Resumo: A legislação brasileira tem sido alvo de diversas mudanças visando garantir celeridade ao Processo civil. Dentre estas, destaca-se a introduzida pela Lei 11.277/06. Tal norma introduziu o artigo 285-A ao Código de Processo Civil. Esta norma regulamentadora dá possibilidade ao Juiz de julgar totalmente improcedente o pedido inicial feito pelo autor, antes mesmo de ordenar a citação do réu. Isto ocorre quando for a matéria unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos semelhantes. Para tal, o juiz deve reproduzir em inteiro teor a sentença proferida anteriormente. Assim sendo, será discutida a constitucionalidade desta Lei.
Palavras-chave: Processo Civil; Celeridade; Julgamento Primae Face.
Sumário: 1 INTRODUÇÃO; 2 A LEI 11.277/06 QUE INTRODUZIU O ARTIGO 285-A; 3 CELERIDADE PROCESSUAL; 3.1 Eficácia, Eficiência e Efetividade do Processo; 4 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO; 4.1 Princípio constitucional do direito de ação; 4.2 Princípio constitucional do devido processo legal; 4.3 Princípio constitucional do contraditório e ampla defesa; 5O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ; 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.
1 INTRODUÇÃO
Tendo em vista que a sociedade é marcada pelas relações interpessoais, diversas vezes surgem litígios (lide). Assim, o processo surge como forma de se pacificar o conflito social, vez que o Estado veda a auto-tutela.
Sabe-se que é da natureza do homem transgredir regras. Nesse contexto, conforme Marcos Bernardes de Mello (2003), o Direito surge para controlar a selvageria humana.
Segundo Mello (2003), Norma Jurídica nada mais é do que uma hipótese de incidência ligada por um modal de natureza deôntica a um preceito normativo, ou seja, se A é, deve ser B. No caso do Direito Processual, a ação do Magistrado é no sentido de imputar a alguém o preceito normativo de norma secundária, pois sabe-se que a sentença é uma norma de efeito real (incide apenas uma vez).
O Direito é fruto de uma tridimensionalidade (REALE, 2010), qual seja, fato, valor e norma. Continua o autor afirmando que as normas jurídicas surgem a partir de fatos relevantes para a ordem social, e que deste modo tenham um valor jurídico que enseja a nomogênese jurídica. Desta maneira, o Direito deve refletir os valores morais da sociedade.
Em que pese às leis (normas) serem criadas para durar no tempo, estas não são eternas. Assim, de certo há normas que caducam, ou seja, que deixam de ser aplicadas pelo decurso do tempo. Justifica-se a atividade legislativa no sentido de renovar a ordem jurídica.
Pelo exposto, a lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, que instituiu o Código de Processo Civil de certo não reflete a ordem social atual, pautada nas relações digitais, em que tudo é muito rápido, célere. A legislação processual civil brasileira tem sido alvo de diversas mudanças, com o intuito de adequar as normas ao contexto social.
Uma delas advêm da Lei 11.277/06 que introduziu o artigo 285-A ao Código de Processo Civil.Esta norma regulamentadora dá possibilidade ao Juiz de julgar totalmente improcedente o pedido inicial feito pelo autor, antes mesmo de ordenar a citação do réu. Isto ocorre quando for à matéria unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos semelhantes. Para tal, o juiz deve reproduzir em inteiro teor a sentença proferida anteriormente.
Assim, tendo em vista a inovação na ordem jurídica, questiona-se a constitucionalidade de tal dispositivo normativo. Assim sendo, o presente artigo trabalhara com o artigo 285-A. Iniciará com uma análise do dispositivo, bem como suas implicações jurídicas.
Após, será abordada a celeridade processual, tema de bastante relevância nos dias atuais, precipuamente após a edição da emenda constitucional de número 45, a qual será abordada. Na sequência, questionar-se-á os conceitos de eficácia, eficiência e efetividade do processo, conceitos estes de suma importância para a análise que se propõe.
