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A inconstitucionalidade do interrogatório do réu realizado antes da instrução criminal no procedimento da Lei de Drogas

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4 A INCONSTITUCIONALIDADE DO INTERROGATÓRIO DO RÉU NA LEI Nº 11. 343/2006  

O procedimento para apuração dos crimes relacionados às drogas inicialmente era regulamentado pela Lei nº 6.368/1976. Mais tarde, foi editada a Lei nº 10.409/2002 que gerou várias discussões doutrinárias e jurisprudenciais. Hodiernamente, a Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) revogou os referidos diplomas legais e estabeleceu os tipos penais correspondentes as condutas ligadas as drogas, bem como introduziu o novo procedimento penal de apuração desses crimes.

Com efeito, a Lei nº 11.343/2006 traz em seus arts. 48 a 59, o procedimento para apuração das infrações das condutas relacionadas às drogas, que é composto da seguinte seqüência de atos: oferecimento da denúncia; notificação do acusado para resposta; apresentação de resposta pelo acusado; recebimento ou rejeição da denúncia pelo juiz; citação do réu; a audiência de instrução e julgamento (interrogatório do acusado; inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e, depois, as da defesa; sustentação oral do Ministério Público e, depois, do defensor do acusado) e, por ultimo, prolate-se a sentença.

É de notório conhecimento que nos procedimentos comuns ordinário e sumário, no procedimento das infrações de menor potencial ofensivo e no procedimento do júri, o interrogatório do réu será realizado após a produção da prova oral em audiência. Enquanto, no rito de apuração dos crimes relacionados às drogas, esse ato será realizado na fase que antecede à instrução criminal.

Depreende-se que o interrogatório do réu será assim realizado em razão do art. 57 do referido diploma legal que dispõe:

Na audiência de instrução e julgamento, após o interrogatório do acusado e a inquirição das testemunhas, será dada a palavra sucessivamente, ao representante do Ministério Público e ao defensor do acusado, para sustentação oral, pelo prazo de 20 (vinte) minutos para cada um, prorrogável por mais 10 (dez), a critério do juiz. Parágrafo único. Após proceder ao interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante.

Para uma melhor compreensão acerca da inconstitucionalidade do interrogatório do réu no procedimento da Lei de Drogas devem ser realizadas algumas considerações acerca da existência dos métodos utilizados para a interpretação da Constituição Federal.

Consagrou-se em nosso ordenamento jurídico que as leis devem ser interpretadas “conforme a Constituição” [48], o que habitualmente se denomina de “princípio de interpretação da lei ordinária de acordo com a Constituição” [49], do qual decorre da natureza rígida desses diplomas legais, bem como da hierarquização das normas, reconhecendo-se, assim, a superioridade da norma constitucional.  

Desse método de interpretação pode-se defluir que “o intérprete, adotando o método ora proposto, há de inclinar-se por esta última saída ou via de solução. A norma, interpretada “conforme a Constituição” será, portanto, considerada constitucional.”[50] Assim, as leis que não se harmonizarem com a Constituição devem ser declaradas inconstitucionais.

Necessário enfatizar que se deve examinar atentamente se a lei está em sintonia com o proposto pela Constituição ou se ela confronta seus mandamentos, haja vista que está consolidado no nosso ordenamento jurídico que se deve preservar ao máximo as finalidades trazidas pela lei e, somente, quando não mais atender a esse objetivo declará-la inconstitucional.  

Salienta, na continuidade do raciocínio:

 Como se vê, esse meio de interpretação contém um princípio conservador da norma, uma determinação de fazê-la sempre subsistente, de não eliminá-la com facilidade do seio da ordem jurídica, explorando ao máximo e na mais ampla latitude todas as possibilidades de sua manutenção. Busca-se desse modo preservar a autoridade do comando normativo, fazendo o método ser expressão do “favor legis” ou do “favor actus”, ou seja, um instrumento de segurança jurídica contra as declarações precipitadas de invalidade da norma. [51]

Feitas essas considerações, pode-se passar para a análise do cerne da questão. Das premissas realizadas deflui-se que o interrogatório do réu no procedimento da Lei de Drogas deve ser considerado inconstitucional, vez que afronta os comandos instituídos pela Constituição Federal, isto é, o interrogatório do réu realizado na Lei de Drogas viola expressamente o princípio da ampla defesa, que constitui um dos princípios fundamentais no âmbito do processo penal.

