CAPÍTULO III
3.1 Os obstáculos enfrentados pelo processo eletrônico
Dentre os vários obstáculos diagnosticados, pode-se juntar a eles a insegurança do sistema quanto a sua indisponibilidade temporária, a interceptação de dados telemáticos, além disto, a legislação brasileira prevê a livre utilização de software, permitindo conflitos entre sistemas operacionais utilizados por usuários e Tribunais.
3.1 Objeções dos advogados quanto à utilização do sistema
A Ordem dos Advogados do Brasil apresenta-se favorável ao processo eletrônico, mas resistente à forma impositiva de sua implementação, por entender que o sistema exclui alguns advogados e cidadãos da Justiça.
O presidente da Comissão Especial de Direito e Tecnologia do Conselho Federal da OAB, Luiz Cláudio Allemand, criticou o CNJ, ao implantar o método virtual sem ouvir a opinião da OAB, que deixou de colaborar e participar do desenvolvimento do sistema em conjunto com o Judiciário, consequentemente erros e falhas poderia ser evitado, permitindo que o sistema fosse acertado desde a sua introdução.
Em fevereiro de 2013, a referida entidade divulgou os cinco principais problemas na utilização do PJe, quais sejam, a carência de infraestrutura da Internet; as obstáculos na acessibilidade; problemas nos sistemas de processo eletrônico; melhorias na utilização do sistema; e a ausência de unificação dos sistemas de processo eletrônico.
A infraestrutura deficiente de Internet com as dificuldades de conexão acarreta demasiados prejuízos, uma vez que, algumas regiões do país não possuem Internet banda larga e 3G eficientes e confiáveis, prejudicando o peticionamendo online dos advogados que atuam nestas localidades.
Claudio Lamachia, vice-presidente do Conselho Federal da OAB destacou que: “Não somos contrários ao PJe, mas contra a forma açodada que este vem sendo imposto à advocacia. Necessitamos de estrutura para trabalhar de forma eletrônica, sob pena de se negar o acesso à Justiça a milhares de cidadãos brasileiro”. (Disponível em: <http://www.oab.org.br/util/print/25217?print=Noticia> Acesso em: 23 de abril de 2014).
O presidente da Comissão de Direito e Tecnologia da Informação e Processo Judicial Eletrônico da OAB-PA, Amadeu dos Anjos Junior, também relatou sobre os problemas de estrutura de telecomunicações que impede o acesso dos advogados ao sistema, e afirmou: “Conforme os dados da Anatel, 93 municípios do Pará, do total de 134, têm apenas um acesso de banda larga e este se mostra falho. Pior: quando há indisponibilidade do sistema, o advogado não tem como provar que peticionou no prazo correto”. (Disponível em: <http://www.oab.org.br/util/print/25217?print=Noticia> Acesso em: 23 de abril de 2014).
Os advogados também estão submetidos aos roteiros ou modelos de petição instituídos pelo PJe, o que acarreta a tais profissionais o peticionamento por preenchimento de formulários, incitando os causídicos ao simplismo, o que, preocupa a defesa dos interesses da sociedade em geral e a segurança jurídica.
Hallrison Dantas, presidente da Comissão do Rio Grande do Norte, comunicou que o programa de Internet de banda larga popular criado pelo governo federal opera em apenas 31 cidades, à medida que, outras 30 cidades do Estado utiliza da Internet discada e via rádio, e estima que a universalização do PJe pode deixar no referido Estado aproximadamente um milhão de pessoas sem acesso à Justiça. (Disponível em: < http://www.orm.com.br/amazoniajornal/interna/default.asp?modulo=222&codigo=633226>. Acesso em: 23 de abril de 2014).
O site O Globo noticiou em novembro de 2013 que a Justiça Trabalhista do Rio de Janeiro, teve o sistema do PJe fora do ar durante todo o mês de outubro do mesmo ano, o procedimento só funcionou por dois dias, o que acarretou de acordo com a OAB-RJ, a paralização de 130 mil processos que tramitava no Estado.
Com o intuito de minimizar os transtornos suportados pelos advogados quanto à indisponibilidade do sistema e problemas com a conexão da Internet o Fórum Permanente de Discussão do Processo Judicial Eletrônico do Conselho Federal da OAB, fez reivindicações através de documento direcionado ao CNJ, dentre elas está à possibilidade de facultar aos advogados o peticionamento físico, ficando o Tribunal encarregado de digitalizar e inserir no sistema para tramitação em meio eletrônico, fazendo as intimações pelo PJe, tal solicitação encontrou fundamento na Lei do processo eletrônico.