Ainda, será feita uma análise do que se denomina de princípios constitucionais do processo, especialmente quanto ao princípio constitucional do direito de ação; princípio constitucional do devido processo legal e o princípio constitucional do contraditório e ampla defesa.
Por fim, será feita uma análise acerca do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão este de suma importância para o poder judiciário. Será analisado as formas como o CNJ visa garantir a razoável duração do processo.
2 A LEI 11.277/06 QUE INTRODUZIU O ARTIGO 285-A
A legislação processual civil brasileira tem sido alvo de diversas mudanças, com o intuito de adequar as normas ao contexto social. Até mesmo porque, o Código de Processo Civil - CPC entrou em vigor em 1974, sendo certo que as normas não mais refletem os interesses da sociedade.
Neste sentido, verifica-se o que doutrinava Miguel Reale. Reale (2010) afirmava que o Direito é fruto de uma tridimensionalidade, qual seja, fato, valor e norma. Continua o autor afirmando que as normas jurídicas surgem a partir de fatos relevantes para a ordem social, e que deste modo tenham um valor jurídico que enseja a nomogênese jurídica.
Dentre as normas introduzidas no CPC, com o intuito de adequar este no contexto social, tem-se a lei 11.277, de 07 de fevereiro de 2006, que inseriu o artigo 285-A neste diploma legal, que assim preceitua:
Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.§ 1º Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. § 2º Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.
Esta norma regulamentadora dá possibilidade ao Juiz de julgar totalmente improcedente o pedido inicial feito pelo autor, antes mesmo de ordenar a citação do réu. Isto ocorre quando forà matéria unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos semelhantes. Para tal, o juiz deve reproduzir em inteiro teor a sentença proferida anteriormente.
Caso o autor discorde da decisão proferida pelo Juiz, poderá este recorrer, neste caso o Juiz poderá revogar a sentença e determinar o prosseguimento do feito, no prazo de cinco dias. Lado outro, caso seja mantido a sentença, o recurso será encaminhado a instancia superior, sendo ordenada a citação do réu.
Embora tenha a aparência de novidade, antes desta norma era possível o julgamento de mérito sem a citação do réu.
Muito embora o art. 285-A tenha a aparente feição de novidade na ordem jurídica, o CPC já autorizava o julgamento de mérito sem a citação do réu nas hipóteses de reconhecimento de prescrição e decadência (arts. 269, IV, e 295, IV, do CPC).(SCHULZE, 2013)
O intuito desta medida é dar celeridade ao processo, sendo esta precedida pela emenda constitucional 45, que reformou o poder judiciário através de alterações em diversas normas constitucionais. Assim é que o magistrado poderá sentenciar no processo no seu primeiro contato com este.
3 CELERIDADE PROCESSUAL
Todo processo precisa ser construído dentro de um tempo, portanto, este é um elemento essencial. O processo se desenvolve a partir de uma sucessão de atos, determinados por prazos que se justificam pelos fins de publicidade, conhecimento e atuação das partes. Nesse norte, pode-se afirmar que o processo é construído a partir de um desencadeamento temporal da participação dos sujeitos envolvidos, quais sejam, os sujeitos ativo, passivo e o Juiz natural. Porém, o tempo do processo interrompe o desenvolvimento linear do tempo cotidiano e ordena a regeneração da ordem social e jurídica. Sob esse aspecto Cruz e Tucci (apud SANTOS, 2012) afirmam que o tempo do processo, sob o aspecto intrínseco, não é um tempo ordinário. Ele se insinua, como uma ação temporária que, por sua ordem e regularidade, compensa as lacunas do tempo profano. O tempo do processo é um tempo inteiramente ordenado que permite à sociedade regenerar a ordem social e jurídica.