A ampla defesa constitui um direito fundamental assegurado pela nossa Constituição Federal (art.5º, LV, CF) e nela está inserida a condição de que qualquer indivíduo que esteja sendo submetido a um procedimento administrativo ou criminal para apuração de responsabilidade, deve ter garantido o direito de vir a se defender da imputação que lhe é feita, usando para tanto de meios lícitos. Sendo imprescindível o impedimento do desrespeito à sua condição paritária no processo, seja de que natureza for.  

De tal arte, é sabido que no âmbito do Direito Processual Penal a consequência do resultado da ação penal é mais grave, pois pode sobejar a privação da liberdade do agente, deste modo, a importância da defesa plena deve ser observada com mais intensidade, como escopo de se obstar o reconhecimento da responsabilidade penal em razão de não se ter permitido a impugnação dos elementos de prova que lhe são imputados.

Pela relevância da matéria, interessa transcrever:

Defesa é o direito que tem o réu ou acusado de opor-se à pretensão do autor (público ou privado), no curso do processo instaurado contra este. E como o processo tem um duplo conteúdo – um processual e outro de mérito – distinguem-se duas formas de defesa: a defesa processual e a defesa de mérito.

Com a primeira, o acusado procurará mostrar, quando isto couber que é inadmissível a prestação jurisdicional pedida, por falta de algum pressuposto processual, condição da ação ou de procedibilidade; e com a segunda, tentará demonstrar que inexiste o direito de punir, ou que a acusação, no todo ou em parte, é improcedente. [52]

O interrogatório do acusado constitui um meio de defesa, pelo qual este tem a possibilidade de apresentar a sua versão dos fatos sobre a imputação que lhe é atribuída. O interrogatório realizado após a produção de toda a prova oral em audiência una garante ao acusado uma defesa mais ampla, tendo em vista que o réu terá maiores elementos para efetivar a sua autodefesa e, assim, também poderá escolher a estratégia de autodefesa que melhor atenda os seus interesses.

No mais, é cediço que o interrogatório do acusado está amplamente amparado pelo princípio da ampla defesa, tendo em vista a nossa concepção de processo, meio pelo qual o acusado é um sujeito de direitos e, tem assegurado pela Constituição Federal todas as garantias individuais. 

No procedimento para apuração dos crimes relacionados às drogas o interrogatório do acusado é previsto para a fase que antecede a instrução criminal – colheita de toda a produção de prova oral – dessa forma, fica evidente que tal ato não certifica ao réu a capacidade de ter garantida uma defesa mais ampla, haja vista que ele será o primeiro da instrução a ser inquirido, e só após as demais provas orais serão colhidas, sendo-lhe negada a possibilidade de ter a mais completa defesa, violando, assim, expressamente o princípio da ampla defesa.

Forte nessa explicação apreende-se que para dar efetiva plenitude a essa visão, deve-se considerar os objetivos colimados no texto constitucional, senão implicaria em uma afronta aos direitos, garantias e princípios constitucionais.  

4.1 O RITO DA LEI Nº 11.343/2006

Para este estudo, nos interessa o Capítulo III do Título IV da Lei de Drogas que trata “Do Procedimento penal”, sendo ele dividido em duas seções: a “Seção I” intitulado “Da investigação” e a “Seção II” denominada de “Da Instrução Criminal”. Observe-se que para a apuração dos crimes relativos a entorpecentes, o rito especial está disposto nos arts. 48 a 59 a Lei de Drogas, com a aplicação subsidiária do CPP e da Lei de Execução Penal.

A investigação da infração penal está regulamentada no art. 50 do referido diploma legal, da qual se depreende que havendo prisão em flagrante ou prisão preventiva, o prazo para encerramento do inquérito será de trinta dias.

Todavia, se não houve prisão em flagrante e se o réu estiver solto, o prazo será de noventa dias. Registre-se que se tiver necessidade, o juiz pode fundamentadamente duplicar os referidos prazos, ouvido o Ministério Público.

