEVEDOR. FGTS. DECISÃO DO STF. APLICAÇÃO DO ART. 741, PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC. EXTRATOS. 1. O reconhecimento de inexistência de coisa julgada contra a Constituição, e a possibilidade de sua mutabilidade quando prevista em lei, não afrontam a estabilidade das relações jurídicas. Ao contrário, confirmam a supremacia da Constituição e o direito subjetivo validamente constituído, atuando como fator de equilíbrio do ordenamento jurídico, uma vez que apenas as decisões em desconformidade com esse ordenamento terão sua execução obstada, especialmente em se cuidando de matéria de direito público, como na espécie, em que todos os destinatários da lei devem receber tratamento isonômico.
2. [...] deve adequar o título judicial exequendo ao entendimento do STF. (TRF – 1ª Região, Apelação cível 2002.30.00.001158-9/AC, Relator convocado Jamil Rosa de Jesus, julgado em 24/11/2003).
3. À guisa de conclusão
Pelas considerações acima alinhavadas, e não negando o mérito do princípio que a coisa julgada pretende resguardar - o da segurança jurídica, há de se concluir que a veneração dispensada à coisa julgada já não se pode exacerbar de tal forma a ponto de, em nome de sua intangibilidade, consagrar e perpetuar uma decisão que afronta a Constituição da República, quando proferida em confronto direto com seus dispositivos ou quando pautada em lei considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal e, portanto, lei eliminada do ordenamento jurídico.
A coisa julgada, neste sentido, não pode ter o condão de cristalizar situações fático-jurídicas contrárias aos preceitos constitucionais. A supremacia da Constituição, a necessidade de que a prestação jurisdicional se paute no ideal de Justiça e na legalidade bem como a ideia de que a segurança jurídica como valor inerente à coisa julgada e, por conseguinte, o princípio de sua intangibilidade são dotados de relatividade, autorizam a possibilidade de, em certos casos, relativizar a res judicata, fazendo esta quedar-se diante da desconformidade com a Carta Magna, sob pena de se manter situações destoantes com os princípios que regem um legítimo Estado Democrático de Direito.
Na ausência de expressa habilitação constitucional, a segurança e a certeza jurídicas inerentes ao Estado de Direito são insuficientes para fundamentar a validade de um caso julgado inconstitucional, de maneira que, sem nulificar o princípio da segurança jurídica, já não se pode ignorar a relativização da coisa julgada para adequar todos os atos infraconstitucionais à Constituição da República e à realidade fático-social como forma de garantir efetiva prestação jurisdicional, por meio de decisões justas - qualidade que certamente não ostentarão se albergarem situações desconformes com os ditames da Constituição.
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[1] O ordenamento pátrio, de forma expressa, mas ainda com alguma tergiversação doutrinária, já abraça tal possibilidade de relativização, conforme se depreende do artigo 475-L, § 1o do CPC.
[2] Diz-se preponderantemente porque também o legislativo, excepcionalmente, efetua controle repressivo, como ocorre nas situações do artigo 49, V e 62 (rejeição de MP) da CF.
[3] A justiça possível em Perelman é a justiça formal ou abstrata segundo o parâmetro da igualdade, fundado sobre uma pauta valorativa. Logo, a justiça deve contentar-se com um desenvolvimento formalmente correto de um ou mais valores. E assim Perelman é levado a distinguir três elementos na justiça de determinado sistema normativo: o valor que a fundamenta, a regra que a enuncia e o ato que a realiza” (NUNES JUNIOR, 2003)
[4] Cibele Pinheiro Marçal TUCCI, no texto Bases estruturais do processo civil moderno: In Processo Civil. José Cruz e Tucci (coord.). São Paulo, Saraiva, 1995, p.55, assim coloca: “impõe-se o estudo do processo à luz da comparação jurídica, do momento histórico, da ideologia e das vicissitudes de um povo, sob pena de transportar esse instrumento de Justiça e os seus relevantes escopos para o plano estreito do formalismo e das burocracias inócuas”. (g. n.)
[5] Entendimento esposado pelo grande jurista Robert Alexy, quando traça as diferenças entre regras em princípios, no que é referido por Paulo Bonavides em sua obra Curso de Direito Constitucional da Editora Malheiros.
[6] Ensina Luís Roberto Barroso em sua obra Interpretação e Aplicação da Constituição, que o princípio da unidade é uma especificação da interpretação sistemática, e impõe ao intérprete o dever de “harmonizar as tensões e contradições entre as normas. Deverá fazê-lo guiado pela grande bússola da interpretação constitucional: os princípios fundamentais, gerais e setoriais inscritos ou decorrentes de Lei Maior.” (BARROSO, 1999, p. 188).
[7] A Consolidação das Leis do Trabalho também contém esta regra em seu art. 884, § 5o, inserida pela MP no 2.180-35.