O tempo da atividade jurisdicional estará sempre em constante atraso em relação ao tempo do conflito, pois ela se inicia a partir de uma pretensão[1], que é a violação de um direito. Esse descompasso surge da impossibilidade de se parear o tempo social (quando surge um conflito) e o tempo do direito (aplicação da norma ao fato).
Desde a Roma pós-clássica, quando surgiu a idéia da noção pública do processo, já havia críticas acerca da excessiva duração dos processos judiciais. Ressalta-se que até hoje, apesar dos avanços tecnológicos, a morosidade da prestação jurisdicional é criticada em diversos países, como, por exemplo, o Brasil.
Na idade média uma notícia levava dias, quiçá meses, para chegar a alguns povoados. Hoje, com o advento e avanço da internet, um fato que acontece do outro lado mundo chega à população em minutos, e pode ser acessada até mesmo pelo celular.
A sociedade vem sofrendo grandes mudanças a partir da socialização do computador e da Internet, o que muitos denominam de sociedade da informação. Imagine que, em um passado relativamente recente, para que se tivesse acesso a um fato relevante para a sociedade era necessária a busca dessa informação em algum jornal, revista, livro, entre outros. (...) Hoje os fatos são publicados instantaneamente na rede mundial de computadores. (ALMEIDA, ALMEIDA, 2013, p. 192)
O que se observa é que a atual cultura é extremamente imediatista e de grande agilidade comunicacional. Segundo Cruz e Tucci (apud SANTOS, 2012), o tempo é algo relativo e extremamente subjetivo, cada individuo se afeta de maneira distinta pelo o tempo, e, apesar de o relógio marcar as horas igualmente em qualquer lugar do planeta, para alguns o tempo voa e para outros não.
No Brasil, a referência acerca da celeridade processual só foi concretizada pela Emenda Constitucional número 45 de 2004, que aditou o rol de direitos e garantias processuais fundamentais, inserindo o inciso LXXVIII[2] ao artigo 5º. Cumpre salientar que a preocupação em face do tempo processual não é em relação à rapidez e sim com a duração razoável do processo, pois há sim casos em que é preciso uma prestação jurisdicional diferida.
Há uma pauta axiológica que rege a noção de razoabilidade processual. Segundo Luiz Roberto Barroso (apud SANTOS, 2012), a verificação da compatibilidade entre o meio empregado pelo legislador e os fins visados, bem como a aferição da legitimidade dos fins é a garantia do devido processo legal, que por sua vez remete a idéia de razoabilidade. Portanto é indevida e irrazoável o prolongamento injustificado da prestação jurisdicional.
O Código de Processo Civil brasileiro (CPC), em seu artigo 125, estabelece que toda atuação irresponsável das partes deve ser coibida pelo juiz, a quem compete dirigir o processo e zelar pela rápida solução do litígio.Portanto, o processo deve ser célere, porém, a priori, deve respeitar o devido processo legal, que se traduz como o princípio máximo de todo processo, o qual deve ser respeitado por todos os outros.
3.1Eficácia, Eficiência e Efetividade do Processo
Muitos doutrinadores não se preocupam com os critérios de eficácia, eficiência e efetividade do processo, sendo que muitas das vezes estes critérios não possuem muita cientificidade. Quanto ao critério de eficácia, “Ensina Maximiano que (...) é aquele utilizado ‘para indicar que a organização utiliza corretamente seus recursos’” (SANTOS, 2012, pg. 24). Ou seja, quanto maior o índice de realização dos objetivos propostos, mais a organização é eficaz.
Já a eficiência consiste na medida normativa de utilização dos recursos no processo. Portanto, como se depreende desses conceitos, o critério de eficiência tem caráter eminentemente econômico “(...) que valoriza a capacidade administrativa de obter ‘produtos mais elevados (resultados, produtividade, desempenho) relativamente aos insumos (mão-de-obra, materiais, dinheiro, máquina e tempo) necessários à sua consecução’” (SANTOS, 2012, pg. 25).