Discorrendo sobre a matéria, Pacelli lembra que a oitiva do Ministério Público é indispensável, vez que cabe a ele o juízo de valoração jurídico- penal da matéria. Antevendo, eventual desclassificação do fato inicial pela autoridade policial, a intervenção do Ministério Público é importante para assegurar a tutela das liberdades públicas.[53]

Ocorrendo a prisão em flagrante, a autoridade policial, imediatamente, comunicará o juiz, remetendo-lhe cópia do auto lavrado, a ser encaminhado no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, ao Ministério Público (art. 50, caput).  

Insta perceber que a manutenção da prisão em flagrante se baseia nas razões e motivações da prisão preventiva. Demais, a preventiva não tem previsão legal de duração, isto é, o prazo tem como limite a sua decretação. Logo, considera-se que o prazo para encerramento das investigações deve compreender tanto a prisão em flagrante quanto a prisão preventiva.

Cabe salientar que no caso de flagrante é exigida para a lavratura do auto de prisão em flagrante, a elaboração de um laudo de constatação, como meio de prova técnica, a ser realizado por um perito oficial e, na sua falta, por pessoa idônea. Note-se que o perito que subscreveu o laudo de constatação não ficará impedido de participar da elaboração do laudo definitivo (art.50,§1º e §2º).

Atente-se que para que o Ministério Público ajuíze a ação penal é necessário que se tenha um suporte mínimo de prova, bem como de autoria, justa causa e condições da ação, assim, se torna imprescindível o laudo de constatação da natureza e quantidade de droga apreendido com o agente.

Findo o prazo para as conclusões investigativas e tendo a autoridade policial relatado as circunstâncias do fato, justificando as razões que o levaram à classificação do delito, indicando a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes do agente, encaminhará os autos do inquérito ao juiz (art.52, I).

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Isto posto, caso seja necessário novas diligências, a autoridade policial requererá os autos para realizá-las. Entretanto, poderá realizar as diligências “independentemente da presença física dos autos de investigação” [54], se elas forem úteis ou necessárias à plena elucidação do fato ou, necessárias ou úteis à indicação de bens, direitos e valores de que seja titular o agente ou, que figurem em seu nome. Em ambos os casos o resultado deverá ser encaminhado ao juízo competente até 03 (três) dias antes da instrução criminal (art.52, II e § único).   

Essas diligências complementares podem ter por finalidade apurar todos os bens, direitos e valores pertencentes ao indiciado que, muito provavelmente, os conquisto por conta da prática do delito de tráfico ilícito de entorpecentes. Para tanto, cabe ao Ministério Público, durante a instrução, requer o seqüestro dos bens em geral, buscando torná-los indisponíveis. Posteriormente, advindo a condenação, serão eles confiscados pelo Estado.[55]

Reza o art.53, incisos I e II do referido dispositivo legal que em qualquer fase da persecução penal serão permitidos, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios: a infiltração por agentes da polícia, em tarefas de investigação, constituída pelos órgãos especializados pertinentes; a não- atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível.

Nessa linha, segue-se o procedimento do rito das Drogas, com o oferecimento da denúncia que se encontra regulamentado pelo art. 54. O oferecimento da denúncia deve ser feito no prazo de dez dias, a contar do recebimento do inquérito policial, de Comissão Parlamentar de Inquérito ou de peças de informação pelo Ministério Público.

O referido prazo é único, isto é, esse prazo é tanto para o indiciado solto quanto para o preso. Lembre-se que se o prazo for ultrapassado, sendo o indiciado preso, configurar-se-á constrangimento ilegal que dará ensejo a sua liberação. Caso o indiciado esteja solto, não trará nenhum prejuízo para ele se a denúncia for feita após o prazo.