As quedas no fornecimento de energias também geram transtornos no sistema de processo eletrônico, visto que os usuários ficam impedidos de exercer qualquer atividade, aumentando consideravelmente o tempo da tramitação da ação judicial.
Quanto à acessibilidade, as principais reivindicações são para que os Tribunais disponham de estruturas que permitam a digitalização dos processos, conforme prevê a lei do processo eletrônico: Artigo 10. § 3° Os órgãos do Poder Judiciário deverão manter equipamentos de digitalização e de acesso à rede mundial de computadores à disposição dos interessados para distribuição de peças processuais. (BRASIL, 2006).
Outra queixa a respeito da acessibilidade do PJe é a da falta de recursos dos sites para os deficientes visuais, visto que as ferramentas de navegação utilizada pelas pessoas cegas apresentaram problemas com o novo sistema, além do mesmo encontrar-se fora das normas internacionais de acessibilidade na web.
Julgado do Supremo Tribunal Federal, proferido pelo ministro Ricardo Lewandowski em janeiro de 2014, garantiu o exercício da advocacia aos deficientes visuais, ao deferir o pedido de liminar da advogada Deborah Prates com deficiência visual, tal decisão assegurou o direito de se apresentar petições e documentos em papel até que os sites do Judiciário estejam munidos de acessibilidade.
Na decisão o ministro destacou: “Ora, a partir do momento em que o Poder Judiciário apenas admite o peticionamento por meio dos sistemas eletrônicos, deve assegurar o seu integral funcionamento, sobretudo, no tocante à acessibilidade”. (Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=259216> Acesso em: 23 de abril de 2014).
Apesar do pedido da advogada ter sido negado anteriormente pelo presidente do CNJ o ministro Joaquim Barbosa, seu petitório baseou-se na recomendação n° 27/2009 do CNJ, onde determina a acessibilidade em todos os tribunais em estruturas físicas, arquitetônicas e de comunicação. Dispõe o texto da recomendação:
Recomenda aos Tribunais relacionados nos incisos II a VII do art. 92 da Constituição Federal de 1988 que adotem medidas para a remoção de barreiras físicas, arquitetônicas, de comunicação e atitudinais de modo a promover o amplo e irrestrito acesso de pessoas com deficiência às suas dependências, aos serviços que prestam e às respectivas carreiras, para a conscientização de servidores e jurisdicionados sobre a importância da acessibilidade enquanto garantia ao pleno exercício de direitos, bem como para que instituam comissões de acessibilidade visando ao planejamento, elaboração e acompanhamento de projetos e metas direcionados à promoção da acessibilidade às pessoas com deficiência. (Publicada no DOU, seção 1, em 25/1/10, p. 107, e no DJ-e nº 15/2010, em 25/1/10, p. 2-4).
Álvaro Sérgio Gouveia Quintão, presidente do Sindicato dos Advogados do Rio de Janeiro, declarou que o sistema virtual vem causando transtornos para todos os que dele se utilizam, e mencionou: “Defendo o PJe e quero que ele venha para facilitar e incluir, mas sua implantação está sendo feito de forma açodada. Prova disso é que o CNJ tem determinado a implantação do PJe sem se preocupar com a exclusão de muitos profissionais, como por exemplo, os advogados cegos”. (Disponível em: <http://www.fenajufe.org.br/index.php/imprensa/ultimas-noticias/1590-pje-e-muito-criticado-durante-audiencia-publica-realizada-na-camara-dos-deputados> Acesso em: 29 de abril de 2014).
A informatização do judiciário necessita de ajustes que garantam a acessibilidade dos advogados com deficiência visual, para que esses profissionais não sejam inviabilizados de exercer seus trabalho por inobservância do PJe a Lei 10.098/2004 (Lei da Acessibilidade).
Ademais, defensores idosos encontram dificuldade para operar o sistema eletrônico, o mesmo foi implantado sem observação à regra do artigo 26 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), que dispõe que o idoso tem direito ao exercício de atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas. (BRAISL, 2003).