Em um paralelo entre os conceitos de eficácia e eficiência, Drucker (apud SANTOS, 2012) sintetiza em duas sentenças: eficácia, como capacidade de fazer as coisas certas e eficiência como capacidade de fazer as coisas de maneira certa.
Já a análise da efetividade não é apenas quanto ao resultado da jurisdição, é preciso se averiguar como foi construída a relação processual, é preciso se analisar a moldura em que está inserido o processo.
Em outras palavras, diante da tutela jurisdicional, uma análise de efetividade deverá verificar como essa tutela foi construída, qual a sua legitimidade e quais os efeitos sociais que dela poderão advir. (SANTOS, 2012, pg. 29).
Portanto, o processo será efetivo se ele refletir a ordem constitucional, ou mais especificamente, as bases do regime democrático proclamados na Constituição.
O processo passa a ser tratado como um reflexo da ordem constitucional, não mais como um mero instrumento técnico. Deste modo,para uma justa prestação jurisdicional, é preciso que o processo se baseie em meios que tenham observados os princípios e garantias estabelecidas, bem como de resultado que tenha um julgamento justo. Se os meios forem adequadamente empregados, este será o melhor caminho para se chegar aos resultados.
4 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO
A Constituição da Republica do Brasil de 1988 sendo a lei máxima que rege o ordenamento jurídico, institui diversos princípios que devem ser observados por toda legislação infraconstitucional, incluindo o Direito Processual. Há princípios constitucionais que ditam a ordem processual, assim é chamado o direito processual constitucional.
Conforme DINAMARCO (2009), o “Direito processual constitucional é o método consistente em examinar o sistema processual e os institutos do processo à luz da constituição das relações mantidas com ela.” (pg. 193)
Neste sentido, tem-se discutido se o artigo 285-A traduz a ordem dos princípios constitucionais. Abaixo se fará a análise de sua constitucionalidade frente ao principio do direito de ação, do divido processo legal e do contraditório e ampla defesa.
4.1 Princípio constitucional do direito de ação
O artigo 5º da CR/88 preceitua em seu inciso XXXV que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988). Assim, todos os indivíduos sob a jurisdição brasileira têm o direito de provocar o poder judiciário. Deste modo, mesmo que não haja pertinência no pedido da pessoa, esta tem direito de levar sua demanda a juízo. Esse é o chamado de Direito de Ação.
Quanto a estes, são várias as teorias existentes, dentre elas ressaltam-se as teorias abstrata, concreta e eclética.
A teoria abstrata afirma que o direito de ação seria um direito subjetivo, público, autônomo a uma sentença de qualquer teor. Consequentemente, o indivíduo possuiria o direito de ação em qualquer situação, uma vez que não há qualquer requisito para sua propositura. Nesta, o direito processual seria autônomo, ou seja, independente do direito material.
A teoria concreta afirma que tem direito de ação quem tem direito a uma sentença favorável. Neste sentido, o direito processual esta intrinsecamente ligado ao direito material.
Por fim, a teoria eclética da ação nada mais é que uma junção das duas teorias supra citadas. Tal teoria foi proposta por LIEBMAN (1984). Afirma o doutrinador que se tem ação quando se preenchem as condições da ação. Esboça-se a teoria que é denominada de trinômio de Liebman. Nesse diapasão, as condições da ação seriam a legitimidade de parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. Ressalta-se que esta teoria é a adotada pelo Código de Processo Civil[3].
Destarte, analisando a teoria proposta, verifica-se que o próprio Liebman revisitou sua criação. O que se viu é que a possibilidade jurídica do pedido não seria uma condição da ação autônoma, pois esta se enquadra dentro do interesse de agir. Ora, só há interesse de agir se houver a possibilidade jurídica do pedido. Ainda, essa revisitação da teoria do trinômio de Liebman influenciou o CPC, conforme se vê no artigo 3º deste, para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade. Ou seja, não há a previsão da possibilidade jurídica do pedido, posto que esta é implícita no interesse de agir. Portanto, para Liebman, “as condições da ação, há pouco mencionadas, são o interesse de agir e a legitimação.” (Liebman, 1984, p. 153).