Em relação ao requerimento de arquivamento pelo Ministério Público, o jurista Nucci assim manifesta:

Previsão inútil. Não há razão alguma para a lei especial prever situação já descrita satisfatoriamente no Código de Processo Penal. Quando o Ministério Público recebe inquérito policial concluído (ou outras peças de informação), pode requerer o arquivamento. Em caso de discordância, o juiz na esfera estadual, segue o disposto no art. 28 do CPP, determinando a remessa dos autos ao Procurador- Geral de Justiça. Este, por seu turno, pode concordar com o promotor e insistir no arquivamento, devendo o magistrado atendê-lo. Caso discorde do promotor, designará outro membro do Ministério Público para ofertar a denúncia e acompanhar o caso. Se o magistrado aquiescer, acolhendo a motivação do promotor, determina o arquivamento. Na esfera federal, remete-se o feito para apreciação de uma Câmara Criminal, composta por membros do Ministério Público Federal de 2º grau, que tomará as mesmas providências já descritas.[56]

No mais, ao oferecer a denúncia o Ministério Público poderá arrolar no máximo cinco testemunhas e poderá requerer as demais provas que entender pertinentes (art.54, III).

Finalizada a denúncia e encaminhada ao magistrado e, não sendo caso de rejeição liminar, este ordenará a notificação do acusado para oferecer resposta no prazo de dez dias. Note-se que a resposta é tratada como defesa prévia no art. 55, caput e como defesa preliminar no art. 55, §1º da Lei de Drogas. A sua apresentação é obrigatória, observando que o acusado deve ser notificado pessoalmente. 

Na resposta o réu poderá suscitar poderá argüir preliminares, invocar as razões de defesa que entender cabível, acostar documentos, especificar provas, arrolar no máximo até cinco testemunhas, opor exceções, quais sejam: exceção de incompetência de juízo, de litispendência, de coisa julgada, de ilegitimidade e de suspeição do juiz.

Todavia, se o acusado não apresentar resposta à notificação no prazo legal, caberá ao juiz nomear defensor para oferecê-la, devendo este apresentá-la no prazo de dez dias (art. 55, §3º).

Apresentada a defesa, o juiz deverá decidir se recebe ou rejeita a denúncia no prazo de cinco dias. Se entender necessário, o juiz poderá determinar a apresentação do preso, a realização de diligências, bem como de exames e perícias no prazo máximo de dez dias.

Elementar o registro que a decisão do magistrado em relação ao recebimento ou rejeição da denúncia deve ser fundamentada, lembrando que a sua não- fundamentação implicará em nulidade processual. Para Norberto Avena, “a nulidade será absoluta, por violação expressa ao art. 93, IX da Carta Política” [57]. Doutro lado, Guilherme de Souza Nucci entende que gerará “nulidade relativa, uma vez que não há expressa determinação legal para que ocorra”.[58]

O art. 56, §1º traz uma inovação bastante importante, qual seja: o magistrado poderá determinar o afastamento do servidor público acusado de tráfico ilícito de drogas, desde que haja decisão fundamentada.

Demais disso, estabeleceu-se que a audiência será realizada no prazo de trinta dias seguintes ao recebimento da denúncia, ressalva feita se houver determinação para a realização de avaliação para atestar dependência de drogas, caso em que se realizará em noventa dias.

Recebida a inicial, o magistrado designará dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal do acusado, a intimação do Ministério Público, do assistente, se for o caso, e requisitará os laudos periciais (art. 56, caput).

Para Nestor Távora, “a audiência de instrução e julgamento deve ser regida pela regra da concentração dos atos processuais” [59]. De acordo com a legislação, nessa audiência, primeiramente, será interrogado o réu, com a possibilidade de esclarecimentos de fatos assinalados pelas partes.

Em seqüência, serão ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação, após, as indicadas pela defesa. Após o término da produção probatória, será passada a palavra, sucessivamente, para ao representante do Ministério Público e ao defensor do réu, para sustentação oral, pelo prazo de vinte minutos para cada um, podendo ser prorrogado por mais dez minutos, desde que se tenha decisão fundamentada por parte do magistrado.

Encerrados os debates orais, o magistrado prolatará a sentença imediatamente ou, não sendo cabível, o fará no prazo máximo de dez dias. O juiz ao sentenciar deverá decidir sobre a destruição da substância entorpecente apreendida, por incineração, que deverá ser feita no prazo máximo de trinta dias.