O Conselho Nacional de Justiça negou o pedido de liminar da OAB-SP, que requisitava o adiamento do prazo que obrigava o peticionamento eletrônico na comarca de Santos, a entidade alega que naquela cidade existem aproximadamente 1,5 mil advogados idosos, e que a imposição do Tribunal impossibilita a prática das atividades desses profissionais, que não conseguiram se ambientar com o PJe no curto prazo estipulado pelo TJ-SP.
A Ordem dos Advogados do Brasil solicitou um pedido de providência, assinado por Rodrigo de Farias Julião, presidente da subseção da OAB de Santos, que apontou:
“Os estudos científicos comprovam, o idoso naturalmente tem dificuldade de inclusão digital, de maneira que a obrigatoriedade do processo eletrônico em face do advogado idoso, por ocasião do ajuizamento de novas demandas, os excluem terminantemente da condição de trabalho, violando seus Direitos Humanos de independência, realização pessoal e dignidade”. (Rover, Tadeu. CNJ nega adiamento de processo eletrônico em Santos. (Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jun-10/cnj-nega-liminar-adiar-peticionamento-eletronico-santos> Acesso em: 24 de abril de 2014).
Segundo a OAB, foram oferecidos pela entidade cursos com o objetivo de capacitar os profissionais, como também se criou um Centro de Apoio Digital, no entanto, tais medidas não se apresentaram satisfatórias, pois que não foi o bastante para que houvesse a inclusão digital de todos os advogados idosos. (Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jun-10/cnj-nega-liminar-adiar-peticionamento-eletronico-santos> Acesso em: 24 de abril de 2014).
Outros entraves enfrentados pelos advogados está na limitação do tamanho dos arquivos para envio, a necessidade de múltiplos cadastros, e a diversidade de sistemas que até o período de agosto de 2013 a OAB apontou ser utilizado cerca de 50 versões diferentes do PJe.
Claudio Lamachia, ao defender “a unificação de um sistema que seja factível e que facilite a inclusão e não a exclusão” salientou a necessidade da unificação e padronização do processo eletrônico, facilitando seu uso pelo advogado, e afirma: “Hoje, o advogado tem que conhecer diversos sistemas de processo eletrônico judicial pelo país a fora: temos que conhecer o sistema da Justiça do Trabalho, o sistema da Justiça Federal, o sistema da Justiça Estadual, e daqui a pouco teremos de conhecer o sistema da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral”. (Disponível em: <http://oabparanavai.com.br/noticias/140> Acesso em: 23 de abril de 2014).
Advogados já reivindicaram ao CNJ a possibilidade do envio de documentos sem limite de tamanho, como também a utilização de cadastro único para todas as instâncias.
Constata-se desta forma que o Pje precisa ser implantado paulatinamente para que haja um acompanhamento da classe dos advogados excepcionais, bem como assegurar a utilização do meio convencional de tramitação das ações quando tal método eletrônico resultar-se insuficiente, seja por indisponibilidade, problemas com conexão, quedas de energia dentre outros obstáculos enfrentados pelo sistema.
3.2 A resistência dos servidores do judiciário e magistrados
O sistema eletrônico implantado no judiciário encontrou rejeição por todas as partes envolvidas no processo, inclusive pelos servidores e magistrados, que clamam por ajustes no método virtual, aplicado em todos os 24 Tribunais Regionais do Trabalho, nos Tribunais de Justiça do Estado de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Maranhão, Minas Gerais e Roraima, como também no Tribunal Regional Federal da 5° Região.
A Associação dos Magistrados do Trabalho da 9° Região (Amatra IX) foi oficiada em dezembro de 2013, pelos Diretores de Secretaria das 23 Varas do Trabalho de Curitiba, em razão da insatisfação geral com relação ao sistema eletrônico implantado na Justiça do Trabalho (PJe-JT), no comunicado foi solicitado que o sistema fosse suspenso de imediato no Paraná, por não conseguir atingir o resultado desejado pela Justiça do Trabalho do estado, e não propiciar celeridade na prestação jurisdicional, bem como não reduzir os custos das demandas.
Servidores, magistrado e advogados, reuniram-se no Fórum de Discussão A Justiça do Trabalho e o PJe-JT, realizado em julho de 2013, no município de Florianópolis (SC), onde declararam ser contra a precipitada implantação do PJe-JT, por verificar que tal sistema é uma regressão comparado às tecnologias utilizadas anteriormente no TRT da 12° Região (SC), visto que a atual versão do procedimento não é segura e completa, acarretando prejuízos ao jurisdicionado e aos operadores do sistema que encontram dificuldades nos cumprimentos de prazos e tarefas.
O Fórum de Discussão reivindicou que fosse suspenso de imediato o PJe-JT implantado na Justiça do Trabalho de Santa Catarina, que a implantação sistema eletrônico (PJe-JT) só retomasse quando seu desenvolvimento fosse considerado satisfatório por seus operadores e por fim requereu a democratização do processo que decide sobre os problemas e soluções no sistema, descentralizando o procedimento, para que estes possam ser resolvidos pelos comitês regionais de negócios de cada TRT e não apenas pelos órgãos de cúpula como o CNJ, possibilitando que os usuários discutam diretamente com os responsáveis pela correção da falha, adequando a suas necessidades.
Noemia Porto, juíza Titular da Vara do Trabalho de Araguaína-TO, em nota técnica da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da justiça do Trabalho), relatou os problemas do PJe apontado pelos magistrados, e declarou que o sistema não atende a nenhuma das seis características importante para um adequado funcionamento, dentre elas a funcionalidade e eficiência, e argumentou “O que queremos é que o PJe funcione, mas a virtualização dos processos precisa ser gradual, inclusive pensando na inclusão digital”. (Disponível em: <http://www.fenajufe.org.br/index.php/imprensa/ultimas-noticias/1590-pje-e-muito-criticado-durante-audiencia-publica-realizada-na-camara-dos-deputados> Acessado em: 30 de abril de 2014).
A desembargadora federal Marisa Santos, coordenadora dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região, expôs as dificuldades enfrentadas com o sistema, a exemplo da digitalização de documentos e sigilo das informações, uma vez que o processo eletrônico não se trata apenas da digitalização do processo, e argumenta: “O processo judicial eletrônico é aquele que tem um sistema em que todos os atos processuais são praticados dentro dele, ou seja, audiência, intimação e o peticionamento sem necessidade de digitalização”. (Disponível em: <http://web.trf3.jus.br/noticias/Noticias/Noticia/Exibir/290395> Acessado em: 30 de abril de 2014).
A transferência do processo físico para o eletrônico requer um período de adaptação, devido a fatores relevantes, como a necessidade de adaptação cultural ao novo método pelos operadores da atividade administrativa do judiciário, magistrados e etc. como a necessidade da realização de treinamentos adequados para estes usuários.
O renomado Hely Lopes de Meirelles, ao tratar do principio da eficiência na atividade administrativa menciona:
O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. (MEIRELLES, 2009, p.98).
A informatização do judiciário se tornou algo inevitável, entretanto o sistema automatizado da justiça precisa de melhorias nos ajustes para minimizar ao máximo as deficiências apresentadas, oferecendo credibilidade aos seus operadores, para que possa existir excelência na prestação do serviço.
3.3 As barreiras para a prática do jus postulandi
O jus postulandi diz respeito à capacidade de qualquer interessado postular suas pretensões perante as instâncias judiciárias independentemente de advogados, embora a Constituição Federar em seu art. 133 afirme ser indispensável à figura do patrono, há exceções como nas causas trabalhistas (Arts. 786 e 791 CLT e súmula 425 TST), e nos Juizados Especiais até o limite de 20 salários mínimos (Art. 9 da Lei n.º 9.099/1995).
O direito do individuo pleitear sem a assistência do advogado, foi afetado com a implantação do PJe, uma vez que determinados documentos no processo judicial eletrônico só podem ser acessados por advogados e magistrados, sendo necessário que as partes façam prévio cadastramento para visualização das peças processuais.
A exigência do cadastramento junto aos órgãos competentes, a necessidade das partes terem um domínio das noções de informática, e precisarem adquirir computadores modernos, dotados de recursos velozes de navegação da internet, capazes de manusear o sistema do PJe são barreiras para a prática do jus postulandi.
O juiz substituto da 33° Vara do Trabalho de Salvador, Murilo Carvalho Sampaio Oliveira, entende que a ferramenta do PJe obriga a contratação de advogados por parte dos empregados e empregadores, para ele três peculiaridades tornam o advogado indispensável nas ações movidas pelo sistema, são elas o certificado digital, na qual o cidadão comum não tem obrigação de possuí-la, dependendo de um advogado para apresentar documentos e petições no processo eletrônico, além da dificuldade técnica-jurídica enfrentada pelo demandante leigo, há dificuldades de natureza informática, na ação eletrônica, também é de competência do autor lançar informações sobre o processo, que no método convencional era atribuição dos servidores da justiça.
Tudo isso, exige do advogado e da parte que postula em causa própria à realização de cursos de capacitação tecnológica para atuar junto ao sistema operacional digital, o pagamento de taxas e anuidades para a habilitação e manutenção do seu cadastro junto ao banco de dados, além dos litigantes passarem a arcar com os honorários de sucumbência, o que não acontecia quando os dois polos da demanda se utilizavam do jus postulandi.
José Carlos de Araújo Almeida Filho, ao fazer considerações a cerca do Processo Eletrônico, menciona:
Para a adoção de meios eletrônicos, é necessário que a parte se encontre adaptada à Medida Provisória n. 2.200-2/2001, ou seja, que possua uma certificação digital. Em termos de certificação digital, podemos afirmar que a mesma não é barata e os custos com o processo podem elevar. Se, de um lado, o que se pretende é a agilidade do Judiciário, por outro lado, temos a impossibilidade de obrigar uma pessoa a adquirir um certificado digital, para assinar petições etc. (art. 5°, II, da CR/88). (ALMEIDA FILHO, 2010, p.112).
O juiz titular da 10ª Vara do Trabalho de Brasília, Márcio Brito, entende que a presença do advogado é indispensável à administração da Justiça, mas para o magistrado é fundamental manter a validade do jus postulandi. De acordo com o juiz que atuou seis anos na Vara do Trabalho de Dianópolis, interior do Tocantins, antes da instauração do processo judicial eletrônico (Pje-JT), cerca de 50% a 60 % das ações trabalhistas que tramitavam na vara eram ajuizadas pelos próprios trabalhadores, posteriormente com a implantação do sistema, que acarretou dificuldades na prática do jus postulandi, o número dessas ações foi reduzido.
A obrigatoriedade dos Tribunais para a utilização do PJe, não assegurando as partes a possibilidade de atuar em causa própria sem a assistência do advogado, não facultando-lhes a utilização do método convencional de peticionamento, não disponibilizando serventuários para digitalização das petições, bem como não desobrigando o cadastramento das partes para visualização das peças processuais, terminam por dificultar o acesso à justiça.
3.4 A vulnerabilidade do PJe
A informática propicia a comunicação eletrônica entre os diversos lugares do mundo por meio da ferramenta: Internet, entretanto todas as pessoas que dela se utilizam não tem sua privacidade resguardada, estando sujeito aos ataques dos “predadores do sistema”, que burlam a segurança. (MARTINS; MARTINS, 2001).
O Brasil está entre os três países com maior número de sites vulneráveis, a brecha na segurança permite que hackers roubem senhas de usuários em muitos sites da web e aplicativos móveis, tal falha já está sendo considerada uma das maiores da história da Internet.
É grande a dificuldade no controle das comunicações eletrônicas, considerando a sua abrangência nacional e internacional, em consequência disso, por mais que os sistemas tenham uma segurança considerável, não estão impossibilitados de invasão.
Ives e Rogério Martins ao tratar da privacidade na comunicação eletrônica mencionam:
[...] Qualquer controle sobre a comunicação eletrônica propicia, também pequenos resultados, visto que dois fatores dificultam supervisão maior: a) a possibilidade de os pontos de ignição do sistema encontrarem-se fora do alcance dos países com regulação jurídica possível; b) os gênios da informática dificultarem sua localização, sobre poderem ter acesso, quebrar sistemas de segurança, invadir e destruir informações alheias, com razoável frequência e impunidade. (MARTINS, Ives Gandra; MARTINS, Rogério Vidal, 2001, p. 42).
Almeida Filho ao discorrer sobre a insegurança dos sistemas de informação em rede e as citações realizadas pelo processo eletrônico menciona:
Os hackers, krackers e os lammers não pouparão esforços no sentido de interceptarem comunicação entre os tribunais e o citando. Isto sem considerar que a mensagem poderá não chegar ao destinatário por motivos diversos dos ataques, como a mudança de correio eletrônico ou indisponibilidade do sistema. [...] Entendemos ser de bom alvitre que as citações sejam realizadas pelos meios ordinários. Não somente em termos de problemas técnicos, mas em virtude de possibilidade de interceptação de dados de telemática. (ALMEIDA FILHO, 2010, p. 208, grifo do autor).
O presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho enviou ofício ao CNJ em janeiro do presente ano, comunicando que fossem efetuados testes públicos de vulnerabilidade e de estabilidade no sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJe), visando à preservação dos direitos e das garantias fundamentais, do devido processo legal e da segurança jurídica. Tal solicitação veio depois do apagão sofrido pelo PJe em 15 de janeiro do mesmo ano, que afetou o trabalho dos advogados de todo o país. O incidente ocorreu quando uma atualização do sistema operacional Java impediu encaminhamento de processos.
Marcos Vinicius, ao discorrer sobre o apagão do sistema operacional do PJe mencionou: “A implantação gradual é a forma mais correta para evitar problemas, pois todo sistema está sujeito a falhas [...] Há de se levar em conta a acessibilidade e a infraestrutura tecnológica de cada região do país para que não voltemos a ver situações como esta.” (Disponível em: <http://www.oab.org.br/noticia/26595/oab-solicita-ao-cnj-testes-de-vulnerabilidade-e-estabilidade-do-pje> Acessado em: 06 de maio de 2014).
Em agosto de 2013 a OAB nacional solicitou ao CNJ 63 razões de melhorias na implantação do PJe, dentre as considerações estão a necessidade de fornecer protocolo eletrônico de recebimento, uma vez que o sistema exibe somente um documento HTML, vulnerável, podendo ser editado, insuficiente para comprovar o peticionamento feito pelo advogado, caso o Tribunal denegue o recebimento da petição.
A respeito do recibo eletrônico de protocolo, dispõe o artigo 10 da Lei n. 11.419/06:
Art. 10. A distribuição da petição inicial e a juntada da contestação, dos recursos e das petições em geral, todos em formato digital, nos autos de processo eletrônico, podem ser feitas diretamente pelos advogados públicos e privados, sem necessidade da intervenção do cartório ou secretaria judicial, situação em que a autuação deverá se dar de forma automática, fornecendo-se recibo eletrônico de protocolo. (BRASIL, 2006).
A precariedade dos recibos fornecidos equipara-se a, em meio físico, entregar uma única via da petição ao Tribunal confiando que ela não será extraviada, exemplificadamente, é como se, ao receber a petição em papel, o funcionário do protocolo solicitasse ao advogado que anotasse o número de protocolo daquela peça no sistema, tal número seria facilmente manipulável.
Outras solicitações feita pela OAB seria a alteração do PJe para o funcionamento off-line, o que cessaria os problemas de instabilidade do sistema, em decorrência da qualidade das conexões, esse modelo de trabalho seguiria o exemplo da Receita Federal do Brasil – RFB, no qual os atos podem ser praticados sem que haja uma conexão. Requereu-se também o aumento do tamanho dos arquivos para o envio, uma vez que com apenas 1,5 Mb exige-se conhecimentos técnicos e específicos de informática.
Requisitou-se também que houvesse uma comunicação permanente com a ICP-Brasil para verificar a lista de certificados revogados (LCR), para que os advogados cadastrados no sistema que não possuam certificado digital válido sejam assegurados de receberem intimações pelas vias ordinárias até sua regularização, caso contrário o profissional estará impedido de receber suas intimações, em razão da mesma ser feita pelo método eletrônico.
Outra insegurança a ser combatida é estabelecer a necessidade de guardar documentos físicos que venham a ser inseridos no sistema pelos servidores, pois caso haja posteriormente a necessidade de realização de perícia, se o documento original for destruído não terá como distinguir, por exemplo, um documento autêntico de um onde a assinatura tenha sido digitalizada e impressa de outro documento.
A fragilidade do sistema PJe, possibilitando que atos processuais relevantes, como intimação e citação, não alcance suas finalidades por invasões no sistema, a precariedade do recibo eletrônico de protocolo, não resguardando os advogados dos seus atos praticados, dentre outras vulnerabilidades constatadas no sistema, são motivos relevantes para que utilize o método convencional de tramitação quando o eletrônico for incapaz de oferecer uma prestação jurisdicional segura e eficiente, caso contrario o acesso a justiça será prejudicado além de causar descrença aos usuários.
REFERÊNCIAS
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