A teoria moderna do trinômio de Liebman é a adotada no sistema processual italiano (FIORATTO, BARROS, 2013).
Questiona-se se o julgamento primae face afronta o direito de ação. Pois bem, mesmo sendo julgada improcedente a ação teve a prestação jurisdicional. Assim é que há doutrinadores que afirmam que quanto ao direito de ação este instituto é constitucional.
Não prejudica nem restringe o direito de ação como poderia parecer à primeira vista. O direito de ação é exercido e o juiz presta a jurisdição julgando o mérito. Se o juiz julga o mérito, é porque reconhece a presença do direito de ação e, em atenção ao seu exercício, julga o mérito logo de início. O que o autor não vai ter é o julgamento de mérito a seu favor, mas o mérito da causa é julgado e a jurisdição prestada. Mas isso não tem nada a ver com as garantias constitucionais do direito de ação. (SOUZA, 2006, p. 50)
Entretanto, a relação processual só se aperfeiçoa com a citação válida do réu. Assim é que, formalmente, não se teve um processo instaurado, não houve a triangulação da relação processual. Neste norte, é possível questionar se o autor teve o direito à ação.
Em que pese não haver a constituição regular do processo, houve a prestação jurisdicional com a sentença de mérito, sendo esta o fim do processo. Portanto, não há que se falar em ausência do direito de ação. Até porque a demanda foi levada à apreciação do juízo.
Cumpre esclarecer que o autor ainda terá direito ao duplo grau de jurisdição, outro princípio constitucional do processo, segundo o qual todos os jurisdicionados têm o direito de revisão das decisões. Deste modo, a priori, não há um prejuízo para o autor, que teve seu direito de ação respeitado, vez que a suposta lesão a direito foi examinada pelo judiciário, além de que este conta com a garantia do duplo grau de jurisdição.
4.2 Princípio constitucional do devido processo legal
Conforme NERY JUNIOR (2004), entende-se por Devido Processo legal a possibilidade efetiva de acesso à apreciação do judiciário de lesão ou ameaça de lesão a direito, deduzindo sua pretensão e defendendo-se da maneira mais ampla possível. Assim é que, mais que o direito ao acesso à justiça, a todo indivíduo é assegurado o direito ao devido processo legal.
Desta forma, para que se tenha o princípio do devido processo legal é preciso que se tenha uma relação processual válida, na qual se observe o andamento processual válido. Assim é que se diz ser o princípio do devido processo legal aquele do qual os demais guardam substrato, posto que se terá a efetivação deste a partir do momento que o processo reflete toda a ordem constitucional.Não se questiona o teor da prestação jurisdicional, se teve o conteúdo que as partes esperavam. Apenas se trabalha com a idéia formal do processo.
Como já dito, a relação de direito processual se inicia com a petição inicial, entretanto só se aperfeiçoa com a citação válida do réu. Assim é que:
[...] o direito de pedir a intervenção do Judiciário consiste, pois, em direito ao devido processo legal, isto é, ao processo como actustriumpersonarum e suas diversas implicações essenciais: a garantia do direito de ação de par com a garantia do direito de defesa; a adoção do contraditório processual; a eqüidistância do juiz no tocante aos interesses em conflitos, como órgão estatal desinteressado, justo e imparcial. (MARQUES, 2003, pg. 491).
Pelo que se vê, para a materialização do devido processo legal, é preciso que as três figuras básicas da relação processual, a priori, intervenham neste na forma da lei. Questiona-se se o julgamento liminar de improcedência fere esse princípio. Ressalta-se que para a aplicação do artigo 285-A do CPC, a rigor técnico, não há relação processual instaurada, pelo que não há que se falar em devido processo legal.
