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O processo legislativo orçamentário no Brasil e a autonomia financeira do Poder Judiciário

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22/02/2015 às 11:17
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6. PROCESSO LEGISLATIVO ORÇAMENTÁRIO. A ELABORAÇÃO DAS PROPOSTAS. A APROVAÇÃO DAS LEIS ORÇAMENTÁRIAS. LIMITES À ATUAÇÃO DOS PODERES.

A Constituição Federal determina a elaboração de três leis orçamentárias, todas de iniciativa do Poder Executivo, como já visto, para a organização das finanças públicas.

São elas:

1) Plano Plurianual (PPA);

2) Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO);

3) Lei Orçamentária anual (LOA).

O Plano Plurianual é o instrumento que consolida o planejamento da atividade financeira governamental, estabelecendo as diretrizes e as metas da administração, inclusive nos âmbitos regionais, para as despesas de capital e outras delas decorrentes, bem como para as referentes aos programas de duração continuada (art. 165, § 1.º, da CF).

Destaque-se que nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade (art. 167, § 1.º, da CF).

No âmbito federal (art. 35 do ADCT), este projeto deve ser encaminhado pelo Executivo ao Legislativo até o dia 31 de agosto do primeiro ano de mandato do Presidente da República (até 4 meses antes do término do primeiro exercício financeiro do mandato), e deve ser aprovado pelo Legislativo até o dia 22 de dezembro (encerramento da segunda sessão legislativa do primeiro exercício do mandato).

A Lei de Diretrizes Orçamentárias é a lei anual que deve dispor sobre (art. 165, § 2.º, da CF):

a) metas e prioridades da administração pública federal;

b) despesas de capital para o exercício financeiro subseqüente (daí sua anualidade);

c) orientação acerca da elaboração da lei orçamentária anual;

d) alterações na legislação tributária;

e) política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal etc.).

Há também outras exigências criadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF – Lei Complementar n.º 101/2000 - art. 4º):

- dispor sobre equilíbrio entre receitas e despesas (deve ser real e não maquiado com operações de empréstimos por exemplo);

- fixar critérios e formas de limitação de empenho caso a previsão de receitas não se realize (na verdade é limitação a novas obrigações e não ao mero empenho);

- instituir normas relativas ao controle de custos e à avaliação dos resultados dos programas financiados com recursos dos orçamentos;

- impor demais condições e exigências para transferências de recursos a entidades públicas e privadas;

- conter anexo de metas fiscais, anexo de riscos fiscais e um anexo específico da LDO da União, tratando este último dos objetivos das políticas monetária, creditícia e cambial. Esse anexo também deve prever metas de inflação do próximo período.

A LDO produz efeitos orçamentários por apenas um ano, para o próximo exercício financeiro. Porém, deve estar acabada e aprovada no primeiro semestre do ano antecedente. Portanto, no segundo semestre do ano antecedente esta lei já está pronta e acabada, mas ainda não surte seus efeitos orçamentários (ela servirá de diretriz para que as outras leis possam ser elaboradas, e por isso deve estar pronta antes).

Em suma, a LDO faz a ligação entre o Plano Plurianual e a Lei Orçamentária Anual.

O Executivo deve enviar ao Legislativo o projeto de LDO até o dia 15 de abril de cada ano (oito meses e meio antes do encerramento do exercício financeiro), sendo que o Legislativo deve apreciá-lo até o dia 17 de julho daquele mesmo ano (encerramento da primeira sessão legislativa).

A Lei Orçamentária Anual (LOA) é aquela que traz a previsão anual, de forma detalhada e pontual, de tudo aquilo planejado a título de despesa, receita ou crédito para o próximo exercício financeiro (é o período compreendido entre 1.º de janeiro e 31 de dezembro).

Também chamada de orçamento, lei de orçamento ou lei orçamentária.

Assim como as demais, é uma lei ordinária, que deve estar em consonância com a LDO e com o PPA.

A Lei de Responsabilidade Fiscal acrescentou os seguintes requisitos à LOA (art. 5.º), que deve conter:

1- anexo com demonstrativo de compatibilidade da programação dos orçamentos com os objetivos e metas do anexo de metas fiscais da LDO;

2- previsão do caráter compensatório entre a arrecadação e a renúncia de receita;

3- previsão para reserva de contingência (congelamento de verbas) com o objetivo de garantir imprevistos;

4- dados sobre o refinanciamento da dívida pública.

O § 4.º, deste art. 5,º, da LRF, veda a existência de crédito com finalidade imprecisa ou com dotação ilimitada na LOA.

Esta lei é composta pela somatória das “peças orçamentárias”. Assim, cada ente administrativo que possui independência ou autonomia, com personalidade própria ou não, e os demais Poderes e entes independentes constitucionais (Ministério Público e Tribunal de Contas da União) elaboram seus próprios orçamentos, que são chamados de “peças orçamentárias”.

Estas peças devem ser reunidas pela chefia do respectivo órgão, pessoa ou Poder e enviadas ao Poder Executivo que fará a consolidação do projeto.