Depreende-se do art. 58, §1º que a prova será preservada por meio da guarda de amostras em fração que deverá ser fixada pelo magistrado. Tal medida não será cabível, quando no curso do processo, a controvérsia versar sobre a natureza ou quantidade de droga apreendida ou sobre a regularidade do laudo de constatação.

O art. 59 da referida legislação estabelece que: “Nos crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º, e 34 a 37 desta Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória”.

4.2 O INTERROGATÓRIO NO RITO DA LEI Nº 11.343/2006 – INVERSÃO NECESSÁRIA

O interrogatório do réu no procedimento da Lei de Drogas deve ser considerado inconstitucional, vez que viola expressamente o princípio da ampla defesa, que constitui um dos princípios norteadores do processo penal e garantidores dos direitos individuais fundamentais do indivíduo estabelecidos na Constituição Federal.

A Constituição Federal estabelece que a defesa deve ser ampla, isto é, a defesa deve ser a mais abrangente e plena possível.  A ampla defesa não pode ser cerceada infundadamente, sob pena de nulidade absoluta.

Esse entendimento foi sumulado, conforme se verifica na Súmula nº 523 do STF que assim dispõe: “No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”.

Convém destacar que do “princípio da ampla defesa decorre a obrigatoriedade de se observar a ordem natural do processo, de modo que a defesa manifeste-se sempre em último lugar, isto é, o presente princípio desautoriza que a defesa seja, de qualquer forma, surpreendida ao longo do processo”. [60]

Sobre a ampla defesa, acrescenta Ada Pellegrini Grinover:

Ora, nessa ampla acepção, ação e defesa não se exaurem, evidentemente, no poder do impulso e no uso das exceções, mas se desdobram naquele conjunto de garantias que, no arco de todo o procedimento, asseguram às partes a possibilidade bilateral, efetiva e concreta, de produzirem suas provas, de aduzirem suas razões, de recorrerem das decisões, de agirem, enfim, em juízo, para a tutela de seus direitos e interesses, utilizando toda a ampla gama de poderes e faculdades pelos quais se pode dialeticamente preparar o espírito do juiz. O paralelismo entre ação e defesa é que assegura aos dois sujeitos do contraditório instituído perante o juiz a possibilidade de exercerem todos os atos processuais aptos a fazer valer em juízo seus direitos e interesses e a condicionar o êxito do processo. [61]

É de notório conhecimento que o primeiro ato da instrução criminal no procedimento da Lei de Drogas é o interrogatório do réu, ato completamente inverso aos demais ritos expressos no Código de Processo Penal.

Após as reformas do Código de Processo Penal, especialmente a Lei n. 11.719/2008, o texto legal realocou o interrogatório colocando-o após a oitiva das testemunhas. A rigor, aplicando-se o disposto no art. 394, §2º do CPP, a lei especial deveria prevalecer, contudo, em homenagem ao princípio da ampla defesa é melhor que se faça o interrogatório após a oitiva das testemunhas, a fim de evitar futuras nulidades que colocariam em risco a efetividade do processo penal.

O jurista Nestor Távora entende que “após a reforma do procedimento comum (Lei nº 11.719/08), que o interrogatório passou para o final da instrução (art.400 do CPP), e refletindo melhor, pensamos ser adequado que se proceda da mesma forma no procedimento especial de tóxicos”. [62]

No mesmo sentido, Guilherme de Souza Nucci afirma que “o interrogatório do réu deve ser feito nos moldes descritos pelo Capítulo III do Título VII do Livro I do Código de Processo Penal”. [63]

Dessa forma, entende-se que a melhor solução para assegurar os direitos e garantias constitucionais do réu e, especialmente, não se ter violada a ampla defesa, o magistrado deveria inverter o interrogatório, passando para o último ato da instrução criminal, conforme se verifica nos procedimentos comuns ordinário e sumário previstos no Código de Processo Penal.

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Sobre a autora
Annelise Freitas Macedo Oliveira

Advogada. Especialista em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera - Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia – Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Annelise Freitas Macedo. A inconstitucionalidade do interrogatório do réu realizado antes da instrução criminal no procedimento da Lei de Drogas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4168, 29 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30743. Acesso em: 23 dez. 2024.

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