A sociedade e suas demandas atuais exigem a transformação / evolução do cargo de delegado federal a fim de conferir maior tecnicidade jurista aos que exercerem tal múnus, bem como a consciência inafastável de sua condição de servidor público, cujo norte para guiar sua postura deve ser sempre o interesse público, o bem comum e a defesa inabalável da Constituição Federal.
O Delegado Jurista é a união do advogado, cujo dever maior é promover a defesa da Constituição, sendo esse essencial à administração da Justiça, nos termos do artigo 133 da CR de 1988, com o delegado técnico e consciente de sua condição de servidor público que tem o dever de promover a segurança pública e a defesa da sociedade, nos termos do artigo 144 da Constituição Federal.
Mas porque dizer que o Delegado Jurista seria a junção / a soma do delegado ao advogado?
É notório e expressamente exigido nos Editais que regulam os respectivos certames que para tomar posse e exercer o cargo de juiz (magistrado) ou membro do ministério público, após a devida aprovação em concurso público, o candidato deverá ter preenchido o requisito essencial de ter exercido a advocacia e ter sua regular inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil pelo prazo de 03 (três) anos.
Assim, entendo que a advocacia é o início, o meio e o fim do jurista, seja qual for a sua especificidade ou modalidade, consultiva ou contenciosa. Acredito e defendo que esse requisito de ter exercido 03 (três) anos de advocacia deveria e provavelmente será aplicado aos concursos de delegado, é uma consequencia inevitável.
Assim, tal evolução do cargo de delegado exige novas armas. Exige-se, portanto, a paridade de armas, sendo uma delas a necessidade de conferir ao Delegado de Polícia Federal a garantia da independência funcional, o que foi instrumentalizado no Projeto de Emenda constitucional nº 293/2008, atualmente em trâmite perante a Câmara dos Deputados Federais, como adiante será exposto.
A Lei nº 12.830, de 20 de junho de 2013, conforme ensinamento do professor Elster Lamoia de Moraes[1], em seu artigo 2º[2], determinou que as funções de polícia judiciária e apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essências e exclusivas de Estado.
Outrossim, a Lei nº 12.830/13, em seu artigo 2º, §5º, garantiu a remoção do Delegado dar-se-á apenas por ato fundamentado. O §6º determinou que o indiciamento será por ato privativo do Delegado mediante análise técnico-jurídico. Tais inovação são positivas, mas não são suficientes.
O artigo 2º de forma expressa que atividade em comento é essencial ao Estado, assim como o Ministério Público e a Defensoria Pública, nos termos dos artigos 127 a 135 da Constituição da República.
O Artigo 3º da mesma Lei nº 12.830/13 determinou que o cargo de delegado de polícia é privativo de bacharel em Direito, devendo-lhe ser dispensado o mesmo tratamento protocolar que recebem os magistrados, os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público e os advogados.
Tratamento protocolar são as formalidades adotadas em atos oficiais e solenidades. A maquina legislativa federal não seria utilizada tão somente para assegurar que os Delegados recebessem em suas correspondências e expedientes a estes dirigidos o tratamento pronominal de Vossa Excelência. Entendo que o legislador quis e foi além disso, conferiu e assegurou aos Delegados garantias para o desempenho de suas atividades equivalentes aos dos magistrados, membros do ministério público, defensores públicos e advogados.
Em relação ao presente, cabe colacionar as palavras do mencionado professor Elster Lamioa de Moraes:
Interpretendo-se de forma sistêmica os artigos 2º e 3º da Lei nº 12.830/2013, podemos concluir que a expressão “tratamento protocolar”, mais do que uma remissão ao pronome de tratamento que deve ser utilizado nos documentos e correspondências dirigidos aos Delegados de Polícia, busca nortear a forma como devem ser tratadas tais autoridades em outros atos oficiais ou solenes relativos às funções por eles desempenhadas, tendo como parâmetro a legislação relativa aos magistrados, promotores, defensores públicos e advogados.