O projeto de LOA deve ser enviado pelo Executivo ao Legislativo até 31 de agosto (4 meses antes do encerramento do exercício financeiro), sendo que cabe ao Legislativo aprová-lo até o dia 22 de dezembro (encerramento da segunda sessão legislativa).

Este processo legislativo das Leis Orçamentárias é atualmente regido pelo art. 166 da CF e pela Lei n.° 4.320/64, enquanto não editada nova lei complementar prevista no § 6.º do mencionado art. 166 da CF.

Como já amplamente referido, a iniciativa dos projetos é privativa do Chefe do Executivo. Não cabe iniciativa popular (art. 165 e art. 84, XXIII, da CF), sendo que a doutrina sustenta ser possível o plebiscito ou referendo, mas apenas para pontos específicos, uma vez que não seria materialmente possível para o projeto todo.

Destaque-se que é vedada a edição de medidas provisórias sobre planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado os créditos extraordinários no caso de despesas imprevisíveis e urgentes (art. 62, § 1.º, I, “d”, da CF).

O projeto com o orçamento unificado é encaminhado ao Poder Legislativo para discussão e aprovação, o que é feito por meio de um procedimento especial previsto no art. 166 e seus parágrafos da Constituição Federal e no regimento comum do Congresso Nacional.

Assim, no âmbito federal, estes projetos iniciam sua tramitação na Comissão Mista de Orçamento, composta de Deputados e Senadores, que dão parecer sobre todos. Os projetos das demais leis que não sejam orçamentárias (ex.: projeto de Código) tramitam primeiro na Câmara dos Deputados e depois no Senado ou vice versa (primeiro no Senado depois na Câmara), mas para as leis orçamentárias há uma única tramitação na Comissão Mista (art. 166 da CF).

No mais, segue a normal disposição do regimento interno.

O Chefe do Executivo pode apresentar emendas modificativas ao projeto que enviou, mas desde que não tenha sido iniciada a votação na Comissão da parte que ele pretende alterar (art. 166, § 5º, da CF).

Por sua vez, os parlamentares podem apresentar emendas para o projeto enviado pelo Executivo referente a todas as leis orçamentárias, tal como já decidiu o Supremo Tribunal Federal (ADI 1.050-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 21-9-1994, Plenário, DJ de 23-4-2004) desde que respeitem o previsto no art. 166, §§ 3º e 4.º, da Constituição Federal:

I- são admitidas livremente emendas para a correção de erros materiais;

II – sempre devem ser compatíveis com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias;

III – somente é possível emenda que indique de onde virão os recursos necessários. A emenda não pode aumentar o volume total de despesas previsto pelo Executivo, devendo propor a anulação de uma despesa e sua substituição por outra;

IV - é vedada emenda sobre: a) previsão de gastos para pessoal e seus cargos; b) a previsão de gastos com o pagamento da dívida pública; c) previsão de gastos com as transferências constitucionais tributárias (art. 157 a 159 da CF). Sobre estes três temas o projeto do Executivo não pode sofrer alterações.

Cada uma das emendas recebe parecer favorável ou contrário da comissão.

Após, o projeto original, as emendas e respectivos pareceres serão apreciados pelo plenário das duas Casas do Congresso Nacional em sessão conjunta, mas a apuração dos votos é separada, votando primeiro os Deputados Federais (art. 43 do Regimento Comum do CN).Depois, o projeto volta ao Executivo para sanção ou veto.

Os recursos que, em decorrência de veto, emenda ou rejeição do projeto de lei orçamentária anual, ficarem sem despesas correspondentes poderão ser utilizados, conforme o caso, mediante créditos especiais ou suplementares, com prévia e específica autorização legislativa (§ 8.º, do art. 166, da CF).

Este, em suma, o procedimento legislativo previsto para a aprovação das leis orçamentárias.

Da sua análise, observamos claramente duas etapas em sua formação: uma meramente administrativa e outra propriamente legislativa.

A etapa administrativa diz respeito às atividades desenvolvidas para a elaboração das propostas orçamentárias de cada ente, indo até a consolidação de todas pelo Executivo.

A partir da apresentação pelo Executivo do projeto ao Legislativo, dá-se início à etapa legislativa, que se encerra com a sua aprovação e promulgação.

Para ilustrar, examinaremos a elaboração do orçamento federal.

Nesta, a fase administrativa envolve um órgão central, alguns órgãos setoriais e as chamadas unidades orçamentárias.

O órgão central é o responsável pela coordenação, consolidação e elaboração da proposta orçamentária da União, que, no caso, é o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, atuando por meio de sua Secretaria de Orçamento Federal (SOF).

Os órgãos setoriais fazem o levantamento das despesas necessárias em suas respectivas áreas.

Por sua vez, as unidades orçamentárias devem fazer a avaliação dos programas e respectivos custos, que se encontram sob sua gestão.

O Poder Judiciário da União possui sete órgãos setoriais com o seguinte número de unidades orçamentárias respectivas: STF(1), STJ(1), Justiça Federal(6), Justiça Militar da União(1), Justiça Eleitoral(28), Justiça do Trabalho(25) e Justiça do Distrito Federal e Territórios(2).