Cumpre salientar que a função precípua do poder judiciária é a prestação jurisdicional, ou seja, é dever deste pacificar a ordem social, através da sentença de mérito, pondo termo a discussão do direito material. Assim, o judiciário se presta a decidir o que se fazer em uma relação interpessoal através da decisão de um juiz natural.
Assim, mesmo julgando liminarmente, o juiz estaria cumprindo a função a que se propõe. Entretanto, não há ainda relação processual, pelo que há quem argumente a inconstitucionalidade da norma regulamentadora.
Entretanto, mesmo tendo a prerrogativa de utilizar tal previsão normativa, ao magistrado é vedado fazê-lo caso não seja o caso corriqueiro. Assim, para dar celeridade, pode este julgar improcedente a pretensão do autor. Deste modo, não se fere o devido processo legal, posto que se terá a finalidade jurisdicional cumprida.
Ressalta-se que em que pese a improcedência de casos similares, o entendimento do magistrado pode ser alterado em determinado caso se houver uma produção de prova antes não ventilada. Assim, há a possibilidade de o magistrado adiantar o mérito sem antes se valer das provas produzidas pelas partes em momento oportuno, tais como prova testemunhal em audiência de instrução e julgamento.Até mesmo, pode o réu reconhecer o direito do autor, possibilidade esta extinta com o julgamento primae face, salvo por via administrativa.
4.3 Princípio constitucional do contraditório e ampla defesa
Previamente constituídos no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal (BRASIL, 1988), os princípios do contraditório e da ampla defesa legitima que as partes em processo judicial ou administrativo em geral são assegurados o direito de se defenderem, valendo-se dos meios e recursos a ela inerentes, senão veja-se, “Artigo 5 º, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (BRASIL, 1988).
O princípio do contraditório postula que não se poderá acusar alguém, sem que seja fornecido a este o direito de ser ouvido e que a todas as partes devem-se assegurar as mesmas prerrogativas no decorrer do processo. Ademais, o princípio da ampla defesa versa sobre a plena liberdade do indivíduo, em defesa de seus direitos, alegar fatos e provas.
Duvidas não há sobre a importância desses dois princípios constitucionais para a manutenção do Estado Democrático de Direito, porém, quando se aplica no contexto do artigo 285-A do CPC, cria-se, então, divergências entre as doutrinas no que diz respeito a sua violação quanto ao julgamento primae face. Assim, questiona-se a constitucionalidade deste artigo face a estes princípios constitucionais do processo.
De um lado, o julgamento liminar se mostra constitucional em relação ao princípio da ampla defesa e do contraditório, vez que a rigor das regras processuais não se teria aperfeiçoado a relação processual. Sabe-se que o processo se inicia com a petição inicial, entretanto a relação só se triangulariza com a citação válida do réu. Assim, não se teria processo em sentido strito, pelo que não há que se falar em violação deste princípio.
Destarte, é um direito do réu responder à um processo quando o é demandado. Entre as várias espécies de resposta tem-se a reconvenção (rito ordinário) e o pedido contraposto (ritos sumário e sumaríssimo). A teor deste institutos, o réu pode, no momento de sua resposta, além de refugar as alegações do autos, fazer pedido que verse sobre o mesmo objeto da lide e conexo à esta. Assim, poderia o réu ter um pedido seu julgado procedente.
Ainda que não tenha direito de reconvir, o réu não terá extinto o seu direito de ação. Ora, se é interesse deste demandar o autor, que o faça pelo meio que lhe convir, ou seja, ajuizando uma ação distinta. Pelo exposto, não se fala em violação do contraditório, posto que o réu é o maior beneficiado com o julgamento liminar de improcedência, pois antes mesmo de se manifestar, o autor terá sua pretensão julgada de maneira favorável ao réu.