Nesse diapasão, no que tange à convocação dos Delegados de Polícia para testemunhar em processos criminais, processos cíveis ou em outros processos ou procedimentos administrativos, deverá o juiz ou autoridade administrativa competente consultar os Delegados de Polícia previamente sobre o dia, hora e local em que poderão ser ouvidos (art. 33, I, da LC nº 35/79; art. 40, I, da Lei nº 8.625/93 e art. 44, XIV, da LC nº 80/94).
(...)
Não bastasse isso, é assegurado ao Delegado de Polícia o direito de utilizar privativamente as insígnias e símbolos privativos do seu cargo (art. 41, X, da Lei nº 8.625/93xii; art. 44, IV, da LC nº 80/94xiii e art. 7º, XVIII, da Lei nº 8.906/94xiv).
Por fim, a simples leitura do art. 3º aqui transcrito torna inequívoco que ao Delegado de Polícia, da mesma forma que aos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública, deve ser dispensado idêntico tratamento pronominal ao dos magistrados.
Lei Orgânica Nacional do Ministério Público:
Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica:
I - receber o mesmo tratamento jurídico e protocolar dispensado aos membros do Poder Judiciário junto aos quais oficiem;
Em relação ao nivelamento do Delegado ao Advogado, e consequente aplicação da Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, cabe colacionar os seguintes termos do artigo mencionado anteriormente do professor Lamoia[3]:
Quando ofendido no exercício da profissão ou em razão dela, é assegurado ao Delegado de Polícia o direito de ser publicamente desagravado (art. 7º, XVII, da Lei nº 8.906/94xi).
Ressalta-se, ainda, que nos termos do artigo 133 da Constituição da República o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Ainda, em relação à Defensoria Pública, cabe mencionar os termos do artigo 134 da CR de 1988 no qual determina que a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado.
Essa evolução alcança seu ápice quando atribuído ao cargo de Delegado a independência funcional, composta pela vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios, o que confere segurança e independência no desenvolvimento de suas atividades, e o mesmo a exerce de forma técnico jurídico, com a consciência de que é servidor público, no mais elementar conceito da palavra servidor, que deve ser inundada pela intenção e objetivo de promover e proporcionar o bem comum, bem estar da sociedade, de atender o interesse público e de prestar ao cidadão o serviço público que a Lei o atribuiu.
A evolução em comento se completa quando o cargo de Delegado passa a ser exercido por aquele concursado que, anteriormente, militou / exerceu o múnus da advocacia. Daquele que exerceu a advocacia pura, com a consciência de que tal função é essencial à administração da Justiça, nos termos do artigo 133 da Carta Maior, cujo norte é a defesa da Constituição da República.
Não resta dúvida de que o Delegado Federal deve possuir paridade de armas no exercício de seus encargos, munido da independência funcional, consciente de que é servidor público, de que deve proteger a Constituição da República Federativa do Brasil, como competência e conhecimentos jurídicos elevados, reputação ilibada e voltado à defesa e construção de uma sociedade justa, onde a Justiça deixe de ser um ideal utópico e passe a ser uma realidade concreta, comum e parte do cotidiano, sem a qual o cidadão não suporte estar desprovido da mesma, da mesma forma que não suporta ser usurpado de sua liberdade ou do próprio ar que respira.
Esse é o Delegado Jurista. É a união do delegado técnico jurídico consciente de sua condição e função de servidor público voltado à prestação do serviço público de qualidade e alto nível, preocupado em atender o cidadão e contribuir para construção de um Estado Democrático de Direito e proporcionar o bem comum e uma sociedade mais justa, aliado a sua experiência e vivência na militância e exercício da advocacia voltada à defesa da Carta da República de 1988, função maior do advogado, exercendo suas atribuições no combate ao crime, na luta por Justiça.
[1] MORAES, Elster Lamioa de. Artigo Tratamento protocolar dispensado ao Delegado de Polícia;
{C}[2]{C} Art. 2o As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
[3] MORAES, Elster Lamioa de. Artigo Tratamento protocolar dispensado ao Delegado de Polícia;