As unidades orçamentárias, por exemplo, do órgão setorial Justiça Federal, são: TRF da 1.ª Região, TRF da 2.ª Região, TRF da 3.ª Região, TRF da 4.ª Região, TRF da 5.ª Região e Justiça Federal de Primeiro Grau. O Conselho da Justiça Federal é quem coordena a elaboração da proposta orçamentária deste órgão setorial Justiça Federal.

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As unidades orçamentárias, que podem ter unidades administrativas para melhor se organizar, são responsáveis pela apresentação de uma programação orçamentária detalhada das suas despesas por programa, ação orçamentária e subtítulo, devendo, ainda, estabelecer suas diretrizes, fixar prioridades, bem como consolidar e formalizar a sua respectiva proposta orçamentária, conforme Manual Técnico de Orçamento do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

Esta fase administrativa possui, basicamente, três etapas: etapa preliminar, etapa intermediária e etapa final.

A etapa preliminar é aquela na qual o órgão central de planejamento elabora as diretrizes estratégicas, estabelece parâmetros quantitativos e fixa as normas gerais para a elaboração do orçamento. Nela, é feita uma estimativa da receita a ser arrecadada, o que envolve uma série de fatores tais como previsão de arrecadação de tributos, previsão de arrecadação de outras receitas públicas, análise de conjunturas políticas e econômicas internas e externas, nível de endividamento público etc.

Esta estimativa é de extrema importância porque servirá de base para as autorizações das despesas públicas dentro do orçamento, ou seja, é essencial para o cálculo das dotações orçamentárias que serão feitas.Como visto, no âmbito federal, este órgão central é o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

Na etapa intermediária, com base nos parâmetros fixados pelo órgão central, os órgãos setoriais fixam suas diretrizes, comunicam-nas às suas unidades orçamentárias e, com base nas manifestações destas, elaboram suas propostas orçamentárias.

Em linhas gerais, o órgão setorial fixa os referenciais monetários que devem ser observados pelas suas unidades orçamentárias, coordena essas unidades na montagem do orçamento setorial e faz a articulação e mediação dos interesses dessas mesmas unidades.

As unidades orçamentárias, com base nos limites indicados pelo órgão setorial, analisam as propostas das suas unidades administrativas, se existirem, fazem eventuais ajustes às prioridades e necessidades do setor, formalizando, ao final, suas propostas, que serão encaminhadas ao órgão setorial para consolidação e encaminhamento ao órgão central.

Na etapa final, o órgão central consolida as propostas recebidas dos órgãos setoriais, fazendo os eventuais ajustes necessários e, ao final, encaminhando a proposta unificada à Presidência da República acompanhada da exposição de motivos do Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão.

O Presidente da República, uma vez de acordo com o projeto, encaminha-o ao Congresso Nacional por meio de mensagem até o dia 31 de agosto.

A partir daqui, inicia-se a fase legislativa do processo.

Recebidos o projeto de lei orçamentária e a mensagem respectiva do Presidente da República no Congresso Nacional, o seu presidente convoca uma sessão conjunta para a leitura da mensagem no prazo de 48 horas (art. 89 do Regimento Comum do Congresso Nacional).

Após, como já visto, o projeto é encaminhado à Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO), que deverá examinar e emitir parecer a respeito, podendo analisá-lo também por meio de comissões temáticas.

Também eventuais emendas apresentadas pelos parlamentares ou pelo Presidente da República, observadas as limitações já acima analisadas, devem ser apreciadas pela CMO, que apresentará parecer a respeito, sendo depois votadas da mesma forma prevista para o projeto de lei orçamentária.

Quanto ao Poder Judiciário, eventuais propostas de alteração no projeto somente poderão ser apresentadas por meio de parlamentares, já que não possuem legitimidade para fazê-lo diretamente.

Com a sanção ou rejeição de eventual veto, a lei orçamentária é promulgada.

Feita essa análise aprofundada do processo legislativo específico para aprovação das leis orçamentárias, passa-se à aplicação do princípio da autonomia Financeira do Poder Judiciário nestas etapas de elaboração e aprovação do orçamento público.

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Sobre o autor
Paulo Cezar Neves Junior

Graduado em Direito pela Universidade de São Paulo (1998). Especialização em Direito Tributário pela Universidade Federal de Santa Catarina (2003). Pós-graduado em Direitos Fundamentais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - Portugal. Mestrando em Direito pela PUC/SP. Ex-Cadete da Academia de Polícia Militar do Barro Branco/SP. Ex-Técnico Judiciário e Ex-Analista Judiciário do TRF 3.ª Região. Ex-Defensor Público da União. Ex-Juiz Federal na 4.ª Região. Atualmente é Juiz Federal em São Paulo/SP e Professor de Direito Econômico/Financeiro, de Direito Processual Civil e de Tutela Coletiva no Curso FMB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JUNIOR, Paulo Cezar Neves. O processo legislativo orçamentário no Brasil e a autonomia financeira do Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4253, 22 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30275. Acesso em: 26 abr. 2